Lost por Carlos Alexandre Monteiro
Se tem uma metáfora de que gosto demais é a do alinhamento cósmico. Sabem aquela conjunção de planetas e/ou estrelas que acontece uma vez a cada zilhão de anos, e que cientistas, estudiosos amadores, esotéricos etc. admiram por saber que nem tão cedo, talvez nunca, verão algo igual? De vez em quando isso acontece na vida alheia e na nossa também. E na arte. Só que há uma diferença notável entre os alinhamento reais e os simbólicos: enquanto astrônomos conseguem calcular quando os astros vão provocar estes fenômenos no Cosmo, os daqui debaixo às vezes só são compreendidos tempos depois que ocorrem.
Lost é um desses alinhamentos. E se torna ainda mais especial porque, desde seu primeiro episódio, nos avisou o que de fato era. Nos permitiu uma mistura de previsão e de certeza de que tínhamos algo espetacular diante dos nossos olhos. Os caras certos, escrevendo roteiros para os caras certos, com uma história bela, fantasiosa, cheia de alegorias e referências, recheada de elementos infalíveis. A fórmula da Coca-Cola sendo criada na nossa cara.
Que outra série de TV conseguiu colocar no mesmo balaio – e de forma muito bem trançada – Star Wars, Alice no País das Maravilhas, mediunidade, Stephen Hawking, Experimento Ludovico e Iluminismo? Se ainda havia uma pá de cal a ser jogada no túmulo dos ultrapassados bobalhões que apontam a televisão como inimiga da leitura e da reflexão, qual outro seriado fez esse serviço de forma tão competente? Qual outra série fomentou tantas discussões e debates inflamados em intervalos de aulas, mesas de bar, listas de e-mails e ambientes corporativos? E qual outra atração do gênero teve a manha de gritar aos olhos e ouvidos de espectadores do mundo todo que, hoje, os meios pertencem às histórias, e não mais o contrário, se estendendo em livros, jogos, videogames, webisódios…?
Criação individual e coletiva, nascida por todos os lados; aniquiladora de maniqueísmos, reverente a defeitos e a virtudes, fã ardorosa do ser humano; geradora de verdades singulares e, ao mesmo tempo, universais. A verdade é que Lost não cabe em si – e para serem justos e corretos com essa realidade, os produtores prometem deixar novos temas para debate, unindo interrogações às exclamações de seu ato final. Há os revoltados, que clamam por respostas diretas e concisas – idiotas da objetividade, alguém? -, mas sei que estes simplesmente não estão entendendo o que de fato nos foi proporcionado por todos esses anos e agora em seu momento máximo se garante como espetáculo inesgotável, que irá se irradiar para muito além de seu suposto encerramento: uma experiência única e inesquecível para cada um que, de verdade, resolve limpar os olhos e mergulhar naquilo que se vê no alto.
* Conheço o Carlão do tempo em que ele era só um dos melhores guitarristas de surf music do Brasil, antes de ele virar essa autoridade toda na série, a partir de sua central, o Lost in Lost, e da filial, o Tudo Está Rodando.
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