Ninguém tá falando muito disso porque o calor de Ainda Estou Aqui ainda é grande, mas Marcelo Rubens Paiva já está com livro novo na praça, mais uma vez autobiográfico, contando a história seguinte ao livro que Walter Salles transformou em nosso primeiro filme nacional a levar um Oscar. O Novo Agora fala do Brasil pós-ditadura militar e da paternidade do próprio Marcelo, misturando ainda mais sua história pessoal com a nossa história brasileira recente. E não custa perguntar: será que vão adaptar seu clássico Feliz Ano Velho novamente para o cinema? Porque a adaptação feita por Roberto Gervitz com Marcos Breda e Malu Mader em 1987 é até OK, mas esse momento Oscar brasileiro pede por uma nova versão — ainda mais que o livro, como Ainda Estou Aqui, estão entre os livros mais vendidos no Brasil hoje.
Marcelo Rubens Paiva trouxe sua trupe musical Lost in Translation para o palco do Centro da Terra na primeira apresentação de dezembro no teatro para celebrar a importância de Bob Dylan na música pop ao misturá-la com poesia, pinçando alguns dos grandes discípulos do autor em versões próprias, por vezes traduzidas e declamadas, em uma noite batizada de Pedras no Caminho. Acompanhado de Fábio França, Rick Villas-Boas, Arthur França, Luli Villares e Luiza Villa, Marcelo recitou algumas traduções próprias e tocou gaita enquanto liderava seu grupo por canções de Dylan (“Blowing in the Wind”, “It’s Alright, Ma (I’m Only Bleeding)”, “Hurricane”, “Like a Rolling Stone” e “It’s All Over Now Baby Blue”, que também veio via Caetano, em sua versão “Negro Amor”, que batizou o espetáculo), Lou Reed (“Perfect Day”, “Walk on the Wild Side”), Neil Young (“Harvest Moon”), Patti Smith (“Dancing Barefoot”), Nick Drake (quando Luiza e Arthur fizeram dupla tocando duas do maravilhoso Bryter Layter num mesmo fôlego, “Introduction” e “Hazey Jane I”), Johnny Cash (“The Man Comes Around”) e Leonard Cohen (“Dance Me to the End of Love”). Um dos pontos altos da noite foi a versão para “Master of War”, conduzida de forma bilíngue por Marcelo e Luiza, numa segunda-feira que lotou o teatro e terminou com a emblemática “All Along the Watchtower”, imortalizada por Jimi Hendrix.
É com imensa satisfação que começamos o último mês de 2024 no Centro da Terra trazendo a faceta musical do escritor Marcelo Rubens Paiva com sua banda Lost in Translation, em que aventuram-se por traduções e versões de canções internacionais. No espetáculo Pedras no Caminho Paiva traça o percurso aberto por Bob Dylan ao fundir canção pop com poesia, com músicas do próprio autor norte-americano e gênios que foram influenciados por ele, como Patti Smith, os Rolling Stones, Lou Reed, Doors e Caetano Veloso, entre outros. O escritor e músico é acompanhado por Fábio França, Rick Villas-Boas, Arthur França, Luli Villares e Luiza Villa. O espetáculo começa pontualmente às 20h e os ingressos estão à venda na bilheteria e no site do Centro da Terra.
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Estamos chegando ao fim do ano e a despedida da música no Centro da Terra sempre acontece com menos datas pois nossa programação encerra as atividades na metade do mês. Por isso não faremos temporada em dezembro, apenas quatro apresentações, mas escolhidas a dedo. Começamos na segunda (dia 2), com a banda Lost in Translation de Marcelo Rubens Paiva fazendo o espetáculo Pedras no Caminho, em que aborda o casamento de música com poesia a partir da influência de Bob Dylan, em canções do mestre traduzidas ao lado de obras de Patti Smith, Lou Reed, Jim Morrison, Rolling Stones e Caetano Veloso. No dia seguinte (dia 3), temos o encontro mágico de meio século de amizade, quando Léa Freire recebe Filó Machado e Alaíde Costa num espetáculo batizado de 50 Anos Juntos. Na segunda seguinte (dia 9), Lara Castagnolli faz sua estreia autoral mostrando as músicas que estarão em seu disco de estreia, batizado de Araribá (que também dá nome à apresentação), que terá produção de Mestrinho, que também participa da apresentação. E o último espetáculo musical de 2024 no Centro da Terra vem do Rio de Janeiro, quando o projeto Crizin da ZO apresenta seu Colapso Programado ao lado da banda Death Kids e de MNTH na terça (dia 10), numa apresentação apocalíptica inédita. Todos os espetáculos começam pontualmente às 20h e os ingressos já estão à venda na bilheteria e no site do Centro da Terra. E se preparem que 2025 promete…
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Forte, bonito e triste: assim é Ainda Estou Aqui, o novo filme de Walter Salles sobre a história de Eunice Paiva, mãe de Marcelo Rubens Paiva (autor do livro original), e mulher do ex-deputado Rubens Paiva (Selton Mello genial, humanizando um nome que ficou associado apenas à política), sequestrado pela ditadura militar brasileira dos anos 70. Com uma atuação soberba de Fernanda Torres como a protagonista do filme e uma direção de arte impecável, Salles recria o clima tenso do início dos anos 70 no Brasil, nos atira nos porões da ditadura num segundo ato devastador e depois nos embala entre a beleza da resistência insistida por Eunice e a tristeza da inevitabilidade de sua situação, nos fazendo pensar sobre esse momento de trevas que ainda atravessamos no país, mais de meio século passado – e começa a ser visto pelo exterior a partir do dia 17 de janeiro, quando estreia nos cinemas dos Estados Unidos. De ver com olhos marejados.
Acredite se quiser: assim era a região do centro de São Paulo em que Paulo Maluf decidiu construir o Minhocão. Com essa outra perspectiva, talvez seja melhor derrubar mesmo esse monstrengo – em vez de cogitar soluções paliativas, como transformá-lo num parque – para tirar essa cicatriz do rosto da cidade. Vi no Marcelo Rubens Paiva.
A produtora Iluminata viu-se desafiada a recriar o Rio de Janeiro como no dia em que ele foi descoberto, eliminando todas as referências humanas da paisagem. O resultado ficou assim:
Vi no blog do Marcelo Rubens Paiva.
Foto: UOL
Mais gente falando sobre o caso da semana, em diferentes textos. Começo com o Matheus Pichonelli, da Carta Capital:
Ao que tudo indica, a ocupação da reitoria da USP foi de fato patrocinada por um grupo de aloprados, que atropelou o rito das assembleias realizadas até então e, num ato de desespero (calculado?), fez rolar morro abaixo uma pedra que, aos trancos, deveria ser endereçada para pontos mais altos da discussão.
Uma vez que essa pedra rolou, como se viu, tudo desandou. Absolutamente tudo, o que se nota pela declaração do ministro-candidato-a-prefeito (algo como: bater em viciado pode, em estudante, não) e do governador (vamos dar aula de democracia para esses safadinhos), passando pela atitude da própria polícia (tão aplaudida como o caveirão do Bope que arrebenta favelas), de cinegrafistas (ávidos por flagrar os “marginais” de camiseta GAP) e de muitos, mas muitos mesmo, cidadãos que só esperavam o ataque aéreo dos japoneses em Pearl Harbor para, em nome da legalidade, arremessar suas bombas atômicas sobre Hiroshima.
O episódio, em si isolado, é sintomático em vários aspectos. Primeiro porque mostra que, como outros temas-tabus (questão agrária, aborto…), a discussão sobre a rebeldia estudantil é hoje um convite para o enterro do bom senso. O episódio foi, em todos os seus atos, uma demonstração do que o filósofo e professor da USP Vladimir Safatle chama de pensamento binário do debate nacional – segundo o qual a mente humana, como computadores pré-programados, só suporta a composição “zero” ou “um”. Ou seja: estamos condicionados a um debate que só serve para dividir os argumentos em “a favor” ou “contra”, “aliado” ou “inimigo”.
Vale analisar a tal dicotomia exposta por Safatle:
De fato, o Brasil tem de conviver atualmente com debates onde o mundo parece se dividir em dois. Não há nuances, inversões ou possibilidades de autocrítica.
Jean-Paul Sartre costumava dizer que o verdadeiro pensamento pensa contra si mesmo.
Este é, por sinal, um bom ponto de partida para se orientar em discussões: nunca levar a sério alguém incapaz de pensar contra si mesmo, incapaz de problematizar suas próprias certezas devido à redução dos argumentos opostos a reles caricatura.
Afinal, se estamos no reino do pensamento binário, então só posso estar absolutamente certo e o outro, ridiculamente errado. Daí porque a única coisa a fazer é apresentar o outro sob os traços do sarcasmo e da redução irônica. Mostrar que, por trás de seus pretensos argumentos, há apenas desvio moral e sede de poder.
Isso quando a desqualificação não passa pela simples tentativa de infantilizá-lo. Alguns chamam isso de “debate”. Eu não chegaria a tanto.
Infelizmente, tal pensamento binário tem cadeira cativa nas discussões políticas.
Se você critica as brutais desigualdades das sociedades capitalistas, insiste no esvaziamento da vida democrática sob os mantos da democracia parlamentar, então está sorrateiramente à procura de reconstruir a União Soviética ou de exportar o modelo da Coreia do Norte para o mundo.
Se você critica os descaminhos da Revolução Cubana ou a incapacidade da esquerda em aumentar a densidade da participação popular nas decisões governamentais, criando, em seu lugar, uma nova burocracia de extração sindical, então você ingenuamente alimenta o flanco da direita.
Esse binarismo só pode se sustentar por meio da crença de que nenhum acontecimento ocorrerá. Tudo o que virá no futuro é a simples repetição do passado. Não há contingência que possa me ensinar algo. Só há acontecimento quando este reforça minhas certezas.
Forastieiri olha por sobre os grupos envolvidos e procura os chefes:
O reitor da USP, João Grandino Rodas, iria ser diferente de seus patrões? As denúncias contra ele se acumulam, e vão da mera extinção de cursos e compra duvidosa de imóveis a atitudes francamente brucutus, como chamar a Tropa de Choque para resolver outra ocupação (em 2006) e realizar demissão em massa de 270 funcionários em janeiro de 2011.
Chamado pela Assembleia Legislativa para se explicar, simplesmente não apareceu. Chegou a ser declarado Persona Non Grata pela congregação da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, com apoio do Centro Acadêmico 11 de Agosto.
Este último foi só mais um enfrentamento. Outros necessariamente acontecerão. E não só entre os estudantes e as autoridades da USP. Porque o problema não é a USP, ou seus estudantes, ou a PM. O problema não é nem o reitor.
O problema é quem indica o reitor, a quem interessa a militarização do governo, e principalmente quem comanda os comandantes. Da próxima vez, sugiro à rapaziada começar a ocupação pelo Palácio dos Bandeirantes.
O Pablo Ortellado segue ampliando a discussão sobre a situação da USP:
Mas o elemento importante, ausente no debate, é a ameaça de uso da força policial para reprimir o movimento estudantil e o movimento sindical. Permitam-me uma breve digressão para argumentar como as duas coisas se juntam.
Maquiavel, teórico da política, defendia numa obra famosa (Os discursos sobre a primeira década de Tito Lívio) que a causa da intensa e fratricida violência política da cidade de Florença era a não institucionalização dos seus conflitos. Em Florença, dizia Maquiavel, cada partido (os guelfos e os gibelinos, os negros e os brancos, os nobres e o povo) consolidavam a vitória com a expulsão do partido adversário da vida política da cidade – de maneira que só restava ao grupo derrotado atuar de fora do jogo político estabelecido, preparando um golpe de estado. O resultado era uma vida política violenta e sanguinária, sem estabilidade política e sem paz interna.
Guardadas as grandes diferenças de contexto histórico, essa é uma excelente explicação para a conturbada vida política da Universidade de São Paulo. Ao contrário das outras grandes universidades públicas, como a Unicamp ou as federais do Rio, Minas e Rio Grande do Sul, a gestão da USP é incrivelmente não democrática, o que, com os anos, empurrou todos os setores não alinhados com o grupo no poder para ação extra-institucional – simplesmente por falta de opção. As eleições para reitor na USP são definidas por um colegiado de apenas 100 pessoas – dessas, há 1 representante dos professores doutores (que compõem a maioria dos docentes), 14 representantes dos estudantes e apenas 3 dos funcionários. Os demais são representantes dos órgãos de direção que, com poucas exceções, se autoperpetuam no poder. Todas as comissões estatutárias são compostas pelas mesmas pessoas que se alternam nas diferentes funções há décadas. É um jogo marcado, viciado e sem qualquer espaço para que a comunidade de 80 mil alunos, 15 mil funcionários e 5 mil professores consiga se manifestar ou influir efetivamente nas decisões. Essa forma institucional excludente e arcaica empurrou as forças políticas para atuar por meio de greves, piquetes e ocupações de prédios, já que simplesmente não têm outra maneira efetiva de atuar.
Para complicar ainda mais a situação, nem mesmo esses injustos procedimentos de eleição de reitor foram honrados, já que na última eleição o governador escolheu o segundo colocado na lista tríplice. E esse segundo colocado, o reitor João Grandino Rodas, tem tido uma gestão fortemente confrontativa, impondo decisões injustas e ameaçando a dissidência com o uso de força policial. Quando ainda era apenas diretor da Faculdade de Direito, o atual reitor usou a força policial para expulsar o MST do prédio da faculdade e, noutra ocasião, fechou o prédio e suspendeu as aulas para impedir que uma passeata de estudantes entrasse no edifício. Ele também foi o principal articulador da entrada da polícia no campus para desocupar a reitoria, o que resultou numa abusiva ação policial que feriu professores e estudantes. Pois é exatamente este reitor que está agora autorizando a atuação ilimitada da polícia no campus o que, dado o seu histórico, não pode deixar de ser visto como uma ameaça do uso deste contingente para reprimir as únicas formas efetivas de atuação política do movimento estudantil e dos sindicatos.
Leonardo Borges Calderoni e Pedro Ferraracio Charbel aprofundam-se nesse tema:
Reconhecer os problemas da gestão Rodas é, sem dúvida, um passo importante. É fundamental, todavia, entendermos que o reitor que está sob investigação do Ministério Público encontrou na estrutura da própria universidade as possibilidades para assim atuar. Mais do que uma “persona non grata”, há na USP toda uma “estrutura non grata”. E no caso da Cidade Universitária, além da estrutura decisória, também a estrutura física precisa ser rearquitetada.
Quando o diálogo não for mais uma promessa vazia e a democracia uma propaganda enganosa, aí sim a USP poderá deixar seus dias de ilha e autonomia seletiva para trás. A USP não deve mais ser um enorme terreno desértico, hostil e sem iluminação; assim como deve se afirmar enquanto universidade pública à serviço da comunidade. A universidade deve ser permeável à sociedade em sua totalidade, não só no que diz respeito à polícia – cuja atuação e estrutura devem ser questionadas dentro e fora do campus. Só assim, a Cidade Universitária será um lugar muito mais seguro e, principalmente, muito mais útil à cidade que a abriga e aos cidadãos que a sustentam.
Fernando Henrique Cardoso, canabista e acadêmico, saiu pela tangente (embora condene a repressão):
Depende, porque a lei especifica quantidades diferentes… Mas eu acho que tem que ter um certo recato. O fato de você estar ali abertamente é uma provocação, não vejo razão para isso.
E tanto o Dafne, o Antonio Prata e o Marcelo Rubens Paiva lembram-se dos seus tempos de universidade para voltar ao tema principal. O melhor é que tudo isso está sendo posto em discussão – e os reaças de plantão seguem latindo sozinhos, sem participar desse diálogo.