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Todo o show: Jards Macalé ao vivo na Europa em março de 2024

A saudade do Jards não vai passar… E assim Thomas Harres, gênio baterista que tocava com o mestre há mais de uma década, resolveu dar uma geral em suas gravações e subiu cinco shows que vez com Macau quando ele passeou pela Europa em março do ano passado. Além de Thomas, Jards estava muitíssimo bem acompanhado pela guitarra de Guilherme Held e o baixo de Paulo Emmery, e o baterista publicou em seu canal no YouTube a íntegra dos shows que o quarteto fez em Frankfurt (dia 4 de março), Mälmo (dia 6), Copenhagen (dia 7), Bremen (dia 9) e Varsóvia (dia 11), todos com mais de uma hora de som, que vocês podem curtir abaixo:  

Jards Macalé: “Vale a pena ser poeta?’

Jards conseguiu ultrapassar o moderno e ser eterno como queria. Escanteado do panteão da MPB para se unir ao bloco dos malditos, passou por apertos e maus bocados para seguir vivendo fazendo música. Mas felizmente a nova geração o descobriu na década passada e eles aos poucos foi recuperando a estatura que sempre teve e morre depois de ter sido muito festejado em vida, como vários de seus contemporâneos não foram. Escrevi sobre sua importância e sua renascença pro Toca UOL.  

Duas vezes histórico

Tive que ir de novo no formidável encontro dos violões de Kiko Dinucci e Jards Macalé, que, nessa sexta-feira, fizeram um show quase idêntico ao que fizeram no dia anterior, numa apresentação menos informal – embora tenha rendido boas prosas entre as músicas, como na quinta – e um pouco menor que a anterior, talvez porque Jards tenha trocado “Mal Secreto” – que é mais extensa devido a uma citação do clássico da bossa nova “Corcovado” – por uma versão acachapante – e solitária – para “Movimento dos Barcos”, esta posta no repertório a pedido de Kiko. Escrevi sobre o show, que deverá repetir-se em algum momento em breve, em mais uma colaboração que faço para o Toca do UOL.  

Violões univitelinos

“E aí, doutor Kiko?”, perguntou Jards Macalé a Kiko Dinucci, que respondeu com outra pergunta (“E agora?”) prontamente respondida por Macau: “Agora foda-se”. Sabíamos que seria memorável, mas acho que nem Kiko nem Jards tinham ideia da química que baixou sobre os dois na primeira das duas apresentações que marcaram para esta semana no Sesc Pompeia. Mesmo com diferenças de geração, personalidade, origem e criação, os dois são gêmeos univitelinos no violão e dividem o mesmo humor – autodepreciativo e de um pugilismo quase fraterno – e apreço pelo baixo calão da vida, o que tornou a apresentação um acontecimento histórico. Passeando por diferentes fases do repertório de Jards, clássicos do samba e algumas canções de Kiko, os dois mostraram a força e a delicadeza de seus violões. Jards é da geração impactada diretamente por João Gilberto e seu instrumento fica entre o ritmo sincopado do mestre baiano e o suingue carioca de seu contemporâneo Jorge Ben, enquanto Kiko, guitarrista de nascença, convertido ao outro instrumento pelo samba, é diretamente influenciado pelo violão de Jards, além de trazer suas influências elétricas – do punk ao noise – para seu pinho. Mas o ponto em comum dos dois é a história do samba, visitada através de clássicos (como “Se Você Jurar” de Ismael Silva embutida em “Let’s Play That”, “Luz Negra” de Nelson Cavaquinho, “Ronda” de Paulo Vanzolini e “Favela”), e a devoção de Kiko por Jards, mencionada pelo próprio, que o perseguia por shows vazios em São Paulo quando ainda era adolescente (dele e de Itamar Assumpção, que não conheceu, como frisou). Isso deixou-o à vontade para passear com Jards em seus sambas imortais como “Pano pra Manga”, “Farinha do Desprezo”, “Boneca Semiótica”, “Depressão Periférica” e “Soluços” (esta no bis), além de duas que Jards tocou maravilhosamente sozinho: “Anjo Exterminado” e “Mal Secreto”. Kiko por sua vez fez duas de seu Rastilho sem Jards (“Febre do Rato” e “Gaba”) e lembrou que há cinco anos ele lançava seu clássico disco naquele mesmo teatro do Pompeia. Os dois ainda tocaram músicas que compuseram juntos, como “Vampiro de Copacabana” e “Coração Bifurcado”, mas tiveram um de seus melhores momentos quando emendaram “Antonico” – eternizada por Gal em seu disco ao vivo Fatal, que Jards visitou diversas vezes em diferentes momentos de sua carreira (tanto só quanto com o próprio Ismael, com Marçal e com Dalva Torres) e que Kiko vem tocando no momento acústico do show mais recente de Juçara Marçal – com uma que Jards nunca havia tocado ao vivo, “No Meio do Mato”, de seu disco Contrastes, de 1977. Um show que parece, ao mesmo tempo, um reencontro de velhos irmãos e o início de uma longa amizade musical. Sorte a nossa.

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Os 50 discos brasileiros mais importantes de 2024 segundo júri da Associação Paulista dos Críticos de Arte

Nesta segunda-feira, a Associação Paulista de Críticos de Arte reúne-se mais uma vez para escolher os grandes nomes do ano que passou e esta relação abaixo lista os 50 discos mais importantes de 2024 de acordo com o júri de música popular da Associação, da qual faço parte ao lado de Adriana de Barros (Mistura Cultural), Bruno Capelas (Programa de Indie), Camilo Rocha (Bate Estaca), Cleber Facchi (Música Instantânea), Felipe Machado (Times Brasil), Guilherme Werneck (Canal Meio), José Norberto Flesch (Canal do Flesch), Marcelo Costa (Scream & Yell), Pedro Antunes (Tem um Gato na Minha Vitrola) e Pérola Mathias (Poro Aberto).

Adorável Clichê – Sonhos Que Nunca Morrem
Alaíde Costa – E o Tempo Agora Quer Voar
Amaro Freitas – Y’Y
Bebé – Salve-se!
Black Pantera – Perpétuo
Bonifrate – Dragão Volante
Boogarins – Bacuri
Cátia de França – No Rastro de Catarina
Caxtrinho – Queda Livre
Céu – Novela
Chico Bernardes – Outros Fios
Chico César e Zeca Baleiro – Ao Arrepio da Lei
Crizin da Z.O. – Acelero
Curumin – Pedra de Selva
Duda Beat – Tara e Tal
Exclusive Os Cabides – Coisas Estranhas
Febem – Abaixo do Radar
Fresno – Eu Nunca Fui Embora
Giovani Cidreira – Carnaval Eu Chego Lá
Gueersh – Interferências na Fazendinha
Hermeto Pascoal – Pra você, Ilza
Ilessi – Atlântico Negro
Josyara – Mandinga Multiplicação – Josyara Canta Timbalada
Junio Barreto – O Sol e o Sal do Suor
Kamau – Documentário
Lauiz – Perigo Imediato
Luiza Brina – Prece
Maria Beraldo – Colinho
Milton Nascimento & Esperanza Spalding – Milton + Esperanza
Ná Ozzetti e Luiz Tatit – De Lua
Nando Reis – Uma Estrela Misteriosa
Negro Leo – RELA
Nina Maia – Inteira
Nomade Orquestra – Terceiro Mundo
Oruã – Passe
Papangu – Lampião Rei
Paula Cavalciuk – Pangeia
Pluma – Não Leve a Mal
Pullovers – Vida Vale a Pena?
Samuel Rosa – Rosa
Selton – Gringo Vol. 1
Sergio Krakowski Trio e Jards Macalé – Mascarada: Zé Kéti
Silvia Machete – Invisible Woman
Sofia Freire – Ponta da Língua
Tássia Reis – Topo da Minha Cabeça
Taxidermia – Vera Cruz Island
Teto Preto – Fala
Thalin, Cravinhos, Pirlo, iloveyoulangelo & VCR Slim – Maria Esmeralda
Thiago França – Canhoto de Pé
Zé Manoel – Coral

Mais uma vez, Jards Macalé

Infelizmente não tivemos Desaniversário neste sábado por motivos alheios à vontade de fazer festa, mas o consolo do cancelamento abrupto foi poder assistir à mais uma apresentação do mestre Jards Macalé, desta vez no Sesc Pinheiros, novamente defendendo seu disco mais recente, Coração Bifurcado, à frente de uma banda composta apenas por mulheres, com Ifatóki Maíra Freitas (nos teclados), Navalha Carrera (na guitarra), Cris Daniel (no baixo), Aline Gonçalves (nos sopros), Victoria dos Santos (na percussão) e Flavia Belchior (na bateria). E além do repertório de seu disco do ano passado, ele inevitavelmente passeou por diferentes clássicos, seja sozinho ao violão (quando, mais uma vez, contou a história do telefone secreto de João Gilberto, antes de tocar a linda “Um Abraço do João”), seja acompanhado da banda, quando visitou marcos pessoais como “Hotel das Estrelas” e “Soluços”, entre outras. E é tão bom ver o monstro sagrado do alto de seus 81 anos passear seu instrumento, parente tanto de João Gilberto quanto de Jorge Ben, colocando o violão como um instrumento jazzístico a favor das canções. Inspirador, como sempre.

Assista abaixo: