O fim de Lost por Gabriel Louback
Texto de fã não é e nunca será imparcial. Dito isso, afirmo: fui e sou fã de Lost. Então serei exagerado na medida que me é possível, como fã, e na proporção que é esperada de alguém assim.
Lembro quando meu irmão chegou um dia e disse “Gá, você precisa ver esse seriado, sério. Muito bom!” Comecei a assistir do 3º episódio da 1ª temporada. Foi assim que conheci a AXN. A hora de Lost era sagrada em casa. Ninguém atendia telefone e se meu pai, coitado, chegasse em casa no meio do episódio, só ia receber um abraço quando aparecesse o robozinho vermelho do JJ Abrams.
No Twitter, comparei Lost ao Show de Truman, não o filme, mas o programa mesmo, dentro do filme. Velhinhas e suas almofadas estampadas com o rosto do Truman, o gordinho na banheira e as pessoas chorando e torcendo pelo Truman como se fosse um conhecido, um grande amigo. Minha comparação foi mais ingênua, dizendo que ao fim de Lost, viraríamos uns para os outros e diríamos: “Hum… o que mais está passando na TV?”
Ledo engano. Lost acabou de terminar pra mim e não quero ver, nunca mais, TV. Claro, é um exagero, mas eu disse que ele viria. A sensação, no momento, é de desamparo, como se eu fosse um órfão. E somos, eu e você, que era e é doente por Lost. É o fim de uma era. Quando comecei a assistir o seriado, morava com meus pais e cursava a faculdade. Hoje estou formado, saí de casa, casei e ontem estava tão ansioso para assistir ao último episódio como se tivesse começado a assistir à série na semana passada. Lost fez parte da minha vida.
A música tema, quase clássica, dessa temporada ainda está na cabeça e preciso me segurar para não chorar. Exagero? Dane-se. Decidi assistir sozinho ao The End, diferente do que foi o seriado inteiro, porque ninguém mais entenderia. Se eu choro com reportagem do Globo Esporte sobre a despedida do Juninho Paulista, que dirá no último episódio do meu seriado favorito.
É uma tristeza que tenha acabado, mas sei que não daria pra ser eterno e prolongar demais seria perigoso. Mas eu sou fã e não quero nem saber. Quero episódios especiais, extras, filme e o que mais for possível fazer. Aí eu lembro do final e os caras colocaram um ponto final. “Era isso que a gente tinha pra contar”.
Sei que nunca lerão isso, mas obrigado JJ Abrams, Damon Lindelof e Carlton Cuse, por terem feito uma das melhores coisas do início desse século. Toda a ‘indústria’ Lost foi algo nunca visto antes, com os ARGs, pistas espalhadas e tal. O que o seriado movimentou foi incrível, reconheço. Mas é o menos importante, para mim. Não escrevo como jornalista cultural, analisando um fenômeno.
O ‘universo’ Lost criado, os personagens e as histórias contadas são o que de mais rico ficam. Tiram sarro de mim pois choro em tudo, mas dessa vez foi diferente. No final, era como se eu estivesse vivendo aquilo com eles, sofrendo junto, rindo junto e, principalmente, chorando junto.
Lost e seu último episódio foram meu Show de Truman e eu sofri como o gordinho da banheira, entregue a um produto cultural televisionado para milhões de pessoas, mas achando que aquela história estava sendo contada só pra mim, sentados um de frente pro outro.
No final das contas, vocês nos fizeram acreditar que somos, cada um, John Locke, especial em si, sem motivo aparente, mas que só é assim porque também acredita ser assim. E, por isso, são uns desgraçados geniais, já que isso é só um seriado e a gente não consegue, nem pode, admitir isso.
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Depois de ter escrito meu texto de fã, acima, no momento da emoção, vai mais um. Continua sendo de um fã, por isso é também uma explicação do porque considerar Lost tão bom e uma das melhores séries já feitas.
O entrevistador Jimmy Kimmel diz acreditar que a história de Lost não é sobre a ilha, é sobre as pessoas. Mais especificamente sobre Jack Shephard. “Eles não responderam todas as perguntas”, algumas pessoas dizem. 1) Se você considerar que o tema da série eram os personagens e não a ilha, eles responderam todas as perguntas. 2) É clichê, mas o que é mais importante: conhecer novas perguntas ou saber todas as respostas?
“Cada pergunta respondida leva a outra”, diz a mãe de Jacob e do irmão. Se assim fosse, o seriado seria eterno, do tamanho de uma vida. Porque a vida é assim. Quantas perguntas suas já foram respondidas, desde “Posso ir jogar bola lá fora?” pra sua mãe, até hoje? E quantas você ainda tem? A nossa vida vai acabar e ainda não teremos todas as respostas. Se com a gente é assim, porque em Lost não seria?
Sim, eles não responderam por que Jacob e o irmão eram daquele jeito. É verdade, não responderam uma porrada de coisa. Mas a ideia não era essa. “Lost” não é porque estavam perdidos e precisavam de uma bússola. É porque estavam perdidos em si e precisavam de novas perguntas, as perguntas certas. Lost foi “Queremos contar uma história. Conheçam essas pessoas, da onde partiram e onde chegaram.”
Contaram uma história que todos sonhamos, de sermos especiais, de termos um propósito nessa vida. Uma história que nos conduza a isso. Porém, as circunstâncias nos perguntam, como a ilha fez com Jack, Sawyer, Kate, e Locke, e cabe a nós darmos as respostas. Nem todos são especiais, mas todos escolhem não apenas desempenhar, mas escrever seus próprios papéis.
Se JJ Abrams, Damon Lindelof e Carlton Cuse conseguiram passar coisas assim por um seriado de TV norte-americano, não tem como dizer que devido a um último episódio sem todas as respostas o seriado perdeu valor. Pelo contrário. O último episódio foi que comprovou todo o valor que Lost teve ao longo desses anos. “Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos?” Cabe a você fazer as perguntas. Se elas serão respondidas, é outra história.
Namaste.
* Gabriel Louback escreveu estes textos em seu blog.
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