Mr. Catra (1968-2018)

, por Alexandre Matias

catra

Mr. Catra foi o mais perto que cheguei de Tim Maia – e tinha essa sensação sempre que o encontrava. Um coração gigante, uma capacidade imbatível de se tornar o centro de qualquer roda de conversa, um senso de humor único, contando histórias escabrosas, inacreditáveis e surreais e as temperando com gargalhadas cavernosas e fumos ótimos. Mas esta personalidade ficava em segundo plano quando pegava o microfone na mão e se transformava em um semideus da música, transmutando qualquer show em uma celebração rítmica que nos levava a todos os centros de negritude de nosso imaginário – Kingston, Salvador, Nova Orleans, Luanda e, claro, o Rio de Janeiro. Um funkeiro que cantava – e encantava – com um timbre de feiticeiro velho, nos revelando lendas e histórias ancestrais em forma de crônicas cariocas seja ao lado de um DJ, de uma banda ou de outros MCs. Nunca sairá da minha memória uma noite na Casa da Matriz ao lado dos Digitaldubs (creio que no verão de 2004), em que as paredes suavam, a névoa branca ocupava pequeno espaço entre as cabeças e o teto, o grave fazia o chão tremer e ele disparava causos e palavras de ordem como um profeta tentando organizar o apocalipse. A notícia de sua passagem é mais uma dessas tragédias deste fatídico 2018, mas também talvez seja a oportunidade de se debruçar na obra em aberto deste que mestrão que, mesmo antes de sua morte, já era um dos maiores nomes da cultura urbana brasileira deste século. Vai na paz.

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