Por Alexandre Matias - Jornalismo arte desde 1995.
Aquele sábado está chegando… No próximo dia 20, eu, Clarice, Camila e Claudinho nos reunimos para mais uma sessão de celebração intensa e acabação saudável quando transformamos o amplo espaço do nosso querido Bubu em uma das pistas mais felizes da cidade. É o dia do Desaniversário, em que enfileiramos hits de todas as épocas para fazer todo mundo dançar sem parar. Você já sabe que além do astral altíssimo, nossa pista também é a favor da redução de danos para nós jovens adultos que queremos aproveitar o domingo, por isso começamos cedo – às 19h – para acabarmos cedo também – por volta da meia-noite. O Bubu fica na marquise do Estádio do Pacaembu (Praça Charles Miller, s/n°) e estaremos te esperando nesse sábado pra se acabar de dançar com a gente!
Coisa séria a apresentação que reuniu Arnaldo Antunes e Vítor Araújo neste fim de semana no Sesc Pinheiros. Comemorando o lançamento da edição ao vivo do tocante Lágrimas no Mar, a dupla voltou a se encontrar num dos primeiros palcos que viu este espetáculo, trazendo algumas novidades. O fato de contar com apenas um músico e instrumentista no palco – e deste ser o prodígio erudito pernambucano – e dos dois estarem trajando ternos e gravatas pretos aumenta a tensão de recital da apresentação, fazendo o público ficar mudo e maravilhado por quase uma hora e meia, quebrando o silêncio apenas com as palmas entre as canções. O espetáculo reúne faixas de diferentes fases da carreira de Arnaldo, que ficaram conhecidas tanto em sua voz (seja na carreira solo – “Contato Imediato”, “Se Tudo Pode Acontecer”, “No Fundo” e “Alta Noite” – quanto com os Titãs – “O Pulso” e “Saia de Mim”) quanto na de outros intérpretes, como Erasmo Carlos (“Manhãs de Love”), Marisa Monte e Carminho (“Vllarejos”), Cássia Eller (“Socorro”) e Maria Bethânia (“Lua Vermelha”, parceria com Carlinhos Brown), com maior ênfase nas recentes “O Real Resiste”, “Na Barriga do Vento” e “João” e, claro, nas canções pinçadas para o registro em disco, como “Longe” (composta com Betão Aguiar e Jeneci), “Umbigo”, “A Não Ser”, “Enquanto Passa Outro” e a faixa-título, além de versões para “Fim de Festa” (de Itamar Assumpção e Naná Vasconcelos) e “Como Dois e Dois” (de Caetano Veloso, interpretada ao lado da diretora de arte do show, Márcia Xavier, que também assina as belas projeções da noite). Claro que o texto das canções ajudava a desanuviar o rigor que o ar de recital dava à noite, ainda mais pontuada pelos poemas curtos e diretos de Arnaldo (“A Boca Oca”, “Um Deus”, “O Corpo”, “Saga”, “O Mar”, “O Buraco do Espelho” e “Bacanas”) que interligavam as canções, mas a entrega de Vítor ao piano, que enfatiza o aspecto percussivo do instrumento ao mesmo tempo em que toca suas cordas por dentro ou grava loops para criar camadas de si mesmo sobre as canções (além de tocar a versão bachiana para “O Trenzinho Caipira”, de Villa Lobos, e a luz densa e implacável de Anna Turra, mantém o clima austero e sisudo na noite, mas sem nunca perder o calor.
E outra atração do fim de semana foi o primeiro show de volta do No Doubt, que aconteceu no primeiro fim de semana do Coachella, o mesmo que viu o encontro de Lana Del Rey com Billie Eilish no dia anterior. Além de desfilar hits de diferentes fases da banda, Gwen Stefani ainda proporcionou o encontro com outra atração surpresa, desta vez Olivia Rodrigo, com quem dividiu os vocais em “Bathwater” – mas o dueto não provocou o mesmo frisson que o da sexta-feira. Não dá pra dizer o mesmo do momento em que a vocalista incitou o público a cantar junto a imortal “Don’t Speak”. Que beleza.
Escalada para a fechar a primeira noite dos dois fins de semana do Coachella, Lana Del Rey encerrou a primeira sexta-feira feira do festival norte-americano recebendo ninguém menos que Billie Eilish no palco. Ela já havia anunciado a presença de convidados ilustres, como seu produtor Jack Antonoff e o multiinstrumentista Jon Baptiste (ambos com apresentações individuais no evento), mas ninguém contava com a presença de Billie, que surgiu ao final da apresentação para dividir vozes com Lana em uma faixa de cada, não por acaso seus primeiros respectivos sucessos: cantaram “Ocean Eyes” de Billie e “Video Games” de Lana e depois ficaram trocando sorrisos, olhares e elogios. “É a voz da nossa geração, a voz da sua geração e estou grata pra cacete que ela está aqui ao meu lado cantando minha música favorita”, comemorou Lana. Billie, por sua vez, não mediu palavras pra celebrar sua heroína: “Eis a razão da existência de metade de vocês putos – incluindo eu! Lana Del Rey, caras, vamo lá!”
Duas bandas distintas, de gerações e formações diferentes, sintonizaram vibes parecidas nessa sexta-feira no Inferninho Trabalho Sujo. Antes da entrada da banda Ondas de Calor foi a vez do quarteto Celacanto, grata surpresa que foge do indie rock que vem sendo feito no Brasil com letras e melodias complexas que fogem das referências de sempre. O show ainda contou com a participação de Lauiz Orgânico, tecladista e produtor do grupo Pelados que acaba de produzir o primeiro álbum da banda. Formado por Miguel Lian Leite (vocal e guitarra), Eduardo Barco (guitarra e acordeão), Matheus Arruda (baixo) e Giovanni Lenti (bateria), o Celacanto tocou pela primeira vez no Picles e está pronto para desbravar mais palcos da cena independente paulistana – e do Brasil. Fique atento.
Depois do Celacanto foi a vez do grupo Ondas de Calor tocar no Inferninho Trabalho Sujo, fazendo a segunda apresentação de sua carreira. Apesar de novíssima (a banda não tem nem conta no Instagram), o Ondas é formado por músicos veteranos da cena que começaram a tocar juntos acompanhando a cantora Soledad. Todos são multiinstrumentistas e passaram o show trocando de instrumentos: Davi Serrano ia da guitarra pro baixo e pro teclado, Xavier Francisco ia da bateria pra guitarra e pro baixo, Allen Alencar ia da guitarra pro baixo e pro teclado e Igor Caracas ia do teclado e percussão pra bateria e pra guitarra, todos tocando músicas compostas individualmente e arranjadas de forma coletiva. O show ainda teve a participação de Julia Valiengo, vocalista da Trupe Chá de Boldo, que contou a história da banda antes de entrar na versão que o grupo fez para “Portentosa”, da própria Soledad. Dois ótimos shows que deixaram a noite em ponto de bala pra eu e a Fran atravessar a madrugada fazendo todo mundo dançar… Foi bonito.
Outra sexta-feira, outro Inferninho Trabalho Sujo no Picles – e a noite tá naquela condição ideal de temperatura e pressão. Começamos os trabalhos com dois shows de duas bandas novíssimas, Celacanto e Ondas de Calor, cada uma delas com uma proposta diferente, mas que encontram pontos em comum em vibes distintas. Depois eu e Fran incendiamos a madrugada adentro como aquela saraivada de hits que faz a pista do Picles suar as paredes! Vamos lá? O Picles fica na Cardeal Arcoverde, 1838, e o primeiro show começa às 21h30.
E como não dá pra parar de ouvir o disco novo da Kim Gordon, pincei essa vez que ela tocou com os três sobreviventes do Nirvana quando a banda entrou para o Rock and Roll Hall of Fame, há dez anos. Ao lado de Dave Grohl, Krist Novoselic e Pat Smear, a ex-baixista do Sonic Youth arranca uma versão de “Aneurysm” do útero, algo que certamente faria o velho Kurt chorar de emoção – olha isso!
E antes da quinta acabar ainda pude ver a segunda noite dos shows que o Queremos fez em São Paulo, antecipando o festival que farão no sábado no Rio de Janeiro. Mais uma vez na Áudio, a produtora carioca reuniu duas atrações internacionais relativamente desconhecidas que trouxeram um bom público para a casa entrando na onda dos dois artistas, nomes em ascensão na cena soul jazz londrina. Quem começou a noite foi a impressionante Adi Oasis, que empunhando seu baixo com uma desenvoltura invejável, como seu carisma igualmente intenso, conquistou facilmente o público – e citar “Onda” do Cassiano ou chamar Luedji Luna para dividir o palco foram só as cerejas de uma apresentação de peso. Depois foi a vez do produtor e tecladista Alfa Mist, que levou o público para uma viagem mais jazz cabeçuda, que rapídamente hipnotizou os presentes. Mas acho que se a ordem das atrações fosse invertidas – deixando Adi Oasis para encerrar o dia -, a noite terminaria num clima ainda mais pra cima e alto astral do que terminou.
Na sexta aula do curso Bibliografia da Música Brasileira, que eu e Pérola estamos dando no Sesc Avenida Paulista, finalmente entramos no século 21 mostrando como a internet ampliou o número de focos e pólos de nossa música ao mesmo tempo em que novas cenas surgiam a partir das novas tecnologias digitais que entravam nas rotinas tanto dos artistas quanto do público. Voltamos um pouco no tempo para falar sobre mangue beat e música brega (citando autores como José Teles, Lorena Calábria, Paulo César de Araújo e Ronaldo Lemos) e como estas duas cenas estavam apontando para as transformações que viriam após a chegada da internet. Com o novo século, puxamos uma tese do livro O Som e o Sentido de José Miguel Wisnik e encaixamos com a do livro Música de Montagem de Sérgio Molina para falar sobre a mudança do formato canção e como a nova cena musical brasileira vem sendo retratada em livros cada vez mais raros.
#bibliografiadamusicabrasileira #sescavenidapaulista
Dua Lipa lançou o terceiro single de seu terceiro álbum, Radical Optimism, e deixando-me influenciar pelos títulos, percebo que o otimismo radical que batiza seu álbum é uma ilusão. “Illusion”, como os dois singles anteriores, apenas repete a fórmula de seu disco de 2020, Future Nostalgia, e mesmo que as digitais de um dos produtores do álbum (o homem Tame Impala Kevin Parker) estejam mais evidentes, não parece que ele conseguiu fazer com que a cantora inglesa desse o salto que parecia estar preparada. Jogando no seguro, ela preferiu seguir numa trilha dançante quase formulaica, que até funciona na pista, mas não expande seus horizontes. O clipe que acompanha o novo single é igualmente sem sabor, recriando coreografias na piscina filmadas de cima como se 2024 precisasse de um velho musical da RKO. Ainda fico na torcida de ela nos surpreender com o conjunto de sua próxima obra, mas até aqui ela tem se provado previsível – ainda que de um bom jeito.