Tecladista fundador do Soft Machine e uma das figuras mais icônicas do rock psicodélico inglês – e um dos responsáveis por transformá-lo em rock progressivo -, Michael Ratledge nos deixou nesta quarta-feira, depois de uma súbita doença, como seu amigo e ex-companheiro de banda John Etheridge escreveu em sua página no Facebook. “Mike era a espinha dorsal do Soft Machine mo início e um sujeito com uma mente absolutamente incisiva – compositor e tecladista maravilhosos. Um verdadeiro homem da renascença – tão talentoso, culto, charmoso – e uma companhia maravilhosa. Nos encontrávamos por semanas nos últimos quarenta anos – um deleite para mim.” Ratledge, conhecido pelos solos endiabrados que caracterizavam a primeira fase da banda, completava um quarteto que era formado apenas por David Allen, Robert Wyatt e Kevin Ayers, a nata da cena de Canterbury, que ainda pariu monstros sagrados como Wilde Flowers, Gong, Caravan, Khan e Camel.
Chocado com a notícia da partida de Boss in Drama, uma das produtoras mais importantes da música eletrônica brasileira dos últimos quinze anos. Nascido Péricles Oliveira, vinha transicionando nos últimos anos e morreu como Peppa Oliveira, sem deixar de lado o apelido que a tornou conhecida no meio, Boss in Drama. Com esse epíteto, tornou-se a produtora responsável por tornar Karol Conká uma febre das pistas, além de ter sido chamada para fazer remixes para deus e o mundo – de Anitta a Linn da Quebrada passando pelas gringas Nicki Minaj, Ariana Grande e Taylor Swift. A notícia foi confirmada pelo amigo da produtora, o jornalista Fernando “Fefito” Oliveira, que divulgou a passagem da amiga pelo Instagram.
Marianne Faithfull, que nos deixou nesta quinta-feira sem que a causa de sua morte fosse revelada, foi mais do que um dos principais ícones da cultura inglesa dos anos 60. Com sua trajetória errática e sempre cercada de grandes artistas, ela viveu uma saga que poderia ser uma parábola para seu tempo, encostando no céu daquela década transformadora ao mesmo tempo em que afundava seus pés no inferno do mesmo período. Musa dos Rolling Stones e depois uma das principais parceiras de Mick Jagger, ela gravou a primeira música composta por Jagger e Keith Richards, que nunca haviam composto em dupla até então, eternizando-se com a incrível balada “As Tears Goes By”. Sua carreira musical misturava-se com o fato de ser um ícone da moda da Swinging London e também uma atriz cobiçada pelos grandes nomes do cinema do período – de Orson Welles a Jean-Luc Godard (que chamou-a para interpretar ela mesma no filme Made in the USA), passando por Alain Delon e Anna Karina e grandes nomes do teatro da época, como Glenda Jackson, Anjelica Huston e Oliver Reed. Seu envolvimento com cocaína e heroína foi também inspiração para grandes músicas dos Stones, como You Can’t Always Get What You Want”, “Wild Horses” e “Sister Morphine”. Ela terminou a década como um retrato do período: viciada e morando na rua, só conseguiu se reerguer quase dez anos depois, quando gravou o álbum Broken English e voltou a colaborar com outros nomes da música, como PJ Harvey, Nick Cave, David Bowie, Lou Reed, Jarvis Cocker, Damon Albarn, Emmylou Harris, Beck e Metallica, além de seguir atuando – interpretou deus em dois episódios da série cômica inglesa dos anos 90 Absolutely Fabulous, o diabo em uma produção de 2004 do musical The Black Rider, escrito por Tom Waits e William Burroughs, e a imperatriz Maria Tereza no Marie Antoinette de Sofia Coppola. Morre com a reputação no lugar depois de altos e baixos e deixando um legado que vai além de sua obra, mostrando a importância da arte de viver.
Morreu, nesta terça-feira, o último sobrevivente da The Band, lendária banda que acompanhou Bob Dylan em sua fase elétrica e que ajudou o mundo do rock entender que música de raiz norte-americana não era só o country. Garth Hudson também não foi apenas o último a entrar no grupo – quando ainda acompanhavam o herói roqueiro canadense Ronnie Hawks no comecinho dos anos 60 e atendiam pelo nome de The Hawks -, como também era o integrante mais velho, três ou quatro anos a mais que o restante do grupo, o que, mesmo quando essa diferença de idade torna-se irrelevante após o início dos 20 anos, dava um ar de irmão mais velho e às vezes até de figura paternal para o grupo canadense. Ao escolher o antiquado órgão Lowrey como se principal instrumento – um contraponto quase ancestral em relação às marcas que mais faziam sucesso entre seus contemporâneos naquele período, como Hammond e Fender Rhodes -, deu ao grupo um ar de mistério e longevidade que seria a essência da banda depois que ela começou a andar com as próprias pernas, no meio dos anos 60. Dylan os convidou para acompanhá-lo numa histórica turnê pela Inglaterra em 1966, quando tocava metade do show só ao violão e a outra metade acompanhado pelo grupo, o rock mais alto que o antigo império havia ouvido, e o teclado de Hudson ligava todo o espalhafato ruidoso dos outros instrumentistas como um cimento em forma de microfonia que parecia ter sido feito séculos atrás. Sua presença dava um ar arcaico e solene ao som emitido por Dylan e sua nova banda, que referida por ele apenas como “a banda”, que foi responsável por consolidar o jovem bardo estadunidense como uma voz superior a todos os outros nomes da dita fase clássica do rock – e além disso podia tocar saxofone quase de surpresa no meio dos shows. Depois de acompanhar Dylan, o grupo que havia assumido o nome de The Band lançou dois álbuns – Music from the Big Pink e um com o próprio – que os colocou na história do rock, além de inventar, dentro do novo mundo da música pop, uma música caipira da América do Norte que não soava conservadora, reacionária ou preconceituosa, mas consciente de sua importância pátria sem cair nas caricaturas do patriotismo. O vínculo com Dylan atravessou os anos 70 quando o grupo acompanhou o velho compadre em uma longa turnê (quase toda recém-lançada em disco na íntegra, na caixa Bob Dylan & The Band – The 1974 Live Recordings, que expande o disco duplo Before the Flood, lançado naquela época, para apenas 27 discos diferentes) e viu surgir, com o nome de The Basement Tapes, num álbum extemporâneo gravado nos anos 60 e lançado só no meio da década seguinte. Este laço culminou em tornar a importância da The Band imprescindível para a música de seu país e após encerrar as atividades, uma década após sua fundação, em um registro ao vivo tornado histórico ao ser dirigido por Martin Scorsese no musical The Last Waltz. Hudson, como os outros integranres do grupo, seguiu e carreira solo e colaborou com grandes nomes de sua geração, como Emmylou Harris, Van Morrison e Leonard Cohen. A banda voltou à atividade em 1983, mas terminou três anos depois quando o baterista e tecladista Richard Manuel cometeu suicídio em 1986. Em 1999, o baixista Rick Danko morreu dormindo e o baterista Levon Helm morreu de câncer em 2012. Há dois anos foi a vez do guitarrista Robbie Robertson, deixando Hudson como o solitário representante vivo de um dos grupos musicais mais importantes da história dos EUA. Agora a banda está completa.
Voz marcante do jornalismo esportivo brasileiro, Leo Batista morreu neste domingo após complicações devido a um câncer no pâncreas. Conhecido por diferentes gerações por apresentar momentos específicos da cobertura esportiva – como o programa dominical os Gols do Fantástico, o resultado da loteria esportiva ou o programa Esporte Espetacular, todos na Rede Globo -, Leo começou no rádio e devido a um plantão foi a voz que anunciou ao resto do Brasil o suicídio do presidente Getúlio Vargas em 1954. Cobriu 13 Copas do Mundo e 13 Olimpíadas e também foi o primeiro locutor de TV a apresentar competições de fórmula 1 e de surfe no Brasil. Mais um ícone do entretenimento brasileiro que nos deixa.
A morte súbita de David Lynch de alguma forma já estava marcada depois que um dos principais autores do século 20 foi diagnosticado com complicações pulmonares, que lhe obrigaram a parar de fumar. O fim do hábito que cultivava desde os 8 anos de idade e era tão característico de sua personalidade no ano passado, de alguma forma acelerou o processo de despedida de Lynch, cujos pulmões também sofreram com a fumaça dos recentes incêndios californianos que assolaram o ar da cidade que escolheu para morar, Los Angeles. Um artista surrealista temporão, ele trouxe todo o credo daquela escola do começo do século para o cinema comercial e depois para a TV e convenceu indústria e público que não era preciso explicar-se para fazer sentido. Sua noção de significado e expressão artística passava necessariamente por sua régua lúdica, com a qual brincava com a dúvida, o desconhecido e o onírico em histórias que mexiam com arquétipos básicos da narrativa contemporânea: o detetive, a estrada, a garota perfeita, o anti-herói, o maluco, o executivo, a femme fatale e a garota ao lado, sempre equilibrando-os entre o delicado e o anormal, o nonsense e o sarcástico, o radiante e o sombrio. Mas sua principal obra vai além de clássicos únicos como Veludo Azul, Cidade dos Sonhos, Eraserhead, O Homem Elefante, Coração Selvagem, A Estrada Perdida, História Real, Império dos Sonhos e sua obra-prima, as três temporadas e o filme e os extras do universo Twin Peaks, que era sua versão da Bíblia. Sua maior contribuição é sua própria persona, um artista exigente e afável que misturava arte, trabalho e vida como se estas três partes fossem uma coisa só – e seus melhores alunos sabem que realmente são. Obrigado, mestre.
Muito triste saber que dona Diva Guimarães, que emocionou a Flip e o Brasil em um depoimento espontâneo em 2017, morreu no sábado passado. Foi a primeira vez que a Festa Literária Internacional de Paraty abriu o microfone para a participação do público e Diva, professora, foi a primeira a falar durante uma mesa em que participava o ator e escritor Lázaro Ramos, quando sentiu-se à vontade para contar toda a dor do racismo que atravessou sua biografia, num depoimento que recupero para lembrar sua passagem. Era minha quarta Flip à frente das redes sociais do evento e quando soube daquela tocante participação não tive dúvidas sobre a possibilidade de publicar no Facebook da festa, o que transformou sua participação não apenas em uma das principais atrações do ano, mas também trouxe à tona questões ligadas à escravidão que ainda fingimos esconder sob a sensação de normalidade que ainda paira sobre o país. Aquela fala a transformou em uma voz a ser ouvida e durante a festa pude colocá-la ao lado de Conceição Evaristo, que tanto admirava. Diva seguiu sendo ouvida em outros programas e entrevistas, levando sua triste história para milhões de pessoas no Brasil e escancarando uma ferida que fingimos ter cicatrizado. Obrigado pela coragem de contar sua história.
Um dos principais nomes da cena folk norte-americana que viu nascer Bob Dylan no início dos anos 60, Peter Yarrow morreu nesta terça-feira, vítima de um câncer na bexiga. Ao lado de Albert Grossman, que seria o futuro empresário de Dylan, ele vislumbrou a possibilidade de criar um trio vocal nos moldes do Kingston Trio, tocando apenas músicas folk, mas com a presença de uma garota. que ele encontrou em Mary Travers, que tinha ares de Brigitte Bardot. Ao lado de um terceiro vocalista, Noel Stookey – cujo nome do meio era Paul -, criou o grupo que ajudou a popularizar o gênero nas rádios dos EUA antes da chegada dos Beatles ao país, espalhando inclusive a palavra de Dylan ao fazer sua “Blowin’ in the Wind” atingir um público ainda maior. O grupo continuou reunido até Yarrow ser preso por abusar de uma garota menor de idade, em 1970, e teve o perdão presidencial dado pelo recém-falecido ex-presidente dos EUA Jimmy Carter.