Sem avisar ninguém, o grupo indie norte-americano Deerhoof lançou Love-Lore, um impressionante exercício em que enfileiram quarenta e três músicas alheias em trinta e cinco minutos, misturando versos, riffs, melodias, solos, grooves e efeitos sonoros ao superporem pedaços de clássicos do rock, hits new wave, temas de seriado, experimentos de vanguarda, hits pop, trilhas de filmes e obras eruditas, misturando Velvet Underground, Sun Ra, Caetano Veloso, Beach Boys, Baden Powell e Vinícius de Moraes, Police, Gary Numan, John Williams, Parliament, Silver Apples, Ennio Morricone, B-52’s, e muito mais. De tirar o fôlego – a bula com todos os nomes das músicas vem abaixo:
Ornette Coleman – “in All Languages”
J.d. Robb – “Excerpt from Spatial Serenade”
Voivod – “Macrosolutions to Megaproblems”
Earl Kim – “Earthlight”
Stu Phillips – “Knight Rider”
Raymond Scott – “Ohio Bell”
Mauricio Kagel – “Music for Renaissance Instruments”
Eddie Grant – “Electric Avenue”
Gary Numan – “Cars”
Karlheinz Stockhausen – “Kontakte”
The Beach Boys – “Wonderful”
Gerald Fried – “Star Trek: Balance of Terror”
Pauline Oliveros – “All Fours”
Paul Williams – “Rainbow Connection”
James Tenney – “for Ann (rising)”
Silver Apples – “Oscillations”
The Police – “Driven to Tears”
Kraftwerk – “We Are the Robots”
John Williams – “Close Encounters of the Third Kind”
Morton Feldman – “Patterns in a Chromatic Field”
Sun Ra – “They Dwell on Other Planes”
Parliament – “Unfunky Ufo”
Asha Puthli – “Space Talk”
Ennio Morricone – “Ottave Comandamento: Corri Veloce”
Milton Babbitt – “Homily for Snare Drum”
The B52s – “Song for a Future Generation”
Sofia Gubaidulina – “Mechanical Accordion”
Vinicius De Moraes & Baden Powell – “O Astronauta”
Dionne Warwick – “Do You Know the Way to San Jose?”
David Graeber – “of Flying Cars and the Declining Rate of Profit”
Derek Bailey – “Improvisation”
William Hanna & Hoyt Curtin – “The Jetsons”
Anthony Braxton – “C-m=b05”
Gyorgy Kurtag – “Shadows for Contrabass Solo”
Eric Siday – “The Perking Coffee Pot”
Igor Stravinsky – “Variations Aldous Huxley in Memoriam”
Caetano Veloso – “Pulsar”
Luigi Nono – “Uno Espressione”
Krzysztof Penderecki – “Threnody for the Victims of Hiroshima”
John Cage – “Empty Words”
George Brecht – “Drip Music”
The Velvet Underground – “All Tomorrow’s Parties”
Laurie Anderson – “Example #22”
De volta, finalmente.
Chris Forsyth + The Solar Motel Band – “Dreaming In The Non-Dream”
LCD Soundsystem – “How Do You Sleep?”
Negro Leo – “Lek Lover”
Olivia Tremor Control – “I Have Been Floated”
Cream – “Dreaming”
Nina Becker – “Voo Rasante”
Neil Young – “Pocahontas”
Boogarins – “Foimal”
Deerhoof – “Small Axe”
Can – “Vitamin C”
Can – “Mother Sky”
Can – “Future Days”
Boards of Canada – “Cold Earth”
Maglore – “Me Deixa Legal”
Led Zeppelin – “Down By the Seaside”
Sérgio Sampaio – “Não Tenha Medo Não! (Rua Moreira, 65)”
Creedence Clearwater Revival – “Bad Moon Rising”
Taylor Swift – “Look What You Made Me Do (Boss in Drama)”
A banda californiana Deerhoof anuncia para setembro seu novo disco, Mountain Moves, e lança o primeiro single, a faixa “I Will Spite Survive”, que conta com a participação de Jenn Wasner, líder do Wye Oak, nos vocais:
Não é a única participação especial do disco, que ainda conta com as presenças da ex-vocalista do Stereolab Lætitia Sadier, da multiinstrumentista Xenia Rubinos, da compositora argentina Juana Molina e da jazzista Matana Roberts, entre outros, além de versões para músicas de Bob Marley, Staple Singers e Violeta Parra, num disco de forte teor político. “Vivemos simultaneamente em dois mundos, uma monocultura maníaca inclinada ao inferno que está guiando a humanidade rumo à extinção e um movimentado submundo lotado de ideias e cheio de otimismo e de vontade de continuar e sobreviver. Mountain Moves recusa o primeiro ao celebrar o último em êxtase”, escreveram na apresentação do disco, cuja capa e ordem das músicas vem abaixo (e o disco já está em pré-venda).
“Slow Motion Detonation (feat. Juana Molina)”
“Con Sordino”
“I Will Spite Survive (feat. Jenn Wasner)”
“Come Down Here And Say That (feat. Lætitia Sadier)”
“Gracias A La Vida (Violeta Parra Cover)”
“Begin Countdown”
“Your Dystopic Creation Doesn’t Fear You (feat. Awkwafina)”
“Ay That’s Me”
“Palace of the Governors”
“Singalong Junk (feat. Xenia Rubinos)”
“Mountain Moves (feat. Matana Roberts)”
“Freedom Highway (The Staples Singers Cover)”
“Sea Moves (feat. Chad Popple, Devin Hoff)”
“Kokoye”
“Small Axe (Bob Marley Cover)”
Eis os vídeos que fiz da eletrizante apresentação da banda norte-americana no Sesc Pompéia.
Foi demais!
Em sua décima terceira edição, o pernambucano Coquetel Molotov se consolida como um dos melhores do país – escrevi sobre o festival no meu blog do UOL.
Conheço Recife desde os tempos em que o mangue beat ainda era uma novidade recebida com estranhamento pelos próprios pernambucanos, que demoraram para reconhecer que aquela mistura de tradição e modernidade encabeçada por Chico Science aos poucos colocaria a cidade não apenas no mapa musical do Brasil como no atlas da cultura mundial. A natureza tradicionalmente cosmopolita da cidade – resquício da colonização holandesa liderada por Maurício de Nassau no século 17 – havia entrado em estado de hibernação durante os anos 80 e a turma dos caranguejos com cérebro sonhava em voltar a respirar uma cidade que fosse reconhecida por sua rica cultura e mentalidade aberta, não pelos índices de violência e de pobreza.
Um quarto de século depois dos primeiros rascunhos do mangue beat, a décima terceira edição do festival pernambucano Coquetel Molotov foi a materialização daquela utopia imaginada no início dos anos 90, quando os primeiros agitadores culturais que criaram aquele movimento hoje histórico começaram a se conhecer. Eles imaginavam uma Recife conectada ao resto do estado, do país e do mundo sem fazer escalas pela ponte Rio-São Paulo, refletindo a atmosfera naturalmente moderna da capital pernambucana em uma conversa internacional e moderna, colocando artistas e público numa sintonia alheia às demandas ou exigências do mercado.
E foi isso que aconteceu na ampla fazenda colonial Coudelaria Souza Leão, neste sábado, dia 22, que recebeu a melhor safra do pop brasileiro deste ano, desfilando entre os dois principais palcos do dia final do evento, que desta vez teve etapas realizadas nas cidades de Belo Jardim (no interior do Pernambuco) e Belo Horizonte nas semanas anteriores. Quase dez mil pessoas assistiram a shows de artistas de diferentes estados brasileiros e de outros países, mas mais do que as atrações musicais o que realmente determinava a atmosfera do festival era o público.
Um púbico completamente misturado – de diferentes etnias, classe sociais, faixas etárias e gêneros -, respeitoso e exigente, entregues à música fosse ela a hipnose psicodélica dos goianos dos Boogarins, o groove sintético da paulistana Céu, o ativismo dance da curitibana Karol Conká ou a pista pesada dos soteropolitanos do BaianaSystem. Em cada um dos shows o público reagia de forma diferente, mas sempre entrando em sintonia completa com a realidade musical proposta por cada atração. Era uma pequena multidão que ia do transe reverente ao baile apaixonado, da surpresa empolgada ao êxtase corporal, deixando os artistas à vontade para fazer o que melhor sabiam.
Isso potencializou shows naturalmente fortes, como o de Céu e do BaianaSystem, donos de dois dos melhores discos e shows deste ano. Frente ao público do palco principal do festival (dentro de um enorme casarão colonial), os dois suaram sorrindo para fazer apresentações irrepreensíveis, conduzindo a platéia na mão ao mesmo tempo em que se entregavam a ela. Já artistas como o paranese Jaloo, a banda carioca Ventre e os norte-americanos do Deerhoof souberam aproveitar as dimensões menores do palco aberto e fizeram shows de pura adrenalina: Jaloo entregue aos braços da audiência, a baterista Larissa Conforto da Ventre mais uma vez roubou a cena com uma intensa intervenção política e os norte-americanos descarregando eletricidade e ritmo. Shows intensos em que parte dessa energia vinha da cumplicidade quase instantânea entre bandas e público.
Entre os dois palcos, este público também circulava entre um mercado de compras, o terceiro palco do festival (a Rural do Rogê, uma velha caminhonete que abriga shows itinerantes pelo Recife, capitaneada pelo Rogê da antiga Soparia, eternizado na música “Macô” da Nação Zumbi) e um quarto palco, bem menor e sem iluminação, quase uma ocupação, que foi colocado entre os dois palcos principais para receber bandas instrumentais. Música para todo o lugar que você ouvisse, cercando um público que começou a frequentar shows exatamente quando o mangue beat começou a ser incorporado ao mainstream da cidade e o Coquetel Molotov começava a dar seus primeiros passos, ainda sob o epiteto de “o festival indie do Recife”.
Treze anos depois o festival cresceu e seu público também, bem como suas ambições culturais e estéticas. E o que viu-se neste sábado no Recife foi justamente a maturidade completa de uma cena local, aberta para o novo e disposta a se reinventar constantemente, uma vez que a cena já entendeu esta realidade. Para o ano que vem eles tentam um desafio ainda maior: trazer o festival para São Paulo. Não apenas alugar uma casa noturna e desfilar algumas atrações que também levarão para o Recife, mas reproduzir em São Paulo a atmosfera deste que é o festival mais alto astral do Brasil. Um desafio e tanto.