“Heroes”, 40 anos

heroes

Outro clássico de David Bowie lançado em 1977 faz aniversário hoje – escrevi sobre “Heroes” no meu blog no UOL.

A fase Berlim de David Bowie não foi apenas seu ápice criativo, foi também seu período de amadurecimento e de desintoxicação. Ao sair da Los Angeles em que era tratado como realeza e mudar-se para uma cidade que ninguém parecia dar muita bola para sua fama, o músico inglês tomou vários choques de realidade. Depois de conquistar seu país e os Estados Unidos, ele se reencontrava com o Velho Continente apenas para perceber que nunca o havia conhecido. A frieza de viver em uma cidade dividida ao meio após a Segunda Guerra Mundial no auge da Guerra Fria também lhe causava uma sensação de estranhamento desagradável e a ausência de cocaína na Alemanha daquele período o obrigou a repensar sua própria biografia de diversos pontos de vista.

O principal alicerce nessa fase foi sem dúvida o produtor inglês Brian Eno. Velho amigo de David Bowie, o ex-Roxy Music abandonara de vez os palcos após dois anos com a banda liderada por Bryan Ferry, para dedicar-se ao estúdio, que encarava como um instrumento musical. Diplomado em arte, Eno começava a aplicar a lição que os Beatles e o Pink Floyd exercitaram na virada dos anos 60 para os 70 para um novo patamar e abria mão das canções, de formatos pré-estabelecidos, de instrumentos identificáveis e do ritmo, embarcando em uma viagem quase visual da música, cultivando timbres e texturas sonoras mais do que letras ou melodias. A utilização de sintetizadores e outros instrumentos eletrônicos o tornaram o pai da ambient music, que tinha como uma de suas inspirações as vertentes mais zen do rock psicodélico alemão, vulgarmente conhecido como krautrock.

Eno estava na Alemanha, produzindo o grupo Harmonia, quando Bowie mudou-se para Berlim. O contato entre os dois foi rápido e logo estavam trabalhando juntos, produzindo uma das maiores obras da carreira de Bowie, o monumental disco Low. Contudo, o disco inaugural da fase Berlim de David Bowie, lançado em janeiro de 1977 (cujo aniversário de 40 anos celebrei neste texto), não foi fruto daquela cidade. A maior parte de Low já chegou pronta no estúdio e foi registrada em sua maioria na França, no Castelo de Hérouville. Apenas algumas partes foram gravadas em Berlim, mesmo que a influência da cidade alemã já pudesse ser sentida nas letras e nos títulos das canções.

E por mais que Low tenha iniciado a relação de Bowie com Eno de forma avassaladora, a colaboração entre os dois foi selada de fato no disco seguinte, lançado no dia 14 de outubro de 1977, há exatos 40 anos. “Heroes” – entre aspas mesmo – não é tão importante quanto o disco anterior, mas é o álbum que consagra não apenas a nova fase da carreira do compositor como o eterniza como um dos principais nomes da música pop do século passado, forjando parâmetros que ajudaram a moldar o pop deste século. É o ponto de amadurecimento de um compositor seguro de si mas disposto a correr riscos e o disco que traga aquela que é considerada sua canção mais emblemática.

Brian Eno, Robert Fripp e David Bowie nos estúdios Hansa, em Berlim.

Brian Eno, Robert Fripp e David Bowie nos estúdios Hansa, em Berlim.

Foi um disco praticamente composto em estúdio. Apenas uma música – “Sons of the Silent Age” – chegou pronta ao hoje mítico Hansa, um estabelecimento que nos anos 30 e 40 era um salão de bailes nazista e nas décadas seguintes uma sala de gravação de concertos, até começar, em 1974, a gravar discos comerciais, sempre a poucos metros do infame Muro de Berlim. Low e “Heroes” (bem como os dois discos de Iggy Pop que Bowie produziu nesta mesma fase, The Idiot e Lust for Life) foram os primeiros grandes álbuns a sair de suas dependências, abrindo caminho para obras clássicas de artistas de peso como Depeche Mode, Killing Joke, Nick Cave & the Bad Seeds, Marillion, Siouxsie & the Banshees, Wire, Pixies, U2, Snow Patrol, Supergrass, Psychedelic Furs, R.E.M. e Manic Street Preachers, entre outros.

Para ajudá-lo neste novo álbum, Bowie mais uma vez chamou Brian Eno para ser seu parceiro e o produtor Tony Visconti, que também havia trabalhado em Low bem como em discos anteriores de Bowie (como seu disco de estreia, The Man Who Sold the World, David Live e Young Americans). Os dois passaram a explorar a acústica do espaço com os timbres eletrônicos e alienígenas propostos pelos sintetizadores trazidos por Eno, sempre preparando terreno para Bowie sentir-se à vontade para compor.

Como Low, “Heroes” também vinha dividido conceitualmente em dois lados. O primeiro deles, dedicado às canções, abre sorrateiro com um hino à vida sem drogas. “Eu queria acreditar em mim, eu queria ser bom, não queria distrações, como todo bom garoto deveria”, cantava imponente em “Beauty and the Beast” sobre uma paisagem sonora conduzida por um piano e um groove elétrico-eletrônico que repetem o mesmo motivo por toda a música, “nada nos corromperá, nada competirá, felizmente os céus nos deixaram de pé.”

Logo no início do disco é possível ouvir um novo som, metálico e elétrico, completamente distinto das paisagens etéreas de Low. Foi a arma secreta que Eno sacou para o disco, ao convidar o guitarrista Robert Fripp, que havia se aposentado do grupo King Crimson – e da música – três anos antes para estudar as obras do mago armênio George Ivanovich Gurdjieff (voltando para o disco apenas no primeiro disco de Peter Gabriel, gravando sob pseudônimo). Depois de muito conversar com Fripp pelo telefone, Brian o convenceu a vir para o estúdio por uma semana, quando o disco já tinha sido composto e estava sendo finalizado. Sem ouvir nenhuma música nem conhecer David Bowie pessoalmente, Fripp chegou no Hansa, ligou seu instrumento e começou a tocar sobre as canções já existentes. Como quase todo o disco, as participações de Fripp foram registradas no primeiro take, mostrando sua capacidade extraordinária de adaptação, além de sua assinatura musical indefectível. Ao lado de Eno, ficava à vontade para exibir sua criação coletiva, uma técnica chamada de Frippertronics, criada no disco que os dois compuseram juntos em 1973, (No Pussyfooting), e utilizada nos dois primeiros discos solos de Brian, Here Comes the Warm Jets e Taking Tiger Mountain (By Strategy), ambos de 1974. A técnica consistia em repetir os sons elétricos da guitarra de Fripp através de loops eletrônicos e mudou completamente a forma como o guitarrista tocava seu instrumento.

O fato do estúdio ficar do lado do Muro de Berlim – e de sua mesa de controle ser possível avistar os soldados armados em eterna vigília – causava a sensação de estarem não apenas entre dois sistemas políticos, mas entre duas metades. A gravação de “Heroes” foi marcada por essa dualidade, que se refletia entre a música pop e a arte clássica, atrito capturado por Eno e Bowie durante toda a estada em Berlim. Em “Heroes” ela vinha também traduzida pelo aspecto globalista da cidade, em que cidadãos de todas as partes do mundo conviviam numa cidade marcada pela tensão pré-apocalipse. Isso se refletia principalmente no lado instrumental do disco, quando Bowie passou a tocar o instrumento japonês koto na faixa “Moss Garden” ou ao tom árabe da melodia de seu sax na faixa “Neuköln”. “V-2 Schneider”, batizada em homenagem a um dos integrantes do Kraftwerk, Florian Schneider, retribuía a citação que o grupo alemão pai da música eletrônica fez ao próprio Bowie na faixa-título em seu álbum Trans Europe Express, lançado em março daquele ano (citando o disco Station to Station e um encontro com Bowie e Iggy Pop).

heroes-bowie

Mas o grande momento do disco é sem dúvida sua faixa-título. Logo que definiram o tom da canção, Fripp achou onde encaixaria sua guitarra e aquele ruído sintético que ia e voltava o atingiu com força, a ponto de tornar seu registro da canção decididamente emotivo. Com microfones espalhados pela sala de gravação do Hansa, Eno conseguia capturar tanto os sussurros do início da interpretação como seu momento mais arrebatador, justamente quando fala dos amantes que se encontram à beira do fatídico muro. A inspiração havia surgido quando o produtor Tony Visconti fugiu do estúdio para encontrar-se com a vocalista Antonia Maass, com quem teve um caso à época da gravação. Bowie viu a cena do próprio estúdio sem que os dois percebessem e capturou aquele momento para dentro da canção, a cena mais intensa e apaixonada dessa que é considerada uma de suas maiores canções.

A capa do disco, em preto e branco, saiu de uma sessão de fotos feita pelo japonês Masayoshi Sukita e a imagem escolhida, como a imagem escolhida para a capa de The Idiot, do Iggy Pop, foi inspirada pela pose do personagem da tela Roquairol, pintada pelo alemão Erich Heckel em 1917. Empacotado com aquela imagem reflexiva e robótica, “Heroes” foi lançado pela gravadora RCA com dois slogans publicitários. O primeiro indicava que Bowie ultrapassa gerações (“Há a velha onda. Há a nova onda. E há David Bowie”) e o outro dizia que “o amanhã pertence àqueles que conseguem o ver chegando”, este cunhado pelo próprio Bowie. Ele sabia exatamente o que estava fazendo.

oldwave-newwave

4:20

Leitura Aleatória 252


riffsyphon1024

1) “Não confunda indústria dos jornais com mídia”
2) 9 hábitos cerebrais que você não sabia que existiam
3) 5 soldados reais que fazem o Rambo parecer uma moça
4) Twitter em 1937
5) Joaquin Phoenix insiste que o lance dele com hip hop é sério (tá bom)
6) Dick Cheney diz que governo de Obama põe EUA em perigo
7) Suspenso o músico que piscou para Barack Obama
8) O dia em que o São Paulo foi rebaixado
9) Hayden Panettiere diz que não está saindo de Heroes (hmmm…)
10) Obama quer impor teto para bônus de executivos em Wall Street

Alan Moore vê TV

A Wizard entrevistou o Alan Moore sobre seus televisão e ele falou sobre alguns dos seriados favoritos aqui. Ele curte The Wire e South Park, não gostou do Family Guy ter pego leve com o Guerra nas Estrelas (“uma sátira aprovada!”, reclama), não gosta de Lost e Heroes e tem um mau presságio sobre o fim de Battlestar Galactica, além de comentar como funciona parte do entretenimento antes.

THE WIRE (HBO)
“It’s probably one of the best pieces of television I’ve ever seen. The only problem with it is that it makes everything else looks kind of sad and poorly written and poorly conceived. The fact is, that as, I think [series creator] David Simon justifiably says somewhere on the closing extra features,’ ‘Everything we raised, we resolved.’ And just that simple statement explains why ‘The Wire’ is so far ahead of any other television that I’ve seen. Every tiny little thing, even inconsequential things that were raised in the first series, were incredibly, dramatically resolved by the end of the fifth. It bears going back and watching again, probably several times.”

BATTLESTAR GALACTICA (Sci Fi)
“I have seen the first half of the final series of ‘Battlestar Galactica.’ It’s well done, but I’ll reserve judgment until I’ve seen the final episodes, because it could, as with so many of these things, end up as a bit of a mess. It seemed that they got a bit self-conscious about making some kind of political analogies that ended up being a bit confusing and ham fisted and perhaps spoiling. I feel that the big problem with most of these programs is that people start off with the good beginnings of an idea. That is disastrous because that is enough to get a show commissioned. So you’ve got the beginnings of a good idea and if it’s not brought to its conclusion properly, it won’t be a good idea at all; it’ll be a waste of everybody’s time. It’ll be a waste of the creator’s time, and more importantly it’ll be a complete waste of the audience’s time. I mean, if you have been following a show expecting it to have a kind of payoff and you’ve been following it for three or four seasons and then at the end, it turns out Bobby Ewing comes out of the shower and one of the characters wakes up and says, ‘Oh, Bobby, I’ve just had the most strange dream!’ You know? There’s a lot of hours, days of your life that you’re never gonna get back again, you know? So if people are gonna invest this much time and enthusiasm, genuine enthusiasm, in these shows, I really think that they ought to pay off. The writers ought to know what the end is; at least the important parts of it before they start and not do anything that is gonna turn out to be irrelevant, pointless or just a confusing red herring.”

LOST (ABC)
“I saw the first few episodes and there were already so many inconsistencies where all the writer would have had to have done was check back to the previous episode. I have no confidence in them knowing where they are going. I think they’re just thinking of weird things week by week.”

SOUTH PARK (Comedy Central)
“I’m very much enjoying the editions of ‘South Park’ that I’ve seen. I think that those guys have got real moral integrity, you know? They really have. They’re kind of fearless. I wouldn’t agree with everything that they say, but God bless them for saying it. I think [Trey] Parker and [Matt] Stone are real troopers. They’re really good.”

FAMILY GUY (Fox)
“I enjoy ‘The Family Guy’ and ‘American Dad’ stuff that I see. We only get them in dribs and drabs. You do tend to sigh a little bit when it gets to, ‘Boy, this is almost as bad as the time when Peter…’ blah, blah, blah fill in the clip. But at the same time, they do some bits that are kind of wonderful. I thought that the soft shoe shuffle of the Dumpster Babies [‘Airport ’07’ episode] was a memorable moment. On the other hand, I did watch the first five or ten minutes of that ‘Family Guy: Blue Harvest,’ and I thought it was rubbish. It was too cozy with George Lucas. It was an approved satire, and how toothless is that? But they’ve had their moments. They’ve done some good stuff. You can’t expect people to do brilliant stuff all the time. Although, actually, I still do.”

HEROES (NBC)
“I saw the last episode of Season One where the flying superhero [Peter Petrelli] and his brother, the exploding superhero [Nathan Petrelli], have a little moment and a bit of a hug and then the flying guy takes the exploding guy up into the atmosphere above New York where he undergoes a nuclear explosion to the great relief of all the spectators. You know, again, it wouldn’t have taken much. All you’d have had to do, as I understand it, and I speak as somebody who doesn’t actually have an Internet connection and has very little idea what an Internet connection is, but I understand there is this thing called ‘Google’ and that apparently you just have to put a couple of words into it and magically it will provide all your reference for you. You don’t even have to get up out of your seat. If you’d have just put, ‘nuclear explosion,’ say, into Google then I’m sure that somewhere in that it would have explained that an air burst is much, much, much, much, much, much worse than a ground burst. I hope that if that unlikely situation should ever come about, I hope that the superpowered beings who will presumably be around to save us from it are perhaps a bit more intelligent, otherwise we’re doomed. So no, I’m not a big fan of ‘Heroes,’ got to say.”

Lost x Heroes

Enquanto a segunda temporada de Heroes não decola (uma ou outra cena instigaram, como a Claire testando ainda mais seus limites ou a briga entre o Matt e o Nathan e, claro, a última cena do capítulo passado, o s02e06), a quarta de Lost, que ainda nem começou, pega fogo. O Carlão adianta alguns possíveis spoilers sobre o que está nos esperando na ilha maldita a partir de fevereiro do ano que vem. E não bastasse Heroes não estar empolgando nem os americanos que se dispõem a responder pesquisas de opinião pública, outro golpe pode abalar a segunda temporada: a greve dos roteiristas de Hollywood, que pode encerrar a s02 antes da metade prevista.

E na paralela, o Larry King acha que o Seinfeld foi cancelado… Não bastasse o cara confundir o nome dos Beatles