O dia em que o Orkut acabou

Hoje é dia de luto na internet brasileira e eu já escrevi meu réquiem pro Orkut. Se você ainda não salvou seus pertences do fim do Orkut, corra, hoje é o último dia.

funeral-do-orkut

Sdds Orkut.

Minha história sobre o Orkut

comunidades_alexandrematias

A Bia me pediu pra escrever um depoimento pra matéria que ela fez sobre o fim do Orkut no YouPix e, quando mal percebi, havia escrito um texto inteiro – que ele publicou em separado e eu republico a seguir:

Minha história sobre o Orkut: Alexandre Matias

Se eu pudesse salvar uma só coisa do meu Orkut, o que seria?“, me vi repetindo para mim mesmo a pergunta que a Bia Granja me fez ao abrir meu velho profile. Tirando o azul calcinha e o logo rosa, o Orkut em 2014 é bem diferente daquele que comecei a frequentar há dez anos e que larguei entre 2008 e 2009. Entrei em comunidades idiotas que criei por puro ócio, reli todos os meus testimonials, visitei álbuns que nem minha memória lembrava, passeei por scraps de um passado que parece mais remoto do que ele realmente é. E, enquanto isso, fui teletransportado pela memória por um período de transição da minha vida que foi muito turbulento, produtivo e intenso.

A era Orkut (2004-2009) foi bem importante pra mim, pois coincidiu diferentes fases: o período em que me mudei pra São Paulo, o fim do meu primeiro casamento, a época em que comecei a me dedicar à cobertura de tecnologia e quando comecei a trabalhar como frila. O Orkut foi uma pauta que acompanhei desde o início e fui um dos primeiros usuários do Brasil (tanto que muitos “testimonials” me rotulam como “sócio do Orkut” ou coisas do tipo – quem dera…). Participei do Mídia Tática Brasil, quando John Perry Barlow e Richard Barbrook se conheceram na Casa das Rosas na Avenida Paulista e muitos dos que estavam naquele evento foram convidados pelo próprio Barlow para entrar naquele tal site novo que ninguém sabia pra que servia.

Eu entendi logo: era uma ótima ferramenta para encontrar personagens e descobrir assuntos para matérias que fazia para a revista Info e para o falecido caderno de Informática da Folha de S. Paulo, além de, claro, reencontrar amigos de um passado distante e conhecer pessoalmente gente que só conhecia no mundo online. Lembro que durante a primeira vinda dos Pixies ao Brasil em 2004, em Curitiba, popularizei a expressão “Orkut funciona” quando reconhecia pessoalmente rostos que só conhecia em fotos.

Foi uma época em que eu viajava muito pelo Brasil (sdds Rio de Janeiro 2002-2005), também porque comecei a trabalhar no Trama Universitário, projeto da gravadora Trama que vislumbrava um circuito cultural universitário no Brasil (antes de “universitário” virar sinônimo de “música pra pegar mulher”, que fase). Eu não tinha celular nem laptop, usava basicamente desktops alheios em lan houses ou em business centers de hotéis (duas entidades em vias de extinção) e o Orkut era uma espécie de “memória em nuvem”, funcionando pra várias coisas também em níveis locais, como descobrir um lugar legal para almoçar no Recife ou saber quem eram os estudantes que estavam organizando protestos contra o aumento de ônibus em Florianópolis e Salvador.

O final deste período misturou um monte de coisas: um acidente de carro que foi determinante na minha vida (aquele momento “para tudo!” existencial), a criação da minha primeira festa (Gente Bonita Clima de Paquera, que terminou em 2011), a fundação do meu podcast (o Vida Fodona, criado no carnaval de 2006 no Recife, ao lado do meu saudoso irmão Fred Leal) e a minha ida para o Estadão, onde fui editar o Link. Esta fase também terminou quando comecei a namorar a Mariana, minha atual esposa, que me ajudou a por minha vida nos trilhos.

Poderia escolher álbuns de fotos, comunidades (o Vida Fodona começou como uma comunidade minha no Orkut), testimonials, a enxurrada de scraps que recebi de alagoanos depois que um texto que escrevi para a Trama Virtual sobre um festival em Maceió foi entendido como um “manifesto de preconceito paulistano contra o nordeste” (justo eu, brasiliense filho de cearenses!), mas quando fui procurar o que escolher pra levar comigo, achei tão simbólico que meu último testimonial fosse o da Mariana, com um singelo “S2” que copiamos de diálogos de adolescentes em lan houses e usávamos como um código óbvio, como se marcasse o fim daquela fase.
E começasse outra muito melhor. 🙂

testimonial_matias

Tumblr do dia: Comunidades do Orkut

comunidadesorkut-00

O humor nonsense das comunidades do Orkut era a pré-história do humor esquizofrênico da internet brasileira atual. Época de um humor mais moleque, menos problogger, que visava mais o choque da ousadia do que o like no Feice – como bem reúne este tumblr – saca outros exemplos aí embaixo:

 

Link – 4 de junho de 2012

• Forte ConexãoGuia de compras do Dia dos Namorados: Tecnófilos, Design, Games, Vintage, Música…Apps a dois • O homem do 9Gag • Cante Algo • E3 sem novidades • Impressão Digital (Alexandre Matias): O dia em que minha conta do Facebook foi desativadaAplicativos de graça, Google Plus Orkut, Acta rejeitada e mais

Impressão digital #0100: A “Orkutização” do Instagram

E na minha coluna na edição de segunda do Link, falo sobre a “maldita inclusão digital” de que tantos gostam de reclamar.

A ‘orkutização’ do Instagram e a natureza gregária da internet
O Instagram criou uma bolha de falso glamour

Iphoneiros em polvorosa: “Vão poluir minha timeline!”, reclamavam usuários do celular da Apple tanto no Brasil quanto no exterior. Eles haviam recebido a notícia de que o aplicativo Instagram havia ganhado, na semana passada, uma versão para Android, o sistema operacional rival do iOS, do iPhone. Por aqui, a indignação veio no inevitável tom de piada característico da nossa vida digital tropical, com a criação de tumblrs como o androidnoinstagram.tumblr.com ou orkutgram.tumblr.com, entre outros. O teor dos tumblrs – e das piadas – era sempre o mesmo: agora o Instagram perderia o seu status, pois uma tal “horda de pobres” começaria a usar o aplicativo.

Para quem não conhece, o Instagram é mais do que um software para celular que permite tirar fotos com filtros vintage. Criado pelo brasileiro Mike Krieger, o aplicativo também funciona como uma rede social – em que é possível assinalar contatos e personalizar perfis como em qualquer site deste tipo, com duas diferenças cruciais. A primeira: é uma rede social feita para o celular. Ela se replica, ao gosto do freguês, pelo Twitter e Facebook, mas seu ambiente nativo é a internet móvel. A segunda é o fato de não existir perfil público. Quem quiser ver a página de alguém no Instagram, ao contrário da maioria das redes sociais, precisa criar uma conta lá.

Eis o motivo da chiadeira. Enquanto era uma rede fechada para usuários de iPhone, o Instagram criou uma bolha de falso glamour que fazia qualquer fotinha vagabunda parecer cool só porque vinha com um tom sépia, com um amareladinho com cara de foto tirada nos anos 70. A reclamação dos antigos usuários levantou a velha falácia repercutida sempre que qualquer serviço online deixava de ser exclusivo de uns poucos early-adopters – a tal “orkutização”.

O termo surgiu, claro, depois que o Orkut começou a se popularizar no País. Antes restrita a quem trabalhava com comunicação ou tecnologia, a rede social aos poucos foi compreendida por pessoas que não passam o dia inteiro na frente do computador. Mais do que isso: à medida em que os anos 2000 foram passando, mais gente pôde comprar um computador e, com isso, a rede social perdeu o ar de ser exclusividade de grupos pequenos. E aos poucos começariam a aparecer perfis de pessoas que não eram descoladas e modernas, mas apenas… normais.

E riam “kkkkkk” ou tiravam fotos em quaisquer situações (parte delas indo parar em sites como perolas.com ou tolicesdoorkut.com) ou não se preocupavam com o português correto ou com “about me” espertinhos. A orkutização vinha acompanhada de uma reclamação obtusa, que resmungava sobre a “maldita inclusão digital” num tempo em que nem todo mundo tinha acesso à internet.

Em menos de dez anos, este quadro mudou – radicalmente. Não só ficou mais fácil comprar computador como a internet móvel trouxe uma imensa leva de pessoas para o dia a dia eletrônico das redes sociais. E cada novidade descoberta pelos primeirões era, em pouco tempo, “orkutizada”. Foi assim com o Twitter, com o Facebook e agora aconteceu com o Instagram.

“Em vez de crème brûlée vamos ver fotos do Habib’s”, alguém twittou, como se os usuários do Instagram não tirassem foto de qualquer PF com um filtro para parecer que não estavam comendo em um restaurante self-service. Ou como se os celulares que rodam o sistema operacional Android não custassem, em alguns casos, até mais do que o preço de um iPhone 4S.

A “orkutização” ou a “maldita inclusão digital” fazem parte da natureza da internet. A rede não é um clubinho exclusivo para uns poucos e bons. Até o fim desta década, todos estaremos conectados a ponto de nem percebermos a separação entre o online e o offline.

Reclamar que mais gente está desfrutando de serviços e produtos que, até determinada época, eram exclusivos de um número pequeno não é apenas reacionarismo barato – é não entender que a natureza digital agrega em vez de separar. Se você tem vergonha de estar na mesma rede social que pessoas que considera “menores”, não tenha dúvida: o problema é seu.

Link – 26 de setembro de 2011

Não passou – Orkut ainda é maior que o Facebook no Brasil A internet no Facebook Mark Zuckerberg, um Steve Jobs de segundaPersonal Nerd: Sem as mãos! Sem ninguém! – O carro que dirige sozinhoRetrospectiva em tempo real: Mês 9Marca ‘Nexus’ já tem dono por aquiGoogle no tribunal, robô nas Olimpíadas e outras novasVida digital: Fabrício do Canto, um pirata brasileiro na Alemanha

Link – 29 de agosto de 2011

O futuro sem JobsPersonal Nerd – O toque de JobsFeice imita o OrkutFomo, o medo de ficar por foraVida Digital: Renato FerreiraRetrospectiva do mêsMarco Civil e Lei Azeredo, mercado móvel, guerra de patentes

"Uma praga chamada Orkut"

Você lembra? Havia quase uma inocência (além dos clichês idiotas convencionais ao telejornalismo) na internet daqueles dias… E isso não tem nem 10 anos.

Link – 14 de fevereiro de 2011

Quem está aí? “O Orkut perdeu o pé”Personal Nerd: Cara a cara Mobile World Congress: Mundo móvelWikiLeaks à brasileira: Vazamento por via diretaSocial Media Week: Quase social O que há por trás do acordo entre Nokia e MicrosoftServidorVida Digital: Jane McGonigal, designer de jogos

Que mãe é essa…

Via Tolices do Orkut.