Em plena era das trevas políticas, Drauzio Varela dá início à nova fase da discussão sobre a maconha no Brasil discutindo seu uso recreativo numa série de vídeos impecável – Dráuzio Dichava é um oásis progressista nesse 2019 retrógrado.
O broder Matias Maxx relembra no minidocumentário A Vitória Não Virá por Acidente como o cárcere do grupo carioca Planet Hemp, em novembro de 1997, ajudou a elevar o nível da discussão sobre a maconha no país.
Conheço Matias Maxx desde o século passado e ele sempre foi um dos principais ativistas da causa canábica no Brasil – a planta é onipresente em sua vida e obra e passa pelo seu zine Tarja Preta, a loja Cucaracha no Rio de Janeiro e a revista SemSemente, além de ter inspirado o onipresente Capitão Presença. Sua última incursão ao mundo verde é o programa de turismo canábico Narcoturista, em que ele encarna o Macoñero Mascarado e dá um rolê por lugares que tenham a ver com a erva. O próximo episódio vai ser gravado no Uruguai e ele quer aproveitar a ida pra ir à fundo na experiência da legalização da maconha no nosso vizinho do sul – e pra isso montou uma campanha de crowdfunding no Catarse para fazer tudo do jeito certo. Bati um papo com ele sobre o programa, a campanha, a viagem e a situação das drogas no Brasil. Pra colaborar com o crowdfunding, clique aqui.
Falaê qual é a do programa.
Então, a idéia do Narcoturistas surgiu meio por acaso. Eu já tinha aquela máscara há muito tempo e basicamente usava no carnaval e na Marcha da Maconha. Aí eu levei ela numa viagem que fiz com o Daniel Paiva para Amsterdã em 2012. A gente foi cheio de gás numas de fazer matérias pra revista semSemente, e também gravar um documentário. Mas era a Cannabis Cup, a gente ficava chapado o tempo todo, e todos nossos possíveis personagens estavam ou super ocupados ou super chapados também.
Foi quando a gente teve essa idéia: fazer um programa de turismo apresentado pelo Macoñero Mascarado. Mas nem isso a gente conseguiu fazer direito. Aí o material ficou arquivado por dois anos quando a gente resolveu pegar pra editar de novo, dublar a porra toda e fazer a magia do cinema acontecer. Um pouco antes da gente lançar, fui ao México de férias, levei a máscara e gravei umas doideiras lá. Mês passado quando fui cobrir a Marcha da Maconha de BH também levei a máscara e daí surgiu o terceiro episódio, em “Brumadim”. A gente também tá fazendo sem pressa um episódio no Rio e um em SP, aonde a gente já gravou uma baldada lá no volume morto da Cantareira…
Agora, o que eu quero com isso? Essa pergunta é dificil. Acho que é dar continuidade ao que eu sempre fiz com a Tarja Preta, que é informar, mas sem perder o bom humor jamais.
O Narcoturistas é só você e o Daniel?
Ele é meu sócio na jogada. Ele é cartunista, co-editor da Tarja Preta e músico, toca na Orquestra Voadora, no Marofas Grass Band, no Luisa Mandou um Beijo e uma porrada de outras bandas daqui do Rio. Então nós dois fazemos praticamente tudo: dirigimos, atuamos, dublamos, filmamos e roteirizamos. Aí tem o DJ Babão que faz a mixagem e sonorização, e o Daniel Tumati que faz os gráficos, efeitos visuais e animações. Mas a gente vai envolvendo mais gente aos poucos: no segundo episódio tem desenho do MZK e no terceiro do Daniel “Etê” Giometti, dos Muzzarellas. No segundo episódio, também contei com a importante parceria do diretor mexicano Julio Zenil, que já fez clipes de várias bandas mexicanas como o Control Machete e é quem fundou a Marcha da Maconha de lá. Se a gente conseguir alcançar a meta do Catarse a idéia é despachar ele pro Uruguai também.
O quanto o Brasil já evoluiu no que diz respeito ao trato das drogas?
O discurso tá evoluindo, sobretudo depois da decisão do STF de 2011 que declarou inconstitucional o crime de apologia às drogas. No entanto o Brasil é um dos países que mais tem gente presa por crimes relacionados à droga. A maioria são pequenos traficantes, usuários muito pobres e alguns cultivadores. E mesmo após essa decisão do STF (ADPF 187), ainda tem gente sendo presa por vestir camisetas com folhas de maconha ou mesmo por cantar músicas sobre maconha – como aconteceu com o Cert da Cone Crew algumas semanas atrás -, sendo que ambas as situações foram explícitas como inconstitucionais no voto do ministro Celso de Melo na ocasião.
O Brasil é muito complicado, pois ao mesmo tempo que você vê uma expansão do que é a cultura canábica e os negócios canábicos, a maioria dos políticos e acadêmicos que defendem a legalização não sacam nada de cultivo ou mesmo de experiências de legalização em outros países, nem mesmo do nosso vizinho Uruguai. Ao mesmo tempo o STF deve votar a inconstitucionalidade do crime de uso de drogas no inicio de agosto, o que é um puta avanço. Mas que se não for acompanhado de alguma forma de regulamentação do cultivo/produção, distribuição e venda das drogas não resolve muito.
Há uma safra de produção audiovisual brasileira que trata sobre o tema. Qual a importância do cinema nisso?
Muito importante. Sobretudo quando esses filmes têm repercussão na grande mídia, como foi o caso do Quebrando o Tabu e do Ilegal, que tiveram trechos exibidos no Fantástico. No caso do Ilegal o filme conseguiu sensibilizar a população de um jeito que dobrou a Anvisa que regulamentou o CBD em tempo recorde, ainda que longe do jeito ideal. Tem também o Cortina de Fumaça do Rodrigo MacNivem que é muito bom.
Além do documentário, você é ferrenho ativista da causa. Como anda a Sem Semente? E que mais você está aprontando?
Sim, eu frequento a Marcha da Maconha desde 2002, e passei a organizá-la no Rio a partir de 2007, nesse meio tempo inspirei o Capitão Presença, e no meu trabalho como fotojornalista, seja na Bizz ou na Vice, sempre tentei levar essa pauta. A semSemente enfrenta os mesmos problemas que qualquer publicação independente com baixo orçamento no país, então a gente tá numa fase de reestruturação. Queremos passar para um formato semestral a partir do próximo semestre. Agora no Uruguai, além de um novo episódio do Narcoturistas também pretendemos gravar um documentário responsa.
Nos últimos dias tive a oportunidade de conhecer o chefe do Instituto Regulador da Canabis do Uruguay e o ex-chefe da junta de drogas de lá, então se prepara galera que vem coisa boa aê. Mas para executar o projeto em sua excelência temos primeiro que bater a meta do Catarse.
Então solta um trocado aê maaaan!!!
Tudo indica que quase quarenta anos depois da profecia de Peter Tosh, o país mais associado ao consumo de maconha irá legalizar a ganja em seu território. Diz o Guardian:
“Debate could start this month in the country where the drug, known popularly as “ganja”, has long been culturally entrenched but illegal.
The bill would establish a cannabis licensing authority to deal with the regulations needed to cultivate, sell and distribute the herb for medical, scientific and therapeutic purposes. “We need to position ourselves to take advantage of the significant economic opportunities offered by this emerging industry,” he said.
It would make possession of 2 ounces (56g) or less an offence that would not result in a criminal record. Cultivation of five or fewer plants on any premises would be permitted. Rastafarians, who use marijuana as a sacrament, could also legally use it for religious purposes for the first time in Jamaica, where the spiritual movement was founded in the 1930s.
E lá vão quase 40 anos que Peter Tosh cantava:
Ainda é um protótipo e seu fabricante, Herbal Elements do Colorado, nos EUA, já fez uma ressalva no Twitter dizendo que enquanto as autoridades não decidirem como a máquina poderá funcionar, ela ainda não sairá da fase de testes.
There has not been any marijuana in the #zazzz machine & will not be any marijuana in the machine until all authorities ok its proposed use.
— Herbal Elements (@HerbalColorado) April 14, 2014
Mas se há cinco anos te dissessem que em 2014 veríamos uma máquina dessas, você provavelmente ia achar que era ficção científica.