2017 também foi um ano de prestar antigas contas: visitar a terra-natal de meus primeiros ídolos, faróis do meu interesse por música e cultura. O encontro com o velho entreposto comercial britânico que fez John, Paul, George e Ringo quererem sair de sua própria cidade aconteceu na mesma semana em que seu disco mais emblemático completava 50 anos e foi farto material para a introspecção pessoal e reencontro com meus próprios interesses, depois de 42 voltas ao redor do sol. Além de visitar as casas que os quatro cresceram e os míticos Strawberry Fields e Penny Lane, ainda pude me calar ao silêncio literalmente sepulcral (ao lado do túmulo de ninguém menos que Eleanor Rigby) do quintal da igreja em que John viu Paul tocar pela primeira vez e aceitá-lo em sua banda. “Ah look at all the lonely people”, cantei calado para mim mesmo. A viagem também me presenteou com uma visita-relâmpago a Manchester, outra cidade-símbolo da minha formação, o reencontro com a querida Megssa e seu marido Gordon, que ainda contou com um show do Fall de lambuja. Uma semana que me fez renascer.
John Cale é outro destes meus padrinhos espirituais: a descoberta do Velvet Underground na adolescência veio quase simultânea à compreensão que aquele seu fundador também era um dos principais produtores da história (Stooges, Modern Lovers, Patti Smith, Nico), parceiro de monstros sagrados (Brian Eno, Nick Drake, Replacements e, claro, Lou Reed) e um dos artistas mais ousados deste século. Já havia assistido um show com o mestre em São Paulo, em 1999, quando ele revezava-se entre a viola e o piano para tocar seus clássicos e de sua primeira banda sozinho no palco e dezoito anos depois me reencontrei com ele na cidade-natal dos Beatles tocando o mítico disco da banana com uma série de convidados. Vestindo um terno meio listrado meio liso, Cale mostrou que é audaz mesmo quando vislumbra a nostalgia e fez um show memorável. Uma das grandes noites do meu 2017 – e desta década, tranquilamente.
Alex Turner e sua gangue reverenciaram o mestre Lou Reed em sua apresentação em Liverpool nessa segunda-feira, com uma versão correta e sóbria de “Walk on the Wild Side”.