Esse foi o último Festa-Solo na segunda-feira – agora ele acontece sempre nas sextas, às 23h45, na twitch.tv/trabalhosujo.
Beabadoobee – “Care”
Smashing Pumpkins – “Cherub Rock”`
Pavement – “You Are a Light”
Astromato – “Não Sei Jogar”
Pixies – “U-Mass”
Jesus & Mary Chain – “Vegetable Man”
Pere Ubu – “Navvy”
Fall – “C.R.E.E.P.”
B-52’s – “Private Idaho”
Blitz – “Você Não Soube Me Amar”
Pretenders – “Brass in Pocket”
Rolling Stones – “Start me Up”
Led Zeppelin – “The Crunge”
Mutantes – “It’s Very Nice Pra Xuxu”
Yes – ” I’ve Seen All Good People”
Yo La Tengo – “Blue Line Swinger”
Thin Lizzy – “Whiskey in the Jar”
Wilco – “Theologians”
BNegão e os Seletores de Frequência – “V.V.”
De Leve – “Essa É Pros Amigos”
Cassiano – “Onda (Poolside & Fatnotronic Edit)”
Lincoln Olivetti & Robson Jorge – “Eva”
A Cor do Som – “Palco”
Letrux – “Coisa Banho de Mar”
Spoon – “Rhthm & Soul”
Lou Reed – “Vicious”
Eurythmics – “Sweet Dreams”
Human League – “Don’t You Want Me”
Cure – “Let’s Go to Bed”
Daryl Hall & John Oates – “I Can’t Go For That (No Can Do)”
David Bowie – “Cat People (Putting Out Fire)”
Radiohead – “Bodysnatchers”
Dua Lipa – “Pretty Please”
Jessie Ware – “Adore You”
Chromatics – “Twist The Knife”
Tame Impala – “Borderline (Blood Orange Remix)”
Lana Del Rey – “Venice Bitch”
Pelados – “Entalhado na Carteira”
Fleet Foxes + Tim Bernardes – “Going-to-the-Sun Road”
Taylor Swift + Bon Iver – “Exile”
Bonifrate – “100%”
Red Hot Chili Peppers – “Breaking the Girl”
Sebadoh – “2 Years 2 Days”
R.E.M. – “Low”
Nick Cave – “Cosmic Dancer”
Fiona Apple – “Ladies”
PJ Harvey – “Down By The Water (Demo)”
Carabobina – “Pra Variar”
Warpaint – “Whiteout”
Angel Olsen – “Lark Song”
Joni Mitchell – “Day After Day”
Beatles – “Long Long Long”
Beatles – “Cry Baby Cry”
Tendo idéias…
Pavement – “Grounded”
Chico Buarque – “Vai Trabalhar Vagabundo”
Fiona Apple – “Relay”
Mombojó – “Discurso Burocrático” / “A Missa”
Edgar – “O Amor Está Preso”
Velvet Underground – “The Murder Mystery”
Raul Seixas – “Tu És O MDC Da Minha Vida”
Serge Gainsbourg – “Je Suis Venu Te Dire Que Je M’En Vais”
Beatles – “Blue Jay Way”
Cure – “Lullaby”
Astromato – “Não Sei Jogar”
Happy Mondays – “Loose Fit”
Chico Science & Nação Zumbi – “Criança de Domingo”
Cidadão Instigado – “Dói”
Carole King – “Way Over Yonder”
Pink Floyd – “Wots … Uh The Deal”
Neste domingo acontece a segunda edição do festival Fora da Casinha, que o compadre Mancha Leonel – o Mancha, da Casa do Mancha – levanta na raça e na unha, sem patrocínio e reunindo o filé da produção musical brasileira independente. Na edição do ano passado ele bateu na tecla do indie rock brasileiro, crucial em sua formação e na história da casinha. Na edição 2016, ele aponta para o perfil atual do estabelecimmento e seus passos futuros, incluindo ícones do rock independente nacional e novos sabores da atual cena pop brasileira, reunindo dez apresentações (Hurtmold, Jaloo, Mauricio Pereira, Cidadão Instigado, Anelis Assumpção & Dustan Gallas, Luiza Lian, Kiko Dinucci, Maglore, As Bahias e a Cozinha Mineira, Ventre e Juliana Perdigão) em três palcos a partir das quatro da tarde. Como no ano passado, eu, Luiz e Danilo representamos a SUSSA – Tardes Trabalho Sujo, tocando apenas música independente brasileira na área comum, que conta com área de alimentação, feirinha de publicações independentes, lançamento do livro Cena Musical Paulistana dos Anos 2010, do Thiago Galletta, e exibição do documentário Música ao Lado” sobre as pequenas casas de shows em São Paulo. O evento acontece na Unibes Cultural, do lado do metrô Sumaré (mais informações aqui), e eu pedi pro Mancha escolher as dez músicas do indie brasileiro que foram mais importante em sua formação. Sugiro dar play no vídeo e abaixar o volume para ouvir a música comentada ao fundo da explicação da escolha para cada faixa.
Bonifrate – “Cantiga da Fumaça”
Pullovers – “Tudo Que Eu Sempre Sonhei”
PELVs – “Even if the sun goes down”
Astromato – “No Macio, No Gostoso”
Bazar Pamplona- “Faixa Bônus”
Thee Butchers Orchestra – “Sugar”
Motormama – “Coração Hardcore”
Wado e o Realismo Fantastico – “Tormenta”
Apanhador Só – “Não Se Precipite”
Superguidis – “Malevolosidade”
Não resisti e resgatei umas edições velhas do Trabalho Sujo impresso, tirei umas fotos e redimensionei pra colocar aqui no site. As fotos estão com cores diferentes não por conta da idade do papel, mas porque parte delas eu fiz de dia (as mais brancas) e a outra de noite (as amareladas). Dá uma sacada como era…
Nesta edição, dois segundos discos: o do Planet Hemp e o do Supergrass.
Nesta eu falei do Panthalassa, disco de remix que o Bill Laswell fez com a obra de Miles Davis, o segundo disco do Garbage, entrevista com Virgulóides, disco de caridade organizado pelo Neil Young e uma explicação sobre um novo gênero chamado… big beat.
Entrevistei os três integrantes do Fellini (Jair, Thomas e Cadão) para contar a história da banda, numa época em que eles nem pensavam em voltar de verdade (depois disso, eles já voltaram e terminaram a bandas umas três vezes). Também tem a história do Black Sabbath, uma entrevista que eu fiz com o Afrika Bambaataa e o comentário sobre a demo de uma banda nova que tinha surgido no Rio, chamada Autoramas.
Disco de remix do Blur, disco póstumo do 2Pac, Curve e entrevista com Paula Toller.
Discos novos da Björk, dos Stones, do Faith No More e do Brian Eno.
Discos novos do Wilco (Summerteeth), Mestre Ambrósio, coletâneas de música eletrônica (da Ninja Tune, da Wall of Sound – só… big beat – e de disco music francesa), resenha da demo da banda campineira Astromato e entrevista com o Rumbora.
Resenha do Fantasma, do Cornelius, do Long Beach Dub All-Stars (o resto do Sublime), do Ringo e do show dos Smashing Pumpkins em São Paulo, com a entrevista que fiz com a D’Arcy.
Vanishing Point do Primal Scream, disco-tributo ao Keroauc, Coolio e a separação dos irmãos da Cavalera.
Reedição do Loaded do Velvet Underground, Being There do Wilco e o show em tributo á causa tibetana.
Especial Bob Dylan, sobre a fase elétrica do sujeito no meio dos anos 60, com direito à entrevista com o Dylan na época, que consegui através da gravadora e um texto de Marcelo Nova escrito especialmente para o Sujo: Quem é Bob Dylan?
30 anos de Sgt. Pepper’s e o boato da morte de Paul McCartney.
Terror Twilight do Pavement, Wiseguys (big beat!), o disco de dub do Cidade Negra (sério, rolou isso), a demo do 4-Track Valsa (da Cecilia Giannetti) e entrevista com o Rodrigo do Grenade.
Pulp, Nação Zumbi, Ian Brown e Seahorses, uma coletânea de clipes ingleses e entrevista com Roger Eno, irmão do Brian.
30 anos de Álbum Branco, show do Man or Astroman? no Brasil, primeiro disco do Asian Dub Foundation, entrevista com a Isabel do Drugstore e demo do Crush Hi-Fi, de Piracicaba.
Os melhores discos de 1997: 1 – OK Computer, 2 – Vanishing Point, 3 – When I Was Born for the 7th Time, 4 – Homogenic, 5 – O Dia em que Faremos Contato, 6 – Dig Your Own Hole, 7 – Sobrevivendo no Inferno, 8 – I Can Hear the Heart Beating as One, 9 – Dig Me Out, 10 – Brighten the Corners… e por aí seguia.
20 anos de Paul’s Boutique, do Beastie Boys, disco do Moby, demo do Gasolines e entrevista com Humberto Gessinger.
Rancid, Superchunk e entrevista com o Mac McCaughan (do Superchunk), Deftones e Farofa Carioca (a banda do Seu Jorge).
Simpsons lançando disco e a lista dos 50 melhores do pop segundo Matt Groening, segundo disco do Dr. Dre, entrevista com Júpiter Maçã que então lançava seu primeiro disco.
A coletânea Nuggets virou uma caixa da Rhino, a cena hip hop brasileira depois de Sobrevivendo no Inferno, disco dos Walverdes e entrevista com Henry Rollins.
Sleater-Kinney, Fun Lovin’ Criminals, Little Quail, demo do MQN e entrevista com o Mark Jones, da gravadora Wall of Sound (o lar do… big beat).
25 anos de Berlin do Lou Reed, disco novo do Pin Ups, disco do Money Mark e entrevista com Chuck D, que estava lançando um livro na época.
Especial soul: a história da Motown e da Stax (lembre-se que não existia Wikipedia na época) e caixas de CDs do Al Green e da Aretha Franklin.
Retrospectiva 1998: comemorando um ano que trouxe artistas novos para a década…
…e os melhores discos de 1998: 1 – Hello Nasty, 2 – Mezzanine, 3 – Fantasma, 4 – Jurassic 5 EP, 5 – Carnaval na Obra, 6 – Deserter’s Songs, 7 – This is Hardcore, 8 – Mutations, 9 – The Miseducation of Lauryn Hill, 10 – Samba pra Burro. Em minha defesa: só fui ouvir o In the Aeroplane Over the Sea em 1999. Não tente entender visualmente, era um método muito complexo de classificação dos discos, um dia eu escaneio e mostro direito.
Beastie Boys, Scott Weiland e Boi Mamão.
A história do Kraftwerk (que vinha fazer seu primeiro show no Brasil), o acústico dos Titãs, Propellerheads (big beat!) e entrevista com Ian Brown.
Segundo disco do Black Grape, coletânea de 10 anos da Matador e entrevista com o dono da gravadora, Gerard Cosloy.
A carreira de Yoko Ono, disco novo do Ween, coletânea de Bauhaus, John Mayall e Steve Ray Vaughan e a trilha sonora de O Santo (cheia de… big beat).
Stereolab, Racionais, Metallica e 3rd Eye Blind (?!).
Disco de remixes do Primal Scream, caixa do Jam, entrevista com DJ Hum, Sugar Ray e disco solo do James Iha.
Cornershop, show à causa tibetana vira disco, Bob Dylan, Jane’s Addiction, Verve e entrevista com Lenine.
Disco de remixes do Cornelius, Sebadoh, Los Djangos, Silver Jews, entrevista com o Lariú e demo do Los Hermanos.
Disco de remixes da Björk e o novo do Guided by Voices.
Disco novo do Sonic Youth, reedição dos discos do Pussy Galore e entrevista com Edgard Scandurra.
Cobertura dos shows do Superchunk no Brasil, Pólux (a banda que reunia a Bianca ex-Leela que hoje é do Brollies & Apples e a Maryeva Madame Mim), Prince e Maxwell, coletânea da Atlantic e entrevista com os Ostras.
…e na cobertura dos shows do Superchunk eu ainda consegui que a banda segurasse o nome do Trabalho Sujo para servir de logo na página.
Editei o Sujo impresso entre 1995 e 2000. Durante esse período, ele teve vários formatos. Começou como uma coluna na contracapa do caderno de cultura de segunda e em 1996 virou uma coluna bissemanal ocupando 1/6 da página 2 do mesmo caderno. No mesmo ano, voltou a ter uma página inteira, nas edições de sábado e entre 1997 e 1999 ocupou a central do caderno de domingo. Neste último ano, voltou a ter apenas uma página, nas edições de sábado. Na época em que eu fazia o Sujo impresso, eu era editor de arte do Diário do Povo e, por este motivo, participei da criação do site do jornal em 1996 – e garanti que o Sujo tivesse uma versão online desde seu segundo ano. Foi o suficiente para que ele começasse a ser lido fora de Campinas (onde já tinha um pequeno séquito de leitores, que compravam o Diário apenas para ler a coluna) e ganhasse algum princípio de moral online, que carrego até hoje.
Na época, eu dividia o gostinho de fazer a coluna com dois outros compadres – o Serjão, que era editor de fotografia do jornal e que hoje está no Agora SP, e o Roni, um dos melhores ilustradores que conheço. Os dois são amigos com quem lamento não manter contato firme, mas são daquelas pessoas que, se encontro amanhã, parece que não vi desde ontem. Juntos, éramos uma minirredação dentro da redação – tínhamos reunião de pauta, discussões sobre o layout da página e trocávamos comentários sobre os discos que eu trazia para resenhar. No fim, eu fazia tudo sozinho na página (como faço até hoje), da decisão sobre o que entra ao texto, passando pela diagramação. Sérgio e Roni entravam com fotos e ilustras, mas, principalmente, com o feedback pra eu saber se não estava viajando demais ou de menos. Nós também começamos a discotecar juntos, mais um quarto compadre, o William, e, em 97, inauguramos o Quarteto Funkástico apenas para tocar black music e groovezeiras ilimitadas, em CD ou em vinil. Não era só eu quem escrevia no Sujo (eu sempre convidava conhecidos, amigos e alguns figurões), mas Roni e Serjão, por menos que tenham escrito, fizeram muito mais parte dessa história do que qualquer um que tenha escrito algo com mais de cinco palavras.
No ano 2000 eu fui chamado pelo editor-chefe do jornal concorrente, o Correio Popular, maior jornal de Campinas, para editar seu caderno de cultura, o Caderno C, cargo que ocupei durante um ano, antes de me mudar para São Paulo. Neste ano, para evitar confusões entre os dois jornais sobre quem era o dono da coluna (e não correr o risco de assistir a alguém depredar o nome que criei no jornal que comecei a trabalhar), decidi tirar o Sujo do papel e deixá-lo apenas online. Criei minha página no Geocities para despejar os textos que publicava em outra coluna dominical, no novo jornal, chamada Termômetro. Mas, online, seguia o Trabalho Sujo -até que, do Geocities fui para o Gardenal, e isso é ooooutra história.
Um dia eu organizo tudo bonitinho, isso é só pra fazer uma graça – e matar a minha saudade.
Lista complicada, o critério definido para determinar o que é ou o que não é rock independente é curto e grosso: se tem dinheiro de empresa grande, não é indie. Assim, os altos e baixos do rock nacional no mercado de discos dão a tônica da produção independente nos últimos vinte anos. Até o começo dos anos 80, ser independente era uma atitude, um manifesto – como foram os discos da fase Racional de Tim Maia e a idéia original do selo de Luís Carlos Calanca, a Baratos Afins. Mas a explosão do rock na década de 80 praticamente extinguiu a produção indie, tamanha era a demanda das grandes gravadoras – e grupos independentes por definição musical tiveram seus discos lançados por majors. A estréia de Lobão, Cena de Cinema, de 1982, por exemplo é uma demo gravada em vinil. Nos anos 90, a chegada da MTV e o sucesso do Sepultura no exterior impulsionam o faça-você-mesmo e o rock independente vive o nascimento de um mercado que começaria a se organizar nos anos seguintes. O sucesso do plano Real, em 94, determina o futuro deste mercado: se por um lado abre a possibilidade de se adquirir tecnologia graças à paridade com o dólar, por outro exclui o elitismo musical do mercado de discos, voltado apenas para classes populares. Isto aumenta a produção caseira e equipa uma primeira geração de computadores que, graças à internet, passa a se comunicar com mais agilidade e para um público específico. Chegamos ao século 21 com uma produção madura e plural, disposta a conquistar o Brasil e o planeta.
Os 25 discos abaixo são as pedras fundamentais na formação de um mercado independente, tanto do ponto de vista comercial como artístico. Cada um deles marca uma etapa concluída, um novo patamar e uma novidade no complexo jogo do rock brasileiro indie, cada vez menos abaixo e mais ao lado do pop endossado por patrões abonados, mesmo aqueles lançados sob uma chancela “indie” (como o selo Plug da BMG, o Banguela da Warner, a Tinitus que era distribuída pela PolyGram ou o Chaos da Sony). Para facilitar a compreensão e não confundir a história, o foco fica apenas no formato rock, excluindo outros agentes cruciais para a formação do mercado independente (como hip hop, heavy metal, eletrônico e hardcore). Se não, era assunto para páginas e mais páginas…
1) Singin’ Alone – Arnaldo Baptista (1982)
Marco zero da produção independente como nós conhecemos, é o primeiro lançamento da Baratos Afins e o alerta “o sonho acabou” para a geração que cresceu à sombra dos Mutantes. Um novo rock estava começando a tomar conta do Brasil (à base do chopp e batata frita) e Arnaldo Baptista chorava as próprias mágoas ao piano, atormentado emocionalmente, com baladas cruas e muito rock’n’roll. Bem distante do sol carioca que começava a bronzear o rádio.
2) 3 Lugares Diferentes – Fellini (1987)
MPB maldita, cool wave, pós-punk, bossa nova, África, cult band, art rock… Conceitos que fervilhavam no underground oitentista se encontraram numa mesma banda. Formada pelos jornalistas Cadão Volpato e Thomas Pappon, o Fellini contava com a participação de Ricardo Salvagni para gravar seu álbum menos enigmático e mais, er, pop. Entre o rock europeu e a melancolia brasileira, eles sintetizavam sentimentos que anos depois seriam traduzidos em um único adjetivo: indie.
3) O Ápice – Vzyadoq Moe (1988)
Na Sorocaba pré-Wry, o clima europeu era mais alemão do que inglês. Culpa do noise dada do Vzyadoq Moe, performáticos orgânicos que partiam pra cima do público. Menores de idade e fartos de punk rock, abraçavam o drone, o cabecismo, o ritmo kraut e o industrial desplugado, especialmente na percussão ferro-velho. O Ápice vale seu título por optar pela independência, enquanto irmãos de sonoridade do grupo (o mineiro Sexo Explícito, os cariocas Black Future e Picassos Falsos) fecharam com a certeza do contrato com grandes patrões.
4) Cascavelettes (1988)
Antes de serem banalizados por um hit na novela Top Model, pelos mimos do superstarismo e muito antes do forróck boca-suja dos Raimundos, os Cascavelettes inauguraram a fase moderna do pop gaúcho, separando os contemporâneos do Liverpool e a geração Rock Grande do Sul como farinha do mesmo saco. Usando o palavrão com motivos rock’n’roll (o rock brasileiro só os usava com motivos punk, ressaca da Censura), o grupo era um misto de Ramones pornográficos com New York Dolls machistas e seu primeiro disco (lançado um ano antes do sucesso de “Nega Bom-Bom”) mostra a disposição para injetar algo mais do que energia no indie nacional. As demos da época, todas batizadas com o nome da banda, mantém o “nível”.
5) You – Second Come (1991)
Este é o único disco do selo Rockit!, do guitarrista da Legião Dado Villa-Lobos, que pode ser considerado independente – já que o sucesso underground que fez esgotar a tiragem inicial de 3 mil discos fez crescer o olho da inglesa EMI-Odeon, que abduziu a marca. A estréia do Second Come, influenciada diretamente pelo sussurrado rock inglês pós-Madchester e pelas convulsões noise pré-grunge do underground americano, abre a segunda fase do indie brasileiro que, devido à onipresença do instrumento, começa a ser definido, anglofonamente, de “guitar” (as duas pronúncias são permitidas).
6) Little Quail and the Mad Birds (1992)
Depois de tentar seguir os passos da geração Legião-Plebe-Capital (em vão, culminando na geração do seminal Rock na Rampa, em 1987), o rock de Brasília volta-se para dentro e a capital do Brasil começa a ebulir culturalmente. Disputando cabeça-a-cabeça o título de melhor banda com o Low Dream e o de melhor demo com o Oz (a excelente Trés Bien Mon Ami), o Little Quail ganha por não soar derivativo de ninguém (nem de My Bloody Valentine, nem de Pixies). A fita é uma ótima desculpa para caçar os registros sonoros do rock candango do começo da década, que vão da fase rock do Pravda aos primórdios dos Raimundos, passando pelas excelentes, e esquecidas, Succulent Fly e Sunburst.
7) Killing Chainsaw (1992)
São os piracicabanos do KC que colocam o rock do interior de São Paulo no mapa da década de 90. O LP homônimo, lançado pela loja de discos Zoyd e sampleando o anime Akira na capa, é o ponto inicial de uma geração que deu ao Brasil instituições célebres do underground, como a casa noturna Hitchcock (em Santa Bárbara d’Oeste), o zine Broken Strings, o festival Juntatribo, a rádio Muda e o estúdio Arenna (todos estes em Campinas), além de bandas que iam do punk pop do No Class ao samba-noise do Linguachula e o industrial nerd dos Concreteness. Além de iniciar a fase caipira do indie nacional, o Killing ainda se orgulhava de seu inglês brasileiro, com sotaque “tchu” em vez de “to” e sem brit-frescuras. O rock aqui é ligado na tomada e na distorção, de pai Sonic Youth e mãe J&MC.
8) Rotomusic de Liquidificapum – Pato Fu (1993)
O disco mais esquisito da gravadora mineira Cogumelo (que já contava com esquisitices como o disco sub-Red Hot do DeFalla ou o caos sônico do Holocausto) também é o disco de estréia do Kid Abelha dos anos 90. Estranho, não? Que nada. Estranho é ouvir a versão speed para “Sítio do Picapau Amarelo” ou um hino mosh baptchura cuja citação da Unimed levou o grupo a tocar no comercial do plano de saúde. E que tal o medley esquizofônico que batiza o disco, que cita, sem pudor, os Flintstones, Kiss, baião, funk metal e beats eletrônicos? Muito mais John do que Fernanda Takai, é o disco do trio mineiro que os fãs de Mike Patton mais gostam. Com razão.
9) Scrabby? – Pin Ups (1993)
Lançado pela Devil e produzido por João Gordo, o terceiro (ou segundo, se não contarmos o LP do projeto Gash) disco dos pais do indie 90 é também seu disco mais sombrio e pesado. Fora as referências inglesas, entra o lado mais caótico e, hm, “visceral” da banda. Gravado com sua formação clássica, é uma mistura de Funhouse (dos Stooges) com Berlin (do Bowie). É o ápice das guitarras de Zé Antônio. “Acho que esse foi o disco que mais teve briga no estúdio”, lembraria o vocalista Luís Gustavo anos depois”, eu nunca vi tanta gente chorando, berrando, a Alê chorando num canto, o Marquinhos no outro”.
10) Mod – Relespública (1993)
Curitiba tem a péssima reputação de não produzir registros sonoros à altura das apresentações ao vivo de suas bandas. Discos e fitas funcionam mais como “guias” sobre o que esperar de determinado grupo do que reproduções in vitro de suas performances instantâneas. Da mesma forma, a cidade não possui rock de laboratório, aquele feito para viver em estúdio. Talvez isto explique o paradoxo fundamental da capital do Paraná: quanto mais bandas a cidade produz, menos elas se destacam em nível nacional. O primeiro compacto da Relespública (ainda com o enfant terrible Daniel Fagundes, vocalista, morto aos 16 anos) pertence à primeira safra do indie rock da cidade, custeado pela gravadora Bloody que pertencia ao mesmo JR que é dono do lendário club 92 Degrees. Com três faixas (“Capaz de Tudo”, “Preciso Pensar” e “Quem é Que Entende o Mundo?”), o vinil fala mais do rock de Curitiba do que todas compilações lançadas em seu nome.
11) Nunca Mais Vai Passar o Que Eu Quero Ver – Doiseu Mimdoisema (1994)
A influência que a Graforréia Xilarmônica, uma das dissidências dos Cascavelettes, teve sobre o rock gaúcho é muito maior que o séquito de fãs que o grupo preserva até hoje. Graças ao improvável gosto musical de seus líderes, Frank Jorge e Marcelo Birck, despertou-se no pop riograndense o prazer em redescobrir a Jovem Guarda, encravada na memória genética do estado. Esta redescoberta trombou irresistivelmente com os prazeres de uma recém-descoberta paixão gaúcha, o experimentalismo no estúdio em tempos de gravação caseira. Diego Medina fez a fita para um amigo de farra, mas a contagiante “Epilético” pulou do som da sala de estar para as ondas do rádio e virou hit local instantâneo. Medina continuaria suas experiências pop no futuro (Grupo Musical Jerusalém, Video Hits, Senador Medinha), mas sem conseguir reencontrar a ingenuidade da primeira fita, que está para o rock gaúcho atual como Angel Dust, do Faith No More, está para o novo metal.
12) Uh-La-La – Dash (1995)
Antes de provocar suspiros com seu baixo Danelectro a bordo dos Autoramas (e ao lado do ex-Little Quail Gabriel Thomaz), Simone do Vale era a líder de um supergrupo indie carioca. Gritalhona e com jeito de moleque, ela era uma das guitarrista do grupo, ao lado de Diba Valadão (na outra guitarra), Formigão (que depois entrou para o Planet Hemp, no baixo) e Kadu (ex-Second Come, na bateria). O hit “Sexy Lenore” transformou a demo Sex and the College Girl num hit do underground do Rio e fez com que o grupo fosse sondado pela misteriosa gravadora Polvo, que lançou o único CD da banda, pra ninguém. Com a capa desenhada por David Mazzuchelli, o disco passou por uma série de empecilhos que o tornaram item de colecionador. O ano era 1995, as grandes gravadoras tinham dado as costas para o rock, as pequenas perdiam ilusões de vendagens altas e vários picaretas apareceram no meio da história. O disco do Dash é apenas um dos muitos exemplos de uma geração pega com as calças na mão.
13) 100 Km c/ 1 Sapato – Lacertae (1995)
Ao mesmo tempo, o Lacertae, no Sergipe, abria uma em muitas possibilidades. Depois da seca de 1995, o mercado independente passou por uma brusca horizontalização, e sua pluralidade tornava-se sua principal qualidade. Assim, bandas de lugares sem tradição passavam a ganhar espaço no cenário, quebrando o eixo Rio-SP-BH-Brasília-PoA-Recife que já havia quebrado o RJ-SP original no começo da década. A cena começa a fragmentar-se não apenas em lugares diferentes (cidades como Goiânia, Londrina, Salvador, Fortaleza, Florianópolis, Vitória e Maceió reivindicam na marra seu próprio espaço, nos anos seguintes) mas em gêneros improváveis. Se a MTV e o Sepultura criaram um hiato noise/guitar/heavy com bandas cantando em inglês e tentando, sem sorte, o mercado exterior, a fita de estréia do Lacertae é o elo perdido entre o pop dos anos 90 e o experimentalismo dos dias do Vzyadoq Moe. Hendrix, discursos concretos e uma bateria com berimbau também mostravam que o Nordeste estava em plena ebulição artística depois do mangue beat.
14) Carbônicos – The Charts (1996)
Com a fragmentação da cena independente, São Paulo entrou numa onda retrô semelhante à gaúcha, disposta a resgatar valores sessentistas a um pop perdido entre a rádio e o anonimato. Antecipando a onda kitsch que veio com Austin Powers e o box-set do disco Nuggets, a cena paulistana passou por uma estilização visual e sonora que mais tarde seria referida, de forma irônica, como a cena “churly”. Os responsáveis pela popularização desta nova fase seria o grupo comandado por Sandro Garcia, que teve seu único disco lançado pela loja Suck My Discs dos jornalistas/músicos Alex Antunes e Celso Pucci (outra ponte dos anos 90 com o cult rock dos 80). Garcia, dono do famoso estúdio Quadrophenia, mais tarde fundaria o Momento 68 com o vocalista da banda gaúcha Lovecraft, Plato Divorack, selando assim a paixão de São Paulo e Porto Alegre pelos anos 60. (Plato aliás é a grande ausência desta lista, talvez por nenhum disco sintetizar toda a complexidade do artista).
15) Learn Alone Or Read The User’s Manual – Sleepwalkers (1996)
Aqui vamos ter motivos de sobra para reclamações. Afinal, muitos vão falar dos tempos do baterista Farmácia ou da clássica Sick Brain in Sue’s Coffee, gravada um ano antes, quando muitos sequer reconhecerão a presença da banda. O fato é que os Sleepwalkers foram a melhor banda de indie rock, em todos os sentidos, que o Brasil já teve, deixando para trás concorrentes de peso como os goianos Grape Storms, a carioca PELVs e o Grenade de Londrina. A sonoridade lo-fi, o tratamento de guitarras, o senso melódico, os refrões, o apelo pop – as qualidades do grupo catarinense podem encher parágrafos e mais parágrafos. Mas além de sua qualidade, sua importância se dá por tirar o pop catarina da vibração riponga de bandas como Phunky Buddha e Dazaranhas. Depois deles, vieram o Feedback Club (da ex-sleepwalker Sabrina), o Superbug, os Pistoleiros, o Pipodélica e as gravadoras Low Tech e Migué Records, dando força à cena ilhéu de Floripa.
16) Baladas Sangrentas – Wander Wildner (1997)
Luminar do punk brasileiro para as massas dos anos 80, o ex-vocalista dos Replicantes seguiu os passos da primeira safra dos anos 90 (comprada pelas majors) e o moldou para o underground. Como os Raimundos tinham o forró, o Planet Hemp tinha a maconha e o mangue beat, os caranguejos; Wander inventou uma máscara para facilitar sua absorção pelo mercado – e com o rótulo “punk-brega” vendeu-se para uma nova geração ao mesmo tempo em que amadurecia sua personalidade pública. Mas, mais importante, a carreira solo do velho WW era uma prova cabal que o rock independente pouco tem a ver com juventude ou faixa etária.
17) Menorme – Zumbi do Mato (1997)
O Zumbi do Mato é o som que Fausto Fawcett e Arrigo (ou Paulo) Barnabé fariam juntos se tivessem alguma afinidade. Mas, mais do que isso, é o ponto de convergência de diversos aspectos do pop carioca, representados por diversas instituições. Há o humor doentio do Gangrena Gasosa, a explosão cênica de Piu-Piu & Sua Banda, a podreira das primeiras fitas do Pólux, as gravadoras Tamborete (do jason Leonardo Panço) e Qualé Maluco (dos planet hemp B-Negão e Formigão), a repetição do Stellar, o choque de Rogério Skylab e o som metal da segunda vinda do Second Come. Além disso, o grupo continua o legado experimental retomado pelo Lacertae que resultou na safra de vanguarda da virada do século, com nomes como Objeto Amarelo, os Jersssons (São Paulo), Os Legais (SC) e Vermes do Limbo (Londrina).
18) A Sétima Efervescência – Júpiter Maçã (1998)
O disco de estréia do ex-cascavelette Flávio Basso é um passo adiante nos conceitos vendidos pelos Charts e por Wander Wildner. Rock adulto, retrô e psicodélico, A Sétima Efervescência sagrava a maturidade da mesma geração que havia tomado a porta-na-cara das gravadoras depois da efervescência do biênio 93/94 e a independência do formato perseguido pelas gravadoras, sem deixar de soar pop, brasileiro e cantando em português e inglês. É o primeiro blip no radar de um mercado que viria, em menos de um ano, a galinha de ouros do trio sertanejo-axé-pagode começar a dar com os burros n’água.
19) Chora – Los Hermanos (1999)
A segunda fita do quinteto Los Hermanos escancarava um pop estritamente radiofônico que foi forjado longe do universo do mercado fonográfico. O grupo liderado por Marcelo Camelo era a continuação do trabalho de uma geração de bandas cariocas que misturavam ska, funk, reggae e samba (nomes como Los Djangos, Acabou La Tequila e, mais tarde, Pedro Luís & A Parede). Mas o grupo ia além e se alinhava ao ecletismo chique de bandas de sua geração, como 4-Track Valsa, Vibrossensores, Vulgue Tostoi, entre outros. Fora os maneirismos apaixonados (que levaram a banda receber rótulos como romanticore e pop brega), a fita mostrava que as possibilidades cogitadas por Júpiter Maçã poderiam ser exploradas a fundo, tanto artística quanto comercialmente. Mas o mercado, acostumado com seu próprio toque de Midas, comprou a banda e forçou “Anna Júlia” a fazer sucesso, overdosando o público do que poderia se tornar os Paralamas do século 21 (e ainda pode, apesar de tudo).
20) Astromato (1999)
Continuação dos experimentos noise e industrial da época do Waterball (92-95), o Astromato era filho direto do Weed, banda de pop guitarreiro britânico que, brincando com as palavras, passou a compor em português e se deu bem. Sua primeira fita era mais um degrau na escalada que o indie brasileiro dava rumo à sua auto-suficiência artística. Se gaúchos e cariocas ajudavam o rock a perder o jeito de moleque, os campineiros explicavam que algumas qualidades (como sensibilidade e timidez) não pertenciam à adolescência. Além disso, a dupla de guitarras Armando e Pedro tramavam texturas sônicas à moda das bandas inglesas que tanto influenciaram o indie no começo dos anos 90 (e que ainda repercutiam, graças a bandas como os mineiros Vellocet, o carioca Cigarettes e os catarinenses Madeixas). Aos poucos, o ciclo vai se fechando.
21) De Luxe 2000 – Thee Butchers’ Orchestra (1999)
Cru e direto, o TBO é a melhor banda de rock’n’roll brasileira na ativa e sua existência se deve à dissidência garageira que rompeu com o indie no meio dos anos 90. Seu núcleo central era o trio da gravadora Ordinary (a produtora Deborah Cassano, seu marido Marco Butcher, ex-Pin Ups, e o guitarrista e produtor Adriano Cintra), que, além dos Butchers’ foi responsável pelo lançamento de bandas como Ultrasom (de Adriano), Red Meat, Spots, Grenade, entre outras. Mais do que agitar o underground com duas guitarras e uma bateria, o Butchers’ está ligado à fase de ouro do indie anos 90, quando o rock brasileiro começou a conversar com os gringos, sem passar pelos veículos oficiais.
22) It’s An Out of Body Experience – Grenade (1999)
O Grenade era o próximo patamar. Fruto dos experimentos lo-fi do ex-Killing Chainsaw Rodrigo Guedes, o grupo nascia em Londrina e logo se tornava um dos maiores nomes do indie nacional. A repercussão se dava graças à sensibilidade de Rodrigo, pai de riffs memoráveis, melodias pop ao extremo e pirações em estúdio. O som ia do rock clássico ao hardcore, passando por folk e indie rock. Lançado no exterior, Out of Body Experience poderia é a conclusão lógica do longo passeio que o rock independente fez durante a década de 90.
23) Brincando de Deus (2000)
O terceiro disco destes baianos deveria ter o título que Experience, do Grenade, levou. Afinal, seria lançado um ano antes e produzido por Dave Friedmann (Flaming Lips, Mercury Rev, Mogwai) caso todo seu equipamento e pré-produções não fossem perdidos num incêndio. O grupo se refez e, ao lado do talentoso produtor e tecladista André T. (responsável pela sonoridade de novos baianos como Rebeca Matta e a banda Crac!), gravou seu álbum definitivo, imbatível. Um disco que poderia ser lançado no mercado exterior sem dificuldades e que, apesar da anglofilia, é essencialmente brasileiro.
24) Peninsula – PELVs (2000)
Completando dez anos de banda e dez anos do selo carioca Midsummer Madness, a PELVs faz um disco igualmente robusto como o do Brincando de Deus, mas cheio de ganchos pop e melódicos. Uma obra-prima do indie nacional, Peninsula soa como todos os independentes querem soar: profissa, autêntico, despreocupado e livre, como se o mercado de discos brasileiro permitisse isto. Se ele não permite, a deixa fica para o indie.
25) O Manifesto da Arte Periférica – Wado (2001)
Além de coroar a recente produção de Maceió (a saber, Varnan, Mopho e Sonic Junior), o disco de estréia do ex-Ball Oswaldo Schlickmann é o auge da produção independente brasileira dos últimos 20 anos. Tem todas as qualidades dos discos citados nesta lista, além de falar em português, compor letras certeiras e experimentar à vontade no estúdio. Se chegamos até aqui com este nível, daqui pra frente é só crescer.
Não lembro pra quem eu escrevi esse texto… Acho que foi pra Zero.
Tudo ou Nada era uma coluna que eu fazia entre 98 e 99 para diferentes veículos online: o site London Burning e o mailzine CardosoOnLine eram dois que a reproduziam. Segue um exemplo, er, “rápido”.
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Vocês estão prontos para o Dia 1?
1º de janeiro do ano 2001 será mais importante do que muita gente pensa. Enquanto muitos esperam o início dos novos século e milênio (como se isso fosse mudar algo na vida de alguém), técnicos, executivos, programadores, jornalistas, internautas, telespectadores, comunicadores, acionistas, diretores, presidentes e outros formadores de opinião roem as unhas de ansiedade. Esperam o réveillon mais aguardado do ano por um simples motivo ligado à tecnologia. Não, não é o bug.
O primeiro dia do ano que vem foi escolhido pelo novíssimo gigante do mercado de infotainment (informação + entretenimento), a AOL Time-Warner, para marcar o início de suas atividades. Batizado simples e taxativamente de “Dia 1”, a data marca o que muitos acreditam ser o começo de uma nova era. Não é para menos. Afinal, a publicidade em torno do “Dia 1” começará ainda neste semestre, perguntando-nos se estamos prontos para ele. À medida que a campanha criará uma expectativa sem precedentes no planeta, ela desvendará alguns segredos que o monstro empresarial prepara para o nosso futuro.
A célula deste novo organismo é um aparelho chamado Info. O Info padrão, usado como símbolo da nova mudança, lembra aqueles antigos aparelhos de televisão que eram o próprio móvel, com uma enorme caixa de som abaixo da tela e pés de cômoda. Existem vários modelos de Infos – portáteis, de pulso, de colo, de bolso, recarregáveis -, mas o modelo standard é o ícone da nova mudança. A princípio, o aparelho impressiona pelo design: uma tela de quarenta polegadas na frente de um enorme alto-falante num console prata de um metro de largura por um metro e vinte de altura.
Tanto som quanto imagem ultrapassam os conceitos atuais. Com micro caixas de som espalhadas por seu corpo, o aparelho tem 32 diferentes canais de som, que podem proporcionar sensações muito próximas ao som real. A imagem é perfeita: são 15 mil linhas de definição projetadas sobre uma tela plana, que fica por trás da tela real, também plana. Com duas telas superpostas, podemos ter a sensação de profundidade em qualquer imagem projetada. Juntos, imagem e som (ambos digitais), derrubam qualquer home-theater existente no mercado.
O aparelho sequer funciona à energia elétrica. Para ligá-lo, basta plugar a toma a um fio que a própria AOL Time Warner deverá fornecer. Se você tem TV a cabo, não se preocupe: com o projeto de compra de todos os “pequenos” (lembre-se do tamanho da operação que estou descrevendo) retransmissores de TV a cabo no mundo, basta solicitar o Info à sua própria provedora e ele estará instalado em sua casa – por meros US$ 50! E pronto: você não precisa pagar mais nada para receber os benefícios do Info.
O controle remoto é do tamanho de uma agenda eletrônica e, como tal, tem teclado alfanumérico. Mas para operações mais simples (como mudança de canais e manipulação do som), um outro artefato surge para facilitar a vida de todos: o Strap-it É uma simples tira de borracha que se adapta a qualquer mão adulta (sim, eles têm modelos infantis e para deficientes físicos): na palma da mão, um pequeno sensor identifica seus comandos e os reproduz na tela, como um mouse acoplado à sua mão.
A chegada do Dia 1 será comemorada com um enorme show de 24 horas que marcará o primeiro dia. A partir de Sidney, na Austrália, o mundo inteiro poderá acompanhar um megashow mundial disposto a transformar o Live Aid em papo furado. Serão 24 cidades escolhidas ao redor do mundo para recepcionar, em cada um dos fusos horários do mundo, a meia-noite do dia 1º de janeiro do ano que vem. Em cada uma destas cidades, a megaempresa construiu um enorme ginásio de fibra de vidro (todos poderão ser montados em menos de duas semanas).
Serão 48 horas de show em cada uma das 24 cidades. As 23 primeiras horas terão apresentações de circo, mágicos, personalidades dos países-sede e outras comemorações, sempre com um enorme relógio que contará os segundos para a chegada do grande dia. Em vários pontos do ginásio, os primeiros Infos entrarão em ação pra valer, transmitindo os shows nas várias partes do mundo. Na grande hora, um artista de peso mundial fará um show inédito cujo tema será o início de uma nova era. O grupo AOL Time Warner tem como empregados gente como Ol’ Dirty Bastard, Missy Elliot, Red Hot Chili Peppers, Cornershop, Cibo Matto, Sensefield, Stone Temple Pilots, Ween, Third Eye Blind, Deftones, Mr. Bungle, Pantera, Atari Teenage Riot, Prodigy, Kid Rock, Raimundos, Filter, Paula Cole, Hootie & The Blowfish, Tori Amos, Everything But the Girl, Eric Clapton, Echo & the Bunnymen, Kronos Quartet, Jose Carreras, AC/DC, Metallica, Robyn Hitchcock, Gilberto Gil, Busta Rhymes, Buena Vista Social Club, Lil’ Kim, X, Ministry, os Simpsons, Better Than Ezra, Natalie Merchant, Cure, Rod Stewart, Son Volt, Cher, Sugar Ray, Rush, Quad City DJ’s, Alanis Morrisette, B-52’s, Seal, Nick Cave, Towa Tei, Stereolab, Cesaria Evora, Flaming Lips, Björk, Bad Religion, Junior M.A.F.I.A., Crosby, Stills, Nash & Young, Quincy Jones, South Park, Van Halen, Genesis, Fountains Of Wayne, Soul Coughing, Robin Hitchcock, Brandy, Madonna, Steel Pulse, R.E.M., Depeche Mode, Enya, Built to Spill, Café Tacuba, Kris Kristofferson, Collective Soul, Timbaland & Magoo, Fleetwood Mac, John Fogerty, Superdrag, Paul Simon, Goo Goo Dolls, Lemonheads, Baby Bird, Jimmy Page & Robert Plant, Kid Loco, Philip Glass, k.d. Lang, Dimitri from Paris, Green Day, Pet Shop Boys, Chris Isaak, Latin Playboys, Joni Mitchell, Paul Oakenfold, Lou Reed, Wilco, Neil Young, Gipsy Kings, Matchbox 20, entre outros, e todos farão parte da festa, fazendo o show que querem, convidando os artistas que bem entendessem, culminando com um festival de 24 horas de duração, durante todo o Dia 1.
Quem estiver frente ao Info terá uma noção da revolução pela transmissão dos shows. Qualquer aparelho pode localizar qualquer show em qualquer uma das vinte quatro festas no mundo, desde que este já tenha acontecido. Uma vez no show, pode-se escolher as diferentes câmeras que o registram, focalizando tanto apenas o vocalista quanto todas as câmeras ao mesmo tempo. E você achava que 40 polegadas era exagero.
Abaixo da tela, uma outra tela preta, menor e mais horizontal, traz as últimas notícias da megafesta, intercalando-as com outras notícias do mundo, que podem ser vistas a um simples toque. Sempre que algum artista estiver numa entrevista coletiva o espectador será avisado, caso requeira essa opção. Basta cadastrar-se e você assiste à entrevista, podendo até mandar perguntas para o artista ou comprar objetos e peças de roupa usadas no show.
Não precisa se preocupar em gravar: para o usuário do Info, videocassete é coisa do passado. Basta chamar o canal localizador e digitar algumas palavras-chave para que você seja apresentado a todos os itens relativos ao tema: de shows a videoclipes, passando por discos inteiros, sites de fãs, filmes, participações especiais em programas alheios, entrevistas, resenhas, comentários, curiosidades, fotos e toda infinidade de informações sobre os itens especificados.
Quer assistir a um filme? Não precisa mais programar o vídeo para gravá-lo. Basta descobrir seu código no canal de filmes (ou através do canal localizador) e começar a assistir. Sem comerciais! Tocou a campainha? Dê pause, ué, como em seu videocassete. Precisa sair? Adicione o filme a Favoritos e saia. Quando voltar, basta retornar no ponto que parou. Não lembra o que estava acontecendo? Rebobine o filme, ora.
O mesmo vale para as partidas da NBA, os campeonatos europeu, sul-americano e asiático de futebol, o SuperBowl, finais de torneios mundiais, olimpíadas, Copa do Mundo, o diabo. Um toque e o replay em câmera lenta, em todos os ângulos, com todas as câmeras. Você pode até pedir um tira-teima pra saber a velocidade que o jogador cuspiu no chão. Aliás, você pode pedir um tira-teima para saber a velocidade que o artista do show do réveillon cuspiu no chão. Até nas novelas você pode pedir um tira-teima – que, no caso, pode revelar o making of. Falando em making of, pra quê esperar o Video Show separar os erros de gravação se todo programa traz isso em si, como se o programa fosse um site e, ao mesmo tempo, um DVD?
Um pontinho no canto direito superior do Info é uma microcâmera digital. Através dela, você pode se comunicar com qualquer pessoa que possua outro Info (os “infonautas”), contanto que você saiba o código dele. E passar a tarde toda de papo furado com amigos de todo planeta, enquanto assistem a diversos shows. Quer ficar pelado enquanto conversa com o pessoal? Desative a opção “videofone” e converse só com o áudio. Sua voz é feia? Use o controle remoto/teclado, pois. E se você está apressado para sair enquanto assiste TV, clique na opção “mirror” e a tela do Info vira um espelho.
Mas a câmera não serve apenas para a simples comunicação. Você pode adquirir o Infoing, uma mini-ilha de edição portátil que funciona também como câmera. Filme sua família nas férias, selecione a opção My Info e despeje o filme no canal. Você pode disponibilizá-lo para todas as pessoas que têm acesso ao Info, restringir o acesso com uma senha (assim você pode mostrar seus filhos aos seus pais, que moram do outro lado do país) ou limitar à sua própria audiência. Você pode fazer isso com filmes caseiros ou profissionais, divulgando seu trabalho ou lazer para quem você quiser. O mesmo vale para músicas (também registradas no Infoing, que funciona como uma miniestúdio também), artes plásticas, publicidade e qualquer outro tipo de manifestação artística. O grupo AOL Time Warner tem a intenção de incentivar as pessoas a criar e produzir, superlotando seus próprios arquivos de preciosíssimas informações (de dados e gostos pessoais a correspondência eletrônica, movimentação bancária, fotos de família etc).
Isso é só pra assustar. Tudo ficção, mas dá pra ter uma noção do que vem por aí. Parece que só agora ligaram a internet, que antes era só ensaio ou teoria. Com este futuro “Info” todo aquele mundo prometido pela rede quando ela chegou em seu primeiro auge (cerca de 1995) parece pronto para acontecer. Dá pra passar duas horas falando do que pode acontecer quando a televisão encontrar com a internet: já tem gente falando no fim do conceito de shopping center, pois até o comércio tradicional vai ficar obsoleto com esta mudança. Todo mundo que quiser sobreviver no novo capitalismo infonauta terá que pular na internet e fazer a diferença. É aí que entra o “novo Iluminismo”, um conceito criado pelas grandes corporações para fazer com que o consumidor não se sinta passivo: pelo contrário, neste novo momento do capitalismo irá criar personalidades, pop stars, cientistas, artistas e gênios que nunca saem de seus quartos. Cada vez a vida real vai se tornando virtual.
Por isso, domingo de manhã, sol lá fora: vá dar uma volta. Sai da frente desse computador. Respira um ar novo: ar novo é o que não falta.
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Se você gosta de Beastie Boys e chacoalhou o esqueleto com o último disco do Beck, compra o disco dos mexicanos do Titan, que acabou de sair no Brasil. Na capa de Elevator, o tal disco, tem um som 4 em 1 (com carrossel de 3 CDs) em cima de uma televisão. Grooveseira pesada e setentona, instrumental, retrô e plena durante todo disco.
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Tudo indica que o selo carioca Tamborete Entertainment deverá assinar com os noise rockers do Wry. E algo me diz que, caso isso ocorra, a banda pode se tornar um dos maiores nomes do rock independente brasileiro. Acho que ao apresentar a fórmula guitar band para um público fiel como o de hardcore pode causar um estrago considerável.
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O Astromato, de Campinas, tá com fita nova e já tem planos para as gravações do primeiro CD. Pop daquele jeito e cantando em português, o grupo tem chance no mercadão.
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A Face do mês passado traz uma matéria sobre uma droga que eles chamam de “ya ba” (com um ótimo título: “ya ba dabba doom”) e que está sendo temida como o próximo crack. Calma, não é algo tão novo assim: o ya ba é, na verdade, a temível metanfentamina, também conhecida como “crystal meth”. Uma espécie de remédio de farmácia ultrapotente, a metanfentamina te deixa ligado por três dias seguidos e seu uso contínuo torna a pessoa mais violenta e uma das alucinações mais freqüentes são besouros que andam por baixo da pele, fazendo com que o sujeito rasgue a própria pele. Não precisa nem dizer que vicia, né? A chamada da matéria dá o tom do bagulho: “Os nazistas usavam-no para abastecer suas tropas. Você pode fazer em casa usando ácido de bateria e removedor de manchas. No Arizona, inspirou um homem a decapitar seu filho”. Era só o que faltava.
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A mesma Face cita Coppola numa matéria sobre filmes feitos em casa: “A grande esperança para mim é que, agora com essas câmeras de 8 mm saindo, pessoas que normalmente não fazem filmes irão fazê-los. O chamado profissionalismo cinematográfico será destruído e finalmente teremos uma forma de arte”. A entrevista é de 1990. Qualquer semelhança com aquele papo de “novo Iluminismo” não é mera coincidência.
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Tive o novo disco dos Smashing Pumpkins na mão, ouvi e não me dei ao trabalho de gravar. Chato pacas. Vou esperar sair no Brasil…
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Próxima quarta-feira (26) tem Butchers’ Orchestra com Autoramas na Borracharia, em São Paulo. Não dá pra perder.
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Nesse mundo de informações paralelas, algumas são tão mainstream que passam batido. Saca a Melissa Etheridge? É uma espécie de Cássia Eller country americana, que é casada com uma mulher e tem duas filhas de pai desconhecido. Pois é, sabe quem é o pai das filhas dela? Deu na capa da Rolling Stone: David Crosby! Isso mesmo, aquele bigodudo gordo do Crosby Stills Nash & Young, que disse, na reunião do grupo no fim do ano passado, que “desta vez estarei acordado”.
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Se você seguiu o conselho e não comprou o Breakbeat Era importado, se deu bem: saiu pela RoadRunner no Brasil, com caixinha de papelão e tudo mais.
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Tá começando a circular via email uma notícia que diz que a Copa de 2002 vai acontecer mesmo no Brasil. Parece que tem jornal grande (um americano e um italiano) fuçando naquele papo que o Brasil vendeu a copa passada pra garantir a próxima. O email diz que nos próximos meses a Fifa vai anunciar que as Coréias não têm condição de segurança de sediar um mundial e apontará o Brasil – porque o Mundial de interclubes acabou de acontecer por aqui – como próximo país-sede. O que explica porque depois deste mundial ainda tinha técnico da Fifa no Brasil, verificando os campos do Atlético Paranaense e do Bahia…
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Mas por que raios venderam a copa passada? Porque a França tava na maior merda de desemprego da história deles e o mundial levantou a moral dos caras. E porque a reeleição daquele camarada já havia sido garantida com o fim daquele lei que proíbe o uso da “máquina”. Brincadeira…
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Júpiter Maçã foi pra Inglaterra e deve voltar de lá com contrato assinado…
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Uma colega de trabalho de um amigo meu, do alto de sua ingenuidade, soltou a pérola sobre a nova música do Oasis: “Eu só ouvi essa música uma vez e já não suporto mais!”. Na mosca.
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Disco redescoberto da quinzena: Wild Honey, dos Beach Boys, 1967. Média perfeita entre Burt Bacharach e Stevie Wonder, num outro momento em que Brian Wilson e família chegam próximos da perfeição.
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Como diriam os Beastie Boys, os Doors, os Half Japanese, as Spice Girls, o Accept, Van Morrison, os Bar-Kays, Henry Rollins, Roy Ayers, Neil Diamond, os Buzzcocks e o Yello: “Do it”.