Kiko Dinucci: “Vamos explodir!”

, por Alexandre Matias

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Rastilho, segundo disco solo de Kiko Dinucci, é uma bordoada sonora, seja na forma que ele desce a mão no violão, seja no canto triste que entoa mensagens diretas, muitas vezes mesmo sem letra. Resgatando o jeito rude e ríspido de tocar o instrumento que o consagrou nos primeiros discos do Metá Metá e do Passo Torto, ele agora o isola para ser ouvido sem nenhum outro acompanhamento senão as melodias vocais. Acústico e pesado, Rastilho transforma o violão de Kiko em uma arma de fogo verbal, disparando canções que atravessam o coração – de diferentes formas. São lamentos instrumentais (“Exu Odara”) e cantos de terreiro (“Olodé”, “Foi Batendo o Pé Na Terra”), crônicas de quebrada (“Febre de Rato” e “Veneno”, com Ogi, quando o rapper e cantora Juçara Marçal se engalfinham numa introdução à Tom Zé) e sambas de roda (“Foi Batendo o Pé Na Terra”, “Tambú e Candongueiro” que já havia gravado com o Grupo Afromacarrônico, “Vida Mansa”, eternizada por Cyro Monteiro), quase sempre acompanhado pelo luxuoso coro feminino composto por Dulce Monteiro, Maraísa, Gracinha Menezes e pela própria Juçara. Rastilho até cria um gênero novo ao misturar a sonoridade de filmes de velho oeste à rispidez do agreste nordestino (“Marquito”, o duelo de gritos, sussurros e rosnados entre Kiko e Ava Rocha em “Dadá” ou o vôo noturno de Juçara em “Gaba”) O ponto central do disco é sua última faixa, que batiza o disco e sintetiza as duas naturezas de seu título – a peça do violão e o pavio da pólvora -, que acaba solta um pesado presságio sobre o Brasil de 2020: “Vamos explodir”, seja lá o quê. Vamos. Ah vamos.

“Queima
Deixa arder
Virar cinza
Fumaça
A praça derreteu
A noite não findou
O temporal mal começou
Deixa o sol nascer
Quando ele quiser
A lava escorrer até o último sinal de vida
Abraçado à morte sem saber
O moribundos dançam
As moscas já nos cobrem
Ninguém pode parar
Nem fé, amor ou sorte
Vamos explodir”

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