Nicolas Winding Refn e o papel lúdico da violência no cinema

Nicolas-Winding-Refn-Ryan-Gosling

O diretor de Drive fala sobre a importância do sexo e da violência como elemento fantástico na narrativa cinematográfica e detalha porque esta última funciona tão melhor e tem um apelo tão direto, ainda que oposto à sua presença fora da ficção ou do cinema.

Gostou? A íntegra da conversa do diretor em uma das Summer Talks oferecidas pelo Film Society of Lincoln Center·em Nova York pode ser assistida abaixo:

 

Drive: cool até dizer chega

Vintage 80s

A história do filme é ridiculamente simples – galã-durão trabalha como dublê em filmes de ação (capotando carros) e faz bicos como motorista em assaltos conhece vizinha gatinha que tem um filho com um sujeito que está preso. O que vem a seguir é aquela velha história de amor e vingança que habita todos os telefilmes que passam no Super Cine, aquele sábado à noite sem graça e dublado, “um crime que abalou a opinião pública norte-americana”, gangsters, carros e reviravoltas dignas de um filme de Steven Segal.

A diferença é que Drive não é um filme com Steven Segal – mas com Ryan Gosling, queridinho da cinefilia indie há uns cinco anos por um algum motivo inexplicável. E em vez do herói ter um rabo de cavalo e usar uma jaqueta de couro com franjas, ele traja uma jaqueta prateada fuleiraça com um escorpião estampado nas costas, uma versão 1983 de James Dean (canastrice inclusa no upgrade). E que a história pouco importa num filme essencialmente preocupado com estilo – estilo específico e perigoso de ser manuseado: o vintage 80s, a versão que não vê graça nenhuma no deboche trash dos anos 80. Assim que o filme começa, com sua tipologia pink cursiva-cool, sabemos que estamos no mesmo universo paralelo fundado pelo cinema cyberpunk daquela década, o futuro mundano e presente de filmes como Mad Max, Robocop, Blade Runner, Fuga de Nova York e Warriors. Tire o futurismo megalomaníaco e apocalíptico e perceba que já estamos em 2012. Não há carros voadores, nem andróides indistinguíveis de seres humanos nem ciborgues conversando com ETs. Mas as metrópoles estão implodindo, a violência está nas ruas e o máximo de tecnologia que realmente entrou nesse submundo é o fato de usarmos telefones portáteis minúsculos.

Pois o celular é um dos poucos elementos que nos lembra que Drive se passa depois de 1989. Todo o resto do filme é um exercício de estilo anos 80 – o neon superposto ao reflexo da poça d’água sobre o asfalto no escuro sobreposto à câmera lenta exageradamente lenta por sobre alguns litros de gel e outros tantos de vodca barata. O dinamarquês Nicolas Winding Refn faz jus ao prêmio de melhor direção que ganhou em Cannes no ano passado e faz um filme todo baseado numa estética que começa a ser reconsiderada (Drive é o Chromeo do cinema) – e não é por ter um coração de plástico que Drive não tem alma. A caricatura do “strong silent type” que Tony Soprano sentia falta torna o personagem de Gosling robótico como Clint Eastwood nos anos 70, mas o verniz fluorescente da direção torna a história trivial essencialmente secundária – o que é bom para a estética do filme. Um bom roteiro tornaria todo o estilo coadjuvante.

Drive é mais que trunfo da forma sobre o conteúdo, é pós-moderno na medula e cheira a mochila da Company. “2011 foi um grande ano para o cinema, vimos que dá para fazer um filme sem nenhum diálogo e ainda torná-lo divertido…”, Seth Rogen parecia se referir a filme mudo O Artista em seu discurso de abertura do Spirits Awards, mas falava de Drive. E, realmente, é um dos melhores filmes desse 2011 com cara de 1981.

O poster que abre o post não é oficial, e sim feito pelo designer canadense James White.