E na minha coluna da edição dessa semana no Link continuei falando sobre o Hackatão.
O que a lógica do programador e a do jornalista têm em comum
A tecnologia ajuda a traçar conexões
Jornalistas e hackers juntos, não apenas ocupando o mesmo espaço, mas trabalhando nos mesmos projetos. Esta era a utopia imaginada quando colocamos em pé o projeto do Hackatão, que aconteceu no fim de semana anterior ao passado, na sede do Estado, no bairro do Limão, na cidade de São Paulo.
Havia uma expectativa natural sobre como o evento se desenvolveria. Olhando de fora, as duas profissões parecem antagônicas: hackers que invadem sites de jornal ou jornalistas que denunciam hackers que surrupiam dados de empresas e pessoas. São situações que já entraram no imaginário coletivo. Felizmente, os dois estereótipos estão se esvaziando e aos poucos ambos começam a reconhecer-se um no outro.
Vale rebobinar a fita do tempo para lembrar como era o trabalho de um jornalista antes da digitalização dos dados. Se era preciso buscar informações sobre determinada pessoa ou instituição, o pobre repórter tinha de passar horas e horas num arquivo cheio de estantes e pastas de papel e pesquisá-las manualmente para, aos poucos, dar uma cara ou um rumo à matéria que estava sendo apurada. Não é preciso nem voltar muito no tempo – em algumas cidades ou em certas instituições, os dados ainda estão em formato físico, e exigem paciência e disposição de um investigador para traçar conexões entre processos, pessoas e empresas.
Já o programador usava esta mesma lógica no mundo digital. Para desenvolver um programa ou aplicativo, era preciso testar formatos, conexões, permissões e extensões para ver o que funcionaria melhor com o quê. A vantagem do desenvolvedor é que, ao lidar com informações eletrônicas, o trabalho de apuração torna-se mais simples e prático, pois é possível criar scripts, algoritmos ou pequenos programas para fazer estes testes sem que haja interferência humana direta. Assim, o processo torna-se bem mais rápido – e, ao mesmo tempo, mais preciso.
Ao aproximar os dois profissionais, abrimos a possibilidade de esmiuçar bancos de dados com o mesmo rigor que fazia parte da pesquisa daquele velho jornalista, sem correr o risco de falha humana ou de lidar com pilhas de papéis e pastas de documentos (haja poeira!). Com os dados digitalizados, basta usar os recursos da ciência da computação para chegar a cruzamentos e resultados que levariam dias – talvez meses – para serem apurados.
Mas isso tudo era o mundo ideal. Temíamos que pudesse haver algum estranhamento ou que as lógicas do jornalismo e da programação de dados demorassem um pouco para engrenar. Não foi o que aconteceu. Depois que Daniela Silva e Pedro Markun (ambos do grupo Transparência Hacker, que ajudou o Estado a produzir o encontro), os temas começaram a ser apresentados e as tarefas foram divididas.
Tudo muito tranquilo, sem discussão, sem briga por pautas, sem afobação. Aos poucos os grupos foram se formando naturalmente e os assuntos foram divididos de maneira orgânica, sem que houvesse a necessidade de alguém designar funções ou organizar quem faz o quê com quem.
Por mais que já esteja acostumado com a noção da hierarquia horizontal dos tempos digitais, é sempre um prazer vê-la na prática. Ainda mais na minha área de atuação – o jornalismo –, que ainda é cheio de vícios dos tempos analógicos. Mas uma prova de que isso está mudando – e é um prazer fazer parte deste processo – é justamente este primeiro Hackatão, que ainda está dando pano para a manga e cujos projetos estão aos poucos sendo concluídos (leia mais aqui).
Nesta terça-feira, durante o evento YouPix, às 19h30, conversarei mais um pouco sobre a relação entre estes dois fuçadores – o hacker e o jornalista – reunindo gente que participou do Hackatão: Raphael Molesim, Jonas Abreu e Wesley Seidel, que desenvolveram o site Para Onde Foi o Meu Voto? e dois repórteres do núcleo Estadão Dados, Amanda Rossi e Daniel Bramatti). O debate acontece no Pavilhão da Bienal, no Parque Ibirapuera, em São Paulo, e a entrada é gratuita.
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