17 de 2017: 8) Aphex Twin

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A grande apresentação musical do ano, uma overdose atordoante de música que ultrapassa fronteiras e gêneros, o show de Aphex Twin que vi em Londres ainda teve uma cereja de fel: ao sair daquela apresentação soube que a cidade estava atravessando uma série de atentados terroristas que havia paralisado o trânsito, o metrô e a sua vida noturna. Um show que não imaginaria assistir em 2017 acompanhado de um posfácio nada fácil de digerir – bem ao gosto deste autor.

17 de 2017: 9) Centro do Rock

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O Centro do Rock foi um desafio autoproposto: o Centro Cultural mantinha, desde os anos 90, o mês de julho dedicado a shows de rock e resolvi reinventar o antigo Sintonia do Rock para rever o porquê do gênero ter se tornado tão conservador e careta. A minha surpresa foi perceber que o rock – força-motriz de pelo menos cinco gerações – ainda segue vivo, importante e subversivo, mesmo que não se apresente mais como tal: hardcore, psicodelia, metal, noise, pós-rock, glam, blues rock, punk… Não importa o rótulo, mas o rock sobrevive sem precisar dizer que é parente daquele filhote de blues e country que abalou o planeta há sessenta anos – provocando e causando da mesma forma que nos anos anteriores. O nome do novo Sintonia do Rock é do Cadão – e combinou perfeitamente com a proposta que havia pensado sobre este novo mês.

17 de 2017: 10) A Diva da Flip

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No quarto ano que cuido das mídias sociais da Flip, tive uma das experiências mais gratificantes desde que habito esses ambientes digitais. Estava chegando na sala de imprensa onde ficava a base da comunicação da Festa Literária quando a Gabi me mandou uma mensagem, dizendo que o depoimento de uma certa senhora tinha sido emocionante. Achei que fosse uma das convidadas, mas descobri logo em seguida que tinha sido alguém do público, a primeira pessoa que pode fazer uma pergunta a um autor na história de toda Flip. Também era a primeira vez que a Flip abria suas conferências de forma gratuita, nas mesas da manhã, e Diva pediu a palavra para falar de sua experiência como pessoa e professora, vítima dos preconceitos históricos de nossa pátria. A conferência – e sua participação – foram transmitidas em vídeo e imediatamente pedi o registro daquela fala para soltar nas redes sociais. O impacto do vídeo foi fulminante e rapidamente ultrapassou a dezena de milhões de visualizações no Facebook, transformando a professora Diva Guimarães em ícone da Flip deste ano e levando sua mensagem para milhões de brasileiros que não puderam vê-la ao vivo (além de, de quebra, levar toda a produção de conteúdo da festa para ainda mais gente). Um momento mágico e importante, mostrando a força e o papel da cultura, principalmente nestes momentos sombrios que atravessamos neste ano.

17 de 2017: 11) Brasília

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2017 foi o ano que mais vim para minha cidade, desde que a deixei no início de 1993. Entrei no ano na Chapada (a praia de Brasília) e vim por diversas ocasiões à cidade, o que me ajudou neste processo de cura e introspecção que me acompanhou durante o ano. Foi um período de reconciliação com a minha cidade favorita e também a oportunidade perfeita para voltar às minhas origens, além de ficar mais próximo da minha família. Até nisso o ano me ajudou.

17 de 2017: 12) Twin Peaks

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A grande obra de 2017 foi a inesperada e inacreditável terceira temporada de Twin Peaks, negação da nostalgia da série antiga, talvez a grande obra (e epitáfio final?) de David Lynch e ainda mais revolucionária que a primeira vinda. Com seu final estarrecedor, a volta do agente Cooper à cidade que lhe deu fama foi a viagem mais pesada e psicodélica do ano. E quem embarcou junto com ele sabe que o estrago deste filme de dezoito horas vai ser sentido durante todo o século. Uma obra-prima.

17 de 2017: 13) A arte do encontro

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Outra grande lição de 2017: saia da internet para encontrar quem você gosta. Ídolos, parentes, amigos e conhecidos são melhores quando confrontados olho no olho. E pode ser que isso provoque projetos, processos e surpresas.

17 de 2017: 14) Rock in Rio

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Meu quarto Rock in Rio, não tão intenso quanto o primeiro, não tão empolgante quanto o de Las Vegas, mas sem dúvida uma experiência e tanto – principalmente por já conhecer a lógica e as artimanhas do festival e, claro, por finalmente conseguir assistir ao Who ao vivo.

17 de 2017: 15) Lee Ranaldo

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Pude ver dois shows e conhecer melhor um dos fundadores de minhas bandas favoritas – e, mais que isso, produzir um show do cientista louco do Sonic Youth no CCSP, misturando satisfação pessoal e profissional numa noite mágica. Foi o oitavo show solo do Lee Ranaldo que assisti (sem contar os seis shows que vi com sua antiga banda), o entrevistei em minha cidade-natal e, maravilhado, ouvi-lo dizer que a volta do Sonic Youth não é impossível.

17 de 2017: 16) Bicho de 4 Cabeças

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O encontro da quatro principais bandas independentes de São Paulo foi sem dúvida meu salto mais ousado na curadoria do CCSP este ano. E quando Hurtmold, Bixiga 70, Rakta e Metá Metá estavam todos juntos tocando ao mesmo tempo eu tive a certeza de que tudo é possível. Melhor show nacional que vi este ano – o ano que mais vi shows na vida.

17 de 2017: 1) Curador

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2017 foi um ano de auto-análise, de autoconhecimento, de olhar para dentro para saber o que queremos do lado de fora. Enquanto 2016 foi uma porrada inesperada (entre outras coisas engrossei a estatística dos divórcios daquele ano), 2017 foi um ano de cultivo, de introspecção e de escolhas. E o fato de ter me tornado curador de música de duas instituições distintas ajudaram bastante nesse processo. Já havia sido curador de músicas em três situações diferentes (do Prata da Casa do Sesc Pompeia em 2012, do Festival da Cultura Inglesa em 2012 e 2013 e do Circuito Cultural Paulista em 2015), mas nos três casos entrei em projetos já existentes e obedeci a regras pré-estabelecidas. O que um amigo meu das artes plásticas dizia que pouco tinha a ver com curadoria: “isso é programação, curador é o cara que criou o Prata da Casa e disse que todo ano alguém iria escolher os artistas daquela vez”, me provocava. E foi com essa provocação que atravessei 2016, bolando qual seria a forma de transformar a programação musical do Centro da Terra, curadoria que aceitei no decorrer do ano passado, de forma que o local não simplesmente recebesse shows já existentes. E quando o Cadão me chamou para ser curador do Centro Cultural São Paulo, no início de 2017, aquela provocação já havia cristalizado e eu sabia que deveria fazer mais que simplesmente escolher ou definir artistas e shows para aquele lugar mágico – cuja magia me fez aceitar instantaneamente o convite. Elencar shows que não existiam e provocar artistas a bolar apresentações inéditas fizeram parte deste processo de auto-análise que me ajudou a atravessar 2017 com a cabeça erguida. A etimologia da palavra “curadoria” é a mesma do verbo “cuidar” e esse cuidado em relação à produção musical brasileira atual me ajudou a entender meu próprio espaço nesse contexto – e a vislumbrar um futuro bem mais interessante que o que havia projetado para mim mesmo até agora. 2017 foi ano dos meus 42 verões, aquele número que Douglas Adams disse que era a resposta para a pergunta sobre o sentido da vida. E foi crucial aceitar esse novo sentido para minha jornada neste planeta.