Preso em isolamento da quarentena, o bardo australiano Nick Cave tem conversado mais ativamente com seus fãs através do fórum de seu site, respondendo a perguntas em textos aprofundados. Um dos temas recentes foi a música mais recente de Dylan, “Murder Most Foul”, um épico de tirar o fôlego que o poeta norte-americano revelou logo no início da quarentena. Disse Cave:
Muitos já escreveram sobre a nova música de Bob Dylan, “Murder Most Foul” – e o interesse é justificável. É uma desconcertante mas bela canção e, como muitas pessoas, fiquei extremamente comovido por ela.
No coração desse épico de dezessete minutos, está um terrível evento, o assassinato de JFK – um vórtice sombrio que ameaça puxar tudo, exatamente como nos EUA em 1963. Girando em torno do incidente, Dylan tece uma litania de coisas amadas – principalmente música – que alcançam a escuridão, na libertação. Na medida em que a música se desenrola, ele lança a linha de vida após linha de vida, de forma insistente e semelhante a um mantra, e somos erguidos, ao menos momentaneamente, livres do acontecimento. A cascata incansável de Dylan feita de referências de músicas aponta para o nosso potencial como seres humanos de criar coisas bonitas, mesmo de frente a nossa própria capacidade de malevolência. ‘Murder Most Foul’ nos lembra que nem tudo está perdido, pois a música em si se torna uma tábua de salvação lançada em nossa situação atual.
A instrumentação é amorfa, fluida e muito bonita. Liricamente, ele tem toda a ousadia perversa e divertida de muitas das grandes músicas de Dylan, mas além disso há algo em sua voz que parece extraordinariamente reconfortante, especialmente neste momento. É como se tivesse percorrido uma grande distância, através de trechos de tempo, cheios de uma integridade e estatura conquistadas, que acalma o caminho de uma canção de ninar, um cântico ou uma prece.
Quanto sobre ser a última vez que ouviremos uma nova música de Bob Dylan, eu certamente espero que não. Mas talvez haja alguma sabedoria em tratar todas as canções, ou, nesse caso, todas as experiências, com certo cuidado e reverência, como se encontrássemos essas coisas pela última vez. Digo isso não apenas à luz do novo coronavírus, mas de que é uma maneira eloquente de levar a vida e apreciar o aqui e agora, saboreando-o como se fosse a última vez. Tomar um drinque com um amigo como se fosse a última vez, comer com sua família como se fosse a última vez, ler para seu filho como se fosse a última vez, ou de fato, sentar na cozinha ouvindo uma nova música de Bob Dylan como se fosse a última vez. Ela permeia tudo o que fazemos com maior significado, colocando-nos dentro do presente, nosso futuro incerto, temporariamente preso.
Ave Nick Cave.
Segundo o Flesch, que só costuma publicar este tipo de notícia quando ela deixa de virar especulação para virar fato, Nick Cave e sua banda Bad Seeds estão com a vinda garantida para realizar uma apresentação em São Paulo, no mês de outubro. Apenas nos resta cruzar os dedos. A foto que ilustra este post é da Lee Harten.
Que momento! Nick Cave encerrava sua apresentação na O2 Arena neste sábado, em Londres, quando, no finzinho de “Push the Sky Away” viu o líder do Primal Scream na plateia e não titubeou: “Bobby Gillespie! Fuck, man!”, disse ao reconhece-lo e passar o microfone.
Aqui, de outro ângulo:
“A maioria de nós não quer mudar, de verdade. Quer dizer, por que deveríamos? O que nós queremos é fazer algumas modificações no modelo original”, diz Nick Cave no trailer de seu próximo projeto, o disco-filme Skeleton Tree/One More Time With Feeling, este último dirigido pelo neo-zelandês Andrew Dominik (autor de O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford e O Homem da Máfia). É o primeiro projeto em que o autor se refere à morte de seu filho de 15 anos, que despencou de um desfiladeiro no meio de uma viagem de LSD em julho do ano passado. Ele continua:
“Mas o que acontece quando um algo ocorre e é tão catastrófico, que você simplesmente muda? Você muda de uma pessoa conhecida para uma pessoa desconhecida. E quando você olha para você no espelho, você reconhece a pessoa que você era, mas a pessoa dentro daquela pele é outra pessoa.”
Tenso.
O disco será lançado no dia 9 de outubro e o filme será exibido no dia anterior (mais detalhes no site de Cave), em diversos cinemas (ainda não há referência à exibição no Brasil, basta checar no site oficial).
Parceiros de longa estrada, Nick Cave e Warren Ellis assinam juntos a trilha sonora do novo filme estrelado por Viggo Mortensen, o francês Loin des Hommes, dirigido por David Oelhoffen. O filme é inspirado no conto existencialista de Albert Camus O Hóspede, em que um policial tem que atravessar o deserto da Argélia para levar um condenado ao julgamento. É o segundo filme com Mortensen que tem a trilha da dupla – o primeiro foi outra jornada crua, o distópico A Estrada, de 2009, baseado no livro homônimo de Cormac McCarthy.
E mais uma vez Polly Jean Harvey rende-se a seu muso, ex-namorado e amigo e regrava outra música de Nick Cave. Depois de atirar-se em “Henry Lee” ao lado do próprio (em pleno namoro nos anos 90), PJ Harvey desta vez vaga pelas ruas de “Red Right Hand“, deixando o ar de saloon original desintegrar-se num piano frio, distante e lindo. A faixa foi gravada para o seriado da BBC Peaky Blinders.
O filme 20,000 Days on Earth mistura realidade e ficção para entrar na cabeça e no coração de um dos maiores nomes da música pop em atividade – Nick Cave. Os diretores Iain Forsyth e Jane Pollard acompanharam o mito em constante formação entre bate-papos com velhos conhecidos, uma sessão de terapia de mentira e em seus momentos de criação para tirar um filme que só vem recebendo elogios, veja o trailer abaixo:
O filme passará no Brasil no Indie Festival (já deram uma sacada no que vem por aí? Muita coisa boa), fique ligado. E aproveitando o lançamento do filme, Nick descolou duas músicas novas – a inédita “Give Us A Kiss” e uma versão ao vivo gravada na Austrália para “Jubilee Street”, de seu disco mais recente.
Houve um momento em que John Cale, Nick Cave e Chrissie Hynde dividiram o mesmo palco para cantar e falar sobre suas próprias canções. Isso aconteceu no dia 7 de setembro de 1999, quando a BBC reuniu os três no programa Song Writers Cycle, que nos presenteou com esta versão para “I’m Waiting for the Man”.
A versão para a música do Velvet Underground foi o final do programa, que vale ser visto na íntegra, com cada um dos três escolhendo determinadas músicas e comentando-as. Infelizmente só consegui achar “Kid” das músicas de Chryssie Hynde (nada de “I’ll Stand By You” ou “Back on the Chain Gang”) no YouTube – já as outras de Cale e Cave seguem abaixo:
Momento “minhas férias”.
Poolside – “Harvest Moon”
Tame Impala – “Feels Like We Only Go Backwards”
Do Make Say Think – “Do”
Dinosaur Jr. – “Freak Scene”
Bob Mould – “Star Machine”
Postal Service – “Clark Gable”
Deerhunter – “Monomania”
Christopher Owens – “Riviera Rock”
Breeders – “I Just Wanna Get Along”
Tinariwen – “Imidiwan Matanam”
Jesus & Mary Chain – “Reverence”
Wedding Present – “Kennedy”
Blur – “This is a Low”
The Knife – “Raging Lung”
Wu-Tang Clan – “C.R.E.A.M.”
Thee Oh Sees – “Carrion Crawler”
Nick Cave & the Bad Seeds – “The Mercy Seat”
Phosphorescent – “Song for Zula”
My Bloody Valentine – “New You”
Los Lobos – “Chuco’s Cumbia”
Neil Young & Crazy Horse – “Like a Hurricane”