80 anos se passaram e tudo continua igual

Café, ópera de Felipe Senna inspirada em Mario de Andrade @ Theatro Municipal (6.5.2022)

“Nenhum artista pode, mesmo que queira, não participar. Ou você não conformisticamente se inclui na coletividade ou conformisticamente se vende aos seus chefes. E não se iluda: num desses vocês há de estar”. Bem forte a ópera Café, composta por Felipe Senna sobre um libreto escrito por Mario de Andrade em 1941 e encenada por Sérgio de Carvalho no Theatro Municipal durante esta semana. Cogitando a possibilidade de um levante dos trabalhadores da cultura cafeeira frente à gana da especulação de uma elite brasileira que só os parasita, as questões de 80 anos atrás infelizmente eram idênticas às de hoje: crise política e econômica, soluções de mentira para problemas reais, como o desemprego, a miséria e a fome. A ópera foi montada com a Orquestra Sinfônica Municipal, o Coral Paulistano, o Balé da Cidade de São Paulo e o Coletivo Nacional de Cultura do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e teve as participações do ator Carlos Francisco e dos grandes Negro Leo e Juçara Marçal. Esta aparece ainda na primeira parte, imponente e na veia (como mostra o vídeo que consegui filmar na encolha, perdão pelo enquadramento cego), enquanto Leo surge gigante no ato final (esse não consegui filmar), atualizando as questões da era getulista para os dias de hoje com direito a fala de Marighella e protagonismo motoboy. Também filmei o encerramento da noite e bastava a presença das bandeiras do MST no Theatro Municipal para sintetizar o que foi aquela noite. E como disse a frase de Mario de Andrade que abre o texto e encerra a ópera: não se iluda. A ópera fica em cartaz até domingo mas os ingressos estão esgotados. Tem que ter mais.

Ouça aqui.