O fim do mundo de 2012

, por Alexandre Matias

Uma retrospectiva pessoal

2012

Se você for parar pra pensar nas pessoas que morreram em 2012 (Millôr, Chico Anysio, Niemeyer, Donna Summer, Ivan Lessa, Jon Lord, Don Cornelius, Nelson Jacobina, Ravi Shankar, Eric Hobsbawn, Marcos Paulo, Hebe, Neil Armstrong, Ray Bradbury, Levon Helm, Moebius, Jimmy Castor, Donald “Duck” Dunn, Wando, Ted Boy Marino, Gore Vidal, Carlão Reichenbach, MCA, Décio Pignatari, Ed Lincoln, Nora Ephron, Whitney Houston e a lista segue), a impressão que se tem é que todo mundo que é importante morreu. Ou que o século 20 está morrendo.

Não é bem isso. Ano que vem haverão mais mortos conhecidos que esse ano e essa progressão continuará em escala geométrica pelo simples e óbvio fato que, durante o século 20, cada vez mais pessoas se tornaram conhecidas e reconhecíveis em larga escala. Há dois séculos haviam bem menos celebridades pelo também simples e óbvio fato de que haviam bem menos pessoas no planeta. As melhorias que a ciência e a tecnologia – agentes diretos da explosão demográfica dos últimos cem anos – deram ao mundo graças ao indesculpável método científico que, aos poucos, vem demolindo preceitos que pareciam eternos, quase todos vinculados a elites religiosas, políticas ou financeiras. O “porque sim” da antiga monarquia do saber vem desabando frente ao “vamos experimentar?” de uma nova forma de governar e gerir a vida, em todas as escalas. Juntas, ciência e tecnologia (todo o conhecimento e todas as ferramentas acumuladas pela humanidade em seus poucos milênios na Terra), não apenas propuseram como provaram que uma democracia de fato é possível. Por vivermos o momento-chave desta mudança, temos a impressão que ela não está acontecendo ou, sei está, anda em câmera lenta. Mas eu tou falando de uma espécie consciente que habita a superfície de todo um planeta; a escala aqui é geológica.

Em contrapartida, a rápida superlotação do planeta aconteceu ao mesmo tempo em que valores como fama, sucesso, ganância e celebridade passaram a ser centrais na sociedade moderna. O novo acúmulo de gente naturalmente implicaria um número maior de ícones e líderes, mas uma deturpação moral, fruto de um deslumbre com a própria imagem, fez que a quantidade de famosos – e, pior, de candidatos a famosos – atingisse níveis exageradamente anormais. A quantidade de gente querendo aparecer aumentou drasticamente no século 20 e isso deixou dons caros à humanidade – como afeto, inteligência, bom senso, paciência, tolerância, caráter – em segundo plano.

Veja a quantidade de famosos que surgiram apenas em 2012, a maioria deles ganhando exposição anabolizada graças à internet. Noutros tempos, “Gangnam Style” e o Jesus de Borja seriam curiosidades esquecidas na semana seguinte. Mas entraram no imaginário das pessoas como milhares de outros personagens que eram literalmente anônimos antes deste ano – Nissin Ourfali, Michel Teló e Lana Del Rey entre muitos outros. Imagine, portanto, como será o obituário de um ano como 2097. Os famosos de antigamente vão morrer aos segundos – ou talvez seja mais provável que, como morrem famosos o tempo todo, suas mortes deixem de ser notícia.

O que, em outras palavras, quer dizer que estamos caminhando rumo ao fim dessa era de celebridades. O excesso de famosos de todos os níveis e em todas escalas do início deste século inevitavelmente nos levará a uma banalização da utilização da imagem como moeda e, se algo não de diferente não aparecer até lá (inteligência artificial, alienígenas, transferência de consciência, cura da morte – as opções são inúmeras), vamos começar a dar valor às qualidades que nos tornam humanos. Isso já está acontecendo à boca pequena, mas à vista de todos – as pessoas estão aprendendo a gostar de si mesmas, de onde vivem, das pessoas da família, de quem está ao seu redor e peguei-me pensando outro dia que isso poderia ter mais a ver com a mudança de eras vislumbrada pelos maias do que propriamente com o mórbido apocalipse associado ao ano que termina. Bem que eu havia spoilado: o mundo não acabou.

E 21 de dezembro de 2012 é uma data como outra qualquer, e como 12/12/12, o dia do descobrimento do Brasil e a data do seu aniversário, só aconteceram uma vez. Creio que vamos começar a dar mais atenção às coisas corriqueiras, que nos cercam, do que à preocupação que temos com a nossa reputação em relação aos outros – isso é conseqüência, não causa. Reputação constrói-se com caráter, não com aparência. Vamos viver a nossa vida mais intensamente, mais do que viver a vida dos outros.

Particularmente, vivi um ano desses. As Olimpíadas em Londres, Avenida Brasil, o julgamento do mensalão, a reeleição de Obama, o Bóson de Higgs, o furacão Sandy – mal acompanhei os grandes acontecimentos do ano e os poucos que me envolvi estavam mais diretamente ligados à minha vida, como o ano de ouro do meu time (#vaicorinthians!) e a tensa eleição municipal na cidade que moro (votei no Haddad). Enquanto passava por uma transição crucial na minha vida (finalmente consertei meu braço), finalizei o ano numa incrível reviravolta profissional (quando deixei o Estadão depois de cinco anos de Link – não foi difícil deixar o Limão, mas ainda sinto saudades da rotina diária com Filipe, Tati, Camilo, Thiago, Murilo, Carol e Vinícius – para assumir a direção da redação da Galileu, na editora Globo). Fui convidado a reinventar o Prêmio de Música Brasileira do Multishow e ao lado do Bruno, do Pedro e do Dudu, inventamos uma mesa redonda que funcionava como uma faixa de comentários via internet do programa que era assistido na TV (e reunindo os bambas Marcelo Castello Branco, Miranda, Sarah Oliveira, Pablo Miyazawa, Pedro Seiler, Ricardo Alexandre, André “Cardoso” Czarnobai, Katia Lessa, Roberta Martinelli e André Forastieri). Também participei outra vez da curadoria do festival da Cultura Inglesa, quando o Franz Ferdinand tocou de graça no Parque da Independência. Fora as atividades semanais: toda segunda Link, toda terça Prata da Casa (levando o clássico projeto do Sesc a uma décima terceira edição – TREZE, hehe – que ia para outras camadas além da MPB, com apresentações de graça de nomes como Silva, Mahmundi, Gang do Eletro, Bonifrate, Madrid, Rafael Castro, Sambanzo, Kika, Tiberio Azul, Rosie & Me, Cícero, Ogi, Pazes, Caçapa, entre muitos outros, num belo panorama – sem modéstia, não sou disso, cê sabe – da nova música brasileira em 2012) e toda sexta as inacreditáveis Noites Trabalho Sujo (em que tive o prazer de discotecar ao lado de compadres e comadres em sets vastos e memoráveis, num dos melhores e mais elegantes inferninhos do Brasil, o Alberta #3 – vale aqui um beijo a todos da casa e aos amigos que passaram pela cabine da melhor de São Paulo, em especial para o Danilo, para a Babee e para o Pattoli, que além de assumir as festas quando estive de licença médica, me ajudaram a consolidar o formato porralouca da festa atual). Fora o Vintedoze, que tocava com o Ronaldo que, com o fim da Colmeia, ficou pela metade. Não conseguimos terminá-lo direito, mas fez história em seu semestre de vida.

E, claro, foi o ano em que OEsquema deixou de ser o site que fundei com o Mini, o Bruno e o Arnaldo para se tornar o condomínio mais cool e elegante da internet brasileira. É muita gente boa num mesmo lugar, às vezes parece um sonho. Começaremos a nos mexer coletivamente já em 2012, quando começamos a publicar nossa primeira retrospectiva em conjunto. Circule pelos sites do header entre o natal e o ano novo para saber das novidades – além de acompanhar nossa home, um espelho das coisas mais legais da internet, pode reparar (ou assinar o RSS). E em 2013 já tem boas novidades.

Da minha parte, desligo minhas atividades neste dia 22 aqui neste Trabalho Sujo e retomo as atividades em 2013 (quer dizer, desligo naquelas – sigo online no Instagram, meu brinquedo favorito do ano). Até o fim do ano deve pintar uma retrospectiva com as 75 melhores músicas de 2012 em retrospectiva, além de uma lista de melhores discos, shows e a lista da retrospectiva dOEsquema, que aparecem antes do dia 31.

Por enquanto, despeço-me de 2012 com um sorriso. Foi um ano incrível – em que o mundo não acabou, mas que ficou um pouco distante. Não reparei direito no que acontecia no mundo, mas estava sempre de olho no que acontecia por perto. Mais do que isso: fazendo acontecer. Graças a deus sou pago para fazer o que gosto e não paro de celebrar isso fazendo coisas legais pros outros. Sempre repito que o sentido da vida não é um significado, mas o verbo sentir no particípio.

E você também pode fazer. É só começar. Recomeçamos no ano que vem. Boas festas para você e para os seus, divirta-se e juízo. E não esqueça do mantra: só melhora!

Até 2013!

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