Vida Fodona #163: Um certo clima de psicodelia no ar

WAT digo eu.

Belle & Sebastian – “If You Find Yourself Caught in Love”
George Harrison – “Got My Mind Set On You”
Jorge Du Peixe e Lucio Maia – “Kanibal”
Frank Zappa – “Florentine Pogen”
Olivia Tremor Control – “Jumping Fences”
Supercordas – “E o Sol Brilhou Sobre o Verde”
Syd Barrett – “Baby Lemonade”
Nick Cave & the Bad Seeds – “Get Ready for Love”
Walter Franco – “Cena Maravilhosa”
Serge Gainsbourg – “Cargo Culte”
Van Morrison – “Sweet Thing”
Phoenix – “Lisztomania”
Genesis – “Back in NYC”
Mopho – “O Amor é Feito de Plástico”
Elastica – “S.O.F.T.”
Pavement – “Old to Begin”
Herbert Vianna – “The Scientist Writes A Letter”
Stevie Wonder – “All Day Sucker”

Glue here.

“The lunatic is on the grass…”

Hoje também é dia de outro Rei Mago – se estivesse vivo, Syd Barrett completaria 62 anos. A data serviu para o lançamento do site oficial do cara – o www.sydbarrett.com -, que não tem nada demais, a não ser umas fotos e umas pinturas. Mas vale pela lembrança.


Syd Barrett – “Bob Dylan Blues

Syd Barrett – “It’s No Good Trying”

G
It’s no good trying to place your hand
D
where I can’t see because I understand
A
that you’re different from me

yes I can tell
D
that you can’t be what you pretend
G
and you’re rocking me backwards
A#
and you’re rocking towards the
C D
red and yellow mane of a stallion horse.

E

G
It’s no good trying to hold your love
D
where I can’t see because I understand
A
that you’re different from me

yes I can tell
D
that you can’t be what you pretend
G A#
the caterpillar hood won’t cover the head of
C D
you know you should be home in bed.

E

G
It’s no good holding your sequin fan
D
where I can’t see because I understand
A
that you’re different from me

yes I can tell
D
that you can’t be what you pretend
G A#
yes you’re spinning around and around in a car
C D
with electric lights flashing very fast…

E

The Piper at the Gates of Dawn – Pink Floyd

Olhe no espelho, o que você vê? Certamente não o mesmo que as outras pessoas vêem em você. O máximo de tempo que você possa dedicar ao simples fato de se observar vai sempre lhe dar a certeza que nunca ninguém te observou daquele jeito. Cada pequena dobra de pele, cada fio de cabelo que sai de sua cara, cada colorido que você possa encontrar: todo detalhe que você vê em seu próprio rosto está envolvido por sentimentos pessoais que vêm à sua memória a cada centímetro observado. O espelho não é um mero reflexo da realidade – é uma distorção plana que nos leva aprofundar-se em nossas personalidades, o único lugar em que conseguimos observar nosso próprio olhar e analisá-lo friamente na tentativa de descobrir o que as outras pessoas podem ver. Mesmo assim, não é preciso, afinal os lados estão trocados: a esquerda é a direita e vice-versa e temos que reorganizar o que vemos no cérebro para tentarmos chegar perto da realidade.

Na frente dele, todos somos iguais. Mesmo se o encaramos ou fugimos dele, temos sempre a mesma reação que é uma ansiedade em vermos nós mesmos. Todo ser humano tem esta curiosidade ou repúdio, sentimento que varia de acordo com o nível de amor próprio que cada um tem. Um mundo estranhamente natural, que nos leva a pensar se é mesmo um portal para uma dimensão paralela, como o escritor inglês Lewis Carroll uma vez imaginou. Confessionário, juiz, vitrine, terapia, passarela: o espelho pode ser o que você quiser, basta você querer. Você transfere para ele aquilo que você quer ser.

A psicodelia foi o espelho que o rock mirou-se no meio dos anos 60. Ao atingir a adolescência, ele viu que não precisava se esconder na barra da calça de gêneros mais velhos para sobreviver. Ele queria se afirmar e bastava apenas se olhar num espelho para ter certeza do que estava fazendo. Mas a psicodelia não é inventada, não surge de uma hora para outra. Bastaram os Beatles disseminar a facilidade e felicidade que era ter e tocar em uma banda de rock para que todo planeta os ajudasse neste processo de amadurecimento.

Nos Estados Unidos, moleques de todo país se enfurnavam nas garagens de seus pais à procura de um som que, por mais rudimentar que fosse, era pessoal, próprio, individual. Das garagens para as ruas, os jovens passaram a morar juntos, em comunidade, numa forma desesperada de deixar a realidade quadrada de seus pais e criar seu próprio modelo de sociedade. O leque de referências ia se ampliando e aqueles jovens iam enfiando tudo que achassem que pudessem ser apenas seu em sua normalidade anormal: drogas, free jazz, xamãnismo, arte de vanguarda, poesia beat, distorção e microfonia, surrealismo, teatro, flores, revolta, modernismo, literatura do começo do século, poesia romântica, efeitos sonoros, gravações alteradas… Como uma menina se maquiando pela primeira vez, o rock americano pegava todas as referências que pudesse encontrar e esfregava-as em sua própria cara, criando sua noção de realidade, um novo mundo.

Na Inglaterra, uma revolução semelhante acontecia, mas ditada pelo estilo. Enquanto os Estados Unidos abraçavam o rock visceral como ponto de partida, no velho continente este saía do ponto de equilíbrio entre mods e rockers. Como a menina americana que se maquiava pela primeira vez, a menina inglesa preocupava-se em não borrar-se (borraria-se uma década depois, com o punk), abraçando um espectro igualmente amplo de informações. Só que o academicismo europeu acabaria fazendo com que a psicodelia inglesa englobasse elementos que sua versão americana nem pensaria em incluir.

O melhor exemplo, claro, é o marco da virada dos Beatles – a tríade Rubber Soul, Revolver e Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band -, que marca a passagem da juventude mundial de um retrato em preto e branco para uma paisagem tridimensional multicolorida, colocando-os no olho do furacão ao mesmo tempo que ajudava-o a continuar evolvendo. Entre os discos de 1965, 1966 e 1967, respectivamente, os Beatles saíam de seu universo pop (mais vasto que a maioria das bandas de sua época, englobando country, soul, pop, folk, skiffle, rockabilly e blues) e criavam um universo tão amplo quanto o que habitamos hoje. Não é exagero dizer que toda cultura pop – que é a cultura popular em tempos de capitalismo – deva os olhos da cara ao que os Beatles fizeram naqueles três anos.

Tibet, circo, música hindu, religião, Bach, mensagens subliminares, amor, técnicas de gravação, medicina e farmacêutica, fitas invertidas, Dylan, música infantil, cravos, Inglaterra vitoriana, Alleister Crowlley, vaudeville, vocais superpostos, televisão, Gandhi, Motown, jazz, Elvis, orquestras, dinheiro, cordas, música erudita, Stockenhausen, nostalgia: a paisagem total criada pelos Beatles regeria não apenas a psicodelia do final dos anos 60 como todo o mundo depois deles.

Um elemento era fundamental para a psicodelia em ambos lados do Atlântico (e para o resto do mundo): o LSD. Sintetizado por Albert Hoffman no final dos anos 50, o ácido lisérgico 25 foi a chave para toda geração flower power perceber a nova dimensão que o mundo tomava, o formato das coisas que estavam para acontecer. Era um portal para uma nova consciência que revelava nuances da realidade imperceptíveis quando careta. Mais do que uma droga hedonista, que apenas faz com que o usuário se sinta bem, o LSD tinha um caráter de revelação, de iniciação mística e espiritual, que fez com que toda uma geração (gente que hoje anda pela casa dos 50 anos e recrimina seus filhos por usar coisas bem mais leves) entrasse na mesma sintonia e se observasse, ao mesmo tempo, no mesmo espelho.

Mas se os Beatles tinham a responsabilidade de serem os líderes desta geração (disfarçando suas mensagens em títulos que soavam como piadas internas, sendo Lucy in the Sky with Diamonds (atente para as iniciais) o caso mais clássico), outros grupos não estavam nem um pouco preocupados em ser sutis. O mais evidente de todos era o Pink Floyd, cujas apresentações ao vivo eram perfeitas para se viajar de ácido. Tomados pelo espírito inventivo e experimentalista que o ácido proporcionava, eles levitavam o rock para uma realidade desconhecida, andando no lado escuro do sonho que os Beatles desenhavam.

O grupo foi criado em 1965 no curso de arquitetura da Escola Politécnica da Regent Street, em Londres. Eram apenas quatro malucos (o guitarrista Syd Barrett, o baixista Roger Waters, o tecladista Rick Wright e o baterista Nick Mason) que começaram como outra banda qualquer, mas que, por influência do ácido, começaram a experimentar o som. À frente do grupo, a figura de Syd Barrett era responsável pelos limites explorados pelo grupo. Barrett era uma versão rock de um misto de Salvador Dali com Buda, liderando o grupo e seus primeiros fãs com a placidez de um líder religioso, mas com o espírito inventivo e de inovação que move a arte desde o começo dos tempos. Introspectivo fora do palco, ele se entregava por inteiro quando imergia-se na música.

O grupo passou por várias encarnações, como Meggadeaths, Sigma 6, Abdabs (que contava com a futura esposa de Wright, Juliette Gale, na formação e se apresentava de forma convencional – como Architectural Abdabs – e não-convencional – como Screaming Abdabs -, às vezes na mesma noite), Leonard’s Lodgers e T-Set, em cada uma delas lapidando o som que mais tarde comporia o som do Pink Floyd. Este nome inclusive, mostra o nível de liderança que Barrett exercia sobre seus outros companheiros, pois foi tirado de uma visão que o guitarrista teve durante uma viagem de ácido. O nome mais tarde seria revelado uma fusão dos primeiros nomes dos bluesmen favoritos de Syd, Pink Anderson e Floyd Council – mas na época ninguém contestou o batismo premonitório.

E como Pink Floyd o grupo saiu do circuito universitário, freqüentando casas noturnas que em pouco tempo se tornariam referenciais da cultura londrina. Vivendo em plena era Swinging London, Londres assistia ao nascimento de sua psicodelia à medida que as cores apareciam e o volume dos sons aumentava, como se a própria cidade tivesse tomado LSD. Os mods tornavam-se cada vez mais coloridos e os rockers cada vez mais barulhentos e essa combinação de estilo com ruído caía como uma luva nas apresentações do Pink Floyd. Em casas de shows como o Marquee, a Roundhouse e o UFO, eles tocavam rocks primitivos (como Louie Louie) em versões caóticas, além de apresentar as canções do vocalista e guitarrista – jóias pop distorcidas em clássicos lisérgicos. Ocasionalmente se comportavam como uma banda tradicional, experimentando em estúdio e no palco os limites que poderiam ser encontrados entre refrões, introduções, solos. Outras vezes deixavam simplesmente o instinto tomar conta em jam sessions intermináveis, onde barulho e silêncio se encontravam com instrumentos tocados de forma não-convencional, efeitos de som e de luz, projeção de slides, seqüências de notas heterodoxas e a repetição abusada ao extremo.

Gravaram seu primeiro single de forma independente, com o futuro George Martin do folk inglês atrás dos controles (Joe Boyd mais tarde seria responsável pelos melhores discos da Incredible String Band, do Fairpoirt Convention, Sandy Denny, Richard Thompson e Nick Drake – além dos primeiros discos do R.E.M.). Arnold Layne/Candy and a Current Bun já mostrava a disposição para ir contra a corrente. No lado A, Syd Barrett cantava sobre o personagem-título, um sujeito cujo hobby era roubar lingerie dos varais da vizinhança. O lado B teve que ter seu título mudado pois o original, Let’s Roll Another One (Vamos Enrolar Mais Um), daria problemas com a polícia. Nos dois, o experimentalismo sônico já estava em voga, com efeitos sonoros, cadências estranhas, o estranho cruzamento do som da guitarra Danelectro de Syd (tocada aos pedaços) e dos teclados de Rick sobre a cozinha anfetamínica de Waters e Mason. Os vocais de Syd – chapados e concentrados ao mesmo tempo – contrapunham-se com as melodias, quase infantis, das duas canções. O single teve ótimo desempenho nas paradas, atingindo o 20º posto na Inglaterra. O próximo (See Emily Play – parente inglesa dos Doors -/Scarecrow) seguia o rumo do primeiro, mas a regência já não era de Boyd, mas de Norman Smith, engenheiro de som da EMI que havia trabalhado em pelo menos quatro discos dos Beatles. Eles foram levados para a mesma gravadora do grupo de Liverpool após seu primeiro contato com o empresário Peter Jenner, que passeava por Londres procurando uma banda que pudesse mudar sua vida. Encontrou o Floyd num show no Marquee Club e resolveu transformá-los em seus Beatles. Logo o grupo estava tocando no concerto de lançamento do diário da revolução sonora londrina – o International Times, também conhecido com It -, em dezembro de 1966.

Logo o nome do grupo começava a crescer e eles fariam sua primeira turnê pela Europa no inverno de 1967. Voltaram da Holanda no dia 27 de abril daquele ano, no Alexandra Palace, ainda a tempo para apresentar-se como principal atração do minifestival 14 Hour Technicolor Dream, ao lado de artistas como Yoko Ono, os Pretty Things, Binder Edwards & Vaughn, Utterly Incredible Too Long Ago To Remember Sometimes Shouting at People, Ron Geesin, Alexander Trocchi, Graham Bond, Michael Horovitz & The 26 Kingly Street Group, Alexis Korner, o pianista Champion Jack Dupree, Barry Fantoni, Ginger Johnson, Savoy Brown, Christopher Logue, 117, os Flies, The Purple Gang, o Crazy World Of Arthur Brown (cujo vocalista ateou fogo no próprio corpo durante seu único hit – Fire) e o Soft Machine. Era claro que o grupo era o principal nome da nova cena londrina, afinal 20 mil malucos de ácido não poderiam estar errados. A consagração aconteceu no mês seguinte, no show Games For May (cujo título havia sido tirado de See Emily Play), no Queen Elizabeth Hall. O evento multimídia colocava o Floyd no centro das atenções, entre música eletrônica, shows de luzes, projeções de imagens, incenso e a estréia do Azimuth Co-Ordinator, o impressionante sistema de som e efeitos sonoros do grupo. Estava na hora de entrar no estúdio para gravar seu primeiro álbum.

Assim nascia The Piper at the Gates of Dawn, cujo título havia sido tirado do livro infantil The Wind in the Willows. Gravado no estúdio 1 do complexo da EMI (que mais tarde viria a ser conhecido como Abbey Road), Piper foi concebido enquanto os Beatles terminavam seu megaprojeto Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band no estúdio ao lado, o 2. A vibração psicodélica estava no ar e muitos cogitam a possibilidade de um disco ter influído no outro, devido aos encontro esporádicos entre Barrett e John Lennon nos corredores da gravadora, saindo dos estúdios para fumar um cigarro ou tomar uma xícara de chá. Capitaneado pelo mesmo Norman Smith de See Emily Play (que depois levaria seus conhecimentos sonoros lisérgicos adquiridos com o Floyd para as gravações do melhor disco dos Pretty Things, S.F. Sorrow), The Piper at the Gates of Dawn é o disco mais pop e mais psicodélico simultaneamente que a história do rock já viu.

Ele abre com a tensa Astronomy Domine, que começa com o empresário Peter Jenner fingindo-se de torre de comando do controle espacial enquanto lê, monocordicamente, um livro de astronomia aberto numa página qualquer. Sobre o vocal robótico, a guitarra seca de Barrett começa a marcar o tempo e é seguida pelo baixo de Waters, formando um compasso mecânico acrescido de um código morse inventado por Rick Wright ao teclado e pela bateria esparsa de Mason. A guitarra abre a canção com acordes soltos e improvisados, seguidos pelos vocais superpostos de Barrett e Waters: “Flutuando abaixo, o som soa sob as águas congeladas no subterrâneo/ Júpiter e Saturno/ Oberon, Miranda e Titânia/ Netuno, Titã/ Estrelas podem assustar”. A guitarra vai para um lado, o baixo vai para o outro e ambos desenham uma ladeira vertiginosa que mostra a amplitude sonora que as referências astronômicas parecem descrever. O vocal sobre este improviso é um falsete assustador que logo é interrompido com o barulho do vento e a entrada do solo. Por trás, Mason viaja sobre a cadência criada no começo da música, virando-a para dar a dimensão espacial do som. Entramos num universo sonoro novo, onde ouvimos cores e vemos sons.

Lucifer Sam abre com uma levada groovy do baixo de Waters surpreendida pelos teclados flutuantes de Wright. “Lucífer Sam/ Gato siamês/ Sempre sentado a seu lado/ Sempre a seu lado/ Este gato é algo que não consigo explicar” – o imaginário de Barrett apenas atira pedaços de referências, deixando o ouvinte sem o rumo que a canção pode ter. Sua guitarra alterna golpes secos com microfonia e assobios feitos com o wah-wah. “Você é o lado esquerdo/ Ele é o lado direito/ Oh não” – não há sentido nenhum nas letras a não ser a mesma expansão de consciência que o grupo propõe com som. Ele quer que o ouvinte torne-se uma criança que não conhece o mundo, ingênua da realidade que o cerca, esperando novidades trazidas de outra região da mente. E assim é Matilda Mother, cujo andamento hipnótico revela ouvintes ávidos pelo desconhecido: “Oh mãe/ Conte-me mais/ Por que você me deixa aqui/ Com meu ar infantil/ Esperando?/ Você só tem que ler as linhas/ Escritas em negro e tudo se iluminará”. No meio da canção, Syd – com os vocais – repete a bateria dos Beatles em Tomorrow Never Knows e deixa teclado e guitarras fazerem o que quiser.

Flaming começa sombria, mas logo se mostra um dos momentos mais coloridos do disco. “Só sob as nuvens azuis/ Deitado num edredon/ Você não pode me ver/ Mas eu te vejo” – aqui a atmosfera é de sonho e o narrador nos guia por um folk ácido, cheio de referências surreais e efeitos sonoros, interrompidos por um solo de teclado inspirado, acompanhado de perto dos ruídos do Azimuth Co-Ordinator e da guitarra melancólica de Syd. A instrumental Pow R. Toc H. nos leva para uma floresta úmida e misteriosa, onde cada um dos integrantes imita um animal fantástico, numa espécie de Caravan (de Duke Ellington) abastecida com ácido. No centro da canção, outro solo de teclado, mais jazzy, dá melodia ao batuque primitivo que é a espinha dorsal do disco. A percussiva Take Thy Stethoscope and Walk é a única composição de Waters do disco e é construída em volta de um vocal repetitivo que trafega o verso “Doctor! Doctor!” de uma caixa para outra. Mas logo à frente, o grupo volta às jam sessions que fazem durante todo disco, para Barrett concluir o primeiro lado do álbum: “Música parece ajudar a dor/ Parece cultivar o cérebro/ Doutor gentilmente conta à sua esposa que/ Estou vivo!/ Flores nascem!/ Perceba!/ Perceba!/ Perceba!”.

O lado B começa com um dos momentos mais memoráveis da carreira do Pink Floyd em disco. Interstellar Overdrive é apenas um riff repetido várias vezes até o grupo ceder ao improviso e se arrastar por quase dez minutos que ao vivo chegavam a quarenta, em alguns casos. Durante o percurso, o mais próximo que a psicodelia chegaria ao free jazz sem perder suas características rocker, o grupo acelera, pára, aumenta o som, diminui, os teclados emitem sons estranhos, a guitarra cria sensações anormais, o baixo desfere golpes e assobia doces melodias e a bateria voa para muito além do ritmo – sempre voltando, ocasionalmente, à frase inicial, que retorna, lenta e com pirações em estéreo, no final da canção, interrompida abruptamente por The Gnome, antes do fim. Esta canção, uma bucólica e infantil descrição da vida de Grimple Grumblo em sua aldeia de gnomos. “Olhar pro céu/ Olhar pro rio/ Não é tão bom?”, sussurra Barrett, celebrando o ócio que sua geração abraçara.

“Um movimento é completo em seis estágios/ E o sétimo traz a volta”, canta, contemplativo, Barrett em Chapter 24, “o sete é o número da luz jovem/ Forma-se quando a escuridão é acrescida de um/ Mudança volta sucesso/ Indo e vindo sem erros/ Ação traz boa sorte/ Pôr-do-sol”. A faixa é lírica e um dos momentos mais lisérgicos do disco e foi tirada em sua íntegra do capítulo 24 (Fu) do I-Ching. Ao ocaso da canção, o teclado de Wright desenha uma bela paisagem em que os vocais de Barrett e Waters se circulam como numa canção oriental.

A percussão de Scarecrow é construída à medida que a canção começa e é acompanhado por um teclado infantil. A faixa tem o mesmo ar pueril de The Gnome, mas em vez de falar sobre sua própria geração, prefere discorrer sobre a de seus pais, falando da estática não-criativa que a sociedade os impôs na figura de um espantalho. O clima infantil continua em Bike, em que os principais elementos do Floyd original – pop, efeitos sonoros, letras surreais, solos, vocais intercalados e superpostos – se encontram pela última vez. “Eu conheço um quarto de sons musicais/ Uns rimam, outros tocam/ A maioria deles é mecânica/ Vamos lá fazê-los funcionar”, Barrett encerra o disco cantando sobre o próprio, à medida que saímos do quarto que ele acabou de descrever. Mas sem antes deixar-nos intrigados com uma seqüência de sons inventados no estúdio.

Lançado no dia 5 de agosto de 1967, The Piper at the Gates of Dawn foi, junto com seus contemporâneos (como o primeiro disco dos Doors, o primeiro de Frank Zappa, o primeiro do Velvet Underground, Smiley Smile, dos Beach Boys) ofuscado pelo lançamento de Sgt. Pepper’s, dos Beatles, que é inevitavelmente o disco mais importante deste período. Mas o disco de estréia do Floyd explora o limite entre o pop e a lisergia de uma forma que os Beatles sequer consideravam. Depois do lançamento do disco, Barrett começou a dar sinais que a quantidade de ácido que tomava não estava fazendo bem à sua cabeça e ele teve de ser afastado do grupo, sendo substituído por David Gilmour já no segundo álbum, A Saucerful of Secrets. Mesmo com alguma participação em Saucerful… (como a íntegra de Jugband Blues e participações em Remember a Day, See-saw e Set the Controls for the Heart of the Sun) e outros singles que hoje só encontramos em piratas (Vegetable Man e Apples and Oranges, além do até hoje inédito Scream Thy Last Scream – todos dignos de nota), o legado de Syd Barrett está totalmente concentrado no primeiro disco do Pink Floyd, que depois tornou-se a principal banda do rock progressivo, levando o conceito dos Beatles em Abbey Road (de 1969) às últimas conseqüências. Mesmo em sua errática carreira solo (em que preferia esmurrar o próprio violão a explorar novos horizontes sônicos), Barrett não conseguiu atingir o mesmo vigor e brilho do auge da psicodelia londrina. Nem ele, nem ninguém.

And if there is no room upon the hill

sydb68.jpg

Ascende Capricórnio! Ave Lúcifer, senhor Syd, guardião da lisergia, onde quer que estejas perdido na imaginação já não mais fértil deste ou de outros cérebros fritos pelo ácido. Dia de reis passado fizeste 61 anos e abençoará a última megalomania da História do Rock, a esperada turnê mundial de volta do Pink Floyd. E lembrem-se das palavras sábias que o Mercury Rev projetou no telão: “Isso não é a sua mente”, ao mostrar a imagem de um cérebro, e “sua mente não pertence a você”.

“Flaming”- Pink Floyd

E D
Alone in the clouds all blue
Bm A Asus4 A Asus2 A
Lying on an eiderdown.
E A
Yippee! You can’t see me
D F E
But I can you.

E D
Lazing in the foggy dew
Bm A Asus4 A Asus2 A
Sitting on a unicorn.
E A
No fair, you can’t hear me
D F E
But I can you.

E D
Watching buttercups cup the light
Bm A Asus4 A Asus2 A
Sleeping on a dandelion.
E A
Too much, I won’t touch you
D F E
But then I might.

E D
Screaming through the starlit sky
Bm A Asus4 A Asus2 A
Travelling by telephone.
E A
Hey ho, here we go
D F E
Ever so high.

E D
Alone in the clouds all blue
Bm A Asus4 A Asus2 A
Lying on an eiderdown.
E A
Yippee! You can’t see me
D F E
But I can you.

“Arnold Layne”- Pink Floyd

A A G F# F
Arnold Layne had a strange hobby
E
Collecting clothes
A G D E
Moonshine, washing line
D C A
They suit him fine.
A A G F# F
On the wall hung a tall mirror
E
Distorted view
A G D E
See-through baby blue
D C
He dug it

G D A C G D
Oh, Arnold Layne, it’s not the same
C G D
Takes two to know
E7 G7
Two to know, two to know,
A7
Two to know
D G E A
Why can’t you see?
A A7 A Asus4 A7
Arnold Layne, Arnold Layne, Arnold Layne, Arnold Layne

A A G F# F
Now he’s caught, a nasty sort of person
E
They gave him time
A G D E
Doors clang, chain gang
E D G
He hates it

G D A C G D
Oh, Arnold Layne, it’s not the same
C G D
Takes two to know
E7 G7
Two to know, two to know,
A7
Two to know
D G E A
Why can’t you see?
A A7 A Asus4 A7
Arnold Layne, Arnold Layne, Arnold Layne, Arnold Layne
A G E A
Arnold Layne, don’t do it again

“Jugband Blues” – Pink Floyd

Tou em altas fase Syd Barrett, não repara…

C Am
It’s awfully considerate of you to think of me here
C Am C
And I’m almost obliged to you for making it clear that I’m not here
Am C
And I never knew the moon could be so big
Am C
And I never knew the moon could be so blue
Am C
And I’m grateful that you threw away my old shoes
F G A
And brought me here instead dressed in red
Bm F#m Bm F#m
And I’m wondering who could be writing this song

G D A D
I don’t care if the sun don’t shine
G D A D
And I don’t care if nothing is mine
Fm A
And I don’t care if I’m nervous with you
Fm A
I’ll do my loving in the Winter

G D A D (X4)

G D
La, La, La, La La, La, La, La
A D —-> (x4)
La, La, La, La La, La, La, La

N.C.
La, La, La, La… (Glissando from D to Fdim: 1 2 1 x x x)

Coda: Am C

Am Am
And the sea isn’t green
C Am
And I love the queen
C Am
And what exactly is a dream?
C A
And what exactly is a joke?

“Lucifer Sam” – Pink Floyd

F#m G
Lucifer Sam, siam cat.
B
Always sitting by your side
E
Always by your side.
C G D
That cat’s something I can’t explain.

F#m G
Jennifer Gentle, you’re a witch.
B
You’re the left side
He’s the right side.
E
Oh, no!
C G D
That cat’s something I can’t explain.

F#m G
Lucifer go to sea.
B
Be a hip cat, be a ship’s cat.
E
Somewhere, anywhere.
C G D
That cat’s something I can’t explain.

F#m G
At night prowling sifting sand.
B
Hiding around on the ground.
E
He’ll be found when you’re around.
C G D
That cat’s something I can’t explain.

“See Emily Play”- Pink Floyd

G D/F# Am/E N.C.
Emily tries but misunderstands, ah-ooh.
Cmaj7 Am G
She’s often inclined to borrow somebody’s dream till tomorrow.
E
There is no other day.
D E
Let’s try it another way.
D E N.C. A
You’ll lose your mind and play free games for May.
G
See Emily play.

G D/F# Am/E N.C.
Soon after dark Emily cries, ah-ooh.
Cmaj7 Am G
Gazing through trees in sorrow, hardly a sound till tomorrow.
E
There is no other day.
D E
Let’s try it another way.
D E N.C. A
You’ll lose your mind and play free games for May.
G
See Emily play.

G D/F# Am/E N.C.
Put on a gown that touches the ground, ah-ooh.
Cmaj7 Am G
Float on a river forever and ever, Emily.
E
There is no other day.
D E
Let’s try it another way.
D E N.C. A
You’ll lose your mind and play free games for May.
G D
See Emily play.