13 de 2013: “Get Lucky”

, por Alexandre Matias

Daft-Punk-Get-Lucky

De Bowie, em janeiro, a Beyoncé, em dezembro, lançamentos-surpresa estiveram na ordem do dia de 2013. É mais um indício que a transição da era analógica para a digital está chegando ao fim. Os artistas, que antes precisavam mover uma enorme máquina de marketing para conseguir ao menos um tijolinho de texto em uma página de jornal, estão fazendo isso sem tanta estrutura, pois falam direto com seus fãs. O álbum-surpresa não é uma novidade de 2013; o Radiohead já fez isso pelo menos três vezes (embora na primeira eles não assumam): no “vazamento” de Kid A no meio do ano 2000, quando o disco estava prometido para setembro; e no lançamento de In Rainbows, de 2007, e The King of Limbs, de 2011, postos para a rua em menos de um mês depois de finalizados em estúdio. A novidade de 2013 é que isso não é mais exceção e, aos poucos, tornam-se regra. Mesmo com gravadoras envolvidas no processo, os artistas querem entrar em contato direto com seus ouvintes e vender seus novos discos sem antecipação. Até o My Bloody Valentine tirou um atraso de mais de duas décadas usando essa fórmula, seguida pelo Boards of Canada, que brincou de quebra-cabeças com ouvintes e ratos de lojas de disco.

Mas ninguém soube faturar tão bem a expectativa como o Daft Punk. Não é de hoje que a dupla francesa experimenta formatos contemplando diferentes mídia e é nítida a ênfase específica que os dois dão à sua criação musical. Ao transformar as antigas máscaras em personalidades-robô, Guy-Manuel de Homem-Christo e Thomas Bangalter ampliaram sua área de atuação para além da música e talvez tenham se perdido no meio do caminho. Entre o soberbo (e lotado de samples) Discovery e a trilha sonora da continuação de Tron, a imagem do Daft Punk chamou mais atenção que suas músicas – e parece que foi com este intuito que Random Access Memories foi gravado. Sem samplear ninguém, a dupla chamou um senhor time de colaboradores (Panda Bear, Julian Casablancas, Giorgio Moroder, Todd Edwards, Chilly Gonzalez) e preferiu centrar fogo em uma música. Ou melhor: quinze segundos de uma música.

Foi o que aconteceu quando ouvimos “Get Lucky” pela primeira vez, num comercial do Saturday Night Live que viralizou no YouTube. 15 segundos e só o riff. A única imagem era o logo da banda, estilizado em prata, seguido das duas metades de cada capacete vindo de cada lado da tela, revelando a data de lançamento do novo disco. Sem vocal. Sem refrão. Só o riff, que depois ficamos sabendo que era tocado por ninguém menos que Nile Rodgers, fundador do Chic, que produziu David Bowie e Madonna nos anos 80. Semanas depois, uma versão esticada do comercial aparecia num telão no festival Coachella não apenas revelando a participação de Rodgers como a do cantor Pharrell, entregando a estrofe pré-verso da música. Ao criar essa expectativa em torno da chegada de uma única canção, o Daft Punk aos poucos foi nos acostumando com sua estrutura, seu ritmo, sua textura musical – essencialmente um flashback literal do final dos anos 70 e início dos anos 80 como o próprio nome do disco deixa claro.

Quando “Get Lucky” apareceu, tudo estava pronto para ela se tornar a música mais ouvida do ano. A expectativa criada em uma única música – e não numa grande volta ou em todo o álbum – colocou o Daft Punk no centro pop de 2013 e transformou seu hit em uma das músicas mais emblemáticas de 2013, mesmo que pareça ter sido feita em 1979. A forma como ela nos foi apresentada é que é típica deste século.

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