Conversando sobre política com o Não Salvo

, por Alexandre Matias

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Bati um papo sobre política com Maurício Cid, do Não Salvo, para o YouPix. Dono de um dos principais blogs do Brasil, ele resolveu, durante estas eleições, entrevistar os candidatos à presidência do país, mesmo sendo um blog de humor. O papo rendeu um post no site do YouPix, veja só:

Não Salvo explica porque resolveu levar as eleições de 2014 a sério

“Eu candidato?”, ri Cid. “Sem a menor chance de acontecer!” Perguntei por provocação, mas não é uma pergunta descabida. O senhor Não Salvo dispensa apresentações quando falamos de internet no Brasil pelo simples fato de que seus milhões de seguidores (dois milhões e meio só pelas contas do Facebook, mais que 1% da população brasileira) não serem apenas fãs ou torcedores.

Eles fazem parte de uma enorme comunidade de jovens que passam o dia inteiro na internet trocando mensagens, links e imagens bizarras ou engraçadas (como todo mundo que está online) . Só que em vez de apenas dispersar sua criatividade e tempo livre pelas canaletas de opinião das timelines das redes sociais, eles reúnem-se para produzir memes históricos, cumprir desafios absurdos ou eternizar momentos da realidade brasileira em manifestações grupais de humor nonsense. Sempre sob as sugestões de seu líder Cid, capitão do blog Não Salvo, que é, por isso mesmo, uma das maiores marcas da internet brasileira.

E o Não Salvo não é o 4chan brasileiro justamente pela postura de Cid, de um humor hilário mas também de uma generosidade absurda. Ele não é o típico troll da internet, talvez por ser brasileiro – seu ar despachado e um sorriso que paira entre a sinceridade e o cinismo o tornam simpático e afável. Ele não quer ser desagradável como o troll, só tá nessa pelas piadas.

Mas o tom bizarro e nonsense de seu humor aos poucos vem mudando a cara das ações do Não Salvo. Há pouco tempo ele enganou veículos de comunicação tradicional – inclusive no exterior – com duas piadas históricas: a invenção do aplicativo Tubby, que seria uma versão masculina do app Lulu, feito para ranquear homens, e uma suposta cobertura oficial da Copa do Mundo feito pelo governo da Coreia do Norte, em que o país asiático havia sido campeão passando por cima de grandes seleções. Os dois trotes não eram apenas piadas – eles mexem com a chancela autoritária que paira sobre o jornalismo (o velho “é verdade, eu li no jornal”) e nos fazem pensar não só sobre a pressa de publicar e a falta de apuração em tempos de internet como também que noções como verdade e mentira podem ser apenas questões de ponto de vista. Ao brincar, Cid está fazendo pensar.

Sua mais recente ação não tem nada a ver com o humor – embora seja filtrada pelo bom humor -, quando ele convocou os candidatos à presidência da república das eleições deste ano para entrevistas. A princípio muitos acharam que ele estava de brincadeira ou que ia falar com os candidatos para os fazerem cair em pegadinhas. Três aceitaram o desafio: Levy Fidelix, Eduardo Jorge e Luciana Genro e descobriram um entrevistador mais preocupado em mostrar a pessoa por trás do personagem do que a ouvir propostas de governo.

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“Queríamos fazer alguma coisa diferente e relacionado a politica para pegar um dos assuntos tops do ano”, me explica Cid por email. “Como dificilmente um candidato a presidente da republica iria dar entrevista para um blog, resolvi deixar um desafio no ar, assim os próprios leitores do blog iriam cobrar uma posição dos presidenciáveis pelas redes sociais. Pra minha surpresa, em menos de 24 horas já tinha candidato entrando em contato!”

Nas entrevistas, descobrimos um Levy Fidelix preconceituoso e torpe antes mesmo de ouvi-lo falar os absurdos toscos sobre homossexualidade que disse no penúltimo debate na TV antes das eleições do primeiro turno, uma Luciana Genro mais à vontade e menos ríspida, um Eduardo Jorge quase tímido com o sucesso de sua campanha online e fugindo do estereótipo “doidão” que foi associado ao seu estilo de atuação.

Pergunto sobre como a comunidade Não Salvo lida com política. “O público do blog tem por sua maioria usuários de 17 a 25 anos. Ou seja, são pessoas que já votam e possuem convicções políticas. Fiquei com receio de início, mas deixei claro que não era pra ser um papo sobre politica, pois isso você encontra em qualquer portal ou revista. A a ideia era um bate papo de amigos, com algumas brincadeiras, claro, mas nada ofensivo ou incisivo. E principalmente o entrevistador – eu – não ser o centro das atenções, deixar o candidato falar, o que é complicado em batalhas de egos da TV. Assim as pessoas iriam tomar suas proprias decisões ou ao menos conhecer melhor os candidatos de uma forma não robótica.”

O fato de três candidatos terem topado dar uma entrevista para um blog prova a importância que a internet vem ganhando, principalmente nas eleições deste ano. “As campanhas desse ano tiveram uma movimentação na internet que ate então não existia”, analisa. “Quatro anos atras, um ou outro fazia um barulho na internet para pontos específicos, mas esse ano todos os candidatos tinham area de social media e estão produzindo bastante conteudo pra rede. Como defensor da internet claro que eu acho que ainda é pouco! Daqui a quatro anos quero ver vlog diário de candidato, no mínimo!”

Um bom exemplo desta mudança é o fato da campanha de Dilma Rousseff ter contratado o personagem Dilma Bolada para ajudá-la na internet. “Não acho que o caso da Dilma Bolada seja isolado, mas existe muito militante natural também”, Cid continua. “Minha timeline do Twitter pelo menos está cheia de gente que fica o dia inteiro falando de um determinado candidato, mas por convicções políticas e não por estar sendo pago por um candidato.” Ele disse que, em seu caso, nenhum político o abordou: “E mesmo se entrasse (em contato) não tem como tomar um lado nesse tipo de briga. Sou bem neutro nas discussões e nem decidi meu voto ainda”, ri. “Vou esperar todas as entrevistas do Não Salvo para escolher.”

Cid é categórico ao falar da importância da internet para o despertar de uma nova consciência política. “É uma mídia que, apesar de ainda ter muita confusão de informação, ao menos levanta o assunto para os interessados, e isso já é uma evolução politica para qualquer país.” Ele destaca o poder da rede em movimentos como a Primavera Árabe, o Occupy Wall Street, os tumultos em Londres em 2011 e os protestos de junho do ano passado, no Brasil. “Cada um teve suas convicções, mas destaco o poder que a internet teve para a mobilização de jovens, o que mostra como a internet globalizou a comunicação em massa das novas gerações.” Ele inclusive considera que o poder de mobilização via internet talvez seja o grande trunfo dos protestos no Brasil em 2013. “Tiveram um propósito interessante, que depois acabou se conturbando nas ideias”, comenta, “mas acho que o principal ensinamento foi que ficou claro que a internet tem o poder para mobilizar pessoas em massa no Brasil de uma maneira absurda.”

Para as eleições deste ano, no entanto, ele preferiu não brincar. “Acho que a aceitação com algo tão sério como política poderia causar uma desconfiança da galera e prefiro não ‘brincar’ com o tema no formato de Desafio Aceito, que movimenta muitas pessoas na internet. Mas pras próxima talvez a gente pense em algo…”, cogita.

E conclui comentando sobre as eleições deste domingo, ao ser perguntado sobre se “as eleições da zoeira” podem continuar nas urnas. “Existe o tradicional voto de protesto. O cara que não se identifica com ninguém e vota em alguem bizarro”, explica. “O problema disso é que os votos que acabam sendo úteis de fato para a legenda do partido desse candidato bizarro, e que pode ter um peso lá na frente. Portanto acho que o maior protesto seria votar nulo. Mas isso também pode, eventualmente, ajudar um candidato que esteja no topo da apuração. Mas não é meu caso, prefiro procurar alternativas ao invés de me abster por completo. O principal protesto que alguem pode fazer é a fiscalização após as eleições”, ensina.

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