Joe Sacco e os limites do humor, traduzido para o português

, por Alexandre Matias

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O Kenzo Miura (valeu!) traduziu o quadrinho que Joe Sacco, o autor do já clássico quadrinho-reportagem Palestina, fez sobre o ataque à redação do jornal francês Charlie Hebdo e os limites do humor.

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SOBRE A SÁTIRA – por Joe Sacco

Minha primeira reação aos assassinatos no escritório do Charlie Hebdo em Paris não foi de uma provocação audaciosa. Não me deu vontade de sair por aí batendo em peito e reafirmando os princípios da liberdade de expressão.

Minha primeira reação foi de tristeza. Pessoas foram brutalmente mortas, dentre elas diversos cartunistas – minha tribo.

Mas junto com o pesar vieram pensamentos sobre a natureza de algumas sátiras do Charlie Hebdo. Enquanto pentelhar os muçulmanos possa ser tão permissível quanto cremos ser perigoso atualmente, nunca me pareceu como nada mais do que uma maneira insípida de usar a caneta.

Será que eu posso brincar disso também? Claro, eu poderia desenhar um homem negro caindo de uma árvore com uma banana em uma das mãos – na verdade, eu acabei de fazer isso. Eu tenho a permissão para ofender, certo?

Incidentalmente, você sabia que o Charlie Hebdo demitiu um jornalista – Maurice Sinet, procure por ele – por supostamente escrever uma coluna antissemita?

Então, com isso em mente, aqui está um judeu contando dinheiro nas entranhas da classe trabalhadora. E se você consegue entender a ‘piada’ agora, ela teria sido tão engraçada assim em 1933?

Na verdade, quando a gente ‘desenha uma linha’, estamos ‘cruzando’ outra também. Porque linhas em um papel são uma arma, e a sátira deve cortar na carne. Mas na carne de quem? E qual é exatamente o alvo? E por quê?

Sim, eu confirmo nosso direito de “tirar sarro” – então eis um desenho gratuito de um autêntico fiel fazendo o trabalho de Deus no deserto. Mas talvez quando a gente se cansar de andar por aí com o dedo indicador em riste possamos pensar no por quê do mundo estar do jeito que está.

E no que acontece com o muçulmanos neste nosso tempo e lugar que faz com eles não consigam desencanar de uma simples imagem.

E se a gente responder “Porque existe algo fundamentalmente errado com eles”- certamente existia algo fundamentalmente errado com os assassinos – então deixem-nos leva-los das casas deles até o mar… porque isso seria bem mais fácil do que ficar decidindo como poderíamos encaixar-nos uns nos mundos dos outros.