Nova York, outono de 2013: The feeling is the genre

, por Alexandre Matias

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Acompanho a evolução da curitibana Fernanda Baglioli em seus sets via Goldiamond e Sweet Grooves há um tempo e quando ela foi passar uma temporada em Nova York no mês passado, me disse que iria assistir a alguns shows e apresentações legais. Pedi pra ela escrever e descrever o que viu na grande cidade e eis seu relato abaixo:

Assim que decidi vir para Nova York visitar minha melhor amiga nas minhas férias defini um objetivo para esta viagem: pesquisa musical. Trabalho com isso e também tenho um projeto paralelo de música eletrônica, o Sweet Grooves, com dois amigos meus onde exploramos bastante gêneros como bass, trap, house, future bass, R&B, hip hop e afins. Então essa viagem não poderia ter vindo em melhor hora. Todo mundo sabe que a melhor época para shows em qualquer canto do mundo é sempre o verão, claro que fiquei um pouco chateada em perder alguns shows de artistas que gosto muito como AlunaGeorge, Bondax, Laurent Garnier e outros. Mas como estamos falando de Nova York a vida noturna é agitada em qualquer estação do ano. Então cá estou eu documentando o outono novaiorquino, em que pude assistir a Kendrick Lamar, Flume, Chet Faker, e alguns DJs e produtores que persigo no Soundcloud que estão despontando na cena eletrônica local.

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O show do Kendrick Lamar foi no Williamsburg Park. Uma experiência quase que surreal, eu, uma branquela sulamericana num show de hip hop no Brooklyn. Claramente não estava sozinha, mas com certeza era minoria. As primeiras atrações eram outros rappers da TDE que tiveram cada um 30 minutos pra convencer a platéia crítica, muito crítica, de que valia a pena estar ali mais cedo. Começou com Bishop Nehru, passou por Jay- Rock e finalizou no Ab-Soul e essa também foi a minha ordem de preferência. Nas duas primeiras músicas de cada um o público somente assistia para analisar, depois que eram convencidos que os rappers tinham realmente talento eles começaram a dançar e curtir. Um deles ainda chegou a falar “thanks for not booing me” e realmente notava-se que muita gente ali era muito crítica. Mas todos saíram do palco aplaudidos. Todos os três estavam ali somente com um DJ, as batidas circularam muito entre o R&B, hip hop e trap, caindo as vezes até para um jazz no caso do Nehru.

Quando Kendrick estava para começar eu já me sentia completamente à vontade e já estava por dentro da mecânica de um show de hip hop americano. “One hand in the air! Now two hands in the air!”, “Brooooook- lyyyyyyn, Broooook-lyyyyn”. Confesso que em certo momento quase nem lembrava que estava ali para ver o Kendrick Lamar, pois já estava imersa na experiência como um todo. Aí uma banda completa se posicionou no palco, e o californiano chegou falando ser o “king of New York” cantando os versos polêmicos da sua participação em “Control” do Big Sean que foi lançada em agosto. Logo depois ele emendou “Backseat Freestyle” que é a minha favorita e daí pra baixo foi lindo, passou pelos hits “Bitch, Don’t Kill My Vibe”, “Poetic Justice” e a gloriosa “Swimming Pools (Drank)”.

No dia seguinte tive a oportunidade (que um cambista me deu) de ir a um show sold out no legendário Webster Hall, construído em 1886. O show era uma noite 100% australiana Touch Sensitive, Chet Faker e Flume e complementada por vários australianos na platéia e seu incansável “Aussie, aussie, aussie, oi, oi, oi”. O primeiro com uma estética super anos 80, me lembrei na hora do filme Drive – não era Kavinsky, mas combinava bastante. House com uma pegada oitentista e às vezes um pouco disco music combinado com um live de um baixo, ótimo para um começo de noite. Depois veio o Chet Faker e sua banda. Já conhecia algumas músicas dele, a banda é ótima, e gosto muito quando misturam elementos eletrônicos (esse é o meu clube) e ele conquistou meu coração com a versão de “No Diggity”.

Mas quando o Flume chegou eu praticamente esqueci tudo o que aconteceu antes. O guri que começou a produzir música com um brinquedo que veio numa caixa de cereal era o grande headliner da noite. E lá estava ele com a grandiosidade de um popstar. Telão syncado com as músicas, bateria eletronica, hexágono de LED, e muitos outros gadgets, fazendo o que qualquer grande produtor de música eletrônica hoje deve fazer, live. O show contou com todas as produções do último álbum dele, incluindo também os remixes de “You & Me” que ele fez para o Disclosure e o de “Get Free” do Major Lazer, mas este feito pelo projeto dele What So Not. Uma das que mais levantaram a pista foi “On Top” que tem a participação do rapper nova iorquino T-Shirt. Ao final, Chet Faker voltou para cantar a lindíssima “Left Alone” e mais uma ainda unreleased. Um brilhante fechamento para uma noite australiana.

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No outro dia fui parar no Output, um club no Brooklyn onde teve a noite da gravadora Symbols Recordings nesse dia praticamente todo o elenco tocou: Kastle, Sweater Beats, Jaw Jam, Druid Cloak e como convidado o Lindsay Lowend. Todos eles são da nova safra de produtores que estão chutando o balde e largando mão de se encaixar em algum gênero. Como a própria descrição da festa dizia “the feeling is the genre”, mas para todos os efeitos chamaremos de “future bass” por mais que rolou um pouco de house, R&B, trap e hip hop.

O Output é um club a se respeitar, logo na entrada você se depara com uma placa “No Photos”, e essa cultura é completamente enraizada nos seus habituès, pois quando tirei o celular da bolsa só pra usar o Shazam levei pito do colega de pista ao lado “se você vai usar seu telefone eu sugiro que você saia da pista para fazê-lo, aqui é lugar de dançar”. Dito e feito, o celular ficou ali na bolsa até às quatro da manhã, com direito a mini-escapadelas somente quando eu subia para o mezzanino, pois não queria estragar a vibe da festa – afinal eu estava lá pra isso, conhecer coisas novas e o Shazam é meu melhor amigo nessas horas.

Lá no Output a pista não lotou em momento algum e com certeza a maioria das pessoas não estavam entendendo muito o que estava acontecendo ali. Muitos eram frequentadores assíduos do club ou amigos dos DJs. O que pra mim foi ótimo, pois tinha espaço de sobra pra dançar. Jaw Jam e Druid Cloak fizeram sets praticamente com suas produções recheados de house quebradíssimos e remixes de clássicos do r&b, o Lindsay Lowend, que era o convidado especial da noite, fez um set mais longo e praticamente dedicado ao Super Nintendo (sim, é influência no trabalho dele) tocando até uma versão super videogame de “Love Foolosophy” do Jamiroquai, e pra minha alegria, que estava na expectativa, ele fechou com a perfeita “GT40” que é de sua própria autoria.

Depois foi a vez do dono do label, Kastle – o único a usar fones pra tocar (todos os outros foram de Launchpad da Novation). Ele também era o mais experiente fez um set que variou bastante do house ao future bass. Chocando ao dizer que um house que estava rolando era um unreleased do renomado produtor de drum ‘n’bass Sub Focus, a faixa “Close” com participação do MNEK mostra que realmente devemos levar a sério o “the feeling is the genre”, e eu estou amando tudo isso. Finalizando a noite o nova iorquino Sweater Beats fez um set super quebrado e recheadíssimo de vocais femininos – que é smepre minha sessão favorita nas lojas de discos “Female Vocalists”. Era um por cima do outro. Rihanna, Ciara, Janet Jackson, Aaliyah, um mais lindo do que o outro, cheio de influências hip hop me fazendo lembrar que eu estava ali no Brooklyn. Valeu a pena esperar até o final, ganhou o meu voto de favorito.

No balanço geral, minha investida em conhecer coisas novas ainda não obteve muito sucesso a “cena bass” do Brasil não está nada atrás da americana, estamos tranquilamente acompanhando. E inclusive, nossas festas são bem mais cheias e animadas! Se você quer saber mais procure os artistas Cesrv, Sants, Marginal Men e Cybass e as festas A Volta, Wobble, Colab011, It’s A Trap, entre outras para entender do que estou falando.

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