Monty Python para todos!

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Arnaldo Branco, Clarice Falcão, Fabiane Langona, Laerte e Gregorio Duvivier falam sobre a importância do grupo inglês Monty Python, que aos poucos começa a disponibilizar sua obra no Netflix, em matéria que escrevi pro site da Trip. Um trecho:

“Lembro quando soube da existência deles, lendo O diário de um cucaracha, do Henfil, uma coletânea das cartas que ele escreveu quando morava nos Estados Unidos nos anos setenta — o Henfil descrevia a ideia geral do programa, chocado que uma parada que pegava tão pesado com a ideia de Deus passava na TV americana”, lembra Arnaldo, sobre a demora do grupo em chegar ao Brasil.

“Acho que o Monty Python ensinou a desenvolver um olhar meio cômico sobre tudo de ridículo e inerente à sociedade. Aquele esquete da entrevista de emprego idiota é um exemplo. Textos imensos. Timing de piada”, continua a quadrinista Fabiane Langona, que ainda reforça a importância do integrante norte-americano do grupo, o animador Terry Gilliam. “A estética dessas animações parece sempre ter feito parte da minha memória por osmose, muito antes de eu ter qualquer ideia do que era Monty Python”, lembra.

Clarice reforça a seriedade do grupo também do ponto de vista musical. “A primeira sequência que vi deles foi o começo d’O sentido da vida, com a canção do esperma, que me marcou profundamente. Era um número musical levado muito a sério e hilário. Acho que pra uma música ficar engraçada ela tem que ser levada a sério. O Eric Idle especialmente fazia isso muito bem”, explica. “Conheci mais profundamente o Monty Python, também por conta da amizade do grupo com o George Harrison — que armou uma produtora e hipotecou a casa pra bancar A vida de Brian”, continua Fabiane. “Adoro essa amizade. E acho que humor X música tem tudo a ver, ainda mais se tratando desse pessoal.”

“Humor é sempre ligado à circunstância — é difícil rir do mesmo modo com que se ria ao ler Jonathan Swift, ou Voltaire”, continua Laerte. “Mas as chaves que o Monty Python nos deixou abrem ainda muitas e muitas portas, isso é verdade.” “Eles continuam muito atuais. Eles estão no nível dos grandes humoristas que são eternos, como Chaplin e Buster Keaton”, emenda Duvivier. “Eles riem do humano, não do que acabou de acontecer essa semana. Não é humor de revista, trocadilho com o nome do presidente ou piada com uma coisa que acabou de sair do jornal. O humor deles é muito ancorado na realidade, no humano. Por isso que eles são tão duradouros, porque eles riem da condição humana — e também daqueles que estão no poder.”

A íntegra pode ser lida aqui.

“Humoristas são como detetives da moral”

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O YouTuber norte-americano Evan Puschak, dono do canal NerdWriter, analisa, usando Louis C.K. como ponto de partida, a forma que comediantes agem na área cinzenta da moral justamente para testar seus limites – se arriscando em nome da sociedade.

Muito bom.

Allan Sieber sobre os limites do humor

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Peguei lá do site dele.

Stephen Fry e o direito a ridicularizar tudo, em português

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O Kenzo Miura (valeu!) também traduziu o trecho que separei do textoYou must mock“, em que o ator inglês Stephen Fry comentou sobre o ataque à redação do jornal Charlie Hebdo:

“Eu me lembro que quando o Fatwa foi declarado contra Salman Rushdie, muitos escritores e colunistas britânicos – que definitivamente deveriam saber disso – disseram que “Os Versos Satânicos” ‘realmente não era tão bom assim’, e a implicação disso era que, desta forma, seria então um grande esforço se posicionar contra a sentença de morte declarada contra o seu autor. Na verdade, (não que isso importe, claro) “Os Versos Satânicos” é um dos grandes romances cômicos do pós-guerra. Um horrível absurdo similar foi espirrado recentemente sobre o tema do filme “A Entrevista” da Sony: ‘Oh, ele é realmente bastante pobre.’

O escritor (agora em grande parte esquecido), radialista e apologista cristão Malcolm Muggeridge destruiu seu legado como um homem sério e interessante em quinze absurdos minutos na televisão, quando ele languidamente descreveu “A Vida de Brian” de Monty Python como ‘de décima categoria’ , como se isso fosse um motivo para parar de exibí-lo. Uma desonestidade absurda. Ele queria impedir sua exibição porque ele sentiu-se “ofendido” por sua “blasfêmia” e então ofereceu o mesmo não-argumento como aquele elaborado por sua companheira e fundadora do Festival da Luz Mary Whitehouse, de memória hilariante: “Oh, eu não estou chocada, oh não. Na verdade, eu achei um pouco chato”. É claro que você achou, querida, e portanto, temos certamente de censurar este filme de imediato. Bah! Hoje em dia “A Vida de Brian” é frequentemente situada no topo de das listas de melhores comédias de todos os tempos e Muggeridge só pode ser razoavelmente lembrado por ser o agente do MI5 que interrogou PG Wodehouse e sua esposa em Paris de forma amável após a sua libertação, em 1944.

Então, que ninguém pense que, para defendermos qualquer obra de arte (ou filme, ou novela, ou desenho animado) contra a censura de qualquer tipo, quanto mais os horrores absurdos de quarta-feira 7 de janeiro, ele precise ser ‘de primeira categoria” (seja lá o que isso signifique ).

Não estamos todos cansados de ver aqueles que afirmam saber a resposta para a vida, a morte e a criação serem tão fudidamente emotivos sobre o seu conhecimento? Se eu soubesse a resposta para tudo, se eu acreditasse ter compreendido as vontades do autor do universo e tivesse o privilégio de entender o que acontece conosco depois da morte, a última coisa que eu seria é uma pessoa facilmente ofendida e na defensiva. ‘Tirem sarro de mim o quanto quiserem’, eu berraria. “Vá em frente, riam até não poder mais, pode me pintar em borrões toscos, ou fazer filmes tirando sarro. ‘Eles passam por mim como o vento ocioso que eu não percebo’.”

4:20

CH-Feb2007

Arnaldo Branco sobre o ataque ao “Charlie Hebdo”: “Condenar um homem-bomba à pena de morte me parece o cúmulo da inutilidade”

arnaldobranco

Meu broder e sócio nOEsquema Arnaldo Branco deu uma entrevista ao site Livre Opinião em que ele deixa claro sua opinião em relação aos sentimentos gerados a partir do atentado à redação do jornal francês Charlie Hebdo:

““Os cartuns são racistas, retratam os islâmicos como terroristas”. Sim – os que são efetivamente terroristas.Trazendo para o nosso contexto: quando você faz um cartum com um traficante de AR-15 e chinelo, não está chamando todos os favelados de bandidos – você está retratando uma minoria (a Rocinha, por exemplo, tem 200 mil habitantes e é controlada por um bando de 100 caras armados) que efetivamente tem grande efeito na vida da comunidade. Todos conhecem as circunstâncias que levam um sujeito ao crime organizado, mas a prática não é menos odiosa – nenhuma miséria justifica a predisposição para o assassinato, senão muito mais gente estaria formando com os traficantes. Digo isso friamente, sem achar que a pena de morte ou redução da maioridade penal seja a solução pra nada – mas também não vou me compadecer da situação de alguém que acha matar um recurso válido. Quando um bandido morre em uma ação da polícia não sinto pena, mas também não me sinto vingado. Pelo mesmo motivo não senti nenhuma emoção quando a polícia francesa cercou os autores do atentado – nenhum desfecho iria trazer o Wolinski de volta, e quem quer que tome esse caminho de violência na vida entende o próprio assassinato como um revés possível do ofício. Condenar um homem-bomba à pena de morte me parece o cúmulo da inutilidade.

Outra coisa: esses caras do #jenesuispascharlie acham que só eles enxergam as implicações e desdobramentos do atentado, se acham o último farol da humanidade, ficam nas redes sociais exibindo sua pretensa sagacidade, dizendo coisas tipo”será que só eu percebo que o Sarkozy é um hipócrita quando fala em liberdade de expressão?” Não, fera, tem a maior galera que se liga nisso, mas nem todo mundo tem a manha de se aproveitar de uma tragédia pra se sentir especial. O que esses relativizadores estão fazendo é contestar luto em velório.

E pior é esse povo que fica repetindo “não teve toda essa comoção com o massacre tal”, como se fosse um campeonato de tragédia. Geralmente você vai na timeline desse pessoal e tem mais foto de almoço do que solidariedade com os oprimidos.”

Falou e disse. A foto saiu do Instagram dele.

Daniel Cohn-Bendit sobre o humor do Charlie Hebdo

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“Era a concepção deles, um jornal satírico onde o exagero era parte de sua ideia. Se você diz que eles exageram, diz que eles não têm razão de ser. Estavam convencidos de que a liberdade de expressão é atacar de Cristo a Maomé. Era a concepção de liberdade deles. Pode-se achar isso babaca ou bom. Mas é parte do jogo. Uma sociedade livre é justamente aquela que suporta o excesso.”

Daniel Cohn-Bendit, um dos grandes nomes do maio de 68 francês, comenta o tipo de humor anárquico defendido pelo jornal Charlie Hebdo, em entrevista ao Rodrigo Vizeu, na Folha. A foto que ilustra o post é do Facebook do Daniel e o retrata durante sua visita ao Brasil no ano passado.

Arte como ofício: Jerry Seinfeld e a anatomia de uma piada

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O New York Times publicou um perfil com Jerry Seinfeld no fim do ano passado em que ele explica como se vê profissionalmente, mais como um atleta do que como um artista:

Estamos acostumados ao clichê do comediante visto como um palhaço triste: uma alma torturada num palco mal iluminado, curando feridas psicológicas à espera de aprovação. Quando o público grita “eu te amo” para Seinfeld, ele gosta de responder: “Eu também te amo e esse é o meu tipo favorito de relação íntima”. Ele me disse: “Este é o barato deste tipo de humor. É o melhor jeito em que funciono”. Ele se parece mais com um atleta exigente que um artista torturado. Ele se compara a jogadores de beisebol – que colocam efeito na bola logo que ela sai de seus dedos, deixando sua média alta – e a surfistas: “Para que eles fazem aquilo? É apenas puro. Você está só. A onda é muito maior e mais forte que você. Você sempre está em desvantagem. Você sempre pode ser esmagado. E ainda assim você aceita isso e transforma isso em uma pequena forma de arte sem sentido.” E diz: “Eu não estou preenchendo um vazio emocional em mim. Estou jogando um jogo bem difícil e se você gosta de ver alguém bom num jogo difícil, é isso que eu faço”.

E, de quebra, pediu para ele explicar, em vídeo, a mecânica de uma piada, abaixo:

 

#Instagramporescrito: viral sem querer e o 360º da ironia

A redescoberta da ingenuidade

Começou ainda no Alberta. Tentei postar uma foto tirada da cabine da pista da Noite Trabalho Sujo (a foto da Bárbara tirando fotos da cabine acima), como faço toda madrugada de sexta pra sábado e o Instagram não respondia. Pensei que fosse o sinal de Wi-Fi da casa, mas saí pra pegar ar e sinal de telefone – e o 3G também não dava sinal de vida no aplicativo. Desisti, voltei pra festa e quando acordei horas depois, retomei o ritual depois de fotografar o céu (“#CliMatias”, diz o Bruno). E nada. Pensei que o problema fosse só comigo, mas bastou abrir qualquer rede social para perceber que um certo volume considerável de pessoas resmungando sobre o fato. O Twitter do Instagram avisava que uma “tempestade elétrica” tinha tirado os servidores do ar. A mesma tempestade atingiu Netflix e Pinterest, que voltaram a funcionar aos poucos. Mas nada do Instagram. Como tinha um programa pré-almoço na agenda saturnina e não queria perder meu registro diário. Fui para o Twitter e twittei um instagram por escrito:

Em questão de segundos, minha fiel colaboradora do Sujo Gi Ruaro, lá de Londres (que recém casou, podem dar os parabéns), pegou carona na minha idéia e a expandiu em uma hashtag:

Como o meu tweet anterior já havia sido replicado algumas vezes, resolvi aproveitar carona na hashtag da Gi e tuitei meu instagram por escrito de fato:

Quando cheguei no Parque do Ibirapuera, onde iria me encontrar com um casal de amigos em um piquenique, o instinto me levou a procurar algum sinal de vida na rede social do aplicativo de fotos com filtro, ainda sem sucesso. Mas bastou passar pelo Twitter para ver que…

A hashtag havia colado. Tanto de maneira sincera – gente tuitando o que deveria estar postando no Instagram – quanto, principalmente, irônica – gente ridicularizando fotos e atitudes na rede social:

Até O Globo

…e a Fernanda Paes Leme entraram na onda:

A avalanche de tweets colocou a hashtag no topo dos trending topics no Brasil (meta pra muito xoxomidia tupiniquim) e explicitou três aspectos que já venho percebendo há algum tempo – dois óbvios, um nem tanto. Os dois primeiros beiram o ridículo da evidência: o Instagram popularizou-se de vez no Brasil a ponto de sua linguagem ter sido completamente assimilada pelo menos por quem está online (o que não é pouca gente) e que os trending topics do Twitter já não são o que foram um dia; medem o pulso de uma rede social específica, não mais o de toda comunidade online.

A terceira constatação é bem interessante e diz respeito à utilização da ironia. Diferente de uma forma de humor (como pensa a maioria dos que se acham irônicos), ironia é uma figura de linguagem que quer dizer justamente o contrário do que está sendo exposto. A frase “só uma pessoa muito inteligente para perceber isso”, por exemplo, é irônica ao sutilmente xingar de burra a pessoa em questão.

O problema é que a ironia funciona melhor em doses homeopáticas. Muita ironia cria a síndrome do menino que gritava lobo – e não é mais possível perceber se o que está sendo escrito ou dito é de verdade ou é só uma sacada esperta. Muitos tweets com a hashtag Instagramporescrito caminhavam nesse fio da navalha. Eram tão irônicos que poderiam ser de verdade. Não dava pra saber se o autor estava brincando ou sendo brincado. E assim completavam o loop da ironia – se a ironia é uma volta de 180 graus, a ironia da ironia é a volta completa para continuar no mesmo lugar.

E isso não era exclusividade da hashtag do sábado passado. O humor na internet quase sempre esbarra nesse duplo sentido e o que parece idiota para alguns, para outros é brilhante (exemplos abundam: Cersibon, o humor involuntário do Yahoo Respostas, Homem Aranha Anos 60), pulverizando assim o tal “bom gosto” do fazer rir ao tornar ainda mais tênue a distinção entre a grosseria e o humor politicamente incorreto ao mesmo tempo em que transforma qualquer grosseiro em novo “gênio do humor”.

Essas fórmulas estão se desgastando e o humor como provocação vai perdendo espaço para outro tipo de reação – que não necessariamente parte do humorismo – que também é típica da internet: o nonsense total, o esvaziamento do excesso de referências do século 21. Talvez seja uma redescoberta da ingenuidade ou só uma forma de exorcizar esse loop de significado protagonizado pela ironia da ironia. Não deixa de ser uma boa notícia.

O antônimo de racismo

Senhoras e senhores, Wanda Sykes.