As imagens da Alemanha antes da queda do muro que compõem o novo clipe do New Order, tiradas do documentário B-Movie: Lust & Sound In West-Berlin 1979-1989, ajudam a ambientar essa “Singularity”, uma das melhores músicas do disco que o grupo inglês lançou no ano passado, nos anos 80 do pós-punk.
De novo usei shows como desculpa para desbravar duas cidades que ainda não conhecia: emendei minha primeira visita ao festival Primavera em sua cidade de origem, Barcelona, a um show de Neil Young cavalgando seu Crazy Horse na capital alemã. Foi minha primeira vez na Espanha e na Alemanha em cidades conhecidas por seu legado histórico e atual movimentação cultural e meu interesse queria saber como uma coisa estava ligada à outra. A chave está no dia-a-dia, nas ruas, no que as pessoas fazem com seu tempo e como o utilizam para viver melhor. Fiquei entre os shows e os inevitáveis passeios turísticos – afinal ir à Barcelona sem passar pela Sagrada Família ou pelo Parque Güell ou não passar por alguns dos prédios que habitam a ilha dos museus de Berlim é perder partes da alma das duas cidades. Entre um e outro, circulei por restaurantes, praças, livrarias, mercados, lojas de discos, centrinhos comerciais, parques e ruas querendo entender o quanto falta para que a gente atinja o nível destas duas cidades.
E a resposta está na forma como seus cidadãos lidam com elas. Cidades não são casualidades que temos que lidar entre a nossa casa e o nosso trabalho. Elas fazem parte da nossa vida de uma forma mais intensa do que pensamos, são continuações não apenas dos espaços que habitamos com freqüência, mas também de nossos corpos. Só uma visão holística sobre arquitetura, urbanismo e cidadania explica o funcionamento e a lógica por trás dessas duas cidades tão distintas. O que as une é justamente a forma como seus habitantes conversam com suas ruas. E tudo passa por educação: não adianta colocar latas de lixo por toda a cidade se as pessoas não sabem que o menor papel atirado no chão é responsável por enchentes ao entupir bueiros. Há uma vivência que não se restringe apenas aos próprios interesses – todos cuidam de tudo e há bem menos serviços particulares do que estamos acostumados. A coleta seletiva de lixo é regra, ninguém tem empregada doméstica, o trânsito respeita os ciclistas, que respeitam os pedestres, que respeitam o trânsito. Todo mundo sabe que tudo está interligado, não adianta querer se dar bem em um determinado aspecto da vida sem que isso acabe acarretando em um problema para outra pessoa. O metrô de Berlim não tem nem catraca e mesmo assim todos pagam o ingresso e o validam antes de subir nos carros. Ninguém tenta dar uma de malandro pra passear de graça.
Foi bem curioso tomar esse banho de civilidade alguns dias antes dos protestos começarem no Brasil – protestos que uniam a população (ao menos a princípio) ao redor do transporte público. Acendeu uma leve esperança de que, após o crescimento econômico, devemos começar a nos preocupar com a nossa educação – e não estou falando de escolas e ensino, e sim com a boa educação, com civilidade e civilização. Ainda temos muito que andar por aqui, mas ao menos me bateu uma sensação de que estamos indo no caminho certo. Tomara.
PS – Os shows foram ótimos: o Primavera em Barcelona funcionou como um relógio, apresentando shows memoráveis do Tame Impala, Blur, Nick Cave, My Bloody Valentine, Chris Owens, Breeders, Bob Mould, Dinosaur Jr. e Jesus & Mary Chain, e o Neil Young fez o melhor show de 2013 com quase três horas de guitarradas na incrível arena de Waldbühne, um dos lugares mais lindos que já vi. Isso sem contar as companhias, foi uma das melhores viagens que já fiz. Saca só os vídeos abaixo:
Aí embaixo tem mais fotos da manifestação a favor do protesto no Brasil que aconteceu neste domingo, feitas pela Ana. Alguém faz uma camiseta com essa frase, por favor!
Esse Cristo do Klaus Kinski é incrível, Gas que lembrou dele. A apresentação aconteceu em 1971, no Sportpalast, em Berlim, e está com legendas em inglês.
Ah se todo teatro fosse assim…
E a lembrança veio bem na hora em que eu tava lendo um artigo no Guardian que falava sobre a biografia do Cristo ser o drama político definitivo.
Enquanto a manhã da terça-feira que assistiu ao atentado terrorista da história (que completa dez anos domingo que vem) terminava em Nova York, em Berlim, na Alemanha, a noite começava com um show do Radiohead, em plena turnê do disco Kid A. O texto abaixo saiu de um post do site de fãs da banda, o At Ease Web, e foi escrito na época:
“I’ve just returned from Radiohead’s show in Berlin. The band did play after the airplanes hit the World Trade Center. At first, Thom didn’t mention what was going on, except for: “What can you say after a day like today. I guess, there is nothing to say”. A couple of songs later Thom said that he was trying not to say anything and apologized for being mute. He then realized that the crowd was probably not aware of what went on in the USA, so Thom & Ed tried to explain the situation. But, I guess that for the people who didn’t know (and I think that a lot of people didn’t have a clue), really couldn’t comprehend those facts. Before ‘You and whose army’ Thom said: “I guess this one is for the Bush administration”. The band ended the show with Street Spirit with the words: “I hope President Bush won’t start World War III”.
Eis o setlist daquele show:
“National Anthem”
“Hunting Bears”
“Morning Bell”
“My Iron Lung”
“Karma Police”
“Permanent Daylight”
“Climbing Up The Walls”
“No Surprises”
“Dollars and Cents”
“Airbag”
“Packt like sardines in a chrusd tin box”
“Fake plastic trees”
“I might be wrong”
“Pyramid song”
“Paranoid Android”
“Idioteque”
“Everything in it’s right place”
“Like spinning plates”
“Lucky”
“You and whose army”
“How to disappear completely”
“Talk show host”
“Street Spirit”
Tem horas que bate uma saudade da Ana… Não que a gente fosse super broder, que ela frequentasse a minha casa ou saíssemos pra almoçar por puro esporte, mas conviver mais com um ano diariamente do lado dessa menina (puxei ela pra trabalhar comigo no Link, pra quem não a conhece – e hoje ela tá na Holanda) era uma constante fonte de inspiração. Aí quando bate a saudade eu baixo no blog dela, mesmo que pra ler uns textos velhos de novo, só pra imaginar ela falando e mexendo os braços ao mesmo tempo em que a voz dela dava loopings de timbres e ela fazia caras e bocas pra contar histórias loucaças de um jeito completamente amalucado, arregalando os olhos e erguendo as sobrancelhas como estivesse entretendo um bebê. E agora, na Europa, ela não para de viajar – e eu curto o jeito que ela viaja:
Quando eu viajo, eu costumo ser uma companhia frustrante pra maioria das pessoas que viajam comigo. É que eu não sinto vontade, exatamente, de visitar os pontos turísticos “imperdíveis”. Na verdade, eu acho a maioria deles bem perdíveis.
Só que isso geralmente provoca indignação nas pessoas que me perguntam o que eu fiz e onde fui. Na verdade, elas parecem achar meus programas bem entediantes. E acaba que eu fico meio sem graça de contar o que eu fiz, porque pra algumas pessoas, se eu não fui no museu, no bairro dos turistas ou nos monumentos históricos, eu não fiz nada que valesse a viagem.
Acontece que, quando eu viajo, meu barato é ler um pouco sobre a cidade, aprender duas dúzias de expressões, mais meia dúzia de pratos típicos, pegar o mapa e sair andando. Se possível, de bicicleta ou de skate. E aí eu vou vendo as pessoas e os lugares, aprendendo a me locomover, olhando os nomes das ruas, vez ou outra parando em um ou outro ponto turístico que cruzar meu caminho. Gosto de comprar umas tranqueiras, de parar pra comer algo e pedir alguma coisa que eu nunca provei antes na vida.
Nessas, vale ler os posts que ela escreveu sobre o carnaval da Holanda, sobre onde fazer compras no Panamá e sobre o fim de semana que ela passou em Berlim.
Thor para meninas, O Natimorto e uma tarde com Mutarelli, Teenage Fanclub e o Whisky Festival, lembranças da Rádio Muda, Wayne Shorter, Moon e Bá, Marginals no Berlim, festivais em São Paulo, Marcelo Mastroianni, Danger Mouse, canal Viva, mas nada de Ed Motta nem de Bethânia. Vinteonze novinho, com os mesmos assuntos de sempre, remixados ad lib à medida em que o álcool e a nicotina dissolvem o cérebro e na vitrola rodam os primeiros discos dos Doors e da Gal.
Ronaldo Evangelista & Alexandre Matias – “Vinteonze #0007“ (MP3)
Pra muitos isso é um martíro, pra outros, um delírio – mas o fato é que Wander Wildner está passando por sua fase Berlim gravando sozinho num quarto e postando tudo no Vimeo. Eu acho massa, o cara tirando a onda do jeito que ele quer – mas eu não escuto mais do que uma vez isso. Vi lá no Marcelo.