E na minha coluna de hoje do Link, escrevi sobre como o famigerado “Harlem Shake” levou um desconhecido pro topo da parada de sucessos mais respeitada do mundo da música.
Um artista desconhecido no topo da parada da Billboard
Dança nonsense levou a música ao topo
Na semana passada, a parada de sucessos da revista norte-americana Billboard incluiu mais um item em seu ranking de músicas mais populares dos Estados Unidos. Chamada de Hot 100, a parada elenca desde 1958 as cem músicas mais vendidas e tocadas durante uma semana e sempre foi o termômetro de desempenho comercial dos artistas. Até a chegada da internet.
Antes da rede, era razoavelmente fácil aferir a performance mercadológica de um músico. Somava-se discos vendidos e músicas tocadas nas rádios e, a partir de cálculos específicos, a revista estabelecia qual era o artista mais popular no momento. Ou a banda que, embora não tenha atingido o topo, continuava a fazer sucesso graças às vendas e às execuções no rádio. Com a internet, esses parâmetros se perderam.
Afinal, qualquer um pode baixar quantas músicas quiser sem pagar ou ouvi-las sem que toquem no rádio, o que torna inviável a quantificação. Mesmo descartando os downloads ilegais, aumentam a cada dia as opções para ouvir música de graça (bandas que liberam o download ou serviços de streaming). Um deles, onipresente, é o que está mais perto de se tornar a maior rádio global que já se viu – embora seja uma plataforma originalmente de vídeo. Sim, o YouTube.
E foi exatamente o número de visualizações via YouTube que foi incluído no Hot 100 da Billboard. Mas o destino irônico quis que a novidade surgisse na hora em que a febre musical da vez não tivesse nem mesmo um vídeo próprio.
Se o novo parâmetro tivesse sido habilitado há seis meses, há um ano, há dois, teria elevado nomes como Psy (de Gangnam Style), Carly Rae Jepsen (de Call Me Maybe) ou Rebecca Black (de Friday) ao topo da lista e acelerado sua consagração comercial. São canções que têm videoclipes próprios, em que as imagens e a exposição são de domínio do artista.
Acontece que o hit de fevereiro de 2013 não é sequer uma música inteira. São 30 segundos de uma faixa que muitos nem mesmo podem considerar (por preconceito) uma canção. Harlem Shake, do produtor norte-americano Baauer, sem querer, se tornou o exemplar mais famoso de um gênero em formação chamado trap music.
A classe musical é uma variante sulista do hip hop norte-americano, mais lenta e pesada, que se aproxima de estilos específicos, como a versão dos EUA do dubstep (mais pesada e rápida do que a original inglesa) e o moombahton (colisão entre house music e reggaeton). Há um paralelo inevitável com o chamado “funk ostentação” paulistano, que se tornou objeto de curiosidade antropológica devido ao seu sucesso via internet.
Mas Harlem Shake não é nova – foi lançada em maio de 2012 e até fevereiro não tinha registro comercial. Até que um grupo de adolescentes australianos se vestiu com fantasias ridículas (um de Power Rangers, outro de alienígena, todos de collant) para dançar de forma ainda mais ridícula com a canção de Baauer. “CON LOS TERRORISTAS!”, diz o grito no início da música, que entra numa batida mecânica que se acelera. Aos 15 segundos, um sample diz “do the harlem shake” e a música se esborracha em câmera lenta, com um beat constante e uma base grave, sintética e lenta.
No vídeo dos jovens, a primeira parte da música é dedicada a se mexer sem sair do lugar, balançando a cabeça e os quadris sem tirar o pé do chão. Na segunda, depois de “do the harlem shake”, os moleques se chacoalham por inteiro, com os braços caídos, numa falta de noção típica da adolescência. Virou uma pérola de humor nonsense da internet.
Justamente por isso pegou. E, como outros, começou a ser citado, referido, misturado. E o “do the harlem shake” convidou as pessoas a fazerem seu próprio “Harlem Shake”. O resto é história.
E, de uma hora pra outra, um artista desconhecido, que criou uma música há quase um ano, tem um trecho seu usado ironicamente em um vídeo que se espalha por um motivo idiota e se torna o artista número 1 na Billboard. Esse começo de século 21 é uma época e tanto…
Minha coluna desta semana no Link relaciona a renúncia do papa à recente discussão sobre o vazio cultural brasileiro deste século.
A nova cultura brasileira é produzida na internet
O novo Tom Jobim não vai sair do trio elétrico
Eu havia acabado de reabastecer meu copo de caju amigo quando me conectei à internet. Era segunda de carnaval e estava longe da rede, num canto do litoral paulista em que o celular só pega na praia. Estava pronto para fotografar uma rara manhã de sol deste verão quando a notícia chegou, nem lembro se por Twitter, Facebook, e-mail ou Instagram.
Em poucos minutos, todos estes ambientes falavam do mesmo assunto: o papa tinha renunciado. Comentei com a minha mulher e sua primeira pergunta foi a mesma que tive: “E pode?”. Li algumas manchetes para ela, conversamos preguiçosamente sobre o tema e voltamos a lagartear sob o sol.
Só quando voltei do feriado me deparei com a avalanche de piadas, paródias, remixes, mashups, montagens, memes e todo tipo de gracinha que a internet nos premia diariamente. Segundo o site Know Your Meme, melhor catálogo dessas manifestações, a primeira piada visual sobre a renúncia do papa foi uma foto de Bento XVI acompanhada da legenda: “Escolhido por Deus. Desiste”.
Mas em pouco tempo as piadas saíam do âmbito religioso, político e sexual (afinal é inevitável associar a notícia aos casos pedofilia envolvendo integrantes da igreja), até chegar ao puro nonsense típico deste humor da internet.
Entre as brincadeiras, estavam os inevitáveis mashups de outros memes. O cartaz de Keep Calm & Carry On virou Keep Calm & Resign. O “Hope” – esperança, em inglês – com a cara de Barack Obama foi substituído por “Pope” – papa – ou “Flop” – fracasso, – com a cara de Joseph Ratzinger.
Outra piada aproveitava a semelhança física do papa com o Imperador da trilogia original de Guerra nas Estrelas para rir de uma “coincidência” entre a renúncia e o anúncio sobre os três novos filmes da grife de George Lucas. Já o usuário do Twitter Six Form Poet escreveu: “o papa dificilmente é a primeira pessoa a perder o interesse em seu trabalho depois que entrou no Twitter”.
Como milhões todos os dias, me inteiro das novidades da sucessão papal entre posts no Facebook, imagens que amigos me mandam por e-mail ou links no YouTube, ao mesmo tempo em que rio das piadas. São uma válvula de escape para a enxurrada de notícias a que somos submetidos diariamente e que logo deixam de ser novidade.
No começo essas apropriações humorísticas eram tímidas e aconteciam aos poucos. Mas, à medida se multiplicam, começam a se cruzar, a se autorreferir, a brincar umas com as outras. Quase todo mundo que está online percebeu que piadas e brincadeiras com notícias e modinhas foram se sobrepondo depois que Facebook e Twitter se firmaram como as principais forças sociais na internet.
A novidade é que isso não é simplesmente um monte de piadinha trocada por alguns conhecidos que, graças à internet, ganharam projeção global. É a produção cultural atual. Na semana passada, uma série de artigos, matérias e entrevistas questionou uma dita parca produção cultural brasileira, que no século 21 estaria rodando em parafuso. Os exemplos citados quase sempre esbarravam na música – artistas como Michel Teló e Gusttavo Lima.
Nem quero entrar no mérito da qualidade ou do bom gosto (réguas beeeem subjetivas), mas é sério que estão esperando encontrar o novo Tom Jobim em um trio elétrico? Ou que o novo Glauber Rocha saia de um best-seller bancado pela Petrobrás?
As cabeças que questionam a ausência do novo sofrem da síndrome de nostalgia ilustrada por Woody Allen na sua fábula Meia-Noite em Paris. Elas se irritam quando ligam o rádio, mas não buscam artistas novos e muitas vezes não sabem nem baixar MP3. E caçam novidades em livros, discos, filmes e peças de teatro quando é provável que elas não venham empacotadas nestes formatos.
O exemplo das piadas produzidas após a renúncia do papa é apenas um. Toda semana tem outros tantos. E o Brasil é uma potência nesse sentido. Só não vê quem não quer.
E na minha coluna de segunda-feira no Link, falei sobre o lançamento do disco novo do My Bloody Valentine (que saiu sem o “y” no título da versão impressa, como dá pra ver abaixo):
Duas décadas depois, um novo disco do My Bloody Valentine
Anúncio derrubou o site oficial da banda
Fevereiro de 2013 mal tinha começado quando surgiu uma notícia inesperada: o grupo inglês My Bloody Valentine finalmente lançou seu novo álbum. A notícia já seria motivo de espanto, afinal o MBV é um dos grupos mais míticos da Inglaterra nos anos 90 e tinha a fama de demorar para lançar novo material devido ao perfeccionismo de seu líder e fundador, o guitarrista e produtor Kevin Shields.
Construindo paredes de barulho com camadas e camadas de microfonia de guitarra, o som do My Bloody Valentine é carregado de uma inusitada doçura, que vem das melodias sussurradas por vocais melancólicos e pelos timbres das mesmas guitarras distorcidas. Loveless, de 1991, sua obra-prima, foi um dos últimos suspiros da existência da banda.
Eles realmente tinham todo tempo do mundo. Shields juntou-se ao grupo Primal Scream para shows em 2004 (inclusive com passagem pelo Rio de Janeiro e por São Paulo, naquele ano) e três anos depois ressuscitou o My Bloody Valentine para shows esporádicos, sempre com músicas tocadas num volume tão extremo que eram distribuídos protetores auriculares na entrada. Em 2008, os dois principais álbuns da banda, Isn’t Anything e Loveless, foram relançados em edições luxuosas. No ano passado foi a vez dos EPs serem reunidos em uma edição caprichada.
A reintrodução do My Bloody Valentine ao cenário musical foi tão gradual que, aos poucos, o lançamento de um disco virava uma nota de rodapé engraçadinha sobre a nova fase da banda.
Até que, no fim de 2012, começaram a aparecer notícias que o disco já estava gravado e seria lançado logo. Kevin Shields, em entrevista, disse que sairia até o fim do ano, mas devido ao histórico de atrasos, o anúncio foi visto com bastante descrença. Na véspera do Natal, o grupo anunciou em sua página do Facebook que o disco sairia em breve. Em um show no fim de janeiro, o primeiro desde 2009, o My Bloody Valentine tocou uma música inédita, batizada informalmente de “rough song” (canção crua, em inglês). Os indícios ficavam mais fortes. Mas o que ninguém esperava aconteceu uma semana depois: o grupo lançou seu novo disco, mais de 20 anos depois de Loveless.
Chamado apenas de MBV (as iniciais da banda e como os fãs se referem ao grupo), o novo disco de capa azul surgiu em 2 de fevereiro também numa mensagem via Facebook. A notícia apontava para o recém-inaugurado mybloodyvalentine.org, que trazia diferentes opções para comprar o disco: em vinil, CD e download em pacotes e formatos variados. A notícia espalhou-se e em questão de minutos o site saiu do ar – tanto fãs quanto curiosos ficaram se perguntando nas redes sociais onde é que dava para ouvir o disco novo. O site voltou a funcionar na madrugada do domingo e versões gratuitas do disco começaram a aparecer em sites de download. O próprio grupo cedeu à audição gratuita e colocou todo o seu disco no YouTube, um vídeo para cada faixa.
Artisticamente, MBV pode ser dividido em duas partes: no “lado A”, repete-se a fórmula de duas décadas atrás; no “lado B”, o grupo mostra seu lado mais ousado, experimental, burilando texturas e percussão. Mas isso é o que menos importa. O importante é que, como o Radiohead fez ao lançar o disco In Rainbows gratuitamente em 2007, o My Bloody Valentine quebra um paradigma crucial na era digital.
O lançamento de MBV, no entanto, não é o segundo exemplo desta série. No mês passado, ninguém menos que David Bowie anunciou um novo disco com um clipe no Vimeo de uma música, sua primeira inédita em uma década. O feito do grupo de Kevin Shields chama atenção por dois motivos: o fim de uma espera gigantesca e o fato de não terem lançado seu disco com uma gravadora, fazendo-o por conta própria.
A tendência é que essas exceções tornem-se regra – e o imediatismo da era digital venha a se sobrepor de vez às etapas do processo de produção industrial a que ainda estamos acostumados.
E por falar em Campus Party, escrevi justamente sobre a boa edição deste ano, que terminou na semana passada, na edição do Link desta segunda-feira:
Sem celebridades, a melhor edição da Campus Party
Evento se adaptou às mudanças tecnológicas
Acompanho a Campus Party desde sua criação. Em 2008, a banda larga não era tão disseminada. Lembro de matérias da época sobre gente que ainda usava conexão discada em São Paulo porque a internet rápida não estava disponível em seu bairro. Portanto fazia sentido um evento em que a conexão veloz fosse a grande atração. Mas a Lei de Moore – aquela que comenta a progressão geométrica da evolução da tecnologia – já antevia que a velocidade deixaria de ser um atrativo em poucos anos e eu já me perguntava o que a Campus Party poderia oferecer no futuro.
A primeira edição aconteceu no Pavilhão da Bienal, no Parque do Ibirapuera, no coração de São Paulo. Um evento em que as pessoas levam seus computadores para passar dias acampados jogando videogame e compartilhando conteúdo naturalmente geraria curiosidade. Assim, a primeira edição funcionou como um cartão de visitas daquele novo universo digital para toda a cidade.
Foi a única que aconteceu ali. As três edições seguintes foram para o Centro de Exposição Imigrantes. Numa região afastada do centro e do metrô, as Campus Party de 2009, 2010 e 2011 aconteceram longe do olhar da cidade. E ali o evento cresceu de forma atrapalhada, com filas e problemas de infraestrutura, segurança, temperatura e barulho.
O público, contudo, relevava. Para os participantes, a Campus Party era um acampamento de verão sem os perrengues e com conexão 24 horas. Tudo bem que não dava para ouvir os debates ou que houvesse uma goteira. O importante era estar conectado.
Neste tempo, o mundo fora da Campus Party mudou. As conexões domésticas melhoraram e hoje baixa-se um filme em menos tempo do que o tempo para assisti-lo, algo considerado incrível na época do primeiro evento. Ao mesmo tempo houve a expansão do Facebook e a popularização dos smartphones, que aceleraram a aproximação de muito mais gente para o digital. Ao completar cinco anos, a Campus Party não parecia mais um evento feito para um nicho de tarados por downloads.
Se a conexão rápida aos poucos deixava de ser um atrativo, coube ao evento repensar no que poderia substituí-la – e por anos assistimos a um desfile de celebridades do universo digital. Nomes como Tim Berners-Lee e Steve Wozniak garantiram uma audiência considerável, mas apostar em nomes famosos também poderia ser um beco sem saída. Afinal, não são muitas as celebridades neste universo e os maiores nomes, como Mark Zuckerberg e Bill Gates, são executivos com agendas lotadas.
Em 2012 o evento mudou para um lugar de acesso fácil, o Parque Anhembi, e algumas questões pareciam ter sido resolvidas. As atrações não eram tão famosas assim: o físico Michio Kaku e o jornalista e matemático Alex Bellos, executivos da empresa do Angry Birds e integrantes do Occupy Wall Street. Mas aos poucos profissionais entenderam que o encontro também era um bom lugar para procurar novos talentos.
Chegamos a 2013 e a edição da semana passada foi, sem dúvida, a melhor da história. Os erros serviram como aprendizado e os palcos foram colocados no centro do pavilhão, causando menos barulho. Com este desafogamento, foi possível abrir mais espaço para quem trouxesse seu computador e, ao dissipar estas pequenas multidões, o ruído diminuiu. O aspecto comercial do evento chegou a um consenso à medida que novas startups e grandes empresas começaram a dialogar entre si usando a Campus Party como ponto de partida. Os convidados desta edição não tinham o peso da fama dos anos anteriores e sua importância não ofuscava o resto das atrações.
É possível que a Campus Party tenha, enfim, chegado à maturidade e entendido sua vocação. Pode ser, por outro lado, que esteja surfando na onda das startups, e que, uma vez que esta onda passe, pode ter de repensar seu rumo. Mas o fato é que houve mais acertos que erros – e isso é digno de parabéns.
Minha coluna desta semana no Link foi sobre a segunda temporada de Black Mirror, que foi anunciada na semana passada.
Se a tecnologia é um vício, quais são os efeitos colaterais?
‘Black Mirror’, série critica efeitos da tecnologia na sociedade
Uma voz monótona repete frases sem emoção: “Viva mais. Conecte-se mais. Viaje mais. Compartilhe mais. Procure mais”. Pessoas sorriem em situações cotidianas com seus tablets ou celulares. A iluminação é perfeita, a fotografia é de publicidade. Todos são lindos.
De relance, um outdoor eletrônico transforma empolgação em ameaça – “O futuro que você merece” – e seguem os imperativos: “Consuma mais. Pense mais. Experimente mais. Lembre mais. Veja mais. Compartilhe mais. Aprenda mais. Faça mais. Lute mais. Faça mais. Conecte-se mais”. As imagens mudam, os sorrisos tornam-se falsos e celulares filmam cenas violentas – confrontos, espacamentos – vistas por uma criança debaixo de seu cobertor.
“Deixe de ser você”, diz a voz robótica antes de surgir uma avenida tomada por pedestres que filmam, sem reação e com seus celulares, uma enorme nuvem de poeira que vem em sua direção. É inevitável a associação com a mórbida nuvem que tomou as ruas de Nova York depois da queda do WTC.
“O futuro está quebrado.” É o trailer da nova temporada de Black Mirror (espelho preto), do jornalista inglês Charlie Brooker, anunciada semana passada. Eu já havia comentado sobre a série em uma Impressão Digital no fim de 2012, mas apenas comentei a força de seu título, mais do que seu tema.
Black Mirror não é um seriado, mas três pequenos filmes exibidos pela Canal 4 da BBC inglesa. Seu autor, Charlie Brooker, é um notável crítico de mídia conhecido por sua abordagem nada sutil e pela franqueza agressiva que usa para expor suas opiniões, uma espécie de Michael Moore menos bonachão. É um inglês cínico cujo sotaque é tão pesado quanto a forma como ele trata os temas que escolhe. Ele explora como burrice, vaidade, ganância e banalidade derretem nossa civilização ao tratar inteligência como excentricidade e aparência como lastro de confiança.
O que une os três primeiros episódios de Black Mirror, exibidos no fim de 2011, é um dos principais alvos das críticas de Brooker – a tecnologia. Sua abordagem é simples: a tecnologia é a droga mais consumida do mundo hoje e estamos todos viciados nela. Todo o ecossistema criado pela internet e novos aparelhos não apenas nos permite consumir conteúdo em qualquer lugar como também faz que nossas vidas possam ser transformadas em conteúdo para ser consumido. A partir desta constatação, Brooker quer descobrir quais são os efeitos colaterais desse vício.
Em três episódios, três choques: no primeiro (Hino Nacional) o primeiro-ministro inglês vê-se chantageado para fazer sexo com um porco em cadeia nacional. No segundo (15 Milhões de Méritos), um operário de uma fábrica do futuro – que parece uma academia de ginástica – tenta ajudar uma desconhecida a comprar sua vaga em um programa de reality show. No terceiro (Toda a História de Você) uma tecnologia permite que você grave e reveja as próprias lembranças e isso pode ser catastrófico para as nossas relações.
Black Mirror ainda é inédita no Brasil e o canal BBC HD, recém-lançado no País, poderia nos presentear com sua exibição (como já fez com a excelente série Sherlock, adaptada pelo bamba Steven Moffat), antes de os três episódios da próxima temporada – que começam a ser filmados no mês que vem e ainda não têm data de exibição – irem ao ar no Reino Unido.
Do pouco que se sabe dos próximos episódios, num deles o namorado de uma viciada em redes sociais consegue voltar a ter contato com ela depois de sua morte graças à internet; no outro, um personagem de programa infantil concorre a um cargo político e começa a soar menos estúpido que seus concorrentes; e no último, uma mulher acorda numa casa em que não conhece para descobrir que as pessoas se tornaram voyeurs sem motivo, filmando os outros o tempo todo e não fazem mais nada.
Não parece tããããão diferente da nossa própria realidade…
E a minha coluna no Link dessa semana foi sobre a morte de Aaron Swartz (que a Tati entrevistou pra uma capa do Link em abril do ano passado…
Swartz não se contentava com uma vida confortável
O ativista seguiu seus ideais e não o mercado
Como acontece com quase tudo online, o trecho do clássico poema beat Grito (Howl, em inglês), de Allen Ginsberg, virou piada há algum tempo. A épica constatação que “vi as melhores mentes da minha geração destruídas pela loucura” ganhou um tom jocoso feito para ridicularizar uma das principais obsessões profissionais deste século digital: “Vi as melhores mentes da minha geração pensando em como fazer as pessoas clicarem em anúncios”.
Parece só uma piada, mas não é exagero: há muita, mas muita, gente talentosa que, devido às preocupações do mercado, se vê obrigada a deixar suas melhores qualidades em segundo plano para queimar neurônios para fazer com que as pessoas curtam posts no Facebook, deem RT em tweets, cliquem em banners ou para que façam galerias de fotos para que os usuários fiquem mais tempo online. Palavras como “engajamento”, “monetização”, “publieditorial” e “multiplataforma” (além de termos em inglês “buzz”, “app”, “newsfeed”, “e-commerce”, “startup”, “brainstorm”) causam urticária em pessoas que gostariam de estar fazendo outras coisas, mas se veem presas à obrigação de gerar audiência para uma marca.
O norte-americano Aaron Swartz, que nasceu em 1986, preferiu o outro caminho. Gênio da programação, o rapaz de 26 anos que cometeu suicídio há dez dias pode ser considerado não apenas um dos desbravadores da web que habitamos hoje, mas um de seus principais arquitetos. Ainda adolescente, trabalhou com nomes como o criador da World Wide Web Tim Berners-Lee (em um projeto de web semântica, a tão esperada web 3.0) e com o advogado Lawrence Lessig (Aaron o ajudou a traduzir a lógica das licenças livres do mundo do direito para a linguagem técnica dos computadores). Mas não bastou estar nos ombros dos gigantes. Foi além.
Não tinha nem 20 anos quando criou o web.py, framework para desenvolvimento web na linguagem Python que não só foi a base da criação de um dos primeiros sites sociais do mundo, o FriendFeed, como mais tarde serviu tanto para a criação do Facebook quanto para os vários projetos de rede social do Google. Ajudou a criar o Reddit, uma das redes sociais mais importantes e ativas da última década, cuja relevância e importância crescem a cada ano – não por acaso Barack Obama ofereceu-se para ser sabatinado na rede social, na campanha para a reeleição no ano passado. Aaron também era um dos principais articuladores do ativismo digital do século, escrevendo artigos e defendendo causas sempre à favor da liberdade de expressão e da internet aberta.
O tom grave de sua morte parece piorar o cenário descrito na paródia do poema do início do texto. Aaron poderia se juntar aos muitos geninhos que preferiram o conforto do emprego seguro e da vida corporativa e hoje estaria vivo, talvez ganhando muito dinheiro, mas inquietado. Preferiu seguir seu coração e todos nós ganhamos com isso.
Os mais cínicos dirão que ir atrás do próprio sonho foi o que determinou o fim de sua vida – um argumento ridículo. O motivo pelo qual Aaron tirou a própria vida não é claro, embora tudo indique que tenha a ver com o processo que o Massachusetts Institute of Technology (MIT) movia contra ele. Um processo que, se fosse considerado culpado, poderia colocá-lo na cadeia por até 50 anos.
Aaron era a favor da difusão livre da informação e hackeou o Jstor, um banco de dados de teses científicas, para mostrar que este conhecimento deveria estar na rua, ao alcance de todos. A ironia desta situação vem do caso que Aaron só virou programador porque, aos 11 anos, descobriu que o próprio MIT oferecia cursos gratuitos online.
Claro que ele aprenderia a programar de outra forma – mas, ao hackear o Jstor, não tenho dúvida de que ele queria aumentar a possibilidade de que mais pessoas como ele pudessem seguir seus sonhos – e não ficar pensando em como fazer os outros clicarem em anúncios.
Usei o gancho do vazamento online do Django para falar do novo filme de Tarantino na minha coluna do Link.
O novo filme de Tarantino e o amadurecimento digital
Formatos piratas já não satisfazem as pessoas
Assisti a Django Livre, que estreia no Brasil na sexta-feira. Era dia de Natal (data da estreia oficial do filme de Quentin Tarantino) e eu estava em uma viagem no exterior. E fui com a minha mulher ver Django numa telona. Gosto de assistir a filmes e séries na TV, já vi muitos filmes no computador, mas nada substitui o cinema para alguns filmes.
O elemento social talvez seja seu aspecto mais encantador: sentar-se no meio de desconhecidos e conduzir-se por uma viagem de sons e imagens que passaram-se na cabeça de um autor, numa sala escura. É um processo completamente diferente da literatura. No cinema, as cores, formas e sons vêm antes da mensagem e da linguagem, e a comunicação é feita por instintos puramente estéticos. Todo mundo vê e ouve a mesma coisa, mas a história é interpretada por cada espectador. E absorver essas sensações coletivamente, uma viagem cerebral cujos condutores são apenas nossos olhos e ouvidos, é uma das grandes experiências sociais que o século 20 deixou para as gerações futuras.
Prefiro assistir aos meus cineastas favoritos assim. Tarantino é um dos meus prediletos entre os vivos (ao lado dos Coen, Cronenberg, Lynch, Scorsese, Herzog e mais alguns) – e por isso cedi à expectativa e resolvi ver o novo filme em inglês mesmo. Na semana passada, no entanto, pude revê-lo em português em uma sessão para a imprensa (que é chamada de cabine), dois dias depois de uma versão screener vazar na internet.
Versões screeners são DVDs enviados a jornalistas que não podem ir às cabines. Elas não têm a qualidade técnica de uma projeção cinematográfica nem a alta definição dos DVDs comerciais. Servem para que o crítico de cinema assista ao filme antes da estreia.
No mundo do download ilegal, essas versões recebem nomenclaturas específicas. Screener, abreviado SCR, é a versão mais apresentável nas primeiras vezes em que o filme vaza online, diferente de outras categorias.
CAM, abreviatura de “câmera”, é o filme pirata mais rasteiro possível, aquele em que o pirateiro filma a tela do cinema. É a qualidade mais tosca que se pode imaginar: iluminação ruim, silhuetas de espectadores e som fora de sincronia são características frequentes. A versão TS – telesync – é um pouco melhor, pois o pirateiro pega o áudio do projetor. Em seguida vem a versão SCR, como a que vazou de Django na semana passada.
Desta vez, o rebuliço que normalmente acompanha o vazamento de obras esperadas há muito tempo – como é o caso do filme de Tarantino – não foi tanto. Parte do público preferiu esperar o filme estrear no cinema (eu estaria entre eles, se já não tivesse visto o filme). Outra parte baixou sem saber da qualidade. E um terceiro grupo preferiu esperar o vazamento de uma versão melhor, em alta definição, ripada do DVD.
O que mostra que estamos vivendo um amadurecimento digital considerável. O mesmo vale para o vazamento de discos ou para a qualidade do áudio de músicas vendidas legalmente online. Há audiófilos que se recusam a ouvir música com bitrate – que mede a qualidade da frequência – menor do que 320 kbps. Dez anos atrás, muitos estavam comemorando o simples fato de o disco ter aparecido online – mesmo que a qualidade fosse inferior ao padrão mais baixo, o de 128 kbps.
Esta mudança está diretamente associada ao tipo de equipamento que temos hoje em casa. Com esses equipamentos, aos poucos estamos exigindo mais qualidade digital. Mas temos que nos acostumar com o fato de que o digital não necessariamente exige suporte para ser consumido. Você não precisa de um DVD para ver um filme como não precisa de um CD para ouvir um disco. Falo mais disso em colunas futuras.
E assistam a Django no cinema. Alguns momentos são de pura catarse coletiva. E saber que você tem que ficar quase três horas sem poder dar pause, olhar a internet no celular ou correr para pegar algo na geladeira torna a exibição ainda mais intensa.
Minha última Impressão Digital de 2012 cogita um 2013 mais móvel e menos preso aos desktops. Será?
2013: O ano em que o celular pode ultrapassar o computador
Futuro pertence aos nichos e à mobilidade
Todo mundo quer saber quando é que o Facebook vai perder a importância – e, principalmente, qual será a nova rede social que vai substitui-lo. Acho que são dois movimentos distintos e uma coisa não está propriamente relacionada à outra.
A rede social de Mark Zuckerberg começou 2012 forte e imponente, rumo ao primeiro bilhão de usuários e disposta a abrir capital. Cumpriu as duas promessas, mas o crescimento já não é mais intenso e o IPO não chegou nem perto da expectativa entusiasmada do início do ano. Por outro lado, cada vez mais gente deixa o Facebook por motivos diversos – discordam de sua política de privacidade, não aguentam mais discutir com desconhecidos horas a fio, não querem mais ver imagens de culto ao ódio, cansaram de misturar trabalho, amigos e família no mesmo ambiente, não gostam do aplicativo móvel, acham que virou uma plataforma de anúncios.
Sobre o último caso, é fato. Seu concorrente direto, o Google, também se sustenta em publicidade, mas enquanto recolhe dinheiro graças à sacada do Ad Sense, a empresa também tem o sistema operacional móvel mais popular, mapeia e digitaliza o mundo em seu serviço cartográfico, tem tablets, celulares e uma tentativa de fundir TV com internet, além dos futurísticos Google Glasses… Enquanto isso, o Facebook apenas vende formas de socializar conteúdo de seus domínios. Repete a lógica da America Online em seus primeiros dias, algo que se provou insustentável. As pessoas não ficam no mesmo site o tempo todo.
Sem contar que um dos motivos do fracasso da abertura de capital do Facebook foi a insegurança que investidores têm em seu futuro móvel. O aplicativo da rede social para celulares não chega aos pés da experiência em desktop. Tentaram entupi-lo com recursos: mensagens, chat, eventos, fotos, jogos… O app é lento e difícil de usar.
No início do ano comentei como a simplicidade é a razão do sucesso de um aplicativo. E isso aconteceu pouco antes de o Facebook anunciar a compra do Instagram. Os motivos da aquisição são especulação, mas têm a ver com o fato de a rede social não ter um aplicativo móvel tão bom quanto o Instagram e também com a possibilidade de estar comprando um possível rival.
Mas o Instagram não deve atingir os níveis do Facebook – mesmo se não fosse comprado. Porque o futuro das redes sociais pertence aos nichos. E, principalmente, o futuro da internet pertence aos celulares.
Esta fábula em que um aplicativo para celulares é comprado por uma rede social criada para ser usada em computadores é uma amostra do futuro que veremos nessa década. A força da internet móvel é comprovada por nós diariamente – seja em programas de geolocalização que nos ensinam caminhos inusitados, na possibilidade de se assistir à TV individualmente em um ônibus (com fones de ouvido, por favor), em inúmeros jogos mais complexos que os primeiros Super Mario e agora cabem em nossos bolsos. Carregamos sempre aparelhos que podem tirar foto, editar texto, vídeo e áudio e publicá-los na internet.
Ao mesmo tempo, nos tornamos mais livres. Livres do mouse e do teclado, da posição arqueada ao debruçarmos nos computadores, de ficarmos sentados o tempo todo. A era pós-PC tão alardeada por Steve Jobs tem menos a ver com tablets e mais com a internet móvel nos celulares. Em pouco tempo, veremos os tablets como trambolhos gigantescos, smartphones para idosos que não conseguiam digitar em teclados touchscreen. Isso acontecerá quando vier o triunfo da internet móvel via celular.
Eis a minha aposta para 2013: menos olhos na telona, mais olhos na telinha. Menos tempo sentado, mais tempo em pé. Menos escritório, mais rua. É claro que temos que esperar melhorias drásticas no nosso parco 3G e num utópico 4G que nem sequer é realidade. Mas, com certeza, usaremos mais celulares que computadores. Se é que já fazemos isso hoje, sem nos dar conta.
Entrei no Estadão no mesmo ano em que saí da Trama. O Trama Universitário, projeto da gravadora em que eu trabalhava, encerrou suas atividades em fevereiro de 2007 e dois meses depois o Guilherme Werneck me chamava para ocupar sua vaga como editor-assistente do Link Estadão, o caderno de cultura digital criado três anos antes por Ricardo Anderaos, que substituiu o antigo caderno de Informática do jornal. Entrei no Link quando ele ainda era um caderno de avaliação de produtos, numa época em que o Orkut era soberano, quando a economia dos aplicativos ainda engatinhava, no mesmo ano em que Steve Jobs lançou o iPhone. Dois anos depois, eu me tornaria o editor do caderno, quando comecei a finalmente, botar as mangas de fora e mostrar como poderia ser um caderno de tecnologia e cultura digital na segunda década do século 21. Junto ao novo cargo veio a coluna Impressão Digital, que começou aos domingos no Caderno 2 e que continuou mesmo após a minha saída do Link, em outubro. Destes cinco anos no Limão, não custa lembrar a satisfação que foi trabalhar num dos principais veículos do jornalismo brasileiro (o mesmo que publicou Os Sertões, que brigou contra a censura na ditadura militar e que declara o voto no dia da eleição – e que também foi o mesmo lugar em que publiquei meu primeiro frila pago, quando Syd Barrett completou 50 anos, em 1996), cujo clima de tranquilidade e franqueza sempre dominou seus corredores (a não ser em períodos tensos específicos, como Copa do Mundo, eleições e passaralhos). Mas a principal recordação destes cinco anos trabalhando ao lado da Marginal Tietê é, sem dúvida, o monte de amigos que fiz naquela redação, seja entre meus amigos e colegas do Link (todos vocês, vocês sabem quem vocês são – não preciso citá-los mais uma vez), até a vizinhança com as turmas do Divirta-se, do Paladar, dos tradutores, da arte, do portal, do pessoal do dia e de todos que conheci nestes anos todos. Lembranças que também se perdem entre as múltiplas referências internas, como os almoços no Puras, as idas à rádio, as noites que terminavam com Seu Matos, os gritos de “Thunder!” do Santana (que confundia o meu HAL 9000 de descanso de tela com o olho de Thundera), as travessuras do Thiagueira, as idas ao Brooklyn ou ao Central Park para fumar um cigarro, as risadas com a Denise. 2012 viu o fim deste ciclo, que foi bem importante para o jornalismo de tecnologia no Brasil (veja o que aconteceu com a Info Exame e o Folha Informática depois de 2009) e para mim, que consegui atingir um novo parâmetro em minha carreira profissional – e juntar tantos amigos nesta jornada. Foi incrível, valeu!
Minha coluna no Link de segunda-feira foi sobre novos hábitos digitais e um pouco de tolerância no ano que vem.
Uma sugestão de resolução de ano novo que vale para todos
Convivemos com velhos e novos hábitos
Fim de ano é sempre a mesma coisa: além das compras e viagens, as pessoas aproveitam para fazer aquela reflexão. Esse momento, na maioria das vezes, se traduz em listas: melhores do ano, resoluções, presentes, convidados, metas.
O site Gawker fez uma dessas, mas, em vez de pensar no melhor do ano, listou o pior. Entre os itens, modinhas hipster (calças skinny, bigodes irônicos), acessórios engraçadinhos (calçados com dedos) e itens do universo do Link, como perfis no Twitter criados para parodiar personalidades, fotos de comida no Instagram e fones de 300 dólares.
Queria aproveitar a deixa para falar de hábitos digitais e, em vez de apenas apontar o que não deveríamos fazer, refletir sobre nossa ética, etiqueta e educação em relação ao novo século digital.
Costumamos rir de nossos pais quando narramos suas desventuras pela internet. A mãe que manda lembranças com palavras meigas no meio de uma discussão acalorada no Facebook. O pai que forwardeia todo e-mail sobre um novo golpe. Ela entope o MSN de emoticons, coleciona power points e tagueia você em fotos da sua adolescência que você não queria que tivessem sido registradas. Ele compartilha listas de piadas d’antanho, descobriu ontem o Battle at Kruger (o clássico vídeo em que um rebanho de búfalos defende um bezerro na savana africana) e manda e-mails desmentindo lendas urbanas. Os dois ainda usam o Internet Explorer, riem “kkkkkk” e perguntam como faz para fazer a carinha sorridente no Facebook.
Rimos com uma camada falsa de superioridade, só porque nos acostumamos com a rede antes de nossos pais. Mas nós também nos comportamos mal online. São gestos que parecem triviais, mas que demonstram tanta falta de familiaridade com a internet quanto nossos pais.
Vivemos uma transição, o que faz muitos se sentirem melhores apenas por usarem os meios digitais há mais tempo. O comentário “old” (velho, em inglês) – dito mesmo em discussões em português quando alguém linka algo achando que é o primeiro a trazer aquela informação – serve como diagnóstico deste momento. A cultura de internet ainda é cíclica – se você se sente decano por ter usado internet nos tempos de conexão discada, saiba que milhões de novos usuários vão conectar-se pela primeira vez usando celulares. E vão descobrir o prazer de mandar vídeos para amigos, quebrar a cabeça até entender o humor nonsense da rede e divertir-se com gifs animados. Eles, como nossos pais, escrevem com o Caps Lock ligado sem saber que isso é como gritar. Colocam imagens na assinatura do e-mail, cumprimentam celebridades no Twitter como se elas fossem responder, acreditam em sites de notícias falsas.
A primeira reação de quem já habita a internet é tratar os novatos com repúdio, ironia ou pena. E, ao fazer isso, estamos sendo tão sem noção quanto os que acabaram de entrar.
Vai chegar o momento em que não vamos mais conseguir nos desconectar. Nossos celulares-computadores estão online o tempo todo. Em questão de anos estaremos organicamente conectados – não custa lembrar que o projeto original do Google Glasses não era um óculos, mas uma lente de contato.
Gosto de comparar o mundo online e offline com a terra e a água, e estamos vivendo aquele momento em que deixamos de ser animais terrestres para nos tornarmos anfíbios. Para quem já sabe respirar dentro da água da internet, qualquer tentativa atrapalhada de nadar parece ridícula. Calma. Houve um dia que não soubemos nadar.
Por isso, listo apenas um item que devemos abandonar em 2013. A impaciência. Em vez de rir, ensine. Em vez zangar-se, mostre. Uma das grandes vantagens da internet é sua natureza colaborativa, que pode nos fazer sair dessa era de individualismo bizarro para voltar a conviver uns com os outros.
Isso também vale para o mundo offline. Mas se começarmos a pensar nisso com a internet como cenário, torna-se mais fácil chegar ao próximo estágio.