Entre o ritmo e o verbo

, por Alexandre Matias

Quando Nath Calan me explicou a ideia que estava propondo para a primeira das duas apresentações no Centro da Terra seria um concerto de música cênica, apresentando obras que a aproximaram desta escola musical, mencionou os trabalhos que equiparavam timbres de percussão com fonemas, gestos com unidades de ritmo e como isso misturava-se com textos, que também apresentaria enquanto desdobrava em seus instrumentos de percussão: um vibrafone, uma percuteria, uma bateria e o próprio corpo. Mas o impacto dos dez primeiros minutos, quando quase em silêncio, atravessou as duas obras que a trouxeram para este universo (“Silence”, do músico e cineasta belga Thierry de Mey, que gritava sem som que “o silêncio deve ser”, e “?Corporael”, do trombonista e compositor francês Vinko Globokar) e suspendeu até a respiração de todos os presentes, que embarcaram em sua proposta num arrebatamento cênico promovido apenas por uma artista e seu próprio corpo, numa apresentação que estava entre a performance e as artes cênicas, mas transpirava música. E dali em diante, Nath estava com o jogo ganho, percorrendo outros momentos igualmente mágicos, como “Toucher”, também de Globokar, em que um texto da peça Vida de Galileu, de Bertolt Brecht, era lido em francês enquanto cada um de seus fonemas era associado a um timbre respectivo entre os muitos tambores à sua mão. Ao vibrafone, percutiu “A Última Curva”, de Martin Herraiz, para depois percorrer o texto “Lisboa Revisitada”, de Fernando Pessoa, acompanhado do solo de bateria escrito por Moisés Bernardes, voltar ao vibrafone para mostrar sua “Um Pouco de Stela”, escrita a partir de textos de Stela do Patrocínio, e mostrar um texto que leu num livro infantil para seu filho e que transformou-se em “Terra”, tocada enquanto percutia uma cabaça e batia em garrafas e formões pendurados à sua frente. E encerrou a apresentação com dois momentos pessoais. Primeiro ao musicar o texto “Subalternidades do Atlântico Sul”, escrito por seu companheiro Danislau TB (também integrante do Porcas Borboletas, que está voltando!), e depois ao mostrar seu próprio texto musicado em percussão, “Falo”, que puxou mais uma vez à bateria. Uma noite mágica.

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