Quem ainda aguenta? Tudo bem, eu dou um desconto e seguro a onda, pois você já deve estar farto de ouvir falar do cara. Mas as imagens acima falam por si sobre o que aconteceu com o nosso herói enquanto estive fora e mantém a chama acesa. E queria aproveitar para deixar um salve aos leitores que não sabem interpretar texto e só leram as partes que quiseram quando versei sobre o significado do surto de Charlie Sheen para os dias de hoje (fico pensando que parte de “foco e paixão” eles não entenderam). Prefiro pensar que são amigos meus disfarçados em pseudônimos me espezinhando. E quando você tem gente como Alec Baldwin e Mike Tyson te dando conselhos como se portar em público, alguma coisa certa você deve ter feito…
Não custa lembrar que o cara que hoje tenta dar lição de moral no Charlie Sheen é o mesmo sujeito que era sinônimo de coxinha antes do 30 Rock:
E que, como bem lembrou a Jufa, disse as seguintes palavras para sua filha de 11 ou 12 anos, ele nem sabia:
“You are a rude, thoughtless little pig. You don’t have the brains or the decency as a human being. I don’t give a damn that you’re 12 years old, or 11 years old, or that you’re a child, or that your mother is a thoughtless pain in the ass who doesn’t care about what you do as far as I’m concerned”
Poizé…
O que importa
Podia ser só mais uma celebridade surtando. “Galã de meia-idade sofre pressão de estúdio para largar as drogas”, “Seriado em risco devido aos surtos de estrela decadente”, “Sexo, drogas e Charlie Sheen” – material para programas de TV e jornalecos sensacionalistas. Mas o protagonista dessa história chama-se Charlie Sheen, um sujeito que, não bastasse ter nascido em Hollywood (ele tava em Apocalypse Now, Curtindo a Vida Adoidado, Wall Street, Platoon, Spin City e Top Gang), passou a última década preso num personagem dedicado a si mesmo (Uncle Charlie, o tio de Jake no seriado Two and a Half Men), curtindo seu ponto de vista em relação a uma vida dedicada aos excessos. E, quando ele resolveu contar sua versão da história, transformou-se numa espécie de filósofo maluco, pregando o fim do mundo para os idiotas e a vida eterna para gente que nem ele. “Tigerblood”.
A entrevista de Sheen vai além do mero sensacionalismo porque o ator nunca fingiu ser alguém diferente do que é. Estava no livro negro de Heidi Fleiss, “Madame Hollywood”, a cafetina que foi presa em 1995, e prontamente admitiu ser cliente. Nunca negou seu passado putanheiro e violento, resumindo tudo no bordão que usou na abertura de uma das vezes em que jogou sua merda no ventilador da América – e do mundo: “É tudo paixão”.
Paixão e foco. Eis as duas principais virtudes exaltadas pelo discurso de Sheen. Um discurso emblemático, implacável, que mistura elementos de auto-ajuda, filosofia maconheira de surfista, autoridade militar, poesia de rua, aula de inglês, mesa redonda de esportes e líder religioso (como bem disseca a Slate – já o NY Times percebe que “Sheen” já virou verbo). Charlie Sheen não está desabafando só por si mesmo. Perceba que seus esbravejos, xingamentos e afrontas não são apenas os de um playboy reclamando porque não deixam ele fazer o que quiser. É claro que há todo o glamour da autocelebração hollywoodiana, essência do ator-personagem. Mas é possível ouvir seu discurso e deixar de lado o fato de que ele bate em mulheres ou que ele faz apologia da autodestruição.
Ele está apenas botando o dedo na cara de quem só reclama, de quem vive conformado sua vidinha sem graça e cuja única ação que consegue por em prática é falar mal da vida alheia. Especialmente da vida de quem vive como quer. Não apenas Charlie Sheen. Mas todos nós.
Porque existe a possibilidade de você saber que a sua vida merece ser vivida de forma plena, sem limites, pura entrega. Uma vida abastecida pela paixão – e isso não quer dizer propriamente uma vida feliz. O próprio conceito de “felicidade” se mistura com o de “conformismo”, se a imagem da felicidade é a da família do comercial de margarina. Apesar dos sorrisos, eles não estão felizes assim. Estão sim, conformados. Mas não satisfeitos.
É isso que Charlie Sheen prega: vá viver a sua vida, levante-se dessa poltrona e pare de viver pelas outras pessoas. No fim das contas, a única coisa que você vai ter é a sua própria experiência, por isso esqueça viagens pelo Discovery Channel, festas no Twitter, discussões por SMS ou amigos do Facebook. Encontre mais gente, saia mais, descubra o mundo, tenha foco, tenha um plano, PLANEJE MELHOR (como reza uma das inúmeras tags que Sheen pregou ao seu nome, com suas entrevistas). Transforme um mísero dia de aula em um desfile a céu aberto em que você possa cantar “Twist and Shout” como Ferris Bueller.
“‘NÃO POSSO’ É O CÂNCER DO ‘ACONTECER'”, esbraveja, como se Keith Richards tivesse caído na fonte da juventude nos anos 60 e não parecesse um maracujá humano dizendo que a vida loka é a que vale. Sheen esticou um pouco o rosto, mas tem a mesma cara de guri que tinha por toda sua carreira. E, ao não envelhecer (por enquanto, embora os jornais já estejam preparando seu obituário), ele mostra que essa autodestruição feliz não é necessariamente algo deprimente. Triste ou não, ela só diz respeito a seu protagonista.
Pode ser que tudo seja uma grande armação, que Sheen esteja preparando território para um filme do mesmo jeito que Joaquin Phoenix tentou há um ano (sem sucesso desde o início, mas Sheen é melhor ator que Phoenix). Pode ser que “Winning” seja uma marca de tênis, “Tigerblood” um energético e “Dying is for fools” um slogan de um plano de aposentadoria privada – e que Sheen tenha arquitetado isso como um grande plano (“I have a plan”) para capitalizar novas marcas a partir de alguns chiliques na TV. Mesmo que marcas se apropriem de seu nome, de suas expressões e de sua vida (quanto tempo vai levar pra aparecer livros e filmes sobre Charlie?), seu recado já foi dado.
Não me espanta isso acontecer na mesma época em que um texto que escrevi em 2003 (“A Sua Vida, Saca?“) ter voltado a circular online. Há muito oba-oba e pouco motivo para comemoração. É preciso festejar estar vivo, comemorar as amizades, os amores, as paixões. Fazer que a vida volte a ter sentido – e que sentido seja entendido não como significado, mas um verbo no particípio. O sentido da vida é tudo aquilo que foi sentido por cada um de nós.
É só isso que importa.
PS – Desligo as máquinas aqui até a segunda dia 15 (mais de uma semana de folga offline, em frente à praia, nada mal. Pode ser que tuíte algo ou que escreva algo no Feice, mas não prometo nada até o meio de março).
PS 2 – E se você curtiu esse papo todo de Ferris Bueller e Charlie Sheen, compra o Link desta segunda-feira que você não irá se arrepender. Sério.
PS 3 – JUÍZO, HEIN. Poucos têm sangue de tigre de verdade.
PS 4 – ZOL
Do Reddit. Manja o Disappointed, não?