Cocção livre

Nesta terça-feira, o trio Música de Selvagem convidou o público do Centro da Terra para uma viagem densa que, ao mesmo tempo em que desbravava fronteiras de linguagem, lentamente aquecia sentimentos e neurônios ao apresentar o conceito de sua apresentação Cru/Cozido, inspirado no trabalho do antropólogo francês Claude Lévi-Strauss, inspirador do disco Pensamento Selvagem, lançado em 2021. O disco original, fruto do processo de isolamento do período pandêmico, misturou os instrumentos do trio (o baixo de Arthur Decloedt, os sopros de Filipe Nader e a percussão de Guilherme Marques) às incursões vocais de Inês Terra e às eletrônicas de Luisa Putterman – tudo gravado à distância e trabalhado em três partes de pós-produção dirigida por cada um dos integrantes do grupo. O trabalho de 2021, portanto dividido em três atos, foi seccionado em 94 partes, sendo que três delas apresentavam cada um dos atos. Para cada uma das 91 partes do trabalho, a artista gráfica Maria Cau Levy criou uma capa específica e todos esses 91 recortes visuais estavam espalhados pelo palco do teatro do Sumaré, de onde o público pode assistir à apresentação. Grudados na plateia, os instrumentistas não precisaram nem de microfones, deixando este apenas com Inês, que ainda processava sua própria voz no meio das diferentes camadas de improviso livre propostas pelo encontro. No lugar de Putterman, que não estava na cidade, o trio chamou o trompetista Rômulo Alexis, que alternou seu instrumento com apitos e flautas, complementando os malabarismos vocais de Inês. Como no disco, o espetáculo foi dividido em três partes, cada uma delas mostrando o processo de transformação da comida que mudou a cara da civilização, apresentando primeiro o estado cru para depois mostrar a metamorfose do momento de cocção para finalmente exibir a última etapa, já cozida. As três partes misturavam ataques coletivos com duos entre diferentes integrantes da apresentação, todos temperados pela luz que ia da penumbra ao calor de cores quentes, numa apresentação curta que ao mesmo tempo pareceu suspender nossa noção de tempo.

Assista abaixo:  

Música de Selvagem: Cru/Cozido

Quem dá as caras nesta terça-feira no Centro da Terra é o grupo instrumental Música de Selvagem, mostrando uma versão ao vivo do disco que lançaram em 2021 inspirado na obra do antropólogo e etnólogo francês Claude Lévi-Strauss chamado Pensamento Selvagem, disco que compuseram remotamente a partir de fragmentos que encontraram na internet e incorporaram à sua música ao lado da cantora Inés Terra e da artista sonora Luisa Putterman, a partir do espírito catalogador do pensador francês, cujo título de uma de suas principais obras batiza o disco, que conta com 94 faixas. Dada à dificuldade de reproduzir o experimento ao vivo, o grupo formado por Arthur Decloedt (baixo acústico), Filipe Nader (saxofones alto e barítono) e Guilherme Marques (piano, percussão e bateria) desenhou o espetáculo Cru/Cozido, em que a improvisação livre é pautada pelo disco de 2021, dividida em três partes: cru, transição entre cru e cozido e cozido. A apresentação conta com a presença de Inês e com o trompetista convidado Romulo Alexis. O espetáculo começa pontualmente às 20h e os ingressos podem ser comprados neste link.

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Professor Duprat – Maestro da Invenção

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Maior satisfação anunciar meu primeiro projeto como diretor artístico, que concebi ao lado dos novos compadres Arthur Decloedt, Charles Tixier e João Bagdadi. O espetáculo Professor Duprat – Maestro da Invenção, que acontece nos dias 6 e 7 de setembro, no teatro do Sesc Pompeia, começou como a ideia de uma celebração dos 50 anos da Tropicália que fugisse do trivial. Chamei João, do selo RISCO, para me ajudar a estruturar a produção, que por sua vez chamou Arthur (do Música de Selvagem) e Charles (do Charlie e os Marretas) para fazer a direção artística. Originalmente havia pensado na recriação do disco que o maestro Rogério Duprat havia lançado naquele 1968 – A Banda Tropicalista do Duprat -, mas logo ampliamos a homenagem para além da efeméride, contemplando todo o alcance de uma obra ainda desconhecida pela maioria do público, diferente de grande parte das músicas que arranjou.

Duprat, que entrevistei para a falecida revista Bizz no segundo semestre do ano 2000 ao lado do Fernando Rosa, mexeu nas bases de canções que hoje fazem parte do imaginário brasileiro: além das tropicalistas “Domingo no Parque” e “Baby”, grande parte das músicas d’Os Mutantes e de Gilberto Gil no início de suas carreira, “Construção” de @Chico Buarque, todo Ou Não de Walter Franco, “Maria Joana” de Erasmo Carlos, todo o Tropicália ou Panis et Circencis e outras tantas. Também foi pioneiro na música eletrônica no Brasil (estudou com Karlheinz Stockhausen e John Cage e foi colega de classe de Frank Zappa), célebre na música erudita contemporânea brasileira e trabalhou com trilha sonora para o cinema, publicidade e até tradução de livros.

A banda montada para apresentação inclui, além dos diretores musicais no baixo e bateria, André Vac (do Grand Bazaar), Mariá Portugal, Rafael “Chicão” Montorfano e Maria Beraldo (do Quartabê), Filipe Nader (também do Música de Selvagem e Trupe Chá de Boldo) e o mestre Thiago França, e o espetáculo ainda conta com Curumin, Tiê, Luiza Lian, Tim Bernardes, Jonas Sá e Jaloo como intérpretes das músicas imortalizadas com arranjos do maestro, morto em 2006. Mas como um espetáculo não é só música, convidamos Gui Jesus Toledo para fazer o som, Caio Alarcon para operar o monitor, Olivia Munhoz para cuidar da direção cênica e iluminação, Gabriela Cherubini e Flávia Lobo de Felício para ficar com o figurino e Maria Cau Levy para criar a identidade visual e a Francine Ramos para a assessoria de imprensa. Abaixo, o texto que escrevemos para apresentar o espetáculo, orgulhosos que estamos da homenagem que estamos fazendo para este farol de nossa música, que muitos ainda não conhecem (mais informações aqui).

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Há meio século o Brasil conheceu o trabalho de um compositor erudito e professor acadêmico que revolucionou a música brasileira. O maestro Rogério Duprat é mais conhecido por sua imagem iconoclasta na capa do disco-manifesto Tropicália ou Panis et Circensis, onde, entre os jovens multicoloridos Gil, Caetano, Mutantes, Tom Zé e Gal Costa, aparecia adulto e monocromático segurando um penico como se fosse uma xícara de chá. A representação – referindo-se ao mictório de Duchamp – talvez seja a melhor tradução para a colossal contribuição deste músico não apenas ao movimento tropicalista quanto à música brasileira desde sua aparição.

O espetáculo Professor Duprat – Maestro da Invenção parte desta efeméride para jogar luz na biografia musical do maestro paulista. Influente não apenas no movimento que ajudou a conceituar (a Tropicália), como na história da música brasileira, Duprat é um dos principais compositores eruditos contemporâneos brasileiros, um dos grandes nomes na música para a publicidade do país, compositor de trilhas sonora para filmes como O Anjo da Noite e Marvada Carne, pioneiro na utilização de computadores na música (há mais de 50 anos), tradutor do único livro de John Cage publicado no Brasil, aluno e colega de nomes como Karlheinz Stockhausen, Pierre Boulez, Gilberto Mendes e Frank Zappa. E, claro, arranjador e maestro de obras de diferentes artistas como Mutantes, Caetano Veloso, Gal Costa, Chico Buarque, Gilberto Gil, O Terço, Nara Leão, Walter Franco, Sá, Rodrix e Guarabyra, Frenéticas, Erasmo Carlos, entre muitos outros.

A proposta da apresentação é trazer parte do repertório produzido por Duprat interpretado por artistas atuais que foram diretamente influenciados por seus feitos criativos. Concebido pelo jornalista, curador e crítico musical Alexandre Matias, do site Trabalho Sujo, com direção musical dos produtores Arthur Decloedt e Charles Tixier e produção executiva de João Bagdadi do Selo RISCO, para o palco do Teatro do Sesc Pompeia. O espetáculo costura músicas conhecidas do grande público (como”Domingo no Parque”, “Cabeça”, “Ave Lúcife”, “Construção”, Tuareg”, “2001”, “Irene”, “Não identificado”, “Índia”, “Futurível” e “Baby” entre outras) com arranjos ousados e a influência comercial e erudita de Duprat.

As canções serão apresentadas de forma não-linear e não-cronológica, ecoando diferentes épocas da biografia do maestro através de artistas como Curumin, Tiê, Jaloo, Tim Bernardes, Jonas Sá e Luiza Lian acompanhados por uma banda formada por Charles Tixier (Charlie e os Marretas), Arthur Decloedt (Música de Selvagem), Filipe Nader (Trupe Chá de Boldo), Thiago França (Metá Metá), Maria Beraldo Bastos, Mariá Portugal e Rafael “Chicão” Montorfano (Quartabê) e André Vac (Grand Bazaar).

Ficha técnica

André Vac: guitarra, violão e violino.
Arthur Decloedt: contrabaixo e MPC.
Charles Tixier: bateria, synths e MPC.
Curumin: vocal e bateria
Filipe Nader: sax alto e barítono, clarinete alto e souzafone.
Jaloo: vocal
Jonas Sá: vocal
Luiza Lian: vocal
Maria Beraldo: vocal, clarinete e clarone
Mariá Portugal: vocal, bateria e MPC
Rafael “Chicão” Montorfano: piano, synths e teclados.
Thiago França: sax tenor e flauta.
Tim Bernardes: vocal e guitarra
Tiê: vocal

Equipe:
Direção artística: Alexandre Matias, Arthur Decloedt e Charles Tixier.
Concepção e curadoria: Alexandre Matias
Direção musical: Charles Tixier e Arthur Decloedt.
Produção executiva: João Bagdadi.
Som: Gui Jesus Toledo.
Monitor: Caio Alarcon
Luz: Olivia Munhoz
Figurino: Gabriela Cherubini e Flavia Lobo de Felicio
Identidade visual: Maria Cau Levy
Assessoria de Imprensa: Francine Ramos.

SERVIÇO:
Professor Duprat – Maestro da Invenção
Dias 6 e 7 de setembro. Quinta, às 21h, e sexta, às 18h
Teatro
Ingressos: R$9 (credencial plena/trabalhador no comércio e serviços matriculado no Sesc e dependentes), R$15 (pessoas com +60 anos, estudantes e professores da rede pública de ensino) e R$30 (inteira).
Venda online a partir de 28 de agosto, terça-feira, às 12h.
Venda presencial nas unidades do Sesc SP a partir de 29 de agosto, quarta-feira, às 17h30.
Classificação indicativa: Não recomendado para menores de 12 anos.
Sesc Pompeia – Rua Clélia, 93.