Entrei no Estadão no mesmo ano em que saí da Trama. O Trama Universitário, projeto da gravadora em que eu trabalhava, encerrou suas atividades em fevereiro de 2007 e dois meses depois o Guilherme Werneck me chamava para ocupar sua vaga como editor-assistente do Link Estadão, o caderno de cultura digital criado três anos antes por Ricardo Anderaos, que substituiu o antigo caderno de Informática do jornal. Entrei no Link quando ele ainda era um caderno de avaliação de produtos, numa época em que o Orkut era soberano, quando a economia dos aplicativos ainda engatinhava, no mesmo ano em que Steve Jobs lançou o iPhone. Dois anos depois, eu me tornaria o editor do caderno, quando comecei a finalmente, botar as mangas de fora e mostrar como poderia ser um caderno de tecnologia e cultura digital na segunda década do século 21. Junto ao novo cargo veio a coluna Impressão Digital, que começou aos domingos no Caderno 2 e que continuou mesmo após a minha saída do Link, em outubro. Destes cinco anos no Limão, não custa lembrar a satisfação que foi trabalhar num dos principais veículos do jornalismo brasileiro (o mesmo que publicou Os Sertões, que brigou contra a censura na ditadura militar e que declara o voto no dia da eleição – e que também foi o mesmo lugar em que publiquei meu primeiro frila pago, quando Syd Barrett completou 50 anos, em 1996), cujo clima de tranquilidade e franqueza sempre dominou seus corredores (a não ser em períodos tensos específicos, como Copa do Mundo, eleições e passaralhos). Mas a principal recordação destes cinco anos trabalhando ao lado da Marginal Tietê é, sem dúvida, o monte de amigos que fiz naquela redação, seja entre meus amigos e colegas do Link (todos vocês, vocês sabem quem vocês são – não preciso citá-los mais uma vez), até a vizinhança com as turmas do Divirta-se, do Paladar, dos tradutores, da arte, do portal, do pessoal do dia e de todos que conheci nestes anos todos. Lembranças que também se perdem entre as múltiplas referências internas, como os almoços no Puras, as idas à rádio, as noites que terminavam com Seu Matos, os gritos de “Thunder!” do Santana (que confundia o meu HAL 9000 de descanso de tela com o olho de Thundera), as travessuras do Thiagueira, as idas ao Brooklyn ou ao Central Park para fumar um cigarro, as risadas com a Denise. 2012 viu o fim deste ciclo, que foi bem importante para o jornalismo de tecnologia no Brasil (veja o que aconteceu com a Info Exame e o Folha Informática depois de 2009) e para mim, que consegui atingir um novo parâmetro em minha carreira profissional – e juntar tantos amigos nesta jornada. Foi incrível, valeu!
A última encarnação do Link que comandei (em sentido horário a partir da esquerda): eu, Camilo, Thiago, Murilo, Vinícius, Carol, Filipe e Tati. sdds glr :~
Minha coluna de despedida da edição do Link. A coluna segue no caderno, toda segunda, mas desde a sexta-feira passada eu não frequento mais os corredores do sexto andar do prédio ocre perto da ponte do Limão na Marginal Tietê. Foi foda – saio com dorzinha no peito por perder determinadas convivências diárias, mas com a sensação de dever cumprido. Depois eu escrevo mais sobre isso…
Jornalismo, tecnologia, web e o que eu tenho a ver com isso
Sou feliz de trabalhar com quem trabalhei
Foi num jornal diário que comecei minha carreira e tomei gosto pelo jornalismo. A redação em que diferentes egos e perspectivas conversam e se chocam é um ambiente fantástico, circo-hospício seríssimo. Os assuntos mais pedestres trombam com as Grandes Questões da Humanidade, tudo correndo contra o relógio do fechamento, segundos contados para terminar o texto, chegar a foto, tratar a imagem, exportar a arte, pensar na página.
A primeira redação em que trabalhei tinha acabado de aposentar as máquinas de escrever e as trocado por PCs, mas não havia e-mail nem internet. Filmes eram revelados. Fumava-se na redação. Parece Mad Men, mas era 1994.
Lembro do primeiro PC com acesso à internet na redação, abandonado na sala de produção, ao lado dos computadores com matérias das agências de notícias, faxes e até uma máquina de telex. Eu era o único jornalista que me dedicava mais do que meia hora online, fuçando sites, listas de discussão e e-zines, antes de ter acesso à web em casa. Não à toa instiguei o próprio jornal a ter sua própria página na rede, ainda em 1996.
Mudei para a redação do jornal concorrente e tornei-me editor do caderno de cultura no mesmo ano em que o Napster popularizou o MP3. Foi quando percebi que internet não era só tecnologia – era cultura. Que baixar MP3 era o primeiro indício da transformação que o meio digital trazia. Não era só uma forma nova de “consumir cultura”, mas uma nova camada de experiência que atravessaria nosso cotidiano em breve.
E aconteceu: vieram os blogs, o Google cresceu, depois o YouTube, as redes sociais e o celular passou a acessar a internet. Passei por outras redações e cheguei a esta do Estadão no mesmo ano em que Steve Jobs mostrou seu iPhone. Novamente num jornal diário, mas o digital se impunha: fatos podiam ser checados online, fontes e personagens podiam ser descobertos em redes sociais, repórteres mandavam informações por celulares, todo mundo tinha e-mail, uma parte (pequena) da redação tinha blog. Ainda havia a máquina de fax e não era possível fumar no computador, mas ainda havia o fumódromo.
Quando comecei no Link, ainda editor-assistente, era relativamente fácil separar quem cobria que área no caderno. Mas os assuntos se misturaram e, ao ser promovido a editor em 2009, implodimos essas barreiras. Como passamos a escrever tanto para um caderno semanal quanto para um site diário – em vez de separar quem é do impresso com quem é do online. A mesma equipe também assumia o caderno em outras plataformas, que experimentou com as redes sociais antes do próprio jornal ter suas contas. Falamos do Twitter, do Marco Civil, do Facebook, da pirataria política e de impressão 3D antes de esses assuntos entrarem na pauta brasileira.
Mas a melhor coisa nestes cinco anos e meio de Link, que terminam nesta edição (estou deixando o Estadão esta semana) foi estar junto a pessoas ótimas, amigos dispostos a encarar desafios e a aprender, sempre de bom humor. Pessoalmente é a principal dívida que tenho com o jornal: ter trabalhado com pessoas tão fodas que vocês conhecem pelo nome e sobrenome, mas que me refiro como amigos – Filipe, Tati, Camilo, Murilo, Carol, Vinícius, Thiago, Helô, Carla, Rafa, Fernando, Ana, Fred, Rodrigo, Bruno, Ju, Lucas, Gustavo, Marcus. Juntos, transformamos não apenas o suplemento de tecnologia em um caderno central para o jornal como aceleramos a mudança na cobertura de tecnologia no Brasil. Além de termos aprendido e nos divertido muito, neste processo.
Quis o destino que meu último Link viesse na mesma semana em que o primeiro jornal que trabalhei acabou; o Diário do Povo, de Campinas, parou de circular no primeiro domingo deste mês. Mas isso não significa que o impresso irá acabar – estamos começando a ver uma transformação bem interessante no que diz respeito ao jornalismo, à tecnologia e, claro, à cultura humana. Vamos ver o que virá.
Saio da redação, mas sigo nestas páginas. A Impressão Digital segue aqui, toda segunda. Foi muito bom, aprendi muito. E não se esqueçam: só melhora.
Jotabê entrou numa pilha de encontrar o mestre enquanto ele estava no Rio de Janeiro – e acabou encontrando-o. E de touca!
Pouco antes das 16h, saída pela esquerda, já abastecido de uma refeição que custava metade do couvert do Fasano, tomando o rumo da Avenida Nossa Senhora de Copacabana, para o táxi final antes do show. Ao menos no show ele dará as caras, e a torcida é para que essa noite promova novamente um encontro com a sua música mutante que inaugurou uma nova perspectiva para a arte contemporânea. “Aquele cara de touca e casaco ali parece o Dylan”, ela diz, desencanadamente. Só o que me faltava, um sósia a essa hora, eu pensei. Mas aí o sujeito se virou para a avenida e o sangue gelou nas veias.
“A máquina! A máquina! A máquina! É ele! É ele MESMO!” Os segundos pareciam horas, a avenida parecia mais larga, e Dylan olhava para um lado e para o outro sem se decidir, parado na frente da banca de jornais da Rua Inhangá. “No direction home”, como sempre. Se for para o outro lado, vai pegar mal correr atrás dele, pensei. Mas aí ele veio para o nosso lado, tranquilamente, como se fosse parte da paisagem, sem causar nenhuma curiosidade dos velhinhos e dos cães de estimação de Copacabana. Caminhando resoluto, com as mãos nos bolsos. Fez uma careta quando viu a máquina fotográfica, mas não parou, continuou andando na direção da lente, e passou por nós aceleradamente.
Continua lá.
“Estava tudo acertado para tocarmos no primeiro semestre, mas tivemos problemas de agenda. Mas nos vemos no segundo, sem falta”, disse Dan Auerbach ao Estadão. SWU ou Planeta Terra? Eu ainda acho que o Terra vai de Pulp…
Escrevi sobre a saída de Jobs do cargo de CEO da Apple no caderno de Economia dessa sexta, no jornal.
É preciso avisar que Steve Jobs não morreu
“News of my death has been greatly exaggerated”
A notícia da aposentadoria de Steve Jobs pegou todos no susto. Sua empresa, criada numa garagem californiana no meio dos anos 70, foi apontada há pouco como a mais valiosa do mundo. A Apple se beneficiou da recente crise econômica que desvalorizou os papéis nos EUA e fez que a antiga líder, a Exxon Mobil, caísse momentaneamente para o segundo posto.
Não é só isso: com a consolidação de seu iPad no mercado, a Apple não apenas ditou um parâmetro para o mercado – ainda sem concorrentes à altura, apesar das inúmeras tentativas –, como corre o risco de reinventar o computador pessoal mais uma vez, se seu tablet aposentar de vez o desktop.
E, de uma hora para a outra, vem a notícia de sua aposentadoria inesperada. Principalmente porque, depois de pedir afastamento por problemas de saúde, ele voltou à ativa, mesmo que por exigência do conselho da empresa, para anunciar o novo modelo do iPad. Parecia que em pouco tempo ele voltaria à ativa de fato e, em breve, revelaria mais um novo produto, além das já anunciadas – embora ainda especuladas – versões do iPhone (a quinta) e iPad (a terceira).
O impacto da notícia, por mais importante que seja, teve um tom fúnebre. Há até fãs da marca fazendo vigília em Apple Stores, como se o criador da empresa tivesse realmente falecido. “Cadê seu Deus agora?”, perguntam engraçadinhos na internet, provocando os fãs dos aparelhos Mac.
Mas a aposentadoria de Jobs é o ponto final em sua carreira? A não ser que seu estado de saúde seja realmente crítico (o que não descarta a possibilidade de sua morte acontecer entre a redação deste texto e sua publicação), a notícia da última quarta é apenas mais uma das inúmeras adversidades que Jobs enfrentou em sua biografia.
Para começar, não é a primeira vez que ele sai da Apple – isso aconteceu em 1985, quando pediu demissão da própria empresa que criou após uma disputa de poder interna. E não é o primeiro problema de saúde que enfrenta – venceu um câncer de pâncreas no início da década passada e passou por um transplante de fígado em 2009.
Não é à toa que a maioria das biografias escritas a respeito dele têm um tom de autoajuda e de superação; motivo semelhante de suas aparições terem tom religioso. Fui a um desses cultos, quando ele apresentou o finíssimo Macbook Air, em janeiro de 2008, em San Francisco – que nem é dos principais aparelhos de sua empresa. Mas a simples presença de Jobs no palco era o suficiente para encantar seus fãs (não à toa, carisma ele tem de sobra) e, logo depois, fazer as ações da empresa subirem. Deixar a Apple, portanto, não é o fim.
Do blog do Chacra:
Quando um ato de terrorismo acontece no Ocidente, sei que meus amigos muçulmanos ficam torcendo desesperadamente para que o autor não seja algum seguidor da mesma religião deles. Sabem que serão associados à ação no outro dia quando forem ao trabalho, à universidade ou à academia. Alguns precisarão esconder os nomes ou adotar apelidos “americanizados”.
Esta espécie de generalização pode ser resumida em um ato de punição coletiva que recebeu destaque nesta semana nos EUA. Depois do 11 de Setembro, um americano matou duas pessoas (um muçulmano e um hindu, mas imaginava que ambos fossem seguidores do islã) e feriu outro (também muçulmano) para se “vingar” dos atentados, por mais que as vítimas nada tivessem a ver com a Al Qaeda. Nesta semana, o autor foi executado no Texas. Ironicamente, até o último minuto, o muçulmano que foi ferido por ele e os parentes das outras duas vítimas, com o apoio do Conselho das Relações Islamico-Americanas, tentaram impedir a execução do islamofóbico. Segundo eles, o assassino deveria ser perdoado pois ninguém deve ser punido com a morte. Uma aula de humanidade em uma nação desenvolvida onde ainda existe a pena capital.
Caso um muçulmano estivesse envolvido nos ataques terroristas de ontem, algumas pessoas poderiam ser alvos de revides em Oslo, como ocorreu no Texas dez anos atrás. E extrema direita da Noruega se fortaleceria justamente pelo discurso islamofóbico. Os muçulmanos seriam vistos como inimigos neste país, por mais que muitos deles sejam nascidos na Noruega, falem a língua e tenham orgulho de sua nação.
Barra.
Escrevi pro Divirta-se, do Estadão, sobre a expectativa para o show do Jon Spencer semana que vem.
Da máquina do tempo
Quando o Jon Spencer Blues Explosion se apresentou no Brasil pela primeira vez, não fui. Era uma das minhas bandas favoritas dos anos 90, mas uma confusão com agendas e horários me fez perder um show que, pelo que disseram, trouxe uma banda mais densa e menos elétrica do que a que conhecíamos. Seu líder ostentava uma barba pesada que fugia do visual rock’n’roll clean e bruto que caracterizava o som do trio. Por isso, quando fui vê-los ano passado no meio do festival de 21 anos da gravadora Matador, em Las Vegas (na festa do meu casamento), não esperava muita coisa – daí a surpresa ao ver um Jon Spencer em 220 volts, teletransportado direto de 1995. O outro guitarrista, Judah Bauer parece mais velho e o baterista Russell Simins engordou uns bons quilos. Mas, no palco, Spencer encarna um Mick Jagger utópico. Vê-los no Bourbon será genial.
O Brancatelli fez uma matéria sobre como os aplicativos feitos a partir de dados públicos podem facilitar a vida da cidade e do cidadão no Metrópole de quinta-feira – e me pediu para dar uma força e falar do contexto mais amplo desse cenário.
Dados abertos: em prol da qualidade de vida
A internet, para muitos, vem como uma ameaça. Afinal, tanto o antigo CEO do Google Eric Schmidt, quanto o dono do Facebook, Mark Zuckerberg, já avisaram que a privacidade acabou. A WikiLeaks de Julian Assange paira sobre a cabeça do status quo com a possibilidade de desvendar segredos bem guardados a qualquer minuto. Hackers ativistas do grupo Anonymous avisam: “Não tentem consertar suas duas caras escondendo uma delas. Em vez disso, tentem ter só um rosto – honesto, aberto.”
Há uma mudança drástica, sutil e otimista no meio dessa paranoia. Afinal, ela requer mais dados abertos para a maioria das pessoas, transparência de governos, empresas e, por que não, do cidadão. E esses dados podem melhorar ainda mais a qualidade de vida das pessoas, principalmente em uma cidade como São Paulo.
Imagine se todos os motoristas pudessem dizer onde estão seus carros? Isso tornaria mais fácil a localização de engarrafamentos. E se pudéssemos detectar mais facilmente pontos de alagamento na época de chuvas? Ou acompanhar o orçamento de obras públicas desde o início? O mundo pode melhorar – e bastante.
Em entrevista exclusiva ao Estadão de hoje:
Há alguma reflexão sendo feita de que o Brasil seria um bom lugar para instalar algumas de nossas operações. É um país grande o suficiente para ser independente da pressão dos EUA, tem força econômica e militar suficiente para fazer isso. E não é um país como China e Rússia que não são tão tolerantes com a liberdade de imprensa. Talvez o Brasil seria um bom país para que coloquemos parte de nossas operações.
Vale à pena ler a íntegra da entrevista, em que ele ainda menciona o blog Falha de S. Paulo, fala de Lula, Dilma e sobre as primeiras vozes pedindo literalmente sua cabeça – que não vêm de um país oriental ou de terceiro mundo, mas da Fox News.