Fecharam a Rádio Muda!
Antes do carnaval, uma péssima notícia para a liberdade de expressão no Brasil: a Rádio Muda, da Unicamp, foi fechada pela Polícia Federal na calada da noite.
Para quem não sabe do que se trata, a Muda era uma das principais rádios livres do Brasil, um fenômeno pouco comum por aqui, em que o conceito de rádio não-comercial quase sempre é confundido com o de rádio comunitária ou o de rádio pirata. A Muda poderia se encaixar no rótulo de comunitária pois era a emissora da Unicamp e lidava apenas com o universo relacionado ao campus campineiro, e de uma forma bem ampla, porque era uma rádio gerida, ouvida e produzida pelos próprios alunos, sem qualquer ingerência da universidade como instituição. Localizada na base da fálica torre que é a caixa d’água do campus, em frente ao DCE, à Biblioteca Central e ao refeitório principal, a Muda não se contentava em tocar programas feitos por alunos – e sempre esbravejava e se orgulhava disso.
Durante quase duas décadas, sua programação espalhava-se pelo bairro de Barão Geraldo, distrito onde fica localizada a Unicamp, como uma projeção radiofônica do zeigeist do campus, com toda sua pluralidade de idéias, gostos e ideologias. Festas, festivais, protestos e informações que interessassem o corpo discente eram sugeridas, apresentadas e oficializadas através da programação da rádio, que funcionava num esquema de coletivo radical – ou todos eram a favor de algo ou aquilo não saía do papel. Não havia maioria nem voto de consenso, era tudo ou nada. O que dava uma dinâmica para a rádio que inevitavelmente saía das reuniões e ia para as cantinas e corredores em frente às salas de aula. As únicas ressalvas feitas ao teor da programação eram táticas – relativas aos lados comercial (a rádio não tinha anunciantes) e político (um mínimo de partidarismo era suficiente pra tirar um programa do ar), eram regras que nunca precisaram ser ditas para serem obedecidas. Faziam parte da natureza da rádio.
O fechamento da Muda foi notícia de rodapé num Jornal Hoje antes do carnaval, que jogou a rádio – cujo alcance mal saía da região da Unicamp – na vala comum das emissoras ilegais que interferem nas transmissões entre vôos e torres de comando em aeroportos, conhecida desculpa para terminar os serviços destas rádios não-oficiais. Os mudeiros – como os ativistas que compõe o coletivo se autodenominam – preferiram não se pronunciar sobre o fechamento e apreensão dos equipamentos e a universidade, que institucionalmente nunca foi grande fã da rádio, também não comentou a situação.