Jerez vai bem com Olafur Eliasson? C’est grec à moi
E já que passei por um assunto quase bissexto por aqui (artes plásticas), não custa citar o curioso jogo que a Helô e o Horta vêm travando no Facebook. Começaram a partir de um jogo de palavras da Helô depois de uma sexta cansativa, mas logo virou um entrave de harmonização entre telas e vinhos, dois assuntos que não tenho a menor intimidade. Pra mim, a história da pintura é um borrão indistinto entre a primeira pincelada e o borrão pós-moderno e enquanto não colocam contornos nos retratados (quadrinhos, desenhos animados, pop art) esse passado é um incógnita com alguns nomes óbvios (Da Vinci, Van Gogh, Picasso, Pollock) em destaque. Vinho então, nem se fala: meu primeiro porre aos treze anos (Campo Grande, 1988, Sangue de Boi) me deixou um trauma histórico em que associo o cheiro da uva fermentada ao de suco gástrico, mas estou em pleno processo de recuperação junto à esposa. O que não me deixa alheio à apreciação deste jogo, uma espécie de versão erudita das T-girls, principalmente devido aos seus personagens. A Helô, os leitores deste saite a reconhecem, me ajuda a capitanear o Link toda semana enquanto singra suas viagens psicológicas como se cozinhasse para um amigo em seu mais que recomendado Caracteres com Espaço. Horta, outro frequentador daquela redação, é o crítico de vinhos do caderno Paladar e pode ser descrito como se todos os personagens de Hergé (Tintim, Haddock, Girassol, os Dupont, talvez Milu) fossem uma só pessoa. Como não entendo patavina deste riscado, pedi para Helô explicar la règle du jeu:
Não é exatamente um jogo, é mais uma brincadeira mesmo. Porque jogo tem regra, isso vale, aquilo não. E brincadeira não. Na brincadeira, brinca-se. E é isso que eu e o Luiz Horta estamos fazendo. A gente tá brincando.
Nossa diversão pode parecer meio inacessível de cara, mas deixa a timidez de lado e chega mais perto. Eu vou explicar como funciona. Você viu Ratatouille, aquele file do ratinho que cozinha? Sabe a hora que o crítico come o ratatouille e é transportado imediatamente para a sala de casa, a mãe dele contra a luz da porta, ele criança (me arrepia só de lembrar)? A sensação que está por trás dessa brincadeira é essa. Mas como é difícil demais descrever memórias de maneira suficientemente clara a ponto de elas serem totalmente compreendidas pelo outro, usamos imagens. E no lugar da comida, vinho.
Para cada vinho, associamos uma obra de arte. A coisa começou comigo jogando uma cartada que já dava o vinho e a obra. Algumas rodadas foram assim. Até que o jogo mudou, quando o Horta jogou uma obra de arte e pediu um vinho. Essa parte ficou mais legal, porque os processos começaram a ficar mais claros.
Digo, antes, as rodadas vinho-obra, elas vinhas sem explicação. Agora, nas rodadas obra…. vinho, quando a gente escolhe o vinho, explica o que levou à decisão. É uma brincadeira de associação livre que apesar de usar dois universos tidos como sofisticados, não passa de uma brincadeira de criança, tipo aquela que você cada um vai dizendo uma palavra por livre-associação e depois todo mundo tenta refazer o trajeto.
Se quiser brincar com a gente, está mais do que bem-vindo. A quadra é o Face. Depois eu ponho as rodadas no meu blog.
Confere lá.
A morte do carão é um nicho
Na funça, Instagram do Pedreira
“Cadê tu, mano?”, Maurício me ligou quando estava descendo a Consolação rumo ao centro. “Calma, tou chegando, já tem gente?”, era meia-noite quando ele havia me ligado, exatamente a hora em que as portas da Tracktower se abriam para a festa de 15 anos do Trabalho Sujo. “Ainda estão chegando, mas vem logo!”. Estava indo. Sem pressa. A lista de convidados já estava batendo o milhar e meio e eu já havia avisado aos próximos: chegue cedo para não pegar fila. E ao passar pela São João, avistei a portinhola que dava acesso à festa, constatando feliz que não havia fila ainda.
Carol e Jana na escada espiral, foto da Ilana
Que nada. A fila começava exatamente logo que se passava pela porta rumo ao prédio e serpenteava pelos vários lances de escada circular até chegar ao andar da Trackers. Passei por ela, cumprimentando uma vastidão de conhecidos e amigos por seus degraus. “Tá todo mundo aí”, pensei, ao mesmo tempo em que começava a perceber que a noite desequlibraria. Quem trabalha na noite consegue perceber, ainda nos primeiros minutos, se o clima vai engatar ou não. E bastou atravessar a porta para dentro do andar em que a festa aconteceu para ter a certeza disso. Recuso-me a tentar descrever o local fisicamente – suas paredes grafitadas e luzes coloridas perdem todo o impacto e magia ao morrer nas palavras.
Hipster in natura, foto da Fer
Cheguei, cruzei o Maurício, “cadê o Ronaldo?”, que ainda não havia chegado (e a fama de atrasado é minha, tudo bem, lido com ela), e comecei a circular pelo lugar em busca da segunda pista. No caminho, num lounge com uma banheira e um cadeirão, encontro Jana, Carol e Ilana tirando fotos sob as luzes coloridas do apartamento. As três atentaram ao meu anúncio e chegaram cedo demais, antes da casa abrir, mas estavam maravilhadas com a casa ao mesmo tempo em que ansiosas em relação ao início da festa.
Like a boss, foto da Ilana (enquadra pra mim? :P)
Jana pede pra tirar uma foto minha na banheira, digo que está cedo e sento no cadeirão para a câmera de seu celular. No cômodo ao lado, o Peba começa a movimentar corpos ao som de grooves dos anos 70. Uma pequena fila se forma no caixa, os fumantes dominam a varanda, as pessoas começam a circular.
Ilana na banheira, foto da Jana
O dono do local me leva à salinha menor que, ainda vazia, me passava a impressão de caos que eu tanto gosto. A palavra “inferninho” piscou no meu inconsciente, me levando para festas em moquifos no Recife, em casas minúsculas no Rio de Janeiro e em Porto Alegre, no saudoso Susi in Transe aqui em São Paulo, animações coletivas que fugiram do controle da realidade e transformaram todos os envolvidos em um único ser festeiro, sorridente, bêbado feliz, inconsequente e tolerante.
Tolerância. Eis a palavra-chave da noite. Percebi logo depois que a Dani chegou e começamos a arrumar seu set. Sem o cabo para ligar seu computador, ela se dispôs a discotecar usando apenas o iPod, até que, certa hora, alguém bateu em algum lugar e desligou o som. Já esperava os habituais “êêêêêêê”, “iiiiiih” e”uuuuuuuuuuh” que sempre acompanham estes incidentes, mas em vez disso, só gente conversando. Ninguém gritou “não vai começar, não?” ou “vai djidjêi”. As pessoas que já lotavam a salinha perceberam que estávamos com um problema e esperavam este ser sanado. Quem queria dançar logo foi para a outra pista, mas a grande maioria esperou pacientemente arrumarmos as coisas e a música voltar a ecoar na salinha. Perguntei se ela tava tranquila, ela disse que não, tava “TEMÇA” (e eu li o mç naquele sorriso duro), disse que ia pegar um drink e fumar um cigarro. A pista ainda não tinha legalizado.
Ao fundo, Mr. Mason e Chico Barney combinam alguma, foto minha
Encontro novamente o Maurício na varanda e ele tá com os olhos arregalados. “OLHA A FILA…”, que fazia a curva e deslizava quarteirão afora. Aos poucos começavam a chegar os relatos: meia hora na fila, uma hora na fila, uma hora e meia na fila, fulano acabou de ligar dizendo que desistiu depois de uma hora. Isso sem contar a chuva. Mas quem enfrentava a bendita não levava nem cinco minutos para entrar no clima da festa. As pessoas estavam ali claramente pra se divertir e haviam se encontrado num apartamento do centro que parecia uma dimensão paralela. Aos poucos, casais de todos os tipos começavam a se formar e a multidão lentamente se metamorfoseava em muvuca. Gente saindo pelo ladrão. Mas nenhuma cara feia, sorrisos largos para todos os lados. E um monte gente conhecida, famosos, amigos, famosos-amigos e conhecidos que sabiam a senha para a noite. Todos se divertindo pacas. “Cê viu que a Alessandra Negrini tá aí?”. Eu só vi o BNegão, cuja presença me lembrou uma noite desse naipe que promovemos em Belém, em 2007, eu discotecando e ele rimando.
A Dani tá escondida atrás do BNegão e, sim, é um cara de toga, foto da Fer
Trago o drink de Dani quando ela me puxa uma relíquia da bolsa, sacudindo CD-Rs com nomes de músicas escritos à mão no envelope de papel branco: “Gente Bonita Clima de Paquera” diziam os títulos dos CDs, gravados para a Gente Bonita em que ela tocou em 2007, que eu comentei outro dia. Mas depois de um início tenso, ela logo estava dominando a pista como bem sabe e o sorriso começou a se soltar. Perguntei quanto tempo ela queria tocar, ela, com algum resquício de ansiedade, disse “meia hora” e eu reclamei que ela havia acabado de começar. Disse que tocaria com ela pra aliviar a tensão, ela topou, mas em menos de dez minutos já estava disparando Neneh Cherry, Technotronic, Madonna e funk carioca como se não houvesse amanhã. Um dos ápices de sua discotecagem foi quando sacou “All That She Wants”, do Ace of Base. A partir daí, as coisas começaram a sair do controle. For good.
Esse cara com a coroa de louros logo tiraria a roupa e ficaria apenas de cueca, pendurado numa janela, foto da Fer
“O que que tá acontecendo?!”, Ronaldo aparece com um sorriso estatelado e olhos pasmos, “que festa é essa, Matias?!”. Saquei meu charuto de Hannibal e ameacei rir “adoro quando um plano dá certo” com o canto da boca, mas estava igualmente pasmo para tentar qualquer reação cínica. As próximas a assumir a pista, Giu e Chebel, já haviam gasto a tensão que fritaram o sábado inteiro com a discotecagem da Dani e ficaram bem à vontade para esculhambar de vez as coisas.
Dani na pista, bem em primeiro plano, foto minha
Que surpresa boa. Quando elas me mandaram o set que eu havia pedido para postar no Sujo, todo cheio de disco music, soul e música brasileira vintage, pensei que podia haver um momento de intersecção com a pista Veneno, grooves que se espalham pelos cômodos na mesma freqüência… mas qual. Apimentadas pelo set da Dani, as duas não seguraram a franga e nos fizeram cantar… “CHORANDO SE FOI” DO KAOMA. E quando a Giu tocou “VOLARE” com os Gypsy Kings? E quando rolou” O Meu Sangue Ferve por Você” do Sidney Magal? Em quase todas essas músicas eu não resistia e abaixava o volume delas no refrão, deixando o povo se esgoelar: “AAAAAAAAAAAAAH! EU TE AMO! AAAAAAAAAAAAAAAAAH EU TE AMO MEU AMOR!” Acho que por volta desse horário todo mundo entrou em alfa ao mesmo tempo e a festa passou a entender todos os sentidos como um só. Visão, audição, tato, paladar e olfato todos à disposição do prazer. Dancinhas, esfregões, gente pendurada no teto, gente tirando a roupa, suor nas paredes, ebulição completa. Eu já falei umas três vezes pra elas, mas não custa repetir: QUE DISCOTECAGEM, meninas.
Que discotecagem… Chorei, foto minha
Depois que Renata e Giuliana saíram (Chebel sairia da festa logo depois, com dor no coração por ter de fazer um frila às 8h da madruga do domingo!), eu e Luciano assumimos a discotecagem e aí eu não lembro de mais nada.
Só uns flashes.
Mas geral curtiu.
Só sei que eram oito da manhã quando cheguei em casa. Vai rolar outra? Vai, mas ainda estou me recuperando do que aconteceu neste sábado… Quem mais foi? Mais histórias? E AS FOTOS, CADÊ? Tive que fazer uma rapa nas poucas fotos que tirei, nas da Fer, do Pedreira e da Jana pra ter alguma recordação visual, mas vi muito flash estourando por lá… Alguém mais tirou? E a pista Veneno? Não vi nada…
E na segunda, a Helô lamentava não ter ido por motivos de saúde, depois de ter ouvido relatos de todas as amigas e de cruzar uma galera no jornal que só me cumprimentava com uma risada frouxa que parecia misturar “que festa” com “que ressaca”. “É o fim do carão, Matias!”, ela comemorava enquanto esperávamos o elevador. “Não é o fim do carão, Helô”, respondi, “as pessoas vão continuar tirando onda que são ricas, cultas, esnobes, nobres, bem vestidas, por dentro. Isso ainda vai ser esfregado na cara de todo mundo”. Mas de todo mundo que se dispor a entrar nessa onda errada. Aos que não – gente que foi na festa de sábado -, uma coisa já está clara: o não-carão é um nicho.
Sejam bem-vindos.
Útil pra quando você for numa raver… Helô quem me mostrou isso.
Eu e a Helô assinamos o texto de capa dessa semana do Link, sobre o botão Curtir, do Facebook.
Curtindo a vida adoidado
Como um mísero botão transformou o Facebook em febre. E essa curtição toda mal começou…
É o gesto mínimo. O polegar levantado, os outros dedos fechados. Feito o sinal, não sobram dúvidas. O joinha, em toda sua simplicidade, virou a partícula elementar da autopublicação.
Uma das grandes discussões no início da chamada web 2.0 era se, no futuro, qualquer um seria produtor de conteúdo. Mas poucos se dispõem a participar da internet de forma ativa. Assim, aquele que não tem Twitter, nem blog, nem Tumblr, que não sobe vídeos no YouTube e não recomenda leituras no Google Reader, ele não publica nada. É um mero leitor passivo, acompanhando a era da autopublicação do lado de fora.
Até o Facebook
A rede social reduziu a autopublicação a sua unidade mais básica, o que une Twitter, YouTube, Flickr e Tumblr. Todos terminam no botão “publicar”. O Feice concentrou-se apenas neste gesto, o mínimo de interação possível entre homem e máquina, o clique no mouse que ativa um link.
E transformou o botão de publicar em um ato amigável, próprio de uma rede de “amigos”. Assim nascia o botão “curtir”.
Pegou. Primeiro, o botão era restrito às publicações dentro do Feice. Alguém indica um link e, em vez de escrever “legal” no comentário, basta apertar o polegar pra cima. A grande sacada de Mark Zuckerberg foi despregar o botão de sua rede – espalhando-o por toda a internet, hoje coalhada pelos joinhas.
Isso aumentou o tráfego de dados dentro da rede e fora dela – quase todos os sites que incluíram a função em sua programação tiveram representativos aumentos de audiência.
Mas o domínio da curtição está só em seus primeiros dias. A novidade desta semana foi a transformação de outro botão, o “Compartilhar” que está prestes a virar apenas “Curtir”. E quando você curte alguma coisa fora do Facebook ela é automaticamente postada no seu mural, abrindo inclusive a possibilidade de comentários – coisa que o Curtir atual não permite.
Com isso, ninguém mais curte em silêncio. Basta clicar no botão e a curtição é dividida com amigos automaticamente. Alguma dúvida de que isso aumentará ainda mais a audiência de sites, fora a do próprio Feice?
Como curtir
É uma ideia quase besta de tão simples, que aproveita da quase passividade de quem está navegando para torná-lo agente ativo do grande jogo que é a internet hoje. Mas é preciso saber curtir.
Pega mal curtir o que você publicou. Também não é legal ser serial liker e sair curtindo tudo por aí. É preciso dar valor a seu joinha. Curtir notícia ruim é esquisito. Curtir quando alguém muda o status de casado para solteiro, então, é grosseria pura.
São apenas algumas dicas desta etiqueta virtual que estamos aprendendo a usar. E curtir.
Helô again.
Vai vendo. Culpa da Helô.
A Helô avisou: Dia e Noite, da Pixar, reapareceu online, pra quem não viu ainda. Vê logo – mas o certo é “REVÊ logo”, porque tinha que ser visto no cinema…
A matéria de capa do Link dessa semana reunia exemplos de como o mundo digital vem mudando nosso vocabulário, inserindo palavras e expressões no dia-a-dia sem que nem sequer nos darmos conta. Além deste glossário (diagramado genialmente, pra variar, pelo Jairo e pelo Thiago e convertido na versão digital vertical acima pela Helô), a edição ainda contava com uma ótima matéria da Carla sobre as mudanças que o idioma sofre com o tempo e um artigo do Bráulio Tavares comentando estas mutações. Recomedo a leitura.
Novo Top 75 e a capa da semana é da co-pilota Helô.