Em outra reedição caprichada da Rhino, o disco que consolidou a importância do Sepultura na cena mundial, Beneath the Remains, ganha uma nova versão em vinil com direito ao disco de 1989 remasterizado a partir das fitas originais, além de um segundo disco com faixas gravadas no Rio de Janeiro, algumas em versão instrumental, antes do grupo registrar as versões definitivas na Flórida, e músicas tiradas do show que o grupo mineiro fez no clube Zeppelinhalle, na cidade alemã de Kaufbeuren, no dia 22 de setembro do ano de lançamento do disco, com direito a versões para “Symptom Of the Universe” do Black Sabbath e “Holiday In Cambodia” dos Dead Kennedys:
São apenas 1500 cópias do disco, que já está à venda.
Taylor-Ruth estava na quinta série quando retirou um disco dos Dead Kennedys na biblioteca da escola. Ela gostou e escreveu sobre isso em seu diário da época – e postou o texto em seu tumblr no começo do ano passado.
Se alguém traduzir, é só escrever nos comentários que eu posto aqui.
O DaSoDu traduziu (valeu!), olha só:
Peguei um monte de CDs de música na biblioteca hoje! Alguns tinham palavrões no título, então eu tive que prometer para Sra. Jervis que eu tinha 15 anos. Ainda não tenho, mas acho que essa mentira não conta na biblioteca.
Já ouvi todos eles agora. Notei que em VÁRIOS desses CDs que os cantores não gostam do Homem. Eles até xingam ele! Não sei quem é o Homem. Talvez seja o Bush ou o diretor do vocalista. Mas se os Dead Kennedys não gostam do Homem, eu também não gosto. Também não gosto dos fachistas [sic]. Acho que eles são como uma religião ou culto a qual o Homem pertence.
Acho que, até agora, eu sou mais punk do que qualquer pessoa que eu conheci em toda a minha vida.
* The Man não é o “Big brother” como o próprio DaSoDu cogitou – e sim uma forma de se referir ao Sistema, com “S” maiúsculo.
Vi no Dangerous Minds.
E no mesmo post do Dangerous Minds vi esses Beatles de desenho animado tocando “California Übber Alles” – simples, besta, mas bem legal.
No ano 2000 entrevistei o Jello Biafra para a revista Rockpress. Devo ter a edição impressa em algum lugar aqui em casa, mas revirando meus arquivos digitais encontrei a versão em .txt da matéria que fiz, que segue abaixo, na íntegra. Resolvi republicá-la agora porque muito do que Jello fala tem a ver com o que está acontecendo agora…
PRESIDENTE KENNEDY
Jello Biafra solta o verbo sobre globalização, processos judiciais, Sílvio Santos, alimentos transgênicos, protestos contra o FMI, corrida eleitoral, pornografia, Gordo na MTV, ecologia e a guerra santa da verdade das câmeras de vídeo!
Muito poderia ser dito à abertura de uma entrevista com Jello Biafra. Mas, sério, precisa? Jello fala pelos cotovelos e gosta, age ao telefone com a mesma verborragia cínica que destila nos microfones do planeta, misturando ideologia, economia global, preconceitos e arte num carregamento expresso de palavras cuspidas com firmeza de uma das línguas mais afiadas da história da música pop. Quase uma hora de papo com o cara pelo telefone explica muita coisa. Então tá: domingo de eleição (primeiro turno), cinco horas da tarde (a hora em que as urnas se fechavam – MUITO sintomático) e o telefone do cara na mão, me passado feito senha secreta pra detonar a bomba da terceira guerra mundial. Não era pra tanto. Era apenas mais uma das bombas verbais do presidente Kennedy, bem na minha orelha. Toca o telefone, duas vezes e atende. A secretária eletrônica.
Jello na secretária eletrônica – “O coelho Alba é um muito especial. Porque seu pelo brilha verde fluorescente no escuro. Não por causa da tintura de cabelo punk, mas porque Alba foi manipulado geneticamente para ser deste jeito pelo artista Eduardo Kac. Há muita controvérsia sobre formas de vida transgênicas para motivos frankenstalimentares, mas… artísticos? Descubra o que as pessoas pensam quando Alba será exposto em público no simpósio de Chicago chamado Arte, Ciência e Liberdade de Expressão: O Mundo de Eduardo Kac, que começa dia 17 de setembro, em Chicago”.
Olá Jello, aqui é Alexandre, do Brasil. Falei com a Michelle da Alternative Tentacles e se você estivesse em casa…
Jello Biafra – Alô.
Alô? Jello?
Jello Biafra – Sim.
Tudo bem?
Jello Biafra – OK.
Dá pra fazer a entrevista agora?
Jello Biafra – Claro.
Eu queria então que você começasse falando sobre as manifestações de Seattle contra as grandes organizações que representam a globalização, o FMI, o Banco Mundial, a OMC (Organização Mundial do Comércio)…
Jello Biafra – Você está gravando?
Sim.
Jello Biafra – Volte a fita para ouvi-lo.
Claro. (Voltei a fita, ele ouve a própria voz e consente).
Jello Biafra – OK.
Entre as formas que você poderia ter usado para falar o que queria, você preferiu cantar.
Jello Biafra – Eu cantei e discursei. E é bom frisar que não foram tumultos, que aquilo foi distorcido pela mídia corporativa porque alguns idiotas quebraram umas janelas. Quem tumultuou foi a polícia. Eu acho que é bom ponto para seu público, aprender como a mídia corporativa trabalha. Eles dizem que é um tumulto porque quebraram umas janelas mas não falam das 50 mil pessoas em paz.
Mas você acha que a música é a forma mais poderosa de atingir outras pessoas?
Jello Biafra – É uma delas. Você pode fazer isso falando, pelo rádio, filmando, pelo jornalismo. Todo mundo deveria fazer o que pode.
Mas a música parece agir de forma mais próxima, porque atua de uma forma mais emocional em relação às pessoas. Você concorda?
Jello Biafra – Houve uma discussão sobre como deveríamos fazer o show no final da manifestação, porque havia muitos policiais e tinha gás para todo lado. Estávamos presos dentro de uma casa de shows assistindo a polícia pela TV do lado de fora. Na noite seguinte ainda houveram problemas com a polícia, toque de recolher e o Michael Franti, do Spearhead, disse: “Agora, de todas as formas, as pessoas precisam de música”.
Um aspecto que parece ser positivo da globalização é o fato de você polarizar a discussão entre os que exploram e as diferentes forças intelectuais e ativistas de esquerda.
Jello Biafra – Não é tão simples. As forças da globalização ainda estão no controle. Eles ainda têm o dinheiro, o poder, a mídia e as armas. Mas essa é a mesma situação que a América assistiu quando algumas vozes solitárias começaram a pedir o fim da guerra do Vietnã, quando algumas vozes corajosas na América do Sul exigiram o fim de ditaduras militares arriscando a própria vida. Você tem que começar em algum lugar, mas o ponto é que isso está apenas começando.
Todo mundo tem de se envolver por todo mundo. Por exemplo, eu ouvi falar que há uma resistência no Brasil ao cultivo de alimentos geneticamente adulterados – ou deveria dizer, mutilados. Nos Estados Unidos, quase ninguém sabe que isso existe, que dizer que já está em nossa comida, agora. Ajuda quando as pessoas no Brasil, na Europa e agora na África e Índia resistem à franken-comida. Ajuda o fato das pessoas do Brasil ajudam o resto de nós salvar os Estados Unidos deles mesmos (ri).
Porque o capitalismo se vende como um paraíso, mas na verdade só oferece uma opção. Veja a atual campanha presidencial americana, em que os dois candidatos são praticamente o mesmo.
Jello Biafra – Sim, o mesmo, mas a maioria das pessoas por aqui não votam, que é o que as corporações querem. Eu estou tentando fazer as pessoas votarem porque existe um bom terceiro candidato chamado Ralph Nader, do Partido Verde. Mesmo se ele não ganhar, o que provavelmente não vai acontecer, a vitória não vem logo adiante: se ele ganha 5% dos votos, o dinheiro que o governo dá aos grande partidos durante a campanha virá de forma equivalente para o Partido Verde. Isso quer dizer 12 milhões de dólares americanos, no mínimo. Podem ser importantes para fazer crescer o perfil e a atenção do Partido Verde nos próximos anos.
Mas surte efeito jogar o jogo político com as regras de quem manda?
Jello Biafra – Eu acho que é melhor do que não fazer nada. A ação nas ruas é uma parte disso, mas a outra é tirar estes imbecis dos escritórios deles, que é uma coisa que ainda podemos fazer. A maioria das pessoas não sabe que estes outros candidatos existem, porque sua liberdade foi tirada pela censura da mídia. A notícia é que o Ralph Nader, do Partido Verde, existe. Mas outra razão para participar mesmo sendo pelas regras deles, é o princípio das artes marciais que fala para usarmos a força de alguém contra eles. Talvez não vamos ter um bom presidente, mas se as pessoas se fizerem ouvir, vão ter pessoas melhores nos escritórios governando cidades, escolas, estados… Não é só o presidente. A maior parte do dinheiro que é mandado do governo federal vai à instância local para ser decidido como ele será gasto, se será gasto em casas para os necessitados ou em um outro campo de golfe. Também é muito importante ver quem está mandando nas escolas, pois ao contrário farão as crianças terem aulas sobre a Bíblia.
E em paralelo a este jogo de mídia, há todo um poder no submundo da internet que não gosta de aparecer e faz tudo que tem de fazer longe do olho público. Qual é seu papel político?
Jello Biafra – Há trinta anos a mídia era independente e ajudava a policiar os governantes e as corporações mostrando como estes agiam de forma imbecil. Agora a mídia foi comprada por estas mesmas corporações e tornou-se basicamente numa vitrine de propaganda para as mesmas. O movimento de mídia independente começou a tomar o poder de volta deles à medida que as pessoas estão tendo a informação
real via internet, pela televisão pública ou microrrádios.
Por exemplo, a CNN disse que, em Seattle, a polícia estava agindo comportadamente e não houveram balas de borracha disparadas. E a mídia independente colocou no ar na internet em menos de uma hora, cenas de policiais atirando nos manifestantes com balas de borracha. CNN foi forçada a mudar sua história pois outras pessoas trouxeram suas câmeras também. Eu chamo isso a guerra santa da verdade do câmera de vídeo (camcorder truth jihad), quando mostra-se algo que não deve ser visto.
Mas como esse movimento consegue quebrar o ciclo que o público quer exatamente este ideal de felicidade?
Jello Biafra – Mas nem todas as pessoas, na América e no mundo, estão tão felizes agora. Falam de como a economia está ótima e como os Estados Unidos nunca foram tão ricos, quando apenas uma em cada cinco pessoas está se beneficiando deste boom econômico. Os outros 80% não tem porra nenhuma. São 80% das pessoas se fodendo e sem saber porquê. Eles podem não entender os motivos, mas aos poucos vão sabendo. Por exemplo, em Seattle, não eram apenas radicais, punks e hippies marchando contra a OMC, mas haviam os sindicatos também. Todo mundo desde metalúrgicos a pilotos estavam marchando lado a lado com pessoas que são normalmente tachadas de loucos. Isso é algo importante a ser salientado: os sindicatos não ajudaram a protestar contra a guerra do Vietnã, mas agora estamos do mesmo lado.
E qual vai ser a velocidade deste desenvolvimento político?
Jello Biafra – Ele vai acontecer. Vai ser difícil, mas tem de ser feito. Vai demorar pelo menos o mesmo tempo que demorou para parar a guerra do Vietnã, talvez mais. Porque desta vez o inimigo são as próprias corporações.
O presidente do Brasil também fechou esse acordo de fortalecimento da economia com o FMI…
Jello Biafra – …e ele deve! Caso contrário, eles descobrem uma forma de derruba-lo.
Deste jeito, nossas riquezas estão sendo aos poucos repartidas pelas corporações estrangeiras. Como você acha que o Brasil pode reagir a isso, uma vez que você conhece a história dos países latino-americanos?
Jello Biafra – Eu acho que é importante lutar o máximo que puder para preservar o que resta da Amazônia e suas tribos nativos. E educar o máximo de pessoas que a maior parte das riquezas vão para corporações multinacionais, não apenas americanas, mas européias e japonesas, e não para o Brasil. Há um discurso que diz que devemos explorar a Amazônia para tirar o Brasil da pobreza, mas não é isso que acontece. Os mesmos ricos tiram o dinheiro e tudo mais e todo o resto continua na mesma. Eu tenho a impressão que a maioria dos brasileiros apóiam a exploração das riquezas nativas.
Sim, porque vem embalado como progresso.
Jello Biafra – O importante seria apontar que isso não estava fazendo bem algum ao país. O Brasil parece um país muito nacionalista, então acho que a primeira coisa a fazer é falar o jeito que eles falam.
Além do fato que o inglês tornou-se uma espécie de uma segunda língua por aqui.
Jello Biafra – Muitas bandas daí cantam em inglês (ri).
Não apenas o Brasil, mas o terceiro mundo como um todo acaba parecendo um mutante entre a cultura americana e a cultura local.
Jello Biafra – Não apenas por causa da TV americana, mas a música também deve ser culpada.
Mas esta mesma música que aliena as pessoas, voltando ao início da entrevista, pode faze-la entende-las?
Jello Biafra – Sim. Você já disse isso, a música pode agir num nível emocional ou espiritual. Eu posso ouvir Ratos de Porão em português e ainda sentir a música, a energia, a emoção. Não são todos americanos que suportam isso, eles não conseguem ouvir outra música que não seja cantada em inglês.
Qual a imagem que o Brasil tem nos Estados Unidos?
Jello Biafra – Uma das piores partes sobre o fato das corporações controlarem a mídia é que a forma que eles censura alguns assuntos importantes existem pra valer. Então as únicas vezes que você ouve falar no Brasil é quando há um acidente de avião ou o time de futebol ganha. Os americanos não tem a menor idéia sobre o Brasil. Sabem que é na América do Sul, que tem muita floresta, que as cidades são muito poluídas… Os que sabem mais um pouco sabem que existe uma enorme desigualdade entre o mais rico e o mais pobre. Mas além disso, ninguém mais sabe mais nada. Eu acho que eu sei mais um pouco porque eu falo com brasileiros com mais freqüência, mas a maioria dos americanos, não, claro (ri).
Você esteve no Brasil em 92. Qual foi a sua impressão quando viu as coisas que já haviam lido sobre?
Jello Biafra – É difícil dizer porque eu não fui à floresta ou qualquer coisa do tipo… Eu só fui ao Rio e a São Paulo. Claro que as favelas eram muito chocantes, mas não surpreendentes. Um amigo brasileiro me levou a uma favela no Rio e ficamos lá à noite para ver uma banda que havia por lá. Há uma atmosfera de felicidade estranhamente diluída na superfície: as pessoas conversando com amigos e vizinhos e bebendo nas ruas… Mas consigo me lembrar de mais coisas além dos velhos discos brasileiros legais que eu encontrei lá. Primeiro foi descobrir que o que os americanos queriam forçar no tal encontro de cúpula (a Eco-92) que as corporações americanas poderiam entrar na Amazônia, pegar o gene de um animal e uma planta e dizer que era delas, vendo por um preço alto para alguém, sem pagar nada para as pessoas que mora lá. Outra coisa que eu me lembro, até comentei isso outro dia, que eu vi que haviam sacos plásticos nos mercados do Brasil do mesmo jeito que nos Estados Unidos. E disseram: “isso mostra como estamos evoluindo no mundo”, o que é justamente o contrário (ri).
E é exatamente assim que vivemos: achando que cada pequena nova coisa é algo que nos eleva e não o contrário.
Jello Biafra – Será mágico como um programa de TV americano. Mas por um outro lado, parece que em vez do Brasil ficar cada vez mais parecido com os Estados Unidos são os Estados Unidos que vão ficar mais parecidos com o Brasil. Um dos economistas do Ronald Reagan dizia que usava o “modelo brasileiro” para o futuro dos Estados Unidos: o rico fica bem mais rico, o pobre fica bem mais pobre e você aciona o poder militar e a polícia para ter certeza que ninguém reclame. Eu lembrei de outra coisa que eu vi no Brasil, era um programa de TV que só mostrava closes em gente morta, toda noite: gente que levou tiro, atropelados… E agora você vê o mesmo tipo de programa nos Estados Unidos.
Prepare-se então para a próxima onda, com mulheres esfregando a bunda na câmera…
Jello Biafra – Isso não me surpreende, não mesmo… Isso já tem aqui. Até os programas de debate, como Jerry Springer, em vez de pegar gente discutindo assuntos tem gente se pegando na porrada. Aí você muda para a Janie Jones e a grande pergunta do dia é “minha filha peituda está mostrando muita carne na escola?”, desfilando adolescentes com peitões na TV… É só sexo e violência, TV é isso. O que aconteceu com um apresentador em São Paulo que tinha um programa de jogos, que parecia um crocodilo e tinha um microfonezão saindo de dentro do peito?
(Rio)
Jello Biafra – Você deve saber de quem estou falando…
Sim, do apresentador Sílvio Santos…
Jello Biafra – Ele foi candidato a prefeito…
A presidente. Eles está na TV agora mesmo, enquanto conversamos. Hoje, inclusive é eleição para prefeito no Brasil.
Jello Biafra – Ele está concorrendo de novo?
Não, ele não chegou a concorrer. Ele só ameaçou fazer, para atrapalhar a disputa. Como o Ted Turner fez…
Jello Biafra – …Não lembro se ele fez isso, mas sei que ele sabe que tem mais poder onde ele está (ri).
Mas qual era a do programa, que você ia falar?
Jello Biafra – O mais louco era que na noite em que eu assisti, o grande prêmio era uma arma (ri)! O show acabava, começava a chover papel do teto, os créditos subiam e ele e a mulher que ganhou o prêmio estavam atirando com suas armas felizes e satisfeitos. Não chega a ser tão estranhos quanto os programas de TV no Japão, mas… Mesmo dando um prêmio como uma arma num programa de TV e ao mesmo tempo tem um show com fotos de cadáveres… Isso é uma forma de dessensibilizar as pessoas em relação à violência. Tentar provar para as pessoas que aquilo é normal. E isso está acontecendo nos Estados Unidos também… Embora não haja nenhuma revista como a Rudolf nos Estados Unidos (ri). Muito menos vendida em bancas de rua onde crianças podem ler…
…e comprar.
Jello Biafra – É estranho. Se o país é muito religioso, fervorosamente católico; o outro lado é tão fervoroso também. Tem uma loja de souvenirs no Corcovado que vende filmes pornô (ri)!
Mudando um pouco de assunto, eu queria que você falasse da briga judicial entre a Alternative Tentacles e os ex-Dead Kennedys.
Jello Biafra – Foi a coisa mais escrota que já aconteceu em toda minha vida. Gastei um bom tempo tentando lembrar as pessoas da nossa música e o que ela significava elas, quando tudo o que eu queria era que eu não tivesse conhecido esses imbecis. Eu não vou deixar eles colocarem “Holidays in Cambodja” numa propaganda da Levi’s. Então eles vieram atrás de mim com um grande advogado corporativo que também representa o Journey, o Boston, os Doobie Brothers e o Santana, e eles estão me processando por não ser corporativo, tentar destruir a Alternative Tentacles e roubar a música. Eles ainda mentiram ao dizer que escreveram todas as minhas músicas. Dizendo que eu estava roubando dinheiro deles quando na verdade eu havia os pago. Para o choque de todos, incluindo deles mesmos, o júri acreditou nisso. E agora, mesmo estando num puta rombo financeiro, eu tenho que juntar grana para apelar na justiça. Nesse meio tempo, eles estão tentando vendendo o catálogo dos Dead Kennedys o quanto antes sem se preocupar com nada. Por isso se você ver qualquer disco da Alternative Tentacles por outra gravadora NÃO COMPRE. Eles ainda usaram dinheiro que roubaram de mim para pagar o advogado deles. Eles não ligam para o que a banda significou, só querem dinheiro.
Quando você vai apelar?
Jello Biafra – Ainda não. Estou me preparando. Toda essa coisa influencia meus sentimentos a respeito do Napster, do download de músicas… Se eles conseguirem tirar minha música de mim, então o Napster será meu melhor amigo.
E o que você acha do Napster hoje?
Jello Biafra – O Napster deve ser destruído em breve pelas grandes gravadoras. Mas logo uma nova tecnologia que será mais difícil de destruir irá substituí-lo. Isso faz parte da bela e a fera que é a internet: não importa que tipo de garras que ponham no caminho e fechem as coisas; sempre haverá um moleque chateado de qualquer idade que irá encontrar um jeito de foder com aquilo (ri)!
Aproveitando a deixa, o que você acha sobre a questão dos direitos autorais. O formato tem que ser mudado?
Jello Biafra – Provavelmente. Agora mesmo estou lutando pelos direitos das minhas próprias músicas (ri). Querem roubar para coloca-la em comerciais e filmes de merda. Mas por outro lado, eu não sei o que vai acontecer. Eu não estou tão preocupado com o Napster ou com essa tecnologia, porque já acabou. Não vai fazer tão mal quanto alguém gravar um filme da televisão ou xerocar parte de um livro para um jornal da escola. Muitas pessoas que usam Napster não o fazem para roubar música, mas para ouvir antes de comprar. Você baixa uma música e se gostar, vai procurar o disco. Demora muito tempo para baixar um CD inteiro no Napster. Tanto tempo que o usuário prefere pegar o CD.
E ao mesmo tempo, conseguem baixar músicas de bandas independentes.
Jello Biafra – Eu espero que as pessoas apóiem a música independente. Porque o Napster pode começar a machucar pequenos músicos, que não têm muita grana e dependem da venda do Napster. Mas até aí eu sou pró-Napster. Eu tenho que ir (espreguiça-se).
Legal, Jello. Ótima entrevista.
Jello Biafra – Você também gostaria de saber que tem um disco novo meu, que é só falado, que vai sair agora em novembro, que chama-se Become the Media. E um novo EP do Lard chamado Seventies Rock Must Die.
Become the Media (torne-se a mídia) é um conselho?
Jello Biafra – É um grito de guerra. Torne-se a mídia ao tornar-se parte da guerra santa da verdade da câmera de vídeo. Pegue os policiais que bateram em Rodney King e os caras atirando balas de borracha – esta é a guerra santa da verdade. Apoie zines, rádio, música, a cultura independente… E, claro, apoie a cultura independente ao não dar dinheiro para grandes lojas em cadeia – sejam lojas, restaurantes… Tornar-se a mídia significa ser didático com as pessoas de casa, na família, na escola… Quando ouvir bobagens como “vou votar em Gore porque o Bush é pior ainda”. Conte a elas… a verdade.
Planos para vir ao Brasil?
Jello Biafra – Não por enquanto. Eu gostaria voltar, mas não parece que eu possa ir agora. Eu estou no meio de uma batalha legal…
Quando a revista sair, eu faço o possível para ela chegar em suas mãos.
Jello Biafra – Acabamos de lançar um disco novo do Ratos de Porão, o Crucificados pelo Sistema, que é uma regravação do primeiro álbum. Tá muito mais insano agora. O primeiro é muito bom, mas eu fiquei surpreso com esse novo…
Você sabia que o Gordo trabalha na MTV Brasil?
Jello Biafra – É engraçado, porque ele nega. Mas eu prefiro ter o Gordo na MTV que a Britney Spears. Ele é um exemplo bem mais positivo para jovens em todo mundo do que o mais novo clone pop americano.
Tá bom Jello. Valeu.
Jello Biafra – OK. Tchau.
A lista é da Paste, não tem ordem (aparentemente), mas tem desde banda que eu nem conhecia a outras que eu nem sabia que tinham logo, passando por versões específicas de bandas que nunca tiveram logo fixo. Mas o pior é a sensação de achar que estão faltando alguns, quem lembra? E de artistas brasileiros?
O Soft Focus, do Ian Svenonius, é um dos melhores programas de entrevista hoje em dia. Na edição acima, ele encontra ninguém menos que o próprio Dead Kennedy Jello Biafra, em sua cidade natal, San Francisco. O resto da entrevista dá pra assistir aqui.
E isso anos antes do MP3… Tirei daqui.
Cês viram que o punk morreu de vez, né?
É, essa guitarra tá citando “California Übber Alles”… Vi na Bia.