Vida Fodona #808: 13 anos de Vida Fodona

Comemorando atrasado.

Justice + Tame Impala – “Neverender”
David Bowie – “Stay”
Happy Mondays – “Bob’s Yer Uncle”
Itamar Assumpção – “Fico Louco”
Jorge Ben – “Cinco Minutos”
Sade – “No Ordinary Love”
Massive Attack – “Black Milk”
Curumin – “Vem Menina”
Yo La Tengo – “Well You Better”
Yumi Zouma – “Catastrophe”
Tops – “Change of Heart”
Yma – “Vampiro”
Erasmo Carlos – “Sorriso Dela”
Ava Rocha – “Beijo no Asfalto”
João Gilberto – “É Preciso Perdoar”

Ouça abaixo:  

Tábua de Esmeraldas, 50 anos depois

Este 23 de abril que também dia de São Jorge foi a deixa escolhida por Vinícius Mendes, colaborador do site da BBC Brasil, para dissecar a mais clássica obra de Jorge Ben numa ótima e extensa reportagem sobre o enigmático e hipnótico A Tábua de Esmeralda, que completa meio século no próximo mês. Buscando referências em velhas entrevistas com Jorge Ben e em estudos sobre alquimia, o repórter debruça-se sobre os assuntos e canções do histórico disco de 1974 que mudou a carreira de grande Jorge por vias tortas. A reportagem aparece num momento em que corre um rumor nos bastidores que cogita a possibilidade do próprio Jorge revisitar o disco ao vivo em uma série de shows pelo Brasil (e talvez pelo exterior?), algo que ele já havia dito que não iria fazer. Mas será que ele volta a tocar violão? Aproveito para republicar a íntegra do Roda Viva de 1995 que trouxe o mestre como entrevistado quando ele responde uma dúvida de ninguém menos que Chico Science (trajando uma bela camiseta do Portishead) sobre o mágico disco (a partir dos 15 minutos).

Veja a íntegra do Roda Viva abaixo:  

50 anos do Phono 73

Imagine um festival reunindo Chico Buarque, Caetano Veloso, Maria Bethania, Elis Regina, Jorge Ben, Gilberto Gil, Nara Leão, Wilson Simonal, Vinícius de Moraes, Toquinho, Raul Seixas, Jair Rodrigues, Wilson Simonal, Erasmo Carlos, Jorge Mautner, Jards Macalé, Sergio Sampaio, MPB4, Wanderléa, Odair José e muitos outros artistas no auge da ditadura militar dos anos 70 — e também da chamada MPB? O Phono 73 aconteceu há 50 anos, quando, nos dias 11, 12 e 13 de maio de 1973, o Palácio de Convenções do Anhembi, em São Paulo, foi inaugurado com este elenco estelar, que fazia parte da principal gravadora do gênero à época, a Phonogram, liderada pelo visionário André Midani. Foi ele que vislumbrou um festival em que os artistas nao competiam e sim colaboravam, gerando encontros históricos como o que fez Gil e Chico criar o hino antiditadura “Cálice” (que nao foi tocado por censura prévia, fazendo com que o baiano mostrasse a música dias depois no histórico show que fez na USP, poucos dias depois), que reuniu Caetano Veloso e Odair José para cantar a polêmica “Eu Vou Tirar Você Deste Lugar” (um dos primeiros hits do segundo, sobre prostituição) e colocou Gil e Jorge Ben para tocar juntos pela primeira vez a clássica “Filhos de Gandhi”. O festival foi registrado para se transformar em filme, mas infelizmente pouco mais de meia hora sobreviveu ao tempo. Felizmente esse pouco que sobrou foi parar no YouTube, para nossa alegria. Saca só.

Assista abaixo.  

Vida Fodona #752: Eu sei, tô devagar

Deixa que eu vou na manha…

Ouça aqui.  

1972 na música brasileira

Começo, nessa sexta-feira, um especial para o site da CNN Brasil em que apresento vinte clássicos da música brasileira que completam meio século neste 2022. 1972 foi um ano mágico para a música e por aqui assistiu ao lançamento de discos que praticamente determinaram o que escutamos hoje. A primeira parte da lista inclui o Transa do Caetano Veloso, o Expresso 2222 do Gilberto Gil, o Elis da Elis Regina, o Sonhos e Memórias: 1941-1972 do Erasmo, o Ben do Jorge Ben e o disco de estreia do Jards Macalé. Os outros discos surgem no sábado e no domingo, aviso por aqui.  

Vida Fodona #714: Desanuviar essa vibe

Porque essa última semana foi pesada…

Ouça aqui.  

“Eu quero ver quando Jorge chegar!!”

“Acho que África Brasil dialoga com o Brasil de 2020 em vários momentos: primeiro com as músicas que falam de personagens negros ou de orgulho negro, como ‘Ponta de Lança Africano’, ‘Xica da Silva’ e ‘África Brasil (Zumbi)’, que têm tudo a ver com as questões raciais que a gente tá vendo hoje, com a questão de dar visibilidade pra personagens negros, a gente sabe que as figuras negras sofreram um apagamento na história do Brasil e que a gente tem um afastamento da África”, enumera Kamille Viola, que acaba de lançar o livro África Brasil – Um Dia Jorge Ben voou para toda a gente ver, dentro da coleção Discos da Música Brasileira (Edições Sesc SP). “Eu brinco que no dia que tiver o ‘fogo nos racistas’ que o Djonga canta, a trilha vai ser a versão de ‘Zumbi’ do África Brasil, que é uma versão com uma guitarrona bem marcante, o Jorge berrando, conclamando os povos negros que foram trazidos escravizados para o Brasil para uma vingança.” Ela antecipa em primeira mão para o Trabalho Sujo o primeiro capítulo do livro, O Bob Marley brasileiro, que conta sobre o interesse que o descobridor do rei do reggae, o dono da gravadora Island, Chris Blackwell, teve no monstro sagrado brasileiro.

“Quis começar por essa história, que muita gente não conhece e não é inédita, mas que não é muito falada e dá a importância do Jorge Ben e como ele é visto no mundo, como sua música chega longe. Ela mostra muita coisa, como ele é admirado, como ele tem a personalidade forte e quer ter o controle pelo trabalho dele, como ele era recebido – era e é – com pompa nas viagens internacionais”, resume Kamille, que só conseguiu entrevistar Jorge Ben durante a quarentena, quando o livro, que começou a ser feito no ano passado, estava sendo finalizado. Mas não foi a primeira vez que ela falou com ele, longe disso.

“Eu o conheci em 2008, quando fui cobrir um desfile em que a Gisele Bundchen estaria e ele sentou do meu lado. Aí eu puxei papo com ele e depois disso esbarrei com ele algumas vezes, em festas de premiações, backstage de show e no Corujão da Poesia, um sarau que acontece de madrugada aqui no Rio”, lembra. Ela chegou inclusive a cogitar uma biografia do ídolo, ao lado da amiga Karla Prado, mas deixou para lá depois que a família de Jorge achou melhor não contar essa história.” Não bastasse isso, ela, que entrevistou Jorge Ben no Copacabana Palace em 2011, ainda teve de perceber que Jorge Ben não lembrava mais dela, diferente de dez anos atrás, quando a chamava pelo nome.

Mas isso nem de longe ofusca a admiração que Kamille tem pelo artista. “Ele criou um som único, mesmo tendo mudado a sua sonoridade ao longo do tempo, o tipo de mistura que ele fez ninguém conseguiu fazer. Fora a famosa capacidade dele de musicar qualquer texto, que ele traduziu com um estilo próprio, como o blues e os spirituals fizeram”, conta a jornalista. “Além de que o Jorge impactou demais alguns movimentos. Os tropicalistas consideram que seu disco Bidu é um disco tropicalista antes do tropicalismo existir. Gilberto Gil quando ouviu Samba Esquema Novo disse que ia parar de compor e ficar tocando só a obra do Jorge Ben, porque ele fez tudo que já podia ser feito. O Mano Brown fala que ele influenciou o rap na temática, porque ele tem uma importância gigantesca sobre a questão racial e da negritude.”

Ela reforça a importância de Jorge para a cultura brasileira neste sentido. “Ele exalta personagens negros, a cultura negra e fala desse embate entre negros e brancos, lembra da escravidão, exalta a mulher negra… A gente sabe que a cultura negra – a capoeira, o jongo – já falava sobre isso, só que o Jorge fez isso sendo um artista mainstream, que tocava no rádio, na TV, vendia milhares de cópias. Sem contar em termos estéticos: ele é um dos precursores do canto falado no Brasil, já tinha o spoken word nos Estados Unidos, nos anos 60 e 70, mas no Brasil o Jorge foi um dos primeiros, que vai impactar no rap, no axé… Ele foi precursor de muita coisa. Além de ser um artista muito prestigiado internacionalmente, regravado, sampleado, é uma referência muito grande. Sempre que eu entrevistava artistas gringos moderninhos que tavam vindo pra cá, como o Beck ou o Vampire Weekend, e eu perguntava sobre música brasileira, sempre respondiam Jorge Ben.”

Kamille, que agora está escrevendo uma biografia sobre Martinho da Vila, não consegue cravar que África, lançado em 1976, é o primeiro disco em que Jorge toca guitarra, referindo-se ao disco O Bidú, cuja ficha técnica deixa tudo meio nebuloso – ela prefere acreditar que é um violão Ovation em vez de uma guitarra, mas confirma que é a partir do disco que pesquisou que Jorge começa a usar a guitarra com distorção e peso, assumindo essa linguagem para seu som – e nunca mais volta ao violão. Mas não consegue cravar que África é seu disco favorito de Jorge. “Eu não consigo escolher um só, durante um tempo eu dizia que meu preferido era o Força Bruta, mas eu amo o África, o Tábua, Ben, Samba Esquema Novo…”

O Bob Marley Brasileiro *

Por Kamille Viola

O estúdio, grande, próprio para a gravação de orquestras, iria receber uma festa. Músicos das bandas Traffic e Bad Company estavam entre os convidados. Chris Blackwell, fundador da Island Records, cuidava pessoalmente dos detalhes. Ele, que dois anos antes tinha revelado Bob Marley ao mundo com o disco Catch a Fire, agora estava gravando em seus estúdios um disco de Jorge Ben. No espaço, um palco montado.

A ideia era apresentar Jorge ao público inglês. Os integrantes da banda do artista, Admiral Jorge V, estavam maravilhados com tudo aquilo – principalmente Dadi Carvalho e Gustavo Schroeter, fãs das bandas de rock britânico. Não bastasse a qualidade técnica do estúdio onde vinham trabalhando, muito superior aos do Brasil, agora estavam frente a frente com alguns de seus maiores ídolos. O único que não parecia estar nada animado com a ideia era o próprio Ben.

A chegada tinha sido com pompa: quando aterrissaram em Londres, os músicos de Jorge Ben foram recebidos por dois carros de luxo, um Bentley e uma Mercedes 600, estilo limusine, para levá-los ao hotel. O artista, sua esposa, Domingas, e o produtor Armando Pittigliani, que estava viajando como road manager, tinham ficado em Paris: quando a banda embarcou para a capital inglesa, o casal ainda não tinha entrado no avião. Pittigliani foi atrás dos dois e acabou sendo deixado de fora do voo também.

Naquela noite, os músicos jantaram com Robin Geoffrey Cable, que havia trabalhado em discos de nomes como Carly Simon e Queen, sua esposa, a portuguesa Tina – que seria a intérprete e tradutora das gravações – e Blackwell com sua primeira mulher, Ada Blackwell. O dono da Island Records comentou com Dadi sobre sua expectativa para as gravações e contou de seus planos de fazer um show de Jorge para apresentá-lo a músicos ingleses e grandes nomes do show business local.

Ben chegou cansado para o jantar e disse, em tom de brincadeira, que tinha achado seu quarto pequeno. Pudera: nas turnês internacionais, ele sempre ficava hospedado em hotéis de luxo, tendo chegado a passar uma longa temporada no suntuoso George V, em Paris. Na noite seguinte, todos se reuniram no estúdio – o mesmo onde tinham sido mixados os discos mais recentes de Bob Marley e onde ele viria a gravar os clássicos álbuns Exodus (1977) e Kaya (1978) – para discutir detalhes das gravações. Blackwell ofereceu um cigarro de haxixe para os músicos e todos os brasileiros recusaram. Depois, Dadi explicou à intérprete que eles não fumavam na frente de Jorge, que era abstêmio.

A gravação correu bem, com o registro feito como se fosse ao vivo, no estúdio de 24 canais. A fita rolava e eles iam tocando repetidamente cada faixa até que Cable considerasse que tinha a melhor versão. Assim, tudo soaria mais natural.

Até o dia da festa, que contaria com um pocket show, Jorge não tinha sido avisado de que iria se apresentar. Depois de emendar a maratona de shows em Paris com as gravações, ele sentia que sua voz estava rouca. Além de tudo, não gostou de ser surpreendido. Então disse que não tinha ido ali para fazer show, e sim para gravar. “Pensa num troço enorme. […] E ele botou um palco lá dentro, para homenagear o Jorge. Aí convidou a elite brasileira lá, turma da embaixada, uns duzentos caras, fez uma puta festa, comilança e o caralho. E o Jorge ficou puto! O Jorge falou: ‘Eu não vim aqui para isso, para ficar tocando, vim aqui para gravar um disco!’”, conta Gustavo, o baterista.

“Ele estava cansado, meio de mau humor – porque o Jorge tem isso, quando ele está de mau humor, não tem saco para nada. Aí é difícil, sabe? Lá em Londres, ele estava um pouco assim. O Chris Blackwell falou para mim: ‘Adoro todo mundo do Brasil, adoro o Gil, adoro o Caetano, mas quem tem condição de fazer sucesso no mundo inteiro é o Jorge Ben’”, lembra Dadi. “O que ele tinha já estava bom pra ele, sabe? Ele ia lá, fazia uns shows, voltava, não queria mais que isso, não, eu acho. Ele curte na hora em que está ali, gravando. Até o momento que teve essa festa: aí ele ficou de mau humor, ficou sem saco. Tanto é que tocou duas músicas, jogou a guitarra e foi embora”, recorda.

Empolgados por estar lado a lado com artistas que admiravam, os roqueiros Dadi e Gustavo seguiram numa jam session com Steve Winwood no piano Rhodes, o baterista Jim Capaldi (que Dadi já conhecia do Brasil, pois ele era casado com a brasileira Ana Campos), ambos ex-Traffic, e músicos do Bad Company. A festa foi até cinco da manhã.

Quando voltaram ao hotel, encontraram Jorge, Armando, João e Joãozinho no restaurante, com uma garrafa de champanhe vazia. O pai de Dadi, com saudade, ligou para o hotel em busca dele. “Ele quis falar com todo mundo, e ficamos no telefone quase uma hora, rindo muito. Fomos dormir lá pelas oito da manhã”, conta9.

Blackwell tinha conhecido Jorge Ben em sua vinda ao Brasil em novembro de 1974, acompanhado por Capaldi (que no ano seguinte se casaria com Ana) e Chris Wood, do então recém-extinto Traffic. Segundo a imprensa brasileira da época, Blackwell teria vindo ao Rio de Janeiro atrás de Cat Stevens, que já estava na cidade havia dois meses. Depois de um jantar na casa de André Midani, que presidia a gravadora Philips – onde conheceu Ben, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Gal Costa e Rita Lee –, o fundador da Island Records convidou Jorge para fazer um disco na Inglaterra.

Os músicos passaram vinte dias gravando no estúdio, com produção e mixagem de Robin Geoffrey Cable. Jorge foi acompanhado pela banda que havia acabado de formar, Admiral Jorge V, com Dadi (baixo), João Roberto Vandaluz (teclado), João Baptista Pereira, o Joãozinho da Percussão (percussão) e Gustavo (bateria). Três cantoras de estúdio locais (as britânicas Barry St. John e Liza Strike, e a neozelandesa Joy Yates) fizeram os vocais de apoio, e o trabalho ainda contou com sax e sintetizador de cordas, tocados por artistas locais (Chris Mercer e Ann Odell, respectivamente).

O baterista lembra que eles ficaram encantados com a estrutura do lugar: “Eram 24 canais, em 1975. Aqui não tinha oito (risos)! Já tinha aquele estúdio maneiro, grande, aquele mesão. […] Só eu tinha oito canais de bateria. Eu! Tinha oito canais para mim, aaaah! Bumbo, caixa, cada tom-tom absurdo, pratos, contratempo. […] Eu nunca vi isso na minha vida. Eu falei: ‘Eu estou aqui no paraíso! Aqui é o paraíso’! (risos)”.

No disco, tudo ganhou uma sonoridade mais pop. Foram gravadas “Taj Mahal” (em versão roqueira e com sopros bem influenciados pelo reggae), “Os alquimistas estão chegando s alquimistas”, “Chove chuva”, “O namorado da viúva”, “Mas que nada” e “País tropical”. Completavam o repertório as inéditas “Jesus de Praga” e “Georgia” (sendo o nome da musa falado em inglês), além de uma faixa em inglês, “My Lady”, cantada com a pronúncia deliciosamente macarrônica de Ben, que havia saído na trilha da novela As divinas… e maravilhosas, da TV Tupi, em 1973.

Em novembro do mesmo ano, os músicos ainda voltaram a Londres para fazer os overdubs do álbum. Dessa vez, ficaram em um hotel cinco estrelas, o Skyline Park. Mas, aparentemente, a “lua de mel” do produtor inglês com Jorge Ben tinha acabado no episódio da festa. Tropical sairia no ano seguinte na Inglaterra (e em 1977 no Brasil), sem grande alarde. Não se tem notícia de que Blackwell tenha voltado a falar em Jorge Ben.

A situação evidenciava algo que se repetiria ao longo da carreira de Jorge: para o bem ou para o mal, ele faria apenas aquilo que quisesse. Dono de uma personalidade forte, quando ele cisma com algo, dizem, não há quem o convença do contrário.

Ele tinha passado um período fora do Brasil pela primeira vez dez anos antes, quando se apresentou em clubes e universidades norte-americanos. A temporada, no entanto, acabou sendo menor do que o previsto, como o próprio artista contaria anos depois, em 1978:

“A minha primeira experiência internacional foi em 1965, quando o Itamaraty enviou alguns músicos, entre eles o Sergio Mendes, em missão cultural aos Estados Unidos. Fui incluído e ganhei uma bolsa para estudar música. Não cheguei a fazer o curso, pois não falava inglês. Não fiz muita coisa por lá, pois fiquei pouco tempo. É que para trabalhar por lá era necessário adquirir o Green Card, e acabei tendo que me alistar no Exército Americano. Fiz isso por pura formalidade, para conseguir trabalho. Só que acabei convocado para ir ao Vietnã e tive que voltar às pressas.”

Em entrevista ao Pasquim, em 1969, ele afirmara, já demonstrando consciência racial: “Negro e estrangeiro, lá nos Estados Unidos, são os primeiros a ir pro Vietnã”.

Em 1966, Mendes lançou uma versão de “Mas que nada” no álbum Herb Alpert Presents Sergio Mendes & Brasil ’66. A música se tornou um grande sucesso, chegando ao quarto lugar da parada Adult Contemporary da Billboard. Ela ganharia versões feitas por nomes do quilate de Dizzy Gillespie (em 1967) e Ella Fitzgerald (1970), entre inúmeras outras. Em 1969, Jorge comentou que só nos Estados Unidos a canção tinha 47 regravações.

Ele teve mais três composições entre as mais vendidas e executadas naquele país: “Zazueira”, com Herb Alpert, “Nena Naná”, com José Feliciano, e “Chove chuva”, com Sergio Mendes. No Brasil, em 1969, Herb Alpert disse que o artista estava desperdiçando uma chance por não aproveitar a onda: “ele poderia ocupar hoje, tranquilamente, o lugar que José Feliciano tem no mercado latino dos Estados Unidos”.

Jorge conta que outra virada em sua carreira aconteceu quando se apresentou no Midem, na França, em 1970: “Quando subi ao palco e vi aquelas pessoas seriíssimas, engomadas, pensei: ‘o que é que eu faço agora?’. A minha sorte é que ‘Mas que nada’ era sucesso com o Sergio Mendes e todo mundo conhecia. Bastou eu começar a cantar pra sentir que todo mundo tava na minha. Fui bisado e a partir dali choveram propostas de trabalho”. O show ficou marcado por seu choro intenso enquanto apresentava “Domingas” (do álbum Jorge Ben, de 1969).

Jornal do Brasil noticiou na época: “Com relação à apresentação de Jorge Ben, o empresário norte-americano George Grief, responsável comercial por José Feliciano e outros cantores famosos, disse que foi a coisa mais importante que vira no festival, sugerindo ao mesmo tempo que Jorge Ben fizesse uma excursão pelos Estados Unidos e Europa”. O próprio artista, de volta ao Brasil, confirmaria o convite.

Em um artigo no Pasquim naquele ano, Chico Buarque, exilado em Roma, contava o encontro que teve com Jorge e o Trio Mocotó na capital italiana logo após o Midem.

“Mas Jorge e seus Mocotós partiram depressa sem explicar direito como foi o negócio lá em Cannes, no festival do “Midem”. Agora cá está o jornal italiano que não me deixa nem exagerar. “O pranto de Jorge Ben” é a manchete. “Não é sempre que a gente vê – diz o jornal – um grande negro de calças escarlates chorar tão desconsoladamente como chorava esta noite o cantor brasileiro. Seus próprios acompanhantes pareciam preocupados, embora continuassem sorrindo ao público para tranquilizá-lo. Jorge Ben chorava sobretudo com o nariz que se lhe dilatou e inchou…” e vai por aí afora. O enorme sucesso de sua música, para o jornalista europeu, é de menos, estava previsto. Inédita é a sinceridade, a ingenuidade de Jorge chorando, enquanto sua cotação subia tantos pontos e seu nome era cogitado, cochichado, pechinchado, revendido e valorizado no mercado internacional do disco. O que parece melancólico, mas é ótimo, é de morrer de rir. É de mandá o piá pegá o tutu, comprá outro fu, machucá as escô e beliscá o mocotó das criô do pa tropi.”

Simonal e Astrud Gilberto também se apresentaram na mesma edição do Midem, e Eliana Pittman foi uma das apresentadoras. Mas Ben foi quem deu o que falar.

Apesar do projeto frustrado de Blackwell de tornar Jorge “o novo Bob Marley”, o artista nunca deixou de se apresentar fora do Brasil. Até hoje, viaja frequentemente à Europa. Em novembro daquele mesmo ano, ele e a Admiral estavam de volta à França para uma nova temporada em Paris. Também foram ao programa Micky Metamorfosis, da TVE, a TV pública espanhola, onde o apresentador Micky diz ao cantor, que vestia uma camisa do Flamengo e já usava os inseparáveis óculos escuros: “Eu, cada vez que te escuto tocar, cantar e improvisar, é como se fosse o Pelé da música. Então bem-vindo ao meu programa e oxalá ganhes esse primeiro encontro com o público espanhol por uma grande, grande goleada”.

Jorge e seus músicos apresentam um medley (ele já usava esse formato pelo menos desde 1973, quando o registrou em disco) com “Por causa de você, menina”, “Chove chuva” e “Mas que nada”, com direito a solos de cada um dos instrumentistas. O artista já aparece tocando um violão Ovation, plugado.

Gustavo Schroeter recorda um episódio em Hamburgo, na Alemanha. Acostumado a reações efusivas da plateia em seus shows, o cantor ficou preocupado, pois o público só aplaudia, educadamente, ao fim de cada música. “O que está acontecendo?”, ele perguntava à banda. Resolveu dar uma pausa. “O Jorge nunca deu intervalo. Era pau dentro, pá, direto, show inteiro, pum (risos)”, diz. No camarim, se mostrou preocupado. Armando Pittigliani, produtor dos três primeiros discos do artista e então diretor de marketing da Philips, contemporizou, dizendo que alemães tinham mesmo reações diferentes.

O segundo set teve um pouco mais de efusividade, mas nada comparado à resposta das plateias com que estavam acostumados. Dali, foram a um restaurante badalado, próximo do local da apresentação. Quando Jorge e banda entraram, todos se levantaram e começaram a aplaudi-los. “Fico arrepiado (de lembrar). Nunca vi isso na minha vida. Nunca vou esquecer”, jura o baterista.

Em uma turnê no México – uma temporada em um hotel –, o percussionista Laudir de Oliveira (morto em 2017) foi assistir a uma apresentação. O músico tinha integrado a banda Brasil ’77 de Sergio Mendes e então estava com o grupo norte-americano Chicago, no qual ficaria por oito anos. Convidou todos para assistir a um show da banda. Gustavo e Joãozinho foram. Na sequência, foram para uma festinha com a banda. “Eu e o Joãozinho saímos numa limusine do Laudir. Cada limusine com um integrante! E fomos para um hotel lá, acho que Sol de América, Sol de… alguma coisa. […] Duplex, tudo enorme, os quartos. Altas farras fizemos lá depois”, lembra Schroeter. Já Joãozinho conta que foi chamado para acompanhar o Chicago em suas turnês, mas seguiu com Jorge Ben.”

Primeiro capítulo do livro África Brasil – Um Dia Jorge Ben voou para toda a gente ver.

Vida Fodona #693: Festa-Solo (27.11.2020)

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Sexta-feira é dia de Festa-Solo, a versão ao vivo do Vida Fodona lá no twitch.tv/trabalhosujo – a partir das 23h45 – e segue a discotecagem dessa sexta…

Billie Eilish – “Therefore I Am”
Angel Olsen – “New Love Cassette (Mark Ronson Remix)”
Chromeo – “6 Feet Away”
Doja Cat – “Say So”
Solange – “Losing You”
Prince – “1999”
Neneh Cherry – “Buffalo Stance”
Chemical Brothers – “Galvanize”
Radiohead – “Reckoner (James Holden Remix)”
Dua Lipa – “Future Nostalgia”
Jessie Ware – “Ooh La La”
Kyle Minogue – “Magic”
Miley Cyrus + Joan Jett – “Bad Karma”
Black Kids – “I’m Not Gonna Teach Your Boyfriend How to Dance with You (The Twelves Remix)”
Midnight Juggernauts – “Into the Galaxy”
Digitalism – “Digitalism In Cairo”
Rapture – “How Deep Is Your Love?”
Cut Copy – “Lights & Music”
Whitest Boy Alive – “Timebomb”
Rihanna – “Same Ol Mistakes”
Jennifer Lopez – “If You Had My Love”
Lisa Stansfield – “All Around the World”
Daft Punk – “Around the World”
LCD Soundsystem – “Yeah”
Hot Chip – “Over And Over”
Beastie Boys – “Triple Trouble”
Isley Brothers – “That Lady (Parts 1 And 2)”
Funkadelic – “One Nation Under A Groove”
Tim Maia – “A Fim de Voltar”
Lincoln Olivetti – “Baila Comigo”
Di Melo – “Kilariô”
Jorge Ben – “Menina Mulher da Pele Preta”
Paulinho da Viola – “Quatorze Anos”
Instituto + Sabotage – “Cabeça de Nêgo”
Racionais MCs – “Fim de Semana no Parque”
A Tribe Called Quest – “Bonita Applebum”
Daryl Hall & John Oates – “I Can’t Go For That (No Can Do)”
Erasmo Carlos – “Mané Joao”
Escort – “If You Say So”
Run-DMC – “It’s Tricky”
Shaggy – “It Wasn’t Me”
Dumbo Gets Mad – “Future Sun”
Domenico Modugno – “Volare”
Gipsy Kings – “Hotel California”
Tom Zé – “Mã”
Talking Heads – “Air”
Moby – “Natural Blues”
Massive Attack – “Unfinished Sympathy”
David Bowie – “Fashion”
Def – “Alarmes de Incêndio”
Napalm Death – “White Kross”
Knife – “We Share Our Mothers Health”
Nicolas Jaar – “Keep Me There”
Björk – “Hunter”
Luiza Lian – “Sou Yabá”
Metá Metá – “Três Amigos”
Michael Kiwanuka – “You Ain’t The Problem”
Lorde – “Team”
Alanis Morissette – “Hand In My Pocket”
Anelis Assumpção – “Receita Rápida”
Douglas Germano – “Valhacouto”
Gui Amabis – “Miopía”
Kali Uchis – “Ángel Sin Cielo”
Negro Leo – “O Pato Vai ao Brics”
Beat Happening – “Indian Summer”
Ariana Grande – “Thank U, Next”
Weyes Blood – “Wild Time”
George Harrison – “All Things Must Pass (Demo)”

Vida Fodona #690: Festa-Solo (13.11.2020)

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Sexta-feira 13 é um ótimo dia pra se acabar numa festa online, dizaê… Cola lá às 23h45 no twitch.tv/trabalhosujo – e assim foi a edição da sexta passada.

Big Star – “Thirteen”
Billie Eilish – “Therefore I Am”
Céu – “Rotação”
New Order – “Age of Consent”
Pixies – “Winterlong”
Otto – “Soprei”
Mutantes – “Jogo de Calçada”
Lô Borges – “Faça Seu Jogo”
Queen – “Play the Game”
Goblin – “Witch”
PJ Harvey – “The Last Living Rose”
Patti Smith – “Land”
Of Montreal – “The Past Is A Grotesque Animal”
Daft Punk + Giorgio Moroder – “Giorgio by Moroder”
Digitaldubs- “Fleetwood Dub”
Avalanches + Leon Bridges – “Interstellar Love”
Zé Manoel – “Adupé Obaluaê”
Luedji Luna – “Bom Mesmo É Estar Debaixo D’Água”
Neville Brothers – “In The Still Of The Night”
Yma – “No Aquário”
Dharma Lovers – “Peixes”
Jupiter Apple – “Over the Universe”
Jorge Ben – “Cinco Minutos”
Djavan – “Samurai”
Jards Macalé – “Let’s Play That”
Vovô Bebê – “Êxodo”
Luisa e os Alquimistas + Jéssica Caitano – “Descoladinha”
Katy Perry + Juicy J – “Dark Horse”
Internet – “Dontcha”
Lauryn Hill – “Doo Wop (That Thing)”
Racionais MCs – “Você Me Deve”
Taylor Swift – “Blank Space”
My Chemical Romance – “Teenagers”
David Bowie – “Moonage Daydream”
T-Rex – “Telegram Sam”
Blue Oyster Cult – “(Dont Fear) The Reaper”
Stealers Wheel – “Stuck in The Middle With You”
Steve Miller Band – “Abracadabra”
Kinks – “David Watts”
Doors – “You’re Lost Little Girl”
Velvet Underground – “Candy Says”
Nick Drake – “Poor Boy”
Dionne Warwick – “Walk On By”
Caetano Veloso – “Nine Out of Ten”
Can – “She Brings The Rain”
Carole King – “Beautiful”
Paul McCartney – “Check My Machine”
Bárbara Eugenia + Pélico- “Roupa Suja”
Letrux – “Ninguém Perguntou Por Você”
Eddie – “Sentado Na Beira Do Rio”
Boogarins – “As Chances”
Beatles – “Not Guilty”

Vida Fodona #684: Festa-Solo (12.10.2020)

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Será que hoje é o último Festa-Solo às segundas-feiras? Confere no twitch.tv/trabalhosujo a partir das 21h… O da semana passada foi assim:

Stevie Wonder – “Ordinary Pain”
Kool & The Gang – “Jungle Boogie”
Curtis Mayfield – “Move on Up”
Ike & Tina Turner – “Livin’ for the City”
Gil-Scott Heron + Brian Jackson – “The Bottle”
Tim Maia – “Guiné Bissau, Moçambique e Angola”
Jorge Ben – “Eu Vou Torcer”
Neville Brothers – “In the Still of the Night”
Caetano Veloso + Banda Black Rio – “Odara”
Funkadelic – “One Nation Under a Groove”
Chromeo – “Clorox Wipe”
Jessie Ware – “Ooh La La”
Dua Lipa – “Hallucinate”
New Order – “Blue Monday”
Pet Shop Boys – “Left to My Own Devices”
Madonna – “Beautiful Stranger”
Lulu – “The Man Who Sold The World”
Chromatics – “The Page”
Kanye West + Pusha T – “Runaway”
Juliana R. – “Dry These Tears”
David Bowie – “Across the Universe”
Caetano Veloso – “For No One”
Siouxsie and the Banshees – “Dear Prudence”
Booker T & The MG’s – “Golden Slumbers”/”Carry That Weight”/”The End”
Booker T & The MG’s – “Here Comes the Sun”
Booker T & The MG’s – “Come Together”
Beatles – “Something (Instrumental)”
Beatles – “Oh! Darling (Instrumental)”