Raridades que podem estar na caixa dos Mutantes

, por Alexandre Matias

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Os Mutantes anunciaram em sua página no Facebook que no final deste mês veremos o lançamento de uma caixa que reúne toda a discografia dos Mutantes, desde Os Mutantes, de 1968, até Mutantes e Seus Cometas no País do Baurets, de 1972, incluindo o disco Tecnicolor, gravado na França e inédito até 1999. As informações ainda são escassas: não há explicação sobre a exclusão dos discos O A e o Z (o primeiro sem Rita Lee, gravado em 1973 e só lançado em 1992), Tudo Foi Feito pelo Sol (o primeiro sem Arnaldo Baptista), de 1974 ou o Ao Vivo, de 1976. Pelo preço anunciado (R$ 180), a caixa só deve ser lançada em CD, mas o lado bom é que ela deve desenterrar faixas conhecidas do grupo que nunca chegaram a ser relançadas (mas foram lançadas em compactos ou compilações) no disco de inéditas Mande um Abraço pra Velha. Também não há mais informações sobre o que será lançado neste CD, mas há várias possibilidades, que reuni abaixo:


Tony Campelo e The Teenage Singers – “Pertinho do Mar” e “O Meu Bem Só Quer Chorar Perto de Mim”, compacto lançado em 1965.
Rita Lee montou o grupo The Teenage Singers ao lado de Suely Chagas e outras duas colegas de escola, mas estas duas logo abandonaram o grupo, deixando Rita e Suely como dupla. Elas foram convidadas pelo pioneiro do rock no Brasil, Tony Campelo, a participar de seu compacto de 1965.


O’Seis – “Suicida” e “Apocalipse”, compacto lançado em 1966.
A dupla Rita e Suely conheceu os rapazes do grupo Wooden Faces (os irmãos Arnaldo e Cláudio César Dias Baptista, Raphael Villardi e Roberto Loyola, que pouco antes se apresentavam como The Thunders) e logo eles formariam um novo grupo, chamado Six Sided Rockers. Nesta época, Cláudio César, o irmão Dias Baptista mais velho, deixou a banda para dedicar-se à construção de equipamentos e instrumentos musicais, enquanto o caçula Sérgio Dias Baptista assumia a guitarra em seu lugar. Sérgio Pastura entrou no lugar de Roberto Loyola na bateria e em 1966 o o grupo mudava o nome para O’Seis. O primeiro registro da banda aconteceu no compacto o mórbido boogie-woogie “O Suicida” e a doce balada latina “Apocalipse”, duas músicas composições de Rita Lee (a primeira com Villardi).



Gemini II e O’Seis – “Lindo” e “Tchau Mug”, compacto lançado em 1967.
O outro registro dO’Seis aconteceu como conjunto de apoio vocal no compacto “Lindo” e “Tchau Mug”, do grupo Gemini II.


Ronnie Von – “O Homem da Bicicleta”, do disco Ronnie Von N°3, lançado em 1967.
Ainda em 1967, o sexteto debanda e Rita, Arnaldo e Sérgio mantém-se juntos com a curta volta de Cláudio César aos palcos como baterista. O novo grupo passa a se chamar O Konjunto (e volta a ser um trio, sem Cláudio César) e depois Os Bruxos. O nome Os Mutantes é sugerido por Ronnie Von, que após conhecer o grupo chama-o para participar de seu terceiro disco. Os Mutantes tocam em algumas músicas do disco Ronnie Von N°3, dividindo os instrumentais com a banda argentina Beat Boys. Na faixa “O Homem da Bicicleta” fica evidente a participação do trio.



Nana Caymmi – “Bom Dia” e “Alegria, Alegria”, compacto lançado em 1967.
O contato com Ronnie Von aproximou os Mutantes de novos cantores e compositores, como Gilberto Gil, que chamou o grupo para ajudá-lo a defender sua “Domingo no Parque” no Festival da Música Popular Brasileira da TV Record, em 1967. A aproximação de Gil apresentou os Mutantes ao produtor Rogério Duprat, dando início a uma parceria mítica, e fez o grupo gravar outro disco como banda de apoio, desta vez da namorada de Gil à época, Nana Caymmi. Com a filha de Dorival os Mutantes gravaram um compacto, em um dos lados tocando uma versão para “Alegria Alegria”, de Caetano Veloso.


Gilberto Gil – “Pega a Voga Cabeludo”, parte do disco Gilberto Gil, lançado em 1968.
Antes de lançar seu primeiro disco, os Mutantes já eram conhecidos no meio e participaram como banda de apoio de todo o segundo disco de Gilberto Gil, lançado em 1968.





Rogério Duprat e os Mutantes – “Canção Pra Inglês Ver/Chiquita Bacana”, “The rain, The Park and Other Things”, “Lady Madonna” e “Cinderella Rockfella”, parte do disco A Banda Tropicalista do Duprat, lançado em 1968.
Os Mutantes também participaram de quatro faixas do inusitado disco A Banda Tropicalista do Duprat, gravado pelo produtor tropicalista em 1968.


Tom Zé, Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil e Mutantes – “Parque Industrial”

Mutantes e Gilberto Gil – “Batmacumba”

Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil e Mutantes – “Hino ao Senhor do Bonfim”, partes do disco Tropicalia ou Panis et Circenis, lançado em 1968.
Nesta mesma época o grupo participou do disco Tropicalia ou Panis et Circensis, marco-zero do movimento tropicalista, com participação evidente nas faixas “Panis et Circensis”, “Parque Industrial”, “Batmacumba” e “Hino ao Senhor do Bonfim”. Destas, apenas a primeira foi aproveitada em sua discografia oficial, no primeiro disco do grupo, chamado de Os Mutantes, lançado em junho de 1968. Na mesma época lançaram o compacto “A Minha Menina” e “Adeus Maria Fulô” com as mesmas versões do primeiro disco.


Mutantes – “Glória ao Rei dos Confins do Além”, lançada como compacto em 1968.
Graças aos festivais de televisão, que lançavam as músicas concorrentes como compactos, os Mutantes lançaram alguns singles com músicas que depois foram aproveitadas em seus discos, como “Mágica”, para o Festival Nacional de MPB, da TV Excelsior, e “Caminhante Noturno”, para o III Festival Internacional da Canção, da TV Globo, ambas músicas gravadas em 1968 e que veriam seu lançamento oficial no ano seguinte, no segundo disco do grupo, batizado apenas de Mutantes. Destas faixas, apenas “Glória ao Rei dos Confins do Além” (escrita pelo jovem Paulo Cesar Girão de Castro, que tinha 16 anos na época, para o II Festival Estudantil da MPB) não chegou a nenhum disco.





Caetano Veloso e Mutantes – “Baby”, “A Voz do Morto”, “Marcianita” e “Saudosismo”, compacto lançado em 1968.


Caetano Veloso e Mutantes – “É Proibido Proibir” e “Ambiente de Festival”, compacto lançado em 1968.
Na mesma época, os Mutantes gravaram dois compactos ao vivo com Caetano Veloso, sendo que o segundo deles trazia a versão em estúdio da música “É Proibido Proibir” em um lado e do outro a versão ao vivo que foi vaiada no III Festival Internacional da Canção, no Teatro da PUC em São Paulo, quando Caetano dá seu histórico discurso sobre a consciência política brasileira pouco antes do AI-5. Clássico.


Mutantes – “Ando Meio Desligado”, lançado em 1970.
A versão do compacto de “Ando Meio Desligado”, lançada no terceiro disco da banda, A Divina Comédia ou Ando Meio Desligado, em 1970, tem uma série de ruídos sobre a música original que não constam na versão do disco. O lado B é “Não Vá Se Perder Por Aí” na mesma gravação do álbum. É o quarto compacto da banda, depois de ter lançado no ano anterior “Caminhante Noturno” e “Baby” (em versões idênticas às dos dois discos anteriores).


Mutantes – “Mande Um Abraço Pra Velha” foi lançada como compacto em 1972.
Depois de “Ando Meio Desligado” os Mutantes lançariam apenas mais um compacto: “Top Top” e “It’s Very Nice Pra Xuxu”, ambas do disco Jardim Elétrico, lançado em 1971. Mas depois de lançar o disco Mutantes e Seus Cometas no País dos Baurets, de 1972, o grupo lançou a música “Mande Um Abraço Pra Velha”, gravada para participar do VII Festival Internacional da Canção, mas ela nunca foi lançada oficialmente. É a última gravação de Rita Lee nos Mutantes.

Não custa lembrar que a história dos Mutantes é composta por gravações não-oficiais e os primeiros discos de Rita Lee. Build Up, de 1970, e Hoje É o Primeiro Dia do Resto da Sua Vida, de 1972, são creditados a Rita mas foram gravados por todos os Mutantes, inclusive com vocais dos irmãos Dias Baptista no segundo disco. O último disco gravado com Arnaldo Baptista, o progressivo O A e o Z, de 1973, foi considerado perdido durante muito tempo e só veio ser desenterrado pelo jornalista (e guitarrista do Fellini) Thomas Pappon no primeiro esforço de biografia que foi feito sobre o grupo, em uma reportagem para a revista Bizz nos anos 1980. À época, os cinco discos dos Mutantes haviam sido reeditados pela loja Baratos Afins e isso deu início a um novo interesse no grupo, que seguiu no disco-tributo a Arnaldo Baptista Sanguinho Novo e culminou com o lançamento da discografia do grupo em CD, em 1992, que também trouxe O A e o Z à tona. Outras gravações dadas como perdidas, feitas na França em 1970, foram resgatadas por outro biógrafo dos Mutantes, Carlos Calado, que durante as pesquisas para o seu livro A Divina Comédia dos Mutantes encontrou as fitas originais gravadas no estúdio parisiense Des Dames. O disco “internacional” dos Mutantes, arquivado pela Polydor inglesa, finalmente foi lançado em 1999.

Resta saber agora quais são as faixas que serão desenterradas por esse novo disco, se ele será lançado fora da caixa, se estas gravações serão remasterizadas e se isso dará início (finalmente) a mais uma nova fase de redescobertas do material produzido pela banda de rock mais inventiva do país. Porque se começar por aí, depois ainda pode-se resgatar material ao vivo, registros em vídeo e outras jóias que devem estar enterradas em acervos por aí…

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