Sexta Trabalho Sujo #012: Anvil FX celebra Marcelo Dolabela

sts-012-anvilfx-

O grupo eletrônico Anvil FX, liderado pelo antológico Paulo Beto, homenageia a vida do ícone do underground mineiro Marcelo Dolabela, que morreu no mês passado, na edição desta semana da Sexta Trabalho Sujo, no Estúdio Bixiga, a partir das 21h (mais informações aqui). Vamos?

Marcelo Dolabela, por Paulo Beto

marcelodolabela-

Aproveitando o show desta sexta-feira, pedi para o Paulo Beto, o mentor do Anvil Fx e amigo de Marcelo Dolabela, que será homenageado neste show, para que ele escrevesse sobre a importância do escritor e poeta, que morreu no mês passado:

Sou muito ruim de datas, mas foi ou em 2016 ou no início de 2017, que tive a felicidade de encontrar o Marcelo tomando uma cervejinha num bar em plena Avenida Paulista. Ele me viu e me gritou. Estava acompanhado de sua adorável Regina. Conversamos um pouco, mas foi rápido. Ele me disse que ia passar uns dias e trocamos contato pra nos ver mais e bater um pouco de perna em SP.

Acho q ele já sabia que eu tinha incorporado no meu repertório ao vivo uma versão de “Aqui Aqui” do Divergência Socialista. Eu disse que ele precisava conhecer a Bibiana Graeff, vocalista da minha banda, e uma noite acabou rolando. Ele se encantou bastante com ela, até porque ela já era bastante fã de sua poesia. Nesse período dele aqui, me mandou um email com duas poesias que ele havia escrito num tempo ocioso no hotel. Me enviou a seguinte mensagem:

“Paulo Beto

bom dia
quarta-feira, como estava livre, fiquei em casa.
ouvi várias vezes a demo-tape sua e da Biba.
ela está ótima.
de tanto ouvi-la, rabisquei estes dois esboços de letras.
se servirem, usem.

As lágrimas vermelhas de Olga B. (tanka # 2016A)

A cara desta fera é a usura

a peste desta festa infesta

a cura deste vício é a fúria

A besta saiu da floresta

a procura é o que nos resta

A cara desta fera é a usura

a peste desta festa infesta

a cura deste vício é a fúria

A besta saiu da floresta

a cultura é o que nos resta

A cara desta fera é a usura

a peste desta festa infesta

a cura deste vício é a fúria

A besta saiu da floresta

a loucura é o que nos resta

*

Louise Brooks voltou a sorrir

A máquina de tua maquiagem

o sexo: anexo? Convexo?

a brita que te faz tão bonita

na grata

greta

grita

grota

gruta

quem escuta tua imagem?

quem vê tua luta na paisagem?

quem lê tua bruta mensagem?”

Eu fiquei absolutamente chocado com a qualidade e conteúdo do material. E num email seguinte ele me disse:

“são duas, mas podem virar uma letra só.
o mote é o mesmo.
beleza (Louise Brooks) + verdade (Olga Benário) + realidade (Brasil-Hoje).
como disseram os românticos alemães: ‘a beleza é a única verdade / a verdade é a única beleza’.”

Fora esse texto ele me enviou livros e impressos e me incentivou a experimentar música com seus poemas.
Com grande amor à obra desse poeta fascinante, que com sua atitude/poema/punk fez minha cabeça explodir no único show que vi de sua banda em 1988 no DCE da UFJF de Juiz de Fora, e desde então Divergência se tornou pra mim uma influência fundamental.

Em sua carreira, Dolabela publicou mais de 30 livros. Entre eles, o ABZ do Rock Brasileiro, considerado a principal referência enciclopédica do rock nacional até a década de 2000. Ele ainda é o autor de Radicais e Adeus, América, que chegou a virar filme sob direção de Patricia Moran.

Estudioso, colecionador e influenciador de várias gerações da música underground de Belo Horizonte, Marcelo Dolabela fundou, em 1983, o Divergência Socialista, banda pilar da cena alternativa da capital mineira. A partir dela várias outras nasceram, dividindo os mesmos integrantes e ensaiando no mesmo espaço, como o Sexo Explícito, R Mutt, Ida e os Voltas, O grande Ah!, entre outras, e anos mais tarde o Pato Fu e o Tetine. “A gente meio que orbitava em torno do Marcelo. É mestre de muitos outros, de outras gerações”, publicou Ulhoa em uma rede social.

Em sua carreira como roteirista, assinou o texto do curta-metragem Uakti: Oficina Instrumental, do cineasta Rafael Conde, que faturou os prêmios de melhor filme e melhor montagem no Festival de Gramado de 1987. O artista também é responsável pelos roteiros dos filmes Arnaldo Batista: Maldito Popular Brasileiro e Adeus, América, ambos de Patrícia Moran.

Fará muita falta esse grande Mestre agredador e professor da arte inconformista, vanguardista e provocadora.
Seu conhecimento precisa ser perpetuado e difundido, porque durante décadas lá esteve ele acumulando, observando, ensinando e principalmente pensando muito a respeito do rock, do pop, da arte e da poesia.
Que se mantenha acesa a luz e o fogo de Marcelo Dolabela.

Sexta Trabalho Sujo: Fevereiro de 2020

sts-fevereiro-2020

Seguindo o baile nas sextas no Estúdio Bixiga, reunimos três bambas para as sessões de fevereiro da Sexta Trabalho Sujo. Na primeira edição do mês, convidei o grupo Anvil FX, fruto do cérebro incansável do mestre Paulo Beto, que irá fazer uma celebração à importância do saudoso Marcelo Dolabela, no dia 7 (mais informações aqui). Dia 14 é a vez do paulista Bruno Schiavo começar a mostrar seu primeiro disco solo, A Vida Só Começou, cheio de melodias assobiáveis, refrões deliciosos e muita experimentação sonora (mais informações aqui). Pulamos a sexta de carnaval para retornar no dia 28 com Pipo Pegoraro, que mostra seu recém-lançado disco instrumental, o ousado Antropocósmico (mais informações aqui)

Marcelo Dolabela (1957-2020)

marcelodolabela

Figura crucial na vida cultural mineira, Marcelo Dolabela havia sofrido um AVC há cerca de um ano e nos deixou neste sábado. Poeta, artista multimídia, escritor, músico e ativista cultural mineiro, ele é mais conhecido por ser autor do clássico ABZ do Rock Brasileiro, uma das primeiras enciclopédias sobre o pop brasileiro, lançada em 1987, por integrar bandas cruciais no underground de Belo Horizonte, sua cidade natal, como Divergência Socialista e Sexo Explícito, e por roteirizar documentários como Uakti – Oficina Instrumental e Arnaldo Batista: Maldito Popular Brasileiro. Abaixo, uma entrevista de 1997 com este herói desconhecido da cena artística nacional.

Obrigado Marcelo.