Charlie Brooker e Annabel Jones, criadores de Black Mirror, acabaram de anunciar a enigmática retrospectiva Death to 2020, que no Brasil vai se chamar 2020 Nunca mais. Justamente no ano em que não fizeram nenhum episódio (até por que, né…?), eles resolvem recapitular essa triste realidade que habitamos em um programa que não tem data de estreia, parece misturar documentário com ficção e parece que ainda está sendo realizado. O teaser publicado nesta segunda conta basicamente isso, além de elencar seus protagonistas, que incluem Samuel L. Jackson, Hugh Grant, Leslie Jones, Joe Keery, Lisa Kudrow, entre outros.
No anúncio feito na sexta, só avisam que estreia em breve…
Um dos melhores seriados de hoje em dia, o Além da Imaginação do século 21 pode ganhar um público ainda maior. Escrevi sobre isso lá no meu blog do UOL.
Perdeu aquela matéria sobre a economia no telejornal de hoje? Tudo bem: Charlie Brooker, o criador de Black Mirror, resume todas elas no no vídeo a seguir.
Enquanto a terceira temporada de Black Mirror não dá as caras, ficamos com um especial de natal com Jon Hamm, Rafe Spall e Oona Chaplin, numa trama que mistura, pra variar, tecnologia, paranóia e (in)segurança, com aquele clima irônico e amargo típico das produções de Charlie Brooker.
O programa vai ao ar na semana que vem. E se você ainda não viu o Além da Imaginação de nossa era, faça-se esse favor…
Minha coluna no Link de hoje é um comentário – sem spoilers – sobre a segunda temporada de Black Mirror, que cada vez torna-se mais importante.
O ‘Além da Imaginação’ do novo século digital
Black Mirror: série pode ser melhor produção de TV no ano
Há meio século, quando a televisão era novidade, o formato seriado foi um dos primeiros a propor uma linguagem típica da nova mídia, diferente de programas de auditório e de notícias que imitavam fórmulas consagradas no rádio. A nova mídia já havia se consolidado em lares norte-americanos e logo invadiria as salas de estar pelo mundo. A caixa luminosa e falante aos poucos descobriu as maravilhas da fita gravada, transmitindo pequenos filmes semanalmente para um público que ainda se acostumava ao novo aparelho e à sua linguagem.
O seriado imitava a fórmula narrativa das peças de teatro que já havia sido absorvida pelo cinema e, nos anos 1950, foi adaptada para a televisão. A principal diferença era o fato de que a TV, muito mais do que o cinema e o teatro, falava com milhões de pessoas ao mesmo tempo. Então era preciso diluir a produção para que as histórias fossem simples – e atingir cada vez mais gente.
Mas, há 50 anos, um contador de histórias começou a mexer neste formato. Depois da consolidação do seriado, ele passou a ser submetido a novas possibilidades – e um dos primeiros a puxar a mudança foi o escritor e roteirista Rod Serling. Cansado das restrições que sofria devido aos patrocinadores, resolveu partir para a ficção científica. E assim criou The Twilight Zone (A Zona do Crepúsculo, como bradava seu título original em inglês), conhecido no Brasil como Além da Imaginação.
O seriado aproveitava a novidade que era a TV para propor novos dilemas e situações pitorescas ao cogitar mudanças absurdas ou surreais em cada novo episódio. Histórias com meia hora de duração (chegaram a ter uma hora, mas só na quarta temporada) retratavam perfeitamente o clima da época.
O início dos anos 60 estava ensanduichado entre a década de 50 – que viu a ascensão da classe média norte-americana ao mesmo tempo em que se vivia a paranoia anticomunista, traduzida em histórias de horror e ficção científica – e o nascer do novo decênio, que, ainda sob a sombra da Guerra Fria, assistiu a mudanças nos direitos civis e no tratamento à mulher, além da popularização de substâncias de expansão da consciência e de celebridades em escala global.
Vivemos hoje uma época parecida com o início dos anos 60. A novidade não é mais a TV, mas a internet. Passamos já da fase de deslumbramento com o fato de estarmos em contato com o mundo inteiro instantaneamente. Mas… cadê o nosso Além da Imaginação?
Está na TV – mas ainda não passou na TV brasileira, nem tem previsão, como confirmei com a assessoria de imprensa do canal inglês BBC por aqui. Black Mirror, criado por Charlie Brooker, já comentado neste espaço, teve sua segunda temporada exibida mês passado. São só três curtos episódios, mas que pegam na veia – e no estômago – quando usam, como Além da Imaginação, nossa relação com novas tecnologias e mídias como metáfora para nos atentar para problemas que nos afligem em escala aparentemente menor.
Não vou contar as histórias nem as surpresas (e são muitas) dos episódios Be Right Back, White Bear e The Waldo Momento, mas insisto que merecem atenção, pois talvez sejam a melhor produção na TV em 2013 até agora.
O ano começou há dois meses, mas vai ser difícil alguém tirar este trunfo do seriado de Brooker. Ele aborda temas como política, violência, alienação, amor, marketing, justiça, inteligência artificial, relações familiares, vingança, morte, reality show, mercantilização da experiência humana, parques temáticos e televisão. Tudo filtrado por TVs de plasma enormes, telefones portáteis, redes sociais, transmissões ao vivo, vida digital e avatares. Talvez só não seja perfeito porque não foi criado para a própria nova mídia, como o Além da Imaginação era em seu tempo.
Mas, por outro lado, como assistir a um programa de TV inglês que só foi exibido oficialmente em seu país? Quem sabe, sabe.
Minha coluna desta semana no Link foi sobre a segunda temporada de Black Mirror, que foi anunciada na semana passada.
Se a tecnologia é um vício, quais são os efeitos colaterais?
‘Black Mirror’, série critica efeitos da tecnologia na sociedade
Uma voz monótona repete frases sem emoção: “Viva mais. Conecte-se mais. Viaje mais. Compartilhe mais. Procure mais”. Pessoas sorriem em situações cotidianas com seus tablets ou celulares. A iluminação é perfeita, a fotografia é de publicidade. Todos são lindos.
De relance, um outdoor eletrônico transforma empolgação em ameaça – “O futuro que você merece” – e seguem os imperativos: “Consuma mais. Pense mais. Experimente mais. Lembre mais. Veja mais. Compartilhe mais. Aprenda mais. Faça mais. Lute mais. Faça mais. Conecte-se mais”. As imagens mudam, os sorrisos tornam-se falsos e celulares filmam cenas violentas – confrontos, espacamentos – vistas por uma criança debaixo de seu cobertor.
“Deixe de ser você”, diz a voz robótica antes de surgir uma avenida tomada por pedestres que filmam, sem reação e com seus celulares, uma enorme nuvem de poeira que vem em sua direção. É inevitável a associação com a mórbida nuvem que tomou as ruas de Nova York depois da queda do WTC.
“O futuro está quebrado.” É o trailer da nova temporada de Black Mirror (espelho preto), do jornalista inglês Charlie Brooker, anunciada semana passada. Eu já havia comentado sobre a série em uma Impressão Digital no fim de 2012, mas apenas comentei a força de seu título, mais do que seu tema.
Black Mirror não é um seriado, mas três pequenos filmes exibidos pela Canal 4 da BBC inglesa. Seu autor, Charlie Brooker, é um notável crítico de mídia conhecido por sua abordagem nada sutil e pela franqueza agressiva que usa para expor suas opiniões, uma espécie de Michael Moore menos bonachão. É um inglês cínico cujo sotaque é tão pesado quanto a forma como ele trata os temas que escolhe. Ele explora como burrice, vaidade, ganância e banalidade derretem nossa civilização ao tratar inteligência como excentricidade e aparência como lastro de confiança.
O que une os três primeiros episódios de Black Mirror, exibidos no fim de 2011, é um dos principais alvos das críticas de Brooker – a tecnologia. Sua abordagem é simples: a tecnologia é a droga mais consumida do mundo hoje e estamos todos viciados nela. Todo o ecossistema criado pela internet e novos aparelhos não apenas nos permite consumir conteúdo em qualquer lugar como também faz que nossas vidas possam ser transformadas em conteúdo para ser consumido. A partir desta constatação, Brooker quer descobrir quais são os efeitos colaterais desse vício.
Em três episódios, três choques: no primeiro (Hino Nacional) o primeiro-ministro inglês vê-se chantageado para fazer sexo com um porco em cadeia nacional. No segundo (15 Milhões de Méritos), um operário de uma fábrica do futuro – que parece uma academia de ginástica – tenta ajudar uma desconhecida a comprar sua vaga em um programa de reality show. No terceiro (Toda a História de Você) uma tecnologia permite que você grave e reveja as próprias lembranças e isso pode ser catastrófico para as nossas relações.
Black Mirror ainda é inédita no Brasil e o canal BBC HD, recém-lançado no País, poderia nos presentear com sua exibição (como já fez com a excelente série Sherlock, adaptada pelo bamba Steven Moffat), antes de os três episódios da próxima temporada – que começam a ser filmados no mês que vem e ainda não têm data de exibição – irem ao ar no Reino Unido.
Do pouco que se sabe dos próximos episódios, num deles o namorado de uma viciada em redes sociais consegue voltar a ter contato com ela depois de sua morte graças à internet; no outro, um personagem de programa infantil concorre a um cargo político e começa a soar menos estúpido que seus concorrentes; e no último, uma mulher acorda numa casa em que não conhece para descobrir que as pessoas se tornaram voyeurs sem motivo, filmando os outros o tempo todo e não fazem mais nada.
Não parece tããããão diferente da nossa própria realidade…
Minha coluna desta edição de segunda-feira do Link (a primeira em que deixo o cargo de editor para assinar apenas como colunista) pega o gancho do título do seriado de Charlie Brooker para comentar nossa relação com as telas que nos cercam…
Como desligar o espelho preto que carregamos no bolso
Fixados à tela, fingimos que nada mais importa
O jornalista, diretor e comentarista inglês Charlie Brooker é uma das melhores cabeças do Reino Unido no século 21. Conhecido por seus comentários ácidos sobre mídia, ele ataca principalmente a televisão em séries produzidas pelos diferentes braços da emissora estatal BBC. No fim da década passada, os episódios de Newswipe, Screenswipe e Gameswipe (sobre, respectivamente, notícias, cinema e videogame) culminaram na série How TV Ruined Your Life (Como a TV Arruinou a Sua Vida, com episódios sobre medo, amor, conhecimento, progresso, aspirações e o ciclo da vida), de 2010. Em 2008, ironizou os reality shows e a mania de zumbis com Dead Set e no fim do ano passado dedicou-se à ridicularizar nossa obsessão pela tecnologia em Black Mirror.
São três histórias independentes que abordam os efeitos que a tecnologia causa ao comportamento humano se a compararmos com uma droga. “Black mirror” é o espelho preto que nos observa e observamos toda vez que uma tela é desligada. Desligamos a TV, o celular, o computador e vemos o nosso próprio rosto em diferentes dimensões, em molduras escurecidas que parecem espelhos em negativo do eu de cada um, como uma espécie de retrato de Dorian Gray de nossos sentimentos.
Desligamos aparelhos e nos vemos mirando para um vazio emocional que parece um abismo, anseios e esperanças refletidos do avesso, mas, ao contrário não é o monstro nietzscheano nos olhando de volta, o desconhecido consciente. É apenas um vazio, como se estivéssemos nos tornando robôs, fazendo o caminho inverso de Roy Batty em Blade Runner.
Não culpe o digital: a tela preta já nos hipnotizava desde os primórdios do cinema e passou a nos refletir a partir da televisão. O computador funcionou como um grilhão da mesa de escritório, uma prisão em forma de horas de trabalho, cuja ilusão de liberdade veio com a chegada dos smartphones.
E chegamos à segunda década do século sem nem sequer olharmos na cara um do outro. Se antes do smartphone uma mesa de bar já poderia criar círculos paralelos de conversa graças à telefonia móvel, com a internet à mão reuniões, encontros e refeições são celebrações de um individualismo autista, em que os presentes fingem presença mas fogem momentaneamente para a porta de entrada de seu umbigo, na palma de sua mão. Fingimos checar as horas e responder um SMS quando, na verdade, estamos vendo reações ao que fizemos nas redes sociais. O espelho negro só reflete aquilo que consideramos “vida” – todo o resto fingimos que não importa não existe, não está lá.
Por isso sonho com um restaurante cujo luxo é não ser interferido por ninguém mexendo no celular. Da mesma forma como deixamos o carro no manobrista ou os sapatos na porta de entrada, poderíamos ter a opção – mesmo que na marra – de deixarmos nossos celulares antes de comer. O restaurante me parece a opção mais viável, mas poderia ser uma academia de ginástica ou uma casa de shows. Nada de fotos, SMS, ligações, redes sociais, notícias, vídeos ou jogos – ficaríamos à disposição daquilo que é nos oferecido. Que, por isso, receberia maior cuidado e atenção.
Acho que isso é uma utopia possível, mas não vejo como regra. Da mesma forma que há restaurantes que não contam com TVs em suas paredes (ainda bem!), cogito a possibilidade de que haja outros que nos despluguem da matrix, mesmo que por algumas horas, para nos conectarmos à vida de fato.
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Esta é a primeira coluna que assino depois de deixar o Link – a partir de hoje, começo uma nova jornada, no comando da redação da revista Galileu, da editora Globo. Troco de pontes (do Limão para o Jaguaré), de marginais (do Tietê para o Pinheiros) e de foco (de tecnologia para ciência), por isso deixo a análise das notícias em segundo plano e passo a dar ênfase à forma como a tecnologia mexe em nossa cultura.
Mais um caso de um mal recorrente: atirador mata 14 durante estreia de filme do Batman em cinema nos EUA. E Charlie Brooker, sempre ele, ressalta como deveríamos reagir em casos como este:
Dica da Gi 😉
“You know what? ‘What the fuck’ doesn’t begin to cover that”
Não é à toa que o Brooker é um dos personagens que eu mais respeito no mundo hoje…
Charlie Brooker é um dos caras mais massa na Inglaterra hoje.
Dica da Gi, que é tão fã quanto eu (ou mais).