Hoje só amanhã: a sexta semana de 2009

Leitura Aleatória mudou para o Twitter
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• Fellini recapitula a carreiratá pra download e tem vídeo ao vivo no YouTube •
• Patrulha do Espaço, a banda de Arnaldo depois dos Mutantes (e a morte de um de seus integrantes) •
• Como era um show dos Mutantes (e um filme com eles) •
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• Leia esse filme e jogue esse livro •
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Camelo viral
Rápido comentário sobre o terceiro episódio da quinta temporada de Lost
Globo OWNED
Fernando Naporano
A Coca-Cola do Justice
David Lynch cantando
A volta do Cara de Cavalo
Federico Fellini e o LSD
Um produto que vai revolucionar o mercado de tecnologia
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Tarantino 2009
Camisinha do Watchmen?
Comerciais feitos pelo público
Maconheiros boicotam Kellog’s
Radiohead no Grammy
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Donnie Darko 2?
Pereio pergunta: sabe aquele homem?
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Bloco do Bruno Aleixo
Comentando Lost: The Little Prince
Los Hermanos tocando Little Joy?
FHC quer legalizar a maconha
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MP3 com o Trio Esmeril tocando os Afro-Sambas
Spot-Motion
Watchmen na capa da Mad
Beach Boys remixado
Roberto Carlos 2009
Watchmen 8-bit
Um blog de comidas gigantes
Humanos entre nós
Carmen Miranda, 100 anos

Fellini ao vivo

O próprio Lariú pinçou umas pérolas da banda ao vivo no auge, sente o drama:


Fellini – Zum Zum Zum Zazoeira (em Porto Alegre, 1990)


Fellini – “Rio-Bahia” (São Paulo, 1987)


Fellini – “Milho” (São Paulo, 1985)


Fellini – “LSD” (Porto Alegre, 1990)


Fellini – “Mosca” (São Paulo, 1985)

Tem muito mais vídeos no canal do YouTube do Thomas.

"Amanhã…" agora

O Midsummer Madness está disponibilizando para download o quinto disco do Fellini, Amanhã é Tarde, que foi lançado em CD em 2003, 13 anos após a dissolução do grupo paulistano. Escrevi sobre o disco na época, dá pra ler aqui, e também escrevi sobre o melhor disco dos caras, 3 Lugares Diferentes.


Fellini – “Amanhã é Tarde

Fellini, 1999

Aproveito a deixa pra ressuscitar uma entrevista que fiz com Cadão, Thomas e Jair na época da primeira volta do Fellini, em 1999. O grupo ainda voltaria de novo para lançar um disco, justamente Amanhâ é Tarde, e fazer outros shows anos depois.

***

Em plenos anos 80, quando as rádios mascavam chiclete, as gravadoras usavam óculos escuros e rock era sinônimo de pop no Brasil, um grupo apareceu para mostrar que existia algo além do clichê rock’n’roll. Compondo sambas quadrados sob guitarras pós-punk, o Fellini era uma banda improvável numa década previsível. Formado por Cadão Volpato, Thomas Pappon, Jair Marcos e Ricardo Savagni, o grupo teve uma carreira marcada por fins e retornos, lançando toda sua discografia apenas por gravadoras independentes – num tempo em que a diferença entre independente e improvisado era nebulosa. Mas o grupo ia contra a corrente e se estabeleceu como um marco no pop brasileiro – a banda mais alternativa do rock nacional (antes mesmo de alternativo ser moda). Lançaram quatro discos (O Adeus de Fellini, Fellini Só Vive Duas Vezes, 3 Lugares Diferentes e Amor Louco), entre 85 e 90, quando pediram as contas. O grupo voltou à ativa no fim do ano passado quando deu três shows (em São Paulo, no Rio e em Brasília) e o Trabalho Sujo aproveitou o gancho para recontar a história do grupo. Pra isso, pedi ajuda a três quartos do grupo (Cadão, Thomas e Jair) em entrevistas separadas via email.

Quem formou o Fellini? Como a banda começou? Houve algum marco inicial da banda?
Cadão –
Thomas Pappon e eu. Tocamos pela primeira vez em maio de 1984, acho, num lugar chamado Alpendre, no Bixiga, em São Paulo. Arnaldo Batista, dos Mutantes estava neste show.
Thomas – Num papo de boteco, eu e o Cadão decidimos formar um grupo. Eu queria “compor” e tocar baixo (estava com o saco de cheio de tocar bateria, ficar confinado ao fundão e não ter muitas chances de apresentar idéias para canções). O Cadão queria fazer letras. Depois chamamos o Jair para a guitarra – que tinha tocado com o Cadão num grupo anterior, do qual não lembro o nome. Finalmente, quando ja tínhamos composto umas três músicas, cruzamos com o Ricardo, que estava começando a tocar bateria. E, sim, há um “marco”: por coincidência, nosso primeiro ensaio com a banda completa, foi no dia 18 de maio de 84 na casa do Ricardo. Era o quarto aniversario da morte de Ian Curtis. Nada como nascer cult.
Jair – Eu e o Cadão, tocávamos no grupo Toque de Recolher, punk rock meio militante, em 83. Mas o Stefano, que tocava baixo, detinha 90% da aparelhagem e resolveu acabar com a banda. Tempos depois, o Cadão me ligou, dizendo que tinha encontrado com o Thomas e queria formar um novo grupo. É bom lembrar que anteriormente, em 81, eu (no baixo), o Minho K (na guitar) e o Thomas (bateria) tambem já havíamos formado o The Internationalists. O nome, inclusive, era uma alusão aa 4a. Internacional. Tocávamos de new wave (Talking Heads, B-52’s, Joe Jackson, Pretenders, XTC, etc.) até Rita Lee, Luís Melodia e King Crimson… Animávamos as festas universitárias da USP, PUC, etc.Bem, então em maio de 84 nós nos encontramos numa lanchonete próxima à PUC. Ali acertamos de começaruma nova banda. O Thomas logo se apressou em nos chamar ate a casa dele, no Morumbi, para iniciarmos o primeiro ensaio, na mesma noite. Fomos num fusca azul do Thomas, quando o mesmo sugeriu o nome: “Fellini”. Uau, eu e Cadão aceitamos de imediato. Neste primeiro ensaio saíram riffs de duas ou três músicas, jamais gravadas, pelo que me lembro… Aí, chamamos o Ricardo Salvagni para tocar bateria (nem lembro como ele surgiu, pois não fazia parte da rapaziada que sempre se encontrava). Comecei com a guitarra, o Thomas no baixo e o Cadão cantando e compondo as letras.

Por que Fellini?
Cadão –
Fellini foi a primeira sugestão do Thomas. As bandas, nesta época, usavam nomes seriíssimos, pós-punks, como Mercenárias, Número 2, Voluntários da Pátria etc.
Thomas – Nesse mesmo boteco, eu e o Cadão fizemos um rápido brainstorm. Fellini foi um dos primeiros nomes sugeridos. Talvez por causa do nosso amor pelo cinema e por um disco que ouviamos muito na epoca, o Feline dos Stranglers, o nome ficou.
Jair – Bem, quem não gosta do nome? Soa bem, em primeiro lugar. E também todos sempre fomos amantes do cinema. Podemos hoje até considerar como uma homenagem ao Federico Fellini. Também gostavamos de um disco dos Stranglers chamado Feline. O Thomas fez a “salada” e o nome saiu…

O primeiro disco chama-se O Adeus do Fellini, que iniciou uma pequena obsessão sobre o fim do grupo. O que o “fim do Fellini” evocava pra vocês?
Cadão –
É uma brincadeira. Havia um disco do Durutti Column chamado The Return of Durutti Column. Achamos engraçado começar pelo fim, mas sempre quisemos acabar mesmo.
Thomas – O Cadão vai dizer que a idéia veio do Return of The Durutti Column, o primeiro disco do Durutti Collumn, mas não me recordo disso. Que me lembre, o Adeus… foi uma especie de gimmick dadaísta, que ironizava a fragilidade e a brevidade das bandas alternativas da época. Como é que um grupo desses poderia vir a fazer mais de um álbum? Também acho que isso foi uma tomada de posição, uma atitude politica mesmo, para deixar claro, desde o comeco: o Fellini nunca seria igual as outras bandas de “rock”.
Jair – Pra mim, encarava o nome do disco como algo surrealista. Particularmente, eu nunca gostaria que o grupo tivesse terminado, especialmente nessa primeira fase. Sim, eu pensava em ganhar dinheiro como fizeram o RPM, os Titãs, etc. Mas a história tomou um outro rumo para a gente, uma espécie de sucesso num “universo paralelo”. O grupo terminou pelo menos umas três vezes pelo que me lembro. Engraçado, o nome do primeiro disco acabou se tornando uma sina pra gente. Porém, eu via o nome apenas como uma brincadeira.

Toda discografia do grupo saiu via independente. Como é olhar pra trás e ver que vcs conseguiram sobreviver num meio que mal existia nos anos 80?
Cadão –
Motivo de muito orgulho e sobressalto pela cara-de-pau. A gente era muito ousado.
Thomas – Me lembro bem de como era difícil lançar discos na época. Mas creio que nós soubemos nos aproveitar bem da maior lição do punk, a do faça-você-mesmo. Não tínhamos nada a perder, todos na banda sabiam que jamais poderiamos viver do Fellini. Cada um dos quatro álbuns que lançamos foi como o parto de um filho. Estão entre as melhores lembranças da minha vida.
Jair – Acho realmente incrível. A estranheza que o nosso som causava à primeira impressão acabou virando o mote para o nosso “sucesso”. Muitos até não gostavam do grupo numa primeira ouvida, depois se acostumavam, gostavam e passavam a adorar. Genericamente falando, deve ter acontecido muito disso por ai. Olha, nos 80 havia uma cena interessante, sim. Ouviu falar de um suposto movimento auto-intitulado “Rock Paulista”? Pois é, fazíamos parte disso. Havia muitos shows em Sampa. Existiu um lugar de pouca vida chamado Napalm, onde muita gente começou a se apresentar (diga-se Ira!, Capital, etc.). Ai teve o Madame Satã, o Carbono 14 e o Radar Tantã. No final da decada, surgiu o Espaço Retrô. Todos estes espaços foram palcos de muitos encontros e projetos… E todos sobreviviam de certo modo…

Que tipo de música vocês ouviam nos anos 80? Quem influenciou o Fellini musicalmente?
Cadão –
Ouvíamos Stranglers, The Fall, db’s, Velvet. Mas as influências mesmo são de uma certa bossa nova um pouco mais oculta que aquela praticada pelos tops da MPB. De alguma forma eu me deixei influenciar – modestamente, claro – pelos gogós de Lúcio Alves e Serge Gainsbourg e pelas valsinhas dos Stranglers.
Thomas – No começo, apenas bandas européias como as inglesas The Fall, Stranglers, Joy Division, New Order, Gang Of Four, Cure e as alemãs Palais Schaumburg e Fehlfarben “palácios e cores que falham”). De influencia nacional, apenas o Lóki? do Arnaldo Baptista.
Jair – Bem, como narrei acima, com certeza: ouvia tudo de new wave, que acredito ter sido uma das bases da influencia do Fellini. Mas os 80 foram bem longos. Bem no comecinho eu e outra roda de amigos não perdiamos um só show do Colégio Equipe, organizados pelo Serginho Groisman. Na época, cheguei a assistir Adoniran Barbosa & Clementina de Jesus, Raul Seixas, Jorge Mautner… Eu apreciava muito a MPB daqueles idos. Através do Thomas, conheci muita coisa mesmo. O pai dele sempre trazia um grande pacote de encomendas quando voltava de suas costumeiras viagens à Alemanha. Ai, já viu, né? No início, o Fellini teve influências sim, principalmente do rock inglês. Depois enveredamos para um trabalho mais experimental, mais MPB (os sambas eletrônicos…), que acabaram caracterizando bem o estilo do grupo…

Qual o maior legado do Fellini?
Cadão –
Independência e senso-de-humor.
Thomas – Duas coisas. Primeiro, a atitude, a postura de anti-banda, como forma de criar um contrapeso ao clichê “roqueiro”, ditado pelas grandes gravadoras e grande maioria das bandas. Nós assimilamos totalmente a imperfeção, o erro, a falta de técnica. Trocamos de instrumentos e quase nunca tocávamos as músicas que as pessoas esperavam ouvir. Com isso tentávamos privilegiar a ironia, a idéia, a leveza, a surpresa e a sensibilidade. Segundo: a nossa música, que era encantadora, sedutora e que revelou um letrista pós-moderno impressionista sem parâmetros no pop nacional. Um gênio.
Jair – Acredito que o reconhecimento de público e críitica seja o maior deles. não existe nada tão gratificante. Ouvi dizer que deixamos muitas pessoas felizes com nossa aparição no fim do ano. Este é o maior legado, na minha opinião, pode crer.

Um marco na carreira do grupo foi empatar com os Titãs como melhor disco do ano na votação da Bizz em 87. Como foi isso?
Cadão –
Um barato, pois eles ficaram putos.
Thomas – Um escândalo! Na verdade, era para o Fellini ter sido escolhido sozinho no primeiro lugar. A redação da Bizz alterou a votação para que isso não acontecesse, pois a fúria dos Titãs, das bandas e das gravadoras seria inevitável. O José Augusto Lemos e o Alex Antunes podem confirmar essa história. Repito: Um escândalo!
Jair – Creio que sim, com certeza. Eu, particularmente, não participei deste trabalho. Os caras podem narrar melhor a experiencia vivida.

Qual o melhor disco do Fellini? Por quê?
Cadão –
Talvez o terceiro, Três Lugares… Mas o que eu gosto mais, porque é fuleiro e atrevido, é o Fellini Só Vive Duas Vezes. Até um guarda-noturno fortuito aparece nele, pois gravávamos na sala de jantar do Thomas.
Thomas – Eu mesmo me pergunto isso várias vezes, cada dia acho uma coisa. Todos são imperfeitos, mas todos são tão legais… Erm, vejamos, talvez o Amor Louco.
Jair – Eu voto no primeiro e no terceiro. O Adeus de Fellini foi uma das melhores coisas que fiz na vida até aqui. Foi o meu primeiro disco também. O Thomas já tinha gravado com o Voluntários… Tivemos dificuldades técnicas, claro, mas o repertorio foi bem acertado, os efeitos (ruídos de helicóptero, máquina de escrever, sino, galo cantando…) e alguns arranjos (trumpete e cello) formaram a receita de um bolo que deu bastante certo e muita repercurssão. E 3 Lugares Diferentes considero o mais criativo em termos de musicalidade e letras. Mereceu o titulo de 87, com certeza. Mas gosto dos outros também (hoje também me considero um fã, re re).

Fale um pouco sobre a ida do Fellini aos EUA.
Cadão –
Tocamos (eu e Thomas, apenas) no Village, em Nova Iorque, num lugar chamado Kenny’s Castaway, onde havia cerca de 30 brasileiros saudosos. Mas o sujeito da Rolling Stone, escrevendo para a Bizz, adorou. Está registrado.
Thomas – Foi apenas um show no Kenny’s Castaways em Nova York, para umas 40 pessoas. Por problemas de visto, fomos apenas eu e o Cadão. Tocamos umas 7 músicas, abrindo para o Ira!. Foi legal. O cara da Rolling Stone adorou.
Jair – Bem, pra mim, foi muito ruim. Eu e outros convidados da banda não conseguimos visto. Muitos músicos de outras bandas também foram barrados no terrível consulado americano. Da banda, somente o Thomas e o Cadão viajaram e se apresentaram numa coisa bem intimista, que parece ter dado certo. Mas, segundo eles, o local não estava muito cheio e a maioria era de brasileiros. Não gosto muito de lembrar do episódio…

Quando, onde e por que o Fellini acabou?
Cadão –
A rigor, o Fellini acabou em 1991, quando extinguiu-se o último fôlego. Thomas foi morar na Europa, não tinha mais sentido continuar.
Thomas – O Fellini não acabou, apenas suspendeu suas atividades por causa da minha mudança para a Europa.
Jair – No início dos 90. O grupo apenas se dissolveu, sem traumas.

Quais suas melhores lembranças do tempo do Fellini?
Cadão –
A amizade dos camaradas, as letras malucas que ocupavam minha cabeça até durante o sono, as namoradas da época, a sensação (motivada pela boa fé do Thomas) de que seria uma coisa para a posteridade, as músicas ainda cruas, sem as letras (a sensação de tê-las ouvido pela primeira vez). Foi muito legal.
Thomas – Ah, são as lembranças das gravações dos 4 álbuns. Nós tinhamos controle total sobre tudo, o tempo inteiro, e os discos dependiam diretamente do nosso esforço. Quando as gravações estavam prontas, vinha a melhor parte. Passava tardes inteiras sentadas num boteco, imaginando a capa, a ordem das músicas, os créditos, as fotos, tudo. Como isso é legal. Quanto aos shows, minhas lembranças não são muito boas, exceto a do show de lançamento do Adeus de Fellini no Madame Satã em dezembro de 85. Mudei do baixo para a guitarra, toquei sentado, o Ricardo passou da bateria para o teclado e ritmo eletrônico. Foi um show sensacional, as pessoas não acreditaram. Não tocamos uma única música do Adeus de Fellini!
Jair – Várias: o primeiro ensaio na casa do Thomas, o primeiro show num lugar chamado Albergue, aqui em SP, os tempos “malditos” de Madame Satã, a gravação do Adeus…, a entrevista no Rio para a Per Lui italiana, as costumeiras sessões de fotos, um incrível show em Porto Alegre (89), as cervejadas com o Thomas… Enfim.

Você gostou dos shows de volta?
Cadão –
Provavelmente foram os melhores que nós já fizemos.
Thomas – Não hesito em dizer que os shows de Brasília e Rio de Janeiro estão entre os 3 melhores que já fizemos.
Jair – Sem comentários, simplesmente maravilhosos.

E o próximo disco? Sai?
Cadão –
Não. O Fellini não volta mais.
Thomas – Who knows? Sinceramente, não vejo muitas perspectivas.
Jair – É, meu amigo, pirigas, pirigas. Vamos esperar os ânimos das internas e das externas.

TODO FELLINI (até 99)


O ADEUS DO FELLINI (85)
Definição: Alto astral subliminar.
Uma Letra: “Toda vez que eu ouço falar em cultura/ Saco meu talão de cheques” (Cultura)
Gracinha no vinil: Lados “Ema” e “Siri”.
Instrumento esquisito: Máquina de escrever.
Hit: “Rock Europeu”


FELLINI SÓ VIVE DUAS VEZES (86)
Definição: Transição intransitável.
Uma Letra: “O amor é uma droga/ nem dá barato”(Todos os Dias da Semana)”
Gracinha no vinil: Desenho de um “burro” de escola
Instrumento esquisito: Trumpete vocal.
Hit: “Alguma Coisa Vai Dar”


3 LUGARES DIFERENTES (87)
Definição: Humores diferentes.
Uma Letra: “Mudar de lugar/ Ou mudar o lugar?” (Valsa de La Revolución)
Gracinha no vinil: Um enorme número 3 no rótulo do lado B
Instrumento esquisito: Zumbido.
Hit: “Teu Inglês”


AMOR BARATO (90)
Definição: Samba-eletrônico
Uma Letra: “Cidade perdida/ Joga as cascas pra lá” (Amor Louco)
Gracinha no vinil: Reprodução da capa no rótulo
Instrumento esquisito: Cavaquinho.
Hit: “Chico Buarque Song”

Amanhã é Tarde – Fellini

Outra resenha das antigas, essa saiu na Play número 5.

***

felliniamanhatarde.jpg

Doze anos se passaram e nada aconteceu ao Fellini. Pioneiro indie brasileiro, a indefectível cult band paulistana volta em versão slim (o núcleo Cadão e Thomas assina todos os créditos do disco) e nem parece que seu último disco saiu em 1990 (o pós-samba Amor Louco). Nesse meio-tempo, Thomas tornou-se correspondente da BBC em Londres e Cadão assumiu a edição de cultura da revista época – enquanto o Fellini descansava no fundo do baú. Ele volta sem perder um milímetro do fôlego tênue das dois vocalistas. Ousando cada vez mais, embora timidamente (a idade nos ensina coisas…), os dois voltam com o que pode ser considerado seu melhor disco, não estivesse o antológico 3 Lugares Diferentes envolto numa mística underground que hoje passa ao largo – certamente, por opção. Afinal, podiam faturar um retorno hermético e bissexto, como bastiões pós-punks do mesmo calibre do grupo (Wire, Pere Ubu, Echo & the Bunnymen) que usam “a volta” como estratégia de marketing. Injetando doses de repetição lírica e saudosismo brasilianista, o grupo faz em Amanhã é Tarde o equivalente dos discos londrinos de Caetano e Gil, no começo dos anos 70. Não seria mal cogitar alguns shows de volta. Nem que seja apenas para ouvir “Gravado no Rio” ao vivo.

Indie 25

Lista complicada, o critério definido para determinar o que é ou o que não é rock independente é curto e grosso: se tem dinheiro de empresa grande, não é indie. Assim, os altos e baixos do rock nacional no mercado de discos dão a tônica da produção independente nos últimos vinte anos. Até o começo dos anos 80, ser independente era uma atitude, um manifesto – como foram os discos da fase Racional de Tim Maia e a idéia original do selo de Luís Carlos Calanca, a Baratos Afins. Mas a explosão do rock na década de 80 praticamente extinguiu a produção indie, tamanha era a demanda das grandes gravadoras – e grupos independentes por definição musical tiveram seus discos lançados por majors. A estréia de Lobão, Cena de Cinema, de 1982, por exemplo é uma demo gravada em vinil. Nos anos 90, a chegada da MTV e o sucesso do Sepultura no exterior impulsionam o faça-você-mesmo e o rock independente vive o nascimento de um mercado que começaria a se organizar nos anos seguintes. O sucesso do plano Real, em 94, determina o futuro deste mercado: se por um lado abre a possibilidade de se adquirir tecnologia graças à paridade com o dólar, por outro exclui o elitismo musical do mercado de discos, voltado apenas para classes populares. Isto aumenta a produção caseira e equipa uma primeira geração de computadores que, graças à internet, passa a se comunicar com mais agilidade e para um público específico. Chegamos ao século 21 com uma produção madura e plural, disposta a conquistar o Brasil e o planeta.

Os 25 discos abaixo são as pedras fundamentais na formação de um mercado independente, tanto do ponto de vista comercial como artístico. Cada um deles marca uma etapa concluída, um novo patamar e uma novidade no complexo jogo do rock brasileiro indie, cada vez menos abaixo e mais ao lado do pop endossado por patrões abonados, mesmo aqueles lançados sob uma chancela “indie” (como o selo Plug da BMG, o Banguela da Warner, a Tinitus que era distribuída pela PolyGram ou o Chaos da Sony). Para facilitar a compreensão e não confundir a história, o foco fica apenas no formato rock, excluindo outros agentes cruciais para a formação do mercado independente (como hip hop, heavy metal, eletrônico e hardcore). Se não, era assunto para páginas e mais páginas…


1) Singin’ Alone – Arnaldo Baptista (1982)
Marco zero da produção independente como nós conhecemos, é o primeiro lançamento da Baratos Afins e o alerta “o sonho acabou” para a geração que cresceu à sombra dos Mutantes. Um novo rock estava começando a tomar conta do Brasil (à base do chopp e batata frita) e Arnaldo Baptista chorava as próprias mágoas ao piano, atormentado emocionalmente, com baladas cruas e muito rock’n’roll. Bem distante do sol carioca que começava a bronzear o rádio.


2) 3 Lugares Diferentes – Fellini (1987)
MPB maldita, cool wave, pós-punk, bossa nova, África, cult band, art rock… Conceitos que fervilhavam no underground oitentista se encontraram numa mesma banda. Formada pelos jornalistas Cadão Volpato e Thomas Pappon, o Fellini contava com a participação de Ricardo Salvagni para gravar seu álbum menos enigmático e mais, er, pop. Entre o rock europeu e a melancolia brasileira, eles sintetizavam sentimentos que anos depois seriam traduzidos em um único adjetivo: indie.


3) O Ápice – Vzyadoq Moe (1988)
Na Sorocaba pré-Wry, o clima europeu era mais alemão do que inglês. Culpa do noise dada do Vzyadoq Moe, performáticos orgânicos que partiam pra cima do público. Menores de idade e fartos de punk rock, abraçavam o drone, o cabecismo, o ritmo kraut e o industrial desplugado, especialmente na percussão ferro-velho. O Ápice vale seu título por optar pela independência, enquanto irmãos de sonoridade do grupo (o mineiro Sexo Explícito, os cariocas Black Future e Picassos Falsos) fecharam com a certeza do contrato com grandes patrões.


4) Cascavelettes (1988)
Antes de serem banalizados por um hit na novela Top Model, pelos mimos do superstarismo e muito antes do forróck boca-suja dos Raimundos, os Cascavelettes inauguraram a fase moderna do pop gaúcho, separando os contemporâneos do Liverpool e a geração Rock Grande do Sul como farinha do mesmo saco. Usando o palavrão com motivos rock’n’roll (o rock brasileiro só os usava com motivos punk, ressaca da Censura), o grupo era um misto de Ramones pornográficos com New York Dolls machistas e seu primeiro disco (lançado um ano antes do sucesso de “Nega Bom-Bom”) mostra a disposição para injetar algo mais do que energia no indie nacional. As demos da época, todas batizadas com o nome da banda, mantém o “nível”.


5) You – Second Come (1991)
Este é o único disco do selo Rockit!, do guitarrista da Legião Dado Villa-Lobos, que pode ser considerado independente – já que o sucesso underground que fez esgotar a tiragem inicial de 3 mil discos fez crescer o olho da inglesa EMI-Odeon, que abduziu a marca. A estréia do Second Come, influenciada diretamente pelo sussurrado rock inglês pós-Madchester e pelas convulsões noise pré-grunge do underground americano, abre a segunda fase do indie brasileiro que, devido à onipresença do instrumento, começa a ser definido, anglofonamente, de “guitar” (as duas pronúncias são permitidas).


6) Little Quail and the Mad Birds (1992)
Depois de tentar seguir os passos da geração Legião-Plebe-Capital (em vão, culminando na geração do seminal Rock na Rampa, em 1987), o rock de Brasília volta-se para dentro e a capital do Brasil começa a ebulir culturalmente. Disputando cabeça-a-cabeça o título de melhor banda com o Low Dream e o de melhor demo com o Oz (a excelente Trés Bien Mon Ami), o Little Quail ganha por não soar derivativo de ninguém (nem de My Bloody Valentine, nem de Pixies). A fita é uma ótima desculpa para caçar os registros sonoros do rock candango do começo da década, que vão da fase rock do Pravda aos primórdios dos Raimundos, passando pelas excelentes, e esquecidas, Succulent Fly e Sunburst.


7) Killing Chainsaw (1992)
São os piracicabanos do KC que colocam o rock do interior de São Paulo no mapa da década de 90. O LP homônimo, lançado pela loja de discos Zoyd e sampleando o anime Akira na capa, é o ponto inicial de uma geração que deu ao Brasil instituições célebres do underground, como a casa noturna Hitchcock (em Santa Bárbara d’Oeste), o zine Broken Strings, o festival Juntatribo, a rádio Muda e o estúdio Arenna (todos estes em Campinas), além de bandas que iam do punk pop do No Class ao samba-noise do Linguachula e o industrial nerd dos Concreteness. Além de iniciar a fase caipira do indie nacional, o Killing ainda se orgulhava de seu inglês brasileiro, com sotaque “tchu” em vez de “to” e sem brit-frescuras. O rock aqui é ligado na tomada e na distorção, de pai Sonic Youth e mãe J&MC.


8) Rotomusic de Liquidificapum – Pato Fu (1993)
O disco mais esquisito da gravadora mineira Cogumelo (que já contava com esquisitices como o disco sub-Red Hot do DeFalla ou o caos sônico do Holocausto) também é o disco de estréia do Kid Abelha dos anos 90. Estranho, não? Que nada. Estranho é ouvir a versão speed para “Sítio do Picapau Amarelo” ou um hino mosh baptchura cuja citação da Unimed levou o grupo a tocar no comercial do plano de saúde. E que tal o medley esquizofônico que batiza o disco, que cita, sem pudor, os Flintstones, Kiss, baião, funk metal e beats eletrônicos? Muito mais John do que Fernanda Takai, é o disco do trio mineiro que os fãs de Mike Patton mais gostam. Com razão.


9) Scrabby? – Pin Ups (1993)
Lançado pela Devil e produzido por João Gordo, o terceiro (ou segundo, se não contarmos o LP do projeto Gash) disco dos pais do indie 90 é também seu disco mais sombrio e pesado. Fora as referências inglesas, entra o lado mais caótico e, hm, “visceral” da banda. Gravado com sua formação clássica, é uma mistura de Funhouse (dos Stooges) com Berlin (do Bowie). É o ápice das guitarras de Zé Antônio. “Acho que esse foi o disco que mais teve briga no estúdio”, lembraria o vocalista Luís Gustavo anos depois”, eu nunca vi tanta gente chorando, berrando, a Alê chorando num canto, o Marquinhos no outro”.


10) Mod – Relespública (1993)
Curitiba tem a péssima reputação de não produzir registros sonoros à altura das apresentações ao vivo de suas bandas. Discos e fitas funcionam mais como “guias” sobre o que esperar de determinado grupo do que reproduções in vitro de suas performances instantâneas. Da mesma forma, a cidade não possui rock de laboratório, aquele feito para viver em estúdio. Talvez isto explique o paradoxo fundamental da capital do Paraná: quanto mais bandas a cidade produz, menos elas se destacam em nível nacional. O primeiro compacto da Relespública (ainda com o enfant terrible Daniel Fagundes, vocalista, morto aos 16 anos) pertence à primeira safra do indie rock da cidade, custeado pela gravadora Bloody que pertencia ao mesmo JR que é dono do lendário club 92 Degrees. Com três faixas (“Capaz de Tudo”, “Preciso Pensar” e “Quem é Que Entende o Mundo?”), o vinil fala mais do rock de Curitiba do que todas compilações lançadas em seu nome.


11) Nunca Mais Vai Passar o Que Eu Quero Ver – Doiseu Mimdoisema (1994)
A influência que a Graforréia Xilarmônica, uma das dissidências dos Cascavelettes, teve sobre o rock gaúcho é muito maior que o séquito de fãs que o grupo preserva até hoje. Graças ao improvável gosto musical de seus líderes, Frank Jorge e Marcelo Birck, despertou-se no pop riograndense o prazer em redescobrir a Jovem Guarda, encravada na memória genética do estado. Esta redescoberta trombou irresistivelmente com os prazeres de uma recém-descoberta paixão gaúcha, o experimentalismo no estúdio em tempos de gravação caseira. Diego Medina fez a fita para um amigo de farra, mas a contagiante “Epilético” pulou do som da sala de estar para as ondas do rádio e virou hit local instantâneo. Medina continuaria suas experiências pop no futuro (Grupo Musical Jerusalém, Video Hits, Senador Medinha), mas sem conseguir reencontrar a ingenuidade da primeira fita, que está para o rock gaúcho atual como Angel Dust, do Faith No More, está para o novo metal.


12) Uh-La-La – Dash (1995)
Antes de provocar suspiros com seu baixo Danelectro a bordo dos Autoramas (e ao lado do ex-Little Quail Gabriel Thomaz), Simone do Vale era a líder de um supergrupo indie carioca. Gritalhona e com jeito de moleque, ela era uma das guitarrista do grupo, ao lado de Diba Valadão (na outra guitarra), Formigão (que depois entrou para o Planet Hemp, no baixo) e Kadu (ex-Second Come, na bateria). O hit “Sexy Lenore” transformou a demo Sex and the College Girl num hit do underground do Rio e fez com que o grupo fosse sondado pela misteriosa gravadora Polvo, que lançou o único CD da banda, pra ninguém. Com a capa desenhada por David Mazzuchelli, o disco passou por uma série de empecilhos que o tornaram item de colecionador. O ano era 1995, as grandes gravadoras tinham dado as costas para o rock, as pequenas perdiam ilusões de vendagens altas e vários picaretas apareceram no meio da história. O disco do Dash é apenas um dos muitos exemplos de uma geração pega com as calças na mão.


13) 100 Km c/ 1 Sapato – Lacertae (1995)
Ao mesmo tempo, o Lacertae, no Sergipe, abria uma em muitas possibilidades. Depois da seca de 1995, o mercado independente passou por uma brusca horizontalização, e sua pluralidade tornava-se sua principal qualidade. Assim, bandas de lugares sem tradição passavam a ganhar espaço no cenário, quebrando o eixo Rio-SP-BH-Brasília-PoA-Recife que já havia quebrado o RJ-SP original no começo da década. A cena começa a fragmentar-se não apenas em lugares diferentes (cidades como Goiânia, Londrina, Salvador, Fortaleza, Florianópolis, Vitória e Maceió reivindicam na marra seu próprio espaço, nos anos seguintes) mas em gêneros improváveis. Se a MTV e o Sepultura criaram um hiato noise/guitar/heavy com bandas cantando em inglês e tentando, sem sorte, o mercado exterior, a fita de estréia do Lacertae é o elo perdido entre o pop dos anos 90 e o experimentalismo dos dias do Vzyadoq Moe. Hendrix, discursos concretos e uma bateria com berimbau também mostravam que o Nordeste estava em plena ebulição artística depois do mangue beat.


14) Carbônicos – The Charts (1996)
Com a fragmentação da cena independente, São Paulo entrou numa onda retrô semelhante à gaúcha, disposta a resgatar valores sessentistas a um pop perdido entre a rádio e o anonimato. Antecipando a onda kitsch que veio com Austin Powers e o box-set do disco Nuggets, a cena paulistana passou por uma estilização visual e sonora que mais tarde seria referida, de forma irônica, como a cena “churly”. Os responsáveis pela popularização desta nova fase seria o grupo comandado por Sandro Garcia, que teve seu único disco lançado pela loja Suck My Discs dos jornalistas/músicos Alex Antunes e Celso Pucci (outra ponte dos anos 90 com o cult rock dos 80). Garcia, dono do famoso estúdio Quadrophenia, mais tarde fundaria o Momento 68 com o vocalista da banda gaúcha Lovecraft, Plato Divorack, selando assim a paixão de São Paulo e Porto Alegre pelos anos 60. (Plato aliás é a grande ausência desta lista, talvez por nenhum disco sintetizar toda a complexidade do artista).


15) Learn Alone Or Read The User’s Manual – Sleepwalkers (1996)
Aqui vamos ter motivos de sobra para reclamações. Afinal, muitos vão falar dos tempos do baterista Farmácia ou da clássica Sick Brain in Sue’s Coffee, gravada um ano antes, quando muitos sequer reconhecerão a presença da banda. O fato é que os Sleepwalkers foram a melhor banda de indie rock, em todos os sentidos, que o Brasil já teve, deixando para trás concorrentes de peso como os goianos Grape Storms, a carioca PELVs e o Grenade de Londrina. A sonoridade lo-fi, o tratamento de guitarras, o senso melódico, os refrões, o apelo pop – as qualidades do grupo catarinense podem encher parágrafos e mais parágrafos. Mas além de sua qualidade, sua importância se dá por tirar o pop catarina da vibração riponga de bandas como Phunky Buddha e Dazaranhas. Depois deles, vieram o Feedback Club (da ex-sleepwalker Sabrina), o Superbug, os Pistoleiros, o Pipodélica e as gravadoras Low Tech e Migué Records, dando força à cena ilhéu de Floripa.


16) Baladas Sangrentas – Wander Wildner (1997)
Luminar do punk brasileiro para as massas dos anos 80, o ex-vocalista dos Replicantes seguiu os passos da primeira safra dos anos 90 (comprada pelas majors) e o moldou para o underground. Como os Raimundos tinham o forró, o Planet Hemp tinha a maconha e o mangue beat, os caranguejos; Wander inventou uma máscara para facilitar sua absorção pelo mercado – e com o rótulo “punk-brega” vendeu-se para uma nova geração ao mesmo tempo em que amadurecia sua personalidade pública. Mas, mais importante, a carreira solo do velho WW era uma prova cabal que o rock independente pouco tem a ver com juventude ou faixa etária.


17) Menorme – Zumbi do Mato (1997)
O Zumbi do Mato é o som que Fausto Fawcett e Arrigo (ou Paulo) Barnabé fariam juntos se tivessem alguma afinidade. Mas, mais do que isso, é o ponto de convergência de diversos aspectos do pop carioca, representados por diversas instituições. Há o humor doentio do Gangrena Gasosa, a explosão cênica de Piu-Piu & Sua Banda, a podreira das primeiras fitas do Pólux, as gravadoras Tamborete (do jason Leonardo Panço) e Qualé Maluco (dos planet hemp B-Negão e Formigão), a repetição do Stellar, o choque de Rogério Skylab e o som metal da segunda vinda do Second Come. Além disso, o grupo continua o legado experimental retomado pelo Lacertae que resultou na safra de vanguarda da virada do século, com nomes como Objeto Amarelo, os Jersssons (São Paulo), Os Legais (SC) e Vermes do Limbo (Londrina).


18) A Sétima Efervescência – Júpiter Maçã (1998)
O disco de estréia do ex-cascavelette Flávio Basso é um passo adiante nos conceitos vendidos pelos Charts e por Wander Wildner. Rock adulto, retrô e psicodélico, A Sétima Efervescência sagrava a maturidade da mesma geração que havia tomado a porta-na-cara das gravadoras depois da efervescência do biênio 93/94 e a independência do formato perseguido pelas gravadoras, sem deixar de soar pop, brasileiro e cantando em português e inglês. É o primeiro blip no radar de um mercado que viria, em menos de um ano, a galinha de ouros do trio sertanejo-axé-pagode começar a dar com os burros n’água.


19) Chora – Los Hermanos (1999)
A segunda fita do quinteto Los Hermanos escancarava um pop estritamente radiofônico que foi forjado longe do universo do mercado fonográfico. O grupo liderado por Marcelo Camelo era a continuação do trabalho de uma geração de bandas cariocas que misturavam ska, funk, reggae e samba (nomes como Los Djangos, Acabou La Tequila e, mais tarde, Pedro Luís & A Parede). Mas o grupo ia além e se alinhava ao ecletismo chique de bandas de sua geração, como 4-Track Valsa, Vibrossensores, Vulgue Tostoi, entre outros. Fora os maneirismos apaixonados (que levaram a banda receber rótulos como romanticore e pop brega), a fita mostrava que as possibilidades cogitadas por Júpiter Maçã poderiam ser exploradas a fundo, tanto artística quanto comercialmente. Mas o mercado, acostumado com seu próprio toque de Midas, comprou a banda e forçou “Anna Júlia” a fazer sucesso, overdosando o público do que poderia se tornar os Paralamas do século 21 (e ainda pode, apesar de tudo).


20) Astromato (1999)
Continuação dos experimentos noise e industrial da época do Waterball (92-95), o Astromato era filho direto do Weed, banda de pop guitarreiro britânico que, brincando com as palavras, passou a compor em português e se deu bem. Sua primeira fita era mais um degrau na escalada que o indie brasileiro dava rumo à sua auto-suficiência artística. Se gaúchos e cariocas ajudavam o rock a perder o jeito de moleque, os campineiros explicavam que algumas qualidades (como sensibilidade e timidez) não pertenciam à adolescência. Além disso, a dupla de guitarras Armando e Pedro tramavam texturas sônicas à moda das bandas inglesas que tanto influenciaram o indie no começo dos anos 90 (e que ainda repercutiam, graças a bandas como os mineiros Vellocet, o carioca Cigarettes e os catarinenses Madeixas). Aos poucos, o ciclo vai se fechando.


21) De Luxe 2000 – Thee Butchers’ Orchestra (1999)
Cru e direto, o TBO é a melhor banda de rock’n’roll brasileira na ativa e sua existência se deve à dissidência garageira que rompeu com o indie no meio dos anos 90. Seu núcleo central era o trio da gravadora Ordinary (a produtora Deborah Cassano, seu marido Marco Butcher, ex-Pin Ups, e o guitarrista e produtor Adriano Cintra), que, além dos Butchers’ foi responsável pelo lançamento de bandas como Ultrasom (de Adriano), Red Meat, Spots, Grenade, entre outras. Mais do que agitar o underground com duas guitarras e uma bateria, o Butchers’ está ligado à fase de ouro do indie anos 90, quando o rock brasileiro começou a conversar com os gringos, sem passar pelos veículos oficiais.


22) It’s An Out of Body Experience – Grenade (1999)
O Grenade era o próximo patamar. Fruto dos experimentos lo-fi do ex-Killing Chainsaw Rodrigo Guedes, o grupo nascia em Londrina e logo se tornava um dos maiores nomes do indie nacional. A repercussão se dava graças à sensibilidade de Rodrigo, pai de riffs memoráveis, melodias pop ao extremo e pirações em estúdio. O som ia do rock clássico ao hardcore, passando por folk e indie rock. Lançado no exterior, Out of Body Experience poderia é a conclusão lógica do longo passeio que o rock independente fez durante a década de 90.


23) Brincando de Deus (2000)
O terceiro disco destes baianos deveria ter o título que Experience, do Grenade, levou. Afinal, seria lançado um ano antes e produzido por Dave Friedmann (Flaming Lips, Mercury Rev, Mogwai) caso todo seu equipamento e pré-produções não fossem perdidos num incêndio. O grupo se refez e, ao lado do talentoso produtor e tecladista André T. (responsável pela sonoridade de novos baianos como Rebeca Matta e a banda Crac!), gravou seu álbum definitivo, imbatível. Um disco que poderia ser lançado no mercado exterior sem dificuldades e que, apesar da anglofilia, é essencialmente brasileiro.


24) Peninsula – PELVs (2000)
Completando dez anos de banda e dez anos do selo carioca Midsummer Madness, a PELVs faz um disco igualmente robusto como o do Brincando de Deus, mas cheio de ganchos pop e melódicos. Uma obra-prima do indie nacional, Peninsula soa como todos os independentes querem soar: profissa, autêntico, despreocupado e livre, como se o mercado de discos brasileiro permitisse isto. Se ele não permite, a deixa fica para o indie.


25) O Manifesto da Arte Periférica – Wado (2001)
Além de coroar a recente produção de Maceió (a saber, Varnan, Mopho e Sonic Junior), o disco de estréia do ex-Ball Oswaldo Schlickmann é o auge da produção independente brasileira dos últimos 20 anos. Tem todas as qualidades dos discos citados nesta lista, além de falar em português, compor letras certeiras e experimentar à vontade no estúdio. Se chegamos até aqui com este nível, daqui pra frente é só crescer.

Não lembro pra quem eu escrevi esse texto… Acho que foi pra Zero.