Mostra Prata da Casa: Sambanzo e Afroelectro

, por Alexandre Matias

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Hoje começa a Mostra Prata da Casa, com o melhor da programação de 2012 do projeto do Sesc Pompéia, que fui curador no ano passado. Como disse no final de 2012, o Prata foi um dos melhores trabalhos que fiz na vida, por uma série de motivos diferentes. E a partir desta terça até o próximo domingo, reunimos os doze melhores shows do ano passado em uma maratona com a melhor música nova produzida em 2012. Não custa lembrar que, ao contrário dos shows do Prata, os da Mostra são pagos e não de graça: mas o ingresso custa R$ 8,00 😉

Abaixo segue o texto que escrevi para a Mostra e sobre as duas atrações de hoje, Afroelectro e Sambanzo.

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Traçar um panorama de artistas com apenas um disco de carreira poderia ser fácil no século 20, quando o percurso natural de qualquer artista passava necessariamente pelo lançamento do primeiro álbum. Mas com a popularização dos meios digitais no século 21, há artistas que nem pensam em lançar CDs – ou vivem de shows ou soltam MP3s aos poucos online -, e ao ser convidado para a curadoria da 13ª edição do Prata da Casa, resolvi testar os limites desta definição ao chamar artistas que não são propriamente novos (como o rapper Max B.O., figurinha carimbada do rap paulistano, cujo primeiro CD foi temporão, ou da octagenária pernambucana Dona Cila do Coco, cujo único disco foi lançado há anos) e que já têm uma longa carreira mas nem sequer têm disco físico (caso do paulistano Rafael Castro, que já havia lançado músicas na internet com sua banda Os Monumentais e que chegou ao primeiro disco físico em 2012, e do carioca Bonifrate, dos psicodélicos Supercordas, pai de dois EPs digitais).

Mas o desafio de uma curadoria dessas vai muito além do formato. É preciso explorar a amplitude de gêneros e estilos que tornam o Brasil um país tão reconhecido mundialmente por sua generosidade musical. Assim, a edição do ano passado teve desde jazz (Raphael Ferreira), samba (Maíra Freitas e Jorginho Neto), música eletrônica cabeçuda (Pazes), psicodélica (Psilosamples) e descerebrada (Gang do Eletro), metal instrumental (Elma), dub (Café Preto), instrumental freak (Chinese Cookie Poets) e com molho regional (A Banda de Joseph Tourton), pop de verão carioca (Mahmundi) e paulistano (Circo Motel), chillwave (Dorgas), indie folk (Rosie & Me, Me & the Plant e Onagra Claudique), indie rock sisudo (Quarto Negro) e indie com flerte com o brega (Dead Lover’s Twisted Heart), a celebração de ritmos (Iconili) e rock regional (Os Sertões), entre vários outros shows que ajudaram a compor um panorama que desassocia a música popular brasileira ao estereótipo da MPB, essa versão institucionalizada dos conceitos criados pela bossa nova. Outro ponto em comum entre a maioria dos artistas desta edição é o fato de colocarem seus próprios discos na íntegra para download.

Escolhi cinco recortes específicos para a Mostra Prata da Casa 2012 reúne duas atrações por noite que acabam por resumir os grandes momentos do ano passado: a influência da música africana na cena paulistana, o rock direto e sem rodeios cantado em português, a maturidade do indie rock, uma jornada entre dois extremos da música tradicional pernambucana, um pop radiofônico com um leve toque de psicodelia e o hip hop de São Paulo.

Foi um ano intenso, plural e, acima de tudo, divertido. Agradeço ao Sesc pelo convite e pela oportunidade – e mando um salve ao produtor Wagner Castro, que, comigo, foi a única testemunha de todos os Prata da Casa de 2012.

Terça, 19 de fevereiro – 19h

África-São Paulo

Uma das principais tendências da atual cena musical paulistana é a cada vez mais intensa conexão africana. África e Brasil sempre tiveram um vínculo muito forte no que diz respeito à musicalidade e pontes sobre o Atlântico já foram erguidas a partir de Salvador e do Rio de Janeiro. É a vez da maior metrópole do país começar a exploração da harmonia polirritmica e da intensidade elétrica e acústica – e um dos principais polos de convergência desta nova linha de frente passa pela dupla Kiko Dinucci e Thiago França. Há, claro, mais nomes envolvidos, mas o trabalho do guitarrista e saxofonista paulistanos (que, ao lado da cantora Jussara Marçal, respondem pelo nome Metá Metá) consegue agregar referências musicais tanto brasileiras quanto africanas muito específicas, que se misturam de diferentes formas à medida em que pulam de um projeto para o outro. O Sambanzo, grupo liderado por Thiago França que conta com Kiko Dinucci na guittarra, é o encontro destas duas forças em voltagem máxima, contando com uma cozinha luxuosa, liderada por Marcelo Cabral (que coproduziu, ao lado de Daniel Ganjaman, o disco de estreia de Criolo, outro marco da conexão África-São Paulo) com Wellington Moreira na bateria e Samba Sam na percussão. O show que fizeram em fevereiro de 2012 foi também quando lançaram seu primeiro EP Etiópia e a catarse coletiva dos músicos contagiou o público. Quase seis meses depois, em agosto, foi a vez do Afroeletro, não tão central neste novo cenário mas de importância ascendente, de conduzir o público ao transe de ritmo e harmonia. O show contou com a presença do próprio Kiko Dinucci – comprovando seu papel de catalizador desta nova cena – e letras em português, além da intensa presença grupal da banda, que inevitavelmente levou o público ao delírio.

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