Meu Chappa

, por Alexandre Matias

Os caras do Chappa Quentefizeram videozinhos compilando o que rolou nos debates do evento. O meu tá aí em cima, mas têm outros aqui. Abaixo, a resenhinha que saiu no site sobre a mesa que eu fiz parte.

NOVAS PLATAFORMAS, NOVAS OPORTUNIDADES, NOVOS COMPORTAMENTOS
22 DE MARÇO DE 2007

MÚSICA CHAPPA QUENTE – YOUTUBE, MYSPACE, NAPSTER, iTUNES, etc: as novas plataformas on-line

A quarta discussão do MCQ veio selar uma impressão latente desde o primeiro debate: os temas discutidos sempre espalham seus tentáculos pelas mesas futuras, não se acomodando à compartimentação imposta pelo formato. Isso significa que muito se falou sobre as novas plataformas, mas que essas plataformas constantemente puxavam outras inquietações, deixando claro que a nova música pede, também nos debates, uma nova abordagem. Passava longe, porém, a idéia de crise: a professora Gisela Castro (ESPM) e os tecnólogos Jarbas Jácome (do grupo pernambucano de incentivo à tecnologia C.E.S.A.R.) e André Valle (FGV) compartilhavam otimismo com os jornalistas Alexandre Matias (do blog Trabalho Sujo) e Marcelo Ferla (Rádio Ipanema). Tudo por conta de uma revolução de costumes iniciada no quarto de um universitário norte-americano, que respondia por um hoje famoso apelido: Napster.

“Quando o Napster saiu, eu estava dando um curso para executivos da indústria fonográfica”, contou André Valle. “Tragam ele para o seu lado, eu disse, porque as pessoas vão se acostumar a não comprar mais música”. A indústria, porém, perdeu tempo tentando frear o avanço tecnológico. Resultado: provocou queda de credibilidade junto ao público jovem, e com isso, segundo André Valle, comprou a sua lápide. “Só falta colocar a data”, completou. A professora Gisela Castro conversou com jovens consumidores de música para sua pesquisa acadêmica sobre esses novos costumes. “Muitos disseram se sentir contentes por lesar a indústria, pois ela merece ser lesada mesmo”, afirmou. “Para eles, pirata é quem cobra por aquilo que não é dele. Trocar música na internet faz parte do espírito fundador da rede”. Jarbas Jácome estava em pleno acordo:

“A cultura é o que determina o que é certo e o que é errado. A troca de arquivos já se tornou cultura. É um processo sem volta”.

Esse tipo de relação, porém, é só a ponta de um gigantesco iceberg. As gravadoras processaram o Napster e conseguiram proibir suas atividades (ao menos da maneira que elas se davam). Mas não eliminou, com isso, a nova filosofia de interatividade e compartilhamento iniciada pelo programa, e que daria rosto àquilo que hoje conhecemos como internet 2.0. Google, YouTube, MySpace, iTunes, Last.fm, Pandora e até mesmo o sistema de dicas da Amazon tiraram, todos, proveito das principais características de compartilhamento pioneiras da criação de Shawn Fanning. Aquele ato de quase-vandalismo inicial tornou-se um mercado multimilionário. “O mundo todo busca informações no Google. Então o Google tem o registro das intenções do mundo. E informação é poder”, raciocinou André Valle. “A internet é um mostro da democracia da informação”, completou o representante do grupo recifense de incentivo a novas tecnologias C.E.S.A.R. “O Google é um fenômeno de pré-burguesia”, interpretou o jornalista Marcelo Ferla. “Aparentemente não tem dinheiro envolvido, mas há a troca de serviços. E todo mundo sai ganhando”.

Curioso, portanto, que as novas tendências tecnológicas tragam de volta, ao menos na aparência, práticas tão arcaicas como a troca, o compartilhamento, o escambo, e problematiza a noção de propriedade. O que não significa, porém, que o capitalismo está ameaçado. “Cada vez mais pessoas estão descobrindo como ganhar dinheiro em cima da rede”, disse Alexandre Matias. “A internet tem um cara subversiva muito grande”, completou Ferla. “É o momento de deixar de percebe-la como subversão, e aprender a trabalhar com ela”. E se a indústria fonográfica como hoje conhecemos estiver com os dias contados, o mesmo pode ser dito sobre a tecnologia vigente. Embora hoje o mp3 substitua os discos físicos, a prática de baixar arquivos está muito associada às condições de conexão atuais. Com os avanços das redes de internet wi-fi, e o surgimento de novidades como o Slacker, a tendência é que a rede se torne um disco rígido comunitário infinito, e as pessoas não precisem mais sequer armazenar dados e músicas em suas máquinas particulares. Uma vez que o mundo decida não mais pagar por música, os artistas precisarão aprender a ganhar dinheiro de outras formas.

“Se por um lado as vendas de cd diminuíram, por outro as pessoas pagam mais caro pelos shows, por exemplo”, explicou André Valle. “Tudo indica que novos hábitos de consumo estão se consolidando”, concordou Gisela Castro. “Parte desta prática que a indústria chama de pirataria, nós podemos chamar de novas práticas de consumo”, completou. “O importante é descobrir novas maneiras de se ganhar dinheiro em uma atividade que estava acostumada com um modelo consolidado há muito tempo”, disse Marcelo Ferla. “O que eu acho que é a grande diferença, é que agora existem várias possibilidades de trabalho”, completou. “Acho que com a internet, não vai haver mais uma tendência predominante”, disse Matias. “É o fim do mainstream. É a pulverização do underground”.

E se nessa nova configuração musical não houver espaço para a indústria fonográfica, ela também terá que migrar para outras atividades. “A Sony tem um dilema interessante”, diz Alexandre Matias, “porque ela é uma empresa que distribui conteúdo, mas que também produz tecnologia”. Para André Valle, o amante de música tem crédito suficiente com a indústria para não deixar os downloads ilegais pesarem em sua consciência:

“Quando compramos o vinil, por exemplo, pagamos não só pelo suporte físico, mas pelo direito de ouvir aquelas músicas. Quando saiu o CD, compramos o mesmo direito novamente. Já pagamos várias vezes por um mesmo produto”.

O que realmente está mudando é a maneira das pessoas se relacionarem. A democratização exaltada por Jarbas Jácome acontece não só com a informação, mas também dentro do próprio sujeito. Se por um lado criações como o Second Life oferecem, em tese, a oportunidade de se ter uma vida diferente, Alexandre Matias acredita que a rede também permite que essa segunda vida não seja mais necessária:

“A separação das vidas real e virtual vai acabar. O grande barato da internet é a possibilidade se expressar, e quanto mais transparente você for, maiores as chances de você ser bem sucedido na rede. Em vez de o cara ser advogado durante o dia, e gótico à noite, a internet nos ensina que você pode ser advogado e gótico ao mesmo tempo. Ela nos ensina sobre tolerância”.

(por Fábio Andrade)