E tão planejando uma ação global para esse sábado…
Publiquei, com esforço coletivo de tradução dos leitores do Sujo, o discurso do Žižek no Zuccotti Park, onde tá rolando o OccupyWallStreet. E agora a editora Boitempo, que publica seus livros no país, descolou a íntegra do mesmo discurso, traduzida por Rogério Bettoni. Lá vai:
Não se apaixonem por si mesmos, nem pelo momento agradável que estamos tendo aqui. Carnavais custam muito pouco – o verdadeiro teste de seu valor é o que permanece no dia seguinte, ou a maneira como nossa vida normal e cotidiana será modificada. Apaixone-se pelo trabalho duro e paciente – somos o início, não o fim. Nossa mensagem básica é: o tabu já foi rompido, não vivemos no melhor mundo possível, temos a permissão e a obrigação de pensar em alternativas. Há um longo caminho pela frente, e em pouco tempo teremos de enfrentar questões realmente difíceis – questões não sobre aquilo que não queremos, mas sobre aquilo que QUEREMOS. Qual organização social pode substituir o capitalismo vigente? De quais tipos de líderes nós precisamos? As alternativas do século XX obviamente não servem.
Então não culpe o povo e suas atitudes: o problema não é a corrupção ou a ganância, mas o sistema que nos incita a sermos corruptos. A solução não é o lema “Main Street, not Wall Street”, mas sim mudar o sistema em que a Main Street não funciona sem o Wall Street. Tenham cuidado não só com os inimigos, mas também com falsos amigos que fingem nos apoiar e já fazem de tudo para diluir nosso protesto. Da mesma maneira que compramos café sem cafeína, cerveja sem álcool e sorvete sem gordura, eles tentarão transformar isto aqui em um protesto moral inofensivo. Mas a razão de estarmos reunidos é o fato de já termos tido o bastante de um mundo onde reciclar latas de Coca-Cola, dar alguns dólares para a caridade ou comprar um cappuccino da Starbucks que tem 1% da renda revertida para problemas do Terceiro Mundo é o suficiente para nos fazer sentir bem. Depois de terceirizar o trabalho, depois de terceirizar a tortura, depois que as agências matrimoniais começaram a terceirizar até nossos encontros, é que percebemos que, há muito tempo, também permitimos que nossos engajamentos políticos sejam terceirizados – mas agora nós os queremos de volta.
Dirão que somos “não americanos”. Mas quando fundamentalistas conservadores nos disserem que os Estados Unidos são uma nação cristã, lembrem-se do que é o Cristianismo: o Espírito Santo, a comunidade livre e igualitária de fiéis unidos pelo amor. Nós, aqui, somos o Espírito Santo, enquanto em Wall Street eles são pagãos que adoram falsos ídolos.
Dirão que somos violentos, que nossa linguagem é violenta, referindo-se à ocupação e assim por diante. Sim, somos violentos, mas somente no mesmo sentido em que Mahatma Gandhi foi violento. Somos violentos porque queremos dar um basta no modo como as coisas andam – mas o que significa essa violência puramente simbólica quando comparada à violência necessária para sustentar o funcionamento constante do sistema capitalista global?
Seremos chamados de perdedores – mas os verdadeiros perdedores não estariam lá em Wall Street, os que se safaram com a ajuda de centenas de bilhões do nosso dinheiro? Vocês são chamados de socialistas, mas nos Estados Unidos já existe o socialismo para os ricos. Eles dirão que vocês não respeitam a propriedade privada, mas as especulações de Wall Street que levaram à queda de 2008 foram mais responsáveis pela extinção de propriedades privadas obtidas a duras penas do que se estivéssemos destruindo-as agora, dia e noite – pense nas centenas de casas hipotecadas…
Nós não somos comunistas, se o comunismo significa o sistema que merecidamente entrou em colapso em 1990 – e lembrem-se de que os comunistas que ainda detêm o poder atualmente governam o mais implacável dos capitalismos (na China). O sucesso do capitalismo chinês liderado pelo comunismo é um sinal abominável de que o casamento entre o capitalismo e a democracia está próximo do divórcio. Nós somos comunistas em um sentido apenas: nós nos importamos com os bens comuns – os da natureza, do conhecimento – que estão ameaçados pelo sistema.
Eles dirão que vocês estão sonhando, mas os verdadeiros sonhadores são os que pensam que as coisas podem continuar sendo o que são por um tempo indefinido, assim como ocorre com as mudanças cosméticas. Nós não estamos sonhando; nós acordamos de um sonho que está se transformando em pesadelo. Não estamos destruindo nada; somos apenas testemunhas de como o sistema está gradualmente destruindo a si próprio. Todos nós conhecemos a cena clássica dos desenhos animados: o gato chega à beira do precipício e continua caminhando, ignorando o fato de que não há chão sob suas patas; ele só começa a cair quando olha para baixo e vê o abismo. O que estamos fazendo é simplesmente levar os que estão no poder a olhar para baixo…
Então, a mudança é realmente possível? Hoje, o possível e o impossível são dispostos de maneira estranha. Nos domínios da liberdade pessoal e da tecnologia científica, o impossível está se tornando cada vez mais possível (ou pelo menos é o que nos dizem): “nada é impossível”, podemos ter sexo em suas mais perversas variações; arquivos inteiros de músicas, filmes e seriados de TV estão disponíveis para download; a viagem espacial está à venda para quem tiver dinheiro; podemos melhorar nossas habilidades físicas e psíquicas por meio de intervenções no genoma, e até mesmo realizar o sonho tecnognóstico de atingir a imortalidade transformando nossa identidade em um programa de computador. Por outro lado, no domínio das relações econômicas e sociais, somos bombardeados o tempo todo por um discurso do “você não pode” se envolver em atos políticos coletivos (que necessariamente terminam no terror totalitário), ou aderir ao antigo Estado de bem-estar social (ele nos transforma em não competitivos e leva à crise econômica), ou se isolar do mercado global etc. Quando medidas de austeridade são impostas, dizem-nos repetidas vezes que se trata apenas do que tem de ser feito. Quem sabe não chegou a hora de inverter as coordenadas do que é possível e impossível? Quem sabe não podemos ter mais solidariedade e assistência médica, já que não somos imortais?
Em meados de abril de 2011, a mídia revelou que o governo chinês havia proibido a exibição, em cinemas e na TV, de filmes que falassem de viagens no tempo e histórias paralelas, argumentando que elas trazem frivolidade para questões históricas sérias – até mesmo a fuga fictícia para uma realidade alternativa é considerada perigosa demais. Nós, do mundo Ocidental liberal, não precisamos de uma proibição tão explícita: a ideologia exerce poder material suficiente para evitar que narrativas históricas alternativas sejam interpretadas com o mínimo de seriedade. Para nós é fácil imaginar o fim do mundo – vide os inúmeros filmes apocalípticos –, mas não o fim do capitalismo.
Em uma velha piada da antiga República Democrática Alemã, um trabalhador alemão consegue um emprego na Sibéria; sabendo que todas as suas correspondências serão lidas pelos censores, ele diz para os amigos: “Vamos combinar um código: se vocês receberem uma carta minha escrita com tinta azul, ela é verdadeira; se a tinta for vermelha, é falsa”. Depois de um mês, os amigos receberam a primeira carta, escrita em azul: “Tudo é uma maravilha por aqui: os estoques estão cheios, a comida é abundante, os apartamentos são amplos e aquecidos, os cinemas exibem filmes ocidentais, há mulheres lindas prontas para um romance – a única coisa que não temos é tinta vermelha.” E essa situação, não é a mesma que vivemos até hoje? Temos toda a liberdade que desejamos – a única coisa que falta é a “tinta vermelha”: nós nos “sentimos livres” porque somos desprovidos da linguagem para articular nossa falta de liberdade. O que a falta de tinta vermelha significa é que, hoje, todos os principais termos que usamos para designar o conflito atual – “guerra ao terror”, “democracia e liberdade”, “direitos humanos” etc. etc. – são termos FALSOS que mistificam nossa percepção da situação em vez de permitir que pensemos nela. Você, que está aqui presente, está dando a todos nós tinta vermelha.
O video com o discurso segue abaixo:
A Fox News entrevistou um dos ativistas do OccupyWallStreet, Jesse LaGreca, que aproveitou a oportunidade para mandar a real sobre o jornalismo da emissora. Mas alguém filmou a entrevista e pôs no YouTube – ou seja, ela foi ao ar, só quem outro canal. A íntegra da entrevista que, óbvio, não passou na Fox News, segue abaixo, transcrita pelo Observer. E, de novo, se alguém traduzir, mandaê que eu posto:
Fox: Jesse, so Ray, your partner here, your…
Ray: comrade.
Fox: Your colleague, she’d seen the protests in Greece and Europe and elsewhere. Did you guys take your cue from that? Are you hoping to cite certainly what was a lot of the tension, if not police activity. I know over the weekend there were over 100 arrests and you guys got things fired up. Are you taking your cues from the international movement and how do you want to see this? If you could have it in a perfect way, how would it be?
Jesse: Well I don’t know, its really difficult to answer questions leading to those conclusions. I’d say that we didn’t take our cue leading off of anybody really. It became a more spontaneous movement. As far as seeing this end, I wouldn’t like to see this end. I would like to see the conversation continue. This is what we should have been talking about in 2008 when the economy collapsed. We basically patched a hole on the tire and said let the car keep rolling. Unfortunately it’s fun to talk to the propaganda machine and the media especially conservative media networks such as yourself, because we find that we cant get conversations for the department of Justice’s ongoing investigation of News Corporation, for which you are an employee. But we can certainly ask questions like you know, why are the poor engaging in class warfare? After 30 years of having our living standards decrease while the wealthiest 1% have had it better than ever, I think it’s time for some maybe, I don’t know, participation in our democracy that isn’t funded by news cameras and gentlemen such as yourself.
Fox: But, uh, yeah well, let me give you this challenge Jesse.
Jesse: Sure.
Fox: We’re here giving you an opportunity on the record […] to put any message you want out there, to give you fair coverage and I’m not going to in any way
Jesse: That’s awesome!
Fox:…give you advice about it. So, there is an exception in the case, because you wouldn’t be able to get your message out there without us.
Jesse: No, surely, I mean, take for instance when Glenn Beck was doing his protest and he called the President, uh, a person who hates white people and white culture. That was a low moment in Americans’ history and you guys kinda had a big part in it. So, I’m glad to see you coming around and kind of paying attention to what the other 99 percent of Americans are paying attention to, as opposed to the far-right fringe, who who would just love to destroy the middle class entirely.
Fox: Alright, fair enough. You have a voice, an important reason to criticize myself, my company and anyone else. But, let me ask you that, in fairness, does this administration, President Obama, have any criticism as to the the financial situation the country’s in…?
Jesse: I think, myself, uh, as well as many other people, would like to see a little but more economic justice or social justice—Jesus stuff—as far as feeding the poor, healthcare for the sick. You know, I find it really entertaining that people like to hold the Bill of Rights up while they’re screaming at gay soldiers, but they just can’t wrap their heads around the idea that a for-profit healthcare system doesn’t work. So, let’s just look at it like this, if we want the President to do more, let’s talk to him on a level that actually reaches people, instead of asking for his birth certificate and wasting time with total nonsense like Solyndra.
E, pelo visto, ficou sem palavras.
Segue a íntegra do discurso que a autora do livro No Logo fez no Zuccotti Park, em Nova York, na quinta-feira da semana passada. E, de novo, se alguém traduzir aqui, eu reproduzo e credito. E, fala sério, começar um discurso desses com “I love you” é muita moral.
I love you.
And I didn’t just say that so that hundreds of you would shout “I love you” back, though that is obviously a bonus feature of the human microphone. Say unto others what you would have them say unto you, only way louder.
Yesterday, one of the speakers at the labor rally said: “We found each other.” That sentiment captures the beauty of what is being created here. A wide-open space (as well as an idea so big it can’t be contained by any space) for all the people who want a better world to find each other. We are so grateful.
If there is one thing I know, it is that the 1 percent loves a crisis. When people are panicked and desperate and no one seems to know what to do, that is the ideal time to push through their wish list of pro-corporate policies: privatizing education and social security, slashing public services, getting rid of the last constraints on corporate power. Amidst the economic crisis, this is happening the world over.
And there is only one thing that can block this tactic, and fortunately, it’s a very big thing: the 99 percent. And that 99 percent is taking to the streets from Madison to Madrid to say “No. We will not pay for your crisis.”
That slogan began in Italy in 2008. It ricocheted to Greece and France and Ireland and finally it has made its way to the square mile where the crisis began.
“Why are they protesting?” ask the baffled pundits on TV. Meanwhile, the rest of the world asks: “What took you so long?” “We’ve been wondering when you were going to show up.” And most of all: “Welcome.”
Many people have drawn parallels between Occupy Wall Street and the so-called anti-globalization protests that came to world attention in Seattle in 1999. That was the last time a global, youth-led, decentralized movement took direct aim at corporate power. And I am proud to have been part of what we called “the movement of movements.”
But there are important differences too. For instance, we chose summits as our targets: the World Trade Organization, the International Monetary Fund, the G8. Summits are transient by their nature, they only last a week. That made us transient too. We’d appear, grab world headlines, then disappear. And in the frenzy of hyper patriotism and militarism that followed the 9/11 attacks, it was easy to sweep us away completely, at least in North America.
Occupy Wall Street, on the other hand, has chosen a fixed target. And you have put no end date on your presence here. This is wise. Only when you stay put can you grow roots. This is crucial. It is a fact of the information age that too many movements spring up like beautiful flowers but quickly die off. It’s because they don’t have roots. And they don’t have long term plans for how they are going to sustain themselves. So when storms come, they get washed away.
Being horizontal and deeply democratic is wonderful. But these principles are compatible with the hard work of building structures and institutions that are sturdy enough to weather the storms ahead. I have great faith that this will happen.
Something else this movement is doing right: You have committed yourselves to non-violence. You have refused to give the media the images of broken windows and street fights it craves so desperately. And that tremendous discipline has meant that, again and again, the story has been the disgraceful and unprovoked police brutality. Which we saw more of just last night. Meanwhile, support for this movement grows and grows. More wisdom.
But the biggest difference a decade makes is that in 1999, we were taking on capitalism at the peak of a frenzied economic boom. Unemployment was low, stock portfolios were bulging. The media was drunk on easy money. Back then it was all about start-ups, not shutdowns.
We pointed out that the deregulation behind the frenzy came at a price. It was damaging to labor standards. It was damaging to environmental standards. Corporations were becoming more powerful than governments and that was damaging to our democracies. But to be honest with you, while the good times rolled, taking on an economic system based on greed was a tough sell, at least in rich countries.
Ten years later, it seems as if there aren’t any more rich countries. Just a whole lot of rich people. People who got rich looting the public wealth and exhausting natural resources around the world.
The point is, today everyone can see that the system is deeply unjust and careening out of control. Unfettered greed has trashed the global economy. And it is trashing the natural world as well. We are overfishing our oceans, polluting our water with fracking and deepwater drilling, turning to the dirtiest forms of energy on the planet, like the Alberta tar sands. And the atmosphere cannot absorb the amount of carbon we are putting into it, creating dangerous warming. The new normal is serial disasters: economic and ecological.
These are the facts on the ground. They are so blatant, so obvious, that it is a lot easier to connect with the public than it was in 1999, and to build the movement quickly.
We all know, or at least sense, that the world is upside down: we act as if there is no end to what is actually finite—fossil fuels and the atmospheric space to absorb their emissions. And we act as if there are strict and immovable limits to what is actually bountiful—the financial resources to build the kind of society we need.
The task of our time is to turn this around: to challenge this false scarcity. To insist that we can afford to build a decent, inclusive society—while at the same time, respect the real limits to what the earth can take.
What climate change means is that we have to do this on a deadline. This time our movement cannot get distracted, divided, burned out or swept away by events. This time we have to succeed. And I’m not talking about regulating the banks and increasing taxes on the rich, though that’s important.
I am talking about changing the underlying values that govern our society. That is hard to fit into a single media-friendly demand, and it’s also hard to figure out how to do it. But it is no less urgent for being difficult.
That is what I see happening in this square. In the way you are feeding each other, keeping each other warm, sharing information freely and proving health care, meditation classes and empowerment training. My favorite sign here says, “I care about you.” In a culture that trains people to avoid each other’s gaze, to say, “Let them die,” that is a deeply radical statement.
A few final thoughts. In this great struggle, here are some things that don’t matter.
§ What we wear.
§ Whether we shake our fists or make peace signs.
§ Whether we can fit our dreams for a better world into a media soundbite.
And here are a few things that do matter.
§ Our courage.
§ Our moral compass.
§ How we treat each other.
We have picked a fight with the most powerful economic and political forces on the planet. That’s frightening. And as this movement grows from strength to strength, it will get more frightening. Always be aware that there will be a temptation to shift to smaller targets—like, say, the person sitting next to you at this meeting. After all, that is a battle that’s easier to win.
Don’t give in to the temptation. I’m not saying don’t call each other on shit. But this time, let’s treat each other as if we plan to work side by side in struggle for many, many years to come. Because the task before will demand nothing less.
Let’s treat this beautiful movement as if it is most important thing in the world. Because it is. It really is.
Se você não gosta dele, nem se dê ao trabalho de apertar o play…
O guitarrista do Rage Against the Machine passou ontem pela praça ocupada e puxou coro ao entoar “This Land is Your Land”, clássico de Woody Guthrie. E fez uma previsão sinistra:
Ouça o que ele tem a dizer (e, de novo, se alguém se dispuser a traduzir, reproduzo aqui) e agradeça a tradução feita pela Mariana, pelo Fred e pelo Daniel. Valeu mesmo, guys:
[…] “[Eles estão dizendo] que nós somos perdedores, mas os verdadeiros perdedores estão lá em Wall Street. Eles foram afiançados por bilhões do nosso dinheiro. Nós somos chamados de socialistas, entretanto, aqui há, de fato, socialismo – para o rico. Eles dizem que nós não respeitamos a propriedade privada. Mas na crise de 2008, mais propriedades obtidas através de trabalho duro foram destruídas do que todos nós estamos estamos aqui para destruir, noite e dia, por semanas. Eles te dizem que nós somos sonhadores; os verdadeiros sonhadores são aqueles que pensam que as coisas podem ir adiante indefinidamente da forma em que estão. Nós não somos sonhadores; nós estamos acordando do sonho que está se transformando em pesadelo. Nós não estamos destruindo nada; nós estamos apenas testemunhando como o sistema destrói a si próprio. Nós todos sabemos [inaudível] de desenhos animados. O gato alcança o precipício, mas continua caminhando, ignorando o fato de que não há nada abaixo de seu chão. Só quando ele olha pra baixo e percebe isso, ele cai. Isso é o que nós estamos fazendo aqui. Nós estamos dizendo para os caras lá em Wall Street, ‘Hey, olhem pra baixo!’
[inaudível] “…Em 2011, o Governo Chinês proibiu, na TV, em filmes e novelas, todas as histórias [inaudível – algo sobre realidades alternativas ou viagem no tempo]. Esse é um bom sinal para a China; isso significa que as pessoas continuam a sonhar com alternativas, ainda que atacados e proibidos, continuam sonhando. Aqui nós não pensamos em proibições, porque [inaudível – “a história”?] oprimiu nossa capacidade de sonhar. Olhem para os filmes que nós vemos a todo o tempo. É fácil imaginar o fim do mundo – um asteróide destruindo toda a vida, e assim por diante – mas nós não podemos imaginar o fim do capitalismo. Então, o que é que estamos fazendo aqui? Deixe me contar a vocês uma velha piada, dos tempos do Comunismo. Um cara foi enviado para trabalhar no leste alemão, vindo da Sibéria. Ele sabia que suas cartas seriam lidas pelos censores, então ele disse a seus amigos: “Vamos estabelecer um código. Se a carta que eu enviar etiver escrita em caneta azul, é verdade o que eu digo; se estiver escrita em caneta vermelha, é falso.” Depois de um mês, seus amigos receberam a primeira carta. Tudo estava escrito em azul. Dizia a carta: “Tudo é maravilhoso aqui. As lojas estão cheias de boa comida, os cinemas passam bons filmes do oeste, os apartamentos são grandes e luxuosos. A única coisa que não se pode encontrar é uma caneta vermelha.” É assim que nós vivemos. Nós temos todas as liberdades que queremos, mas o que está nos faltando é uma caneta vermelha: a linguagem para articular nossa não-liberdade. A forma como somos ensinados a falar sobre liberdade, ‘guerra ao terror’, e assim por diante, falsifica a liberdade. E isso é o que vocês estão fazendo aqui: Vocês estão dando a todos nós uma caneta vermelha.
Há um perigo: Não se apaixonem por si mesmos. Nós temos um momento lindo aqui. Mas se lembrem: Carnavais vêm facilmente. O que importa é o dia seguinte, quando nós temos que retornar à vida normal. Haverá mudanças, então? Eu não quero me lembrar desses dias, você sabe, como ‘Oh, nós éramos jovens, aquilo foi lindo…’ Lembrem-se que a nossa mensagem básica é, ‘Nos é permitido pensar sobre alternativas’ Um tabu é quebrado. Nós não vivemos no melhor mundo possível. Mas ainda há uma longa estrada. Existem questões realmente difíceis, que nos confrontam. Nós sabemos o que nós não queremos, mas o que nós queremos? Que organização social pode substituir o capitalismo? Que tipo de novos líderes nós queremos? Lembram-se: O problema não é a corrupção ou a ganância; o problema é o sistema que te empurra para a corrupção. Tema não só os seus inimigos, mas também seus amigos que estão trabalhando para diluir esse processo, da mesma forma que você toma café sem cafeína, cerveja sem álcool, sorvete sem gordura. Eles tentarão transformar isso em um protesto moralmente inofensivo, um protesto descafeinado. Mas a razão pela qual nós estamos aqui é que nós temos o suficiente do mundo para reciclar garrafas de Coca Cola para dar dois dólares para caridade, ou comprar um capuccino da Starbucks, do qual 1% vai para as crianças famintas do Terceiro Mundo pra nos sentirmos bem. Depois da terceirização do trabalho e da tortura [inaudível – chama por “mic check”] …Nós podemos ver isso por um longo tempo, nós permitimos que nosso engajamento político também seja terceirizado. Nós o queremos de volta.
“Nós não somos Comunistas, se Comunismo significar o sistema que entrou em colapso em 1990. Lembrem-se que hoje, aqueles Comunistas são os mais eficientes, implacáveis capitalistas. Na China, hoje, nós temos um capitalismo que é ainda mais dinâmico que o seu capitalismo norte-americano, porém, não precisa de democracia, o que quer dizer, quando vocês criticam o capitalismo, não permitam que insinuem que vocês são “contra a democracia”. O casamento entre capitalismo e democracia acabou. Uma mudança é possível.”
“Agora, que nós consideramos possível hoje – apenas siga a mídia. Em uma mão há a tecnologia e a sexualidade – tudo parece ser possível. Você pode viajar para a Lua, você pode se tornar imortal pela biogenética, você pode ter sexo com animais, ou qualquer outra coisa. Mas olhem para o campo da economia – lá, quase tudo é considerado impossível. Você quer aumentar um pouco os impostos para os ricos, eles te dizem que é impossível. Nós perdemos competitividade. Você quer dinheiro pra cuidados com a saúde, eles te dizem “Impossível!” Isso significa um Estado Totalitário.’ Há algo errado com o mundo, onde lhe é prometido ser imortal, mas eles não podem gastar um pouco mais com a saúde? Talvez nós tenhamos que configurar nossas prioridades direito. Nós não queremos padrões de vida mais altos; nós queremos melhores padrões de vida. O único sentido no qual nós somos Comunistas é porque nós nos importamos com os comuns; os comuns da natureza, os comuns do que é privatizado pela propriedade intelectual dos biogeneticistas. Para isso, e só para isso, nós devemos lutar.
O Comunismo falhou em absoluto; mas os problemas dos comuns estão aqui. Eles estão nos dizendo que você não é americano aqui, mas os fundamentalistas conservadores, que se intitulam os ‘verdadeiros’ americanos têm de ser lembrados de algo: O que é Cristianismo? É o Espírito Santo. O que é o Espírito Santo? É uma comunidade igualitária de crentes, que são unidos pelo amor que tem uns pelos outros e só possuem sua liberdade e a responsabilidade de fazer isso. Nesse sentido, o Espírito Santo está aqui agora, e lá em Wall Street tem milhões [?] que estão adorando ídolos blasfêmicos. Então, tudo o que precisamos é de paciência.
“A única coisa da qual eu tenho medo é de que nós, algum dia, apenas voltaremos para nossas casas, e então nos encontrem uma vez por ano, bebamos cerveja e nostalgicamente lembremos o quão lindo foi o momento que vivemos aqui. Prometamos a nós mesmos, que isso não será perseguido. Vocês sabem que as pessoas frequentemente desejam algo, mas não querem aquilo de fato. Não tenham medo de querer aquilo que vocês desejam.”
A transcrição saiu daqui, de uma dica da Sereia.
Sim, dois eventos da minha semana passada colidiram na quinta-feira, quando o homem-Neutral Milk Hotel tocou no meio dos manifestantes do Zuccotti Park.
De chorar.