Cidadania digital

Escrevi a capa da revista Sãopaulo, da Folha, neste domingo – uma matéria sobre grupos de moradores de São Paulo que utilizam a internet para fazer política com as próprias mãos.

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Cidadania digital
Mobilizações conectadas à internet redesenham a política da cidade

Depois de facilitar a vida do paulistano –que pode chamar um táxi, escapar do trânsito ou encontrar rapidinho um restaurante próximo–, a migração da internet para o celular passou a colaborar com a transformação do espaço público da cidade. Com acesso de qualquer lugar, as pessoas estão se mobilizando mais rapidamente e colaborando com mais frequência.

“Estamos nas ruas e vendo a internet, e não vendo as ruas pela internet. Somos o oposto dos ativistas de sofá”, afirma a arquiteta e produtora Laura Sobral, 29.

Com a ajuda da rede para divulgar atividades e criar um fórum de discussão, Laura fundou, em janeiro deste ano, um movimento para ocupar o árido largo da Batata, em Pinheiros, região oeste. Todas as sextas-feiras à noite, membros e simpatizantes do grupo A Batata Precisa de Você, que já beira 4.000 integrantes no Facebook, se reúnem no largo para conversar, ouvir música ao vivo e discutir por quais melhorias a área pode passar.

O movimento Minha Sampa também quer uma cidade mais aprazível. Criado em fevereiro deste ano, o grupo desenvolve ferramentas on-line para incentivar mobilizações e pressionar autoridades diretamente. Um desses instrumentos é o site de reivindicações Panela de Pressão (paneladepressao.nossascidades.org), que reúne propostas de usuários para transformar a cidade, entre elas uma que sugere que a avenida Paulista seja fechada aos domingos, como acontece com o Minhocão. Se concordar com a ideia, o usuário pode enviar na hora um e-mail à CET e ao prefeito Fernando Haddad para engrossar o coro.

Ao navegar no “Panela”, dá para ver as iniciativas consideradas vitoriosas pela plataforma, como o impedimento do vagão exclusivo para mulheres nos trens (vetado pelo governador Alckmin) e a proteção dos teatros pequenos ameaçados pela especulação imobiliária (em andamento na prefeitura).

“Damos suporte às mobilizações iniciadas por cidadãos, da concepção ao acompanhamento de resultados”, afirma Anna Livia Arida, 30, diretora do Minha Sampa. O projeto é irmão mais novo do Meu Rio, movimento criado há dois anos que reúne 130 mil cariocas, a maioria jovens.

Na mesma onda, o Hey! Sampa promove debates, passeios e atividades culturais para “valorizar o patrimônio da cidade e difundir a história dos bairros para seus moradores”. “As ferramentas digitais facilitam tanto para chamar a atenção da comunidade como para cobrar o poder público”, conta Paula Dias, 29, cofundadora da plataforma.

Outra iniciativa é o Wikipraça, movimento que pretende conclamar on-line pessoas para utilizar espaços públicos. O primeiro alvo é o largo do Arouche, na região central, onde um grupo encarou o calorão do sábado retrasado (11/10) para construir bancos de madeira. “Mais do que para se comunicar, a internet é um espaço para se organizar”, conta Bernardo Gutierrez, do Wikipraça.

Veterano se comparado a alguns exemplos citados nesta reportagem, o site SP Honesta virou hit ao mapear restaurantes bons e baratos. A página, criada no auge da discussão sobre os preços abusivos na cidade, no ano passado, é produzida com informações de usuários e deve virar aplicativo para celular.

Na rua, na praça ou no restaurante, o discurso é de união por uma cidade “colaborativa”. “A internet torna mais fácil a reunião de pessoas com interesses em comum. Sozinho é muito difícil fazer política. Mas, quando você tem pessoas ao seu redor, concretizar essas iniciativas fica muito mais fácil e divertido”, afirma Tatiana de Mello Dias, 28, uma das criadoras do SP Honesta.

Para a economista Ana Carla Fonseca, as relações entre público, privado e sociedade civil estão cada vez mais porosas. “É um movimento natural de pessoas, empresas e instituições que unem dois traços: trabalham na fronteira da vanguarda, ou seja, não esperam, e entendem que é preciso ser protagonista ou coprotagonista da mudança que defendem, em vez de passar a lista para os outros”, diz ela, que dirige a Garimpo de Ideias, empresa que gere conteúdos, projetos e iniciativas ligados à economia criativa.

Telefone sem fio
Três em cada quatro celulares vendidos no Brasil são smartphones. Dos quase 18 milhões de aparelhos que deixaram as lojas entre abril e junho de 2014, 4,6 milhões eram celulares simples e 13,3 milhões tinham acesso à internet. Não há dados da cidade de São Paulo. “Embora o brasileiro ainda fale mais ao celular do que utilize a internet no aparelho, esse hábito vem mudando”, diz João Paulo Bruder, gerente de telecom da consultoria IDC Brasil.

Mas cadê a internet sem fio e de graça? Embora ainda tímido se comparado a outras capitais do mundo, o projeto Praças Wi-Fi, da Prefeitura de São Paulo, quer estimular a ocupação de 120 praças públicas da cidade a partir da utilização da internet gratuita (veja lista em wifilivre.sp.gov.br). Atualmente, 65 estão em operação.

Outro projeto, da MobiLab (Laboratório de Mobilidade da SPTrans), fundado em parceria com a USP, quer transformar os 15 mil ônibus da frota da cidade em pontos de acesso à rede sem fio. Por enquanto, apenas 20 deles estão em circulação.

Em setembro de 2013, São Paulo se tornou a primeira cidade na América Latina a abrir integralmente e em tempo real os dados do GPS dos ônibus para desenvolvedores.

“Já são mais de 60 aplicativos utilizando essa informação para melhorar o uso do transporte público”, afirma Ciro Biderman, chefe de gabinete da SPTrans.

Biderman diz que pretende implantar o wi-fi também nos 17 mil pontos de ônibus da capital paulista, mas o projeto ainda não saiu do papel. “Seria ainda mais impactante. Além de serviço mais estável do que nos coletivos em movimento, funcionaria durante 24 horas.”

Festa ou bazar?

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Voltei a colaborar com a Folha e pra começar fiz essa matéria pra revista Sãopaulo sobre festas com cara de bazar e vice-versa.

Festas ou bazar?
Designers, estilistas e quituteiros vendem seus produtos com drinques, DJs, bandas e atrações de dia e ao ar livre

Há algo no ar de São Paulo -e não é poluição- que tem feito os moradores da cidade saírem de casa.

Desde as passeatas anteriores aos protestos de junho de 2013 às recentes e polêmicas ciclofaixas, há um ímpeto para ir às ruas em vez de ficar preso em shoppings, engarrafamentos e condomínios fechados, como rezava o antigo clichê paulistano.

O novo passo nessa direção ganhou força com o passar do ano e é a cara desta primavera: festas com jeito de bazar ou bazares com jeito de festa.

O movimento reúne duas tendências já estabelecidas. As festas diurnas deixaram de ser continuações de noites viradas e ganharam contornos com menos cara de balada. Reúnem um público mais velho, mas disposto a sair de casa para dançar -embora não tão tarde.

Os exemplos vão desde a pioneira Green Sunset, no MIS (Museu da Imagem e do Som), aos encontros na finada pracinha da loja Tag and Juice, na Vila Madalena, região oeste.

A outra tendência é a reunião de produtores locais para vender itens artesanais, veganos e vintage em festas-bazares e eventos de maior porte, a exemplo das feiras de vinil, dos encontros gastronômicos e da Feira Plana, de fanzines.

A história do Jardim Secreto, uma dessas novas festas, reflete bem essa fusão. A designer Claudia Kievel, 26, já tinha uma festa, a Uuh Baby!, desde 2012, e a garçonete Gladys Maria, 27, tocava o Bazar Dançante desde 2011.

“Partimos do princípio de que chega de só ter balada como diversão. Queríamos eventos diurnos, ao ar livre, verde, e espaço para novas ideias também de amigos e artistas que admiramos”, resume Claudia.

A próxima edição do Jardim Secreto está marcada para dezembro, em local a ser definido.

Outro evento, o YardSale, nasceu de uma “venda de quintal” -como na tradução do nome para o português-, em março do ano passado. Tamali Reda, 27, que trabalha com cenografia, queria se desfazer de coisas de seu armário.

Ela juntou amigos a fim de fazer o mesmo e a primeira edição deu tão certo que tornou-se regular: ocorre a cada dois ou quatro meses. “Agora chamo designers novos, com propostas diferentes, além de reservar espaço para a arte: fanzines, quadrinhos, tipografia, gravuras.”

A YardSale, que, para Tamali, “é um grande festão”, reúne bazar, DJs, banda e comida (“sempre tentar trazer aquela que tenha cara de comidinha de vó, sabe?”), é itinerante e já passou por vários lugares, como hostel, bar, boate e até “um jardim absurdo do casarão da avó de uma amiga”. A próxima edição está marcada para sábado (27), no restaurante Lorena 1989.

O Bazar Pop Plus Size, da jornalista Flavia Durante, vai além das compras e diversão: “É um evento para celebrar a diversidade e incluir quem sempre foi excluída do mercado da moda, onde é possível comprar roupas, bater papo, fechar negócios, degustar comidinhas, beber e ouvir música, sem ninguém te olhar estranho por você não vestir 38.”

A festa traz marcas e gente de fora de São Paulo e sua edição mais recente aconteceu no fim de semana passado. A próxima será em dezembro.

Uma das inspirações para o Bazar Pop Plus Size é o Mercado Mundo Mix, nome de peso do mercado alternativo dos anos 1990 que ressurge. O evento estará de volta nos dias 8 e 9 de novembro, gratuitamente, no parque da Água Branca, região oeste, com periodicidade mensal. No último domingo (14), a Casa das Caldeiras, também na Água Branca, abrigou a terceira edição da festa anual C.R.I.A., sigla para Coletivo de Realização e Integração Artística, organizada pela Freak Produtora e Estúdio, de Antonio Carvalho, 26, Gustavo Prandini, 25, e Antonio Pauliello, 25, integrantes da banda Mel Azul e da festa Foggiorno.

O evento, gratuito, pela primeira vez abriu suas portas para vendas de produtores locais, inspirados pela festa brasiliense PicniK, com quem dividiram a edição deste ano. Segundo Carvalho, a festa reuniu 1.800 pessoas.

“A ideia é fortalecer a economia criativa local, aproximando os pequenos negócios da área gastronômica, produção de moda e artesanato aos novos artistas independentes, para criar um público consumidor”, diz o organizador Antonio Carvalho.

Como no Brooklyn
Já a novata Feirinha Pantasma, criada pela jornalista Taís Toti, surgiu do sucesso da Feira Plana, de fanzines. “Curto esse lance do Brooklyn [distrito de Nova York], de incentivar a produção artesanal. Não entendia porque isso não pegava aqui. Gosto de saber quem fez as coisas que eu estou comprando, me sinto bem com isso”, afirma Taís, que organiza a feirinha no sobrado do Neu, na Água Branca.

Apesar de o foco ser a produção local, ela não discorda que a feirinha é uma festa, “já que é um evento para que as pessoas possam passar um dia agradável, curtindo as ‘good vibes’. Tem DJ e bebida, então as pessoas se animam”.

“Acho que a tendência são espaços com lojas, restaurantes, cafés e música: tudo misturado”, constata Inara Corrêa, organizadora do Mercado das Madalenas, que ocorre três vezes ao ano na Vila Madalena e teve uma edição no fim de semana passado. A próxima será em dezembro.

Além das compras, há a retomada da rua como espaço de convívio. Carvalho, do C.R.I.A., atribui isso à Virada Cultural. “Abriu precedentes.”

“Acredito que tem aumentado a sensação de pertencimento das pessoas em relação à cidade”, continua Amauri Terto, da festa-exposição-bazar Escambau, que acontece no Puxadinho da Praça, na Vila Madalena.

“Não tenho mais fôlego para ficar batendo cabelo até as 6h e voltar para a casa de metrô”, resume Tamali, da festa YardSale. “Tem rolado um ‘êxodo baladesco’. Parece que existe uma vontade coletiva de aproveitar a cidade de dia.”

Mercado Mundo Mix

Hit nos anos 1990, “o Mercado Mundo Mix nunca parou”, conta o dono da marca, Beto Lago. “De 2002 a 2012, ele ocorreu anualmente em Portugal.” No Brasil, teve breves aparições na Virada Cultural de São Paulo e no Festival de Inverno de Bonito (MS). A temporada portuguesa, no castelo de São Jorge, um dos pontos turísticos de Lisboa, ampliou os horizontes do organizador. “Quero fazer o mesmo modelo que organizamos na Europa: lugares públicos e com entrada gratuita.” Daí a escolha do parque da Água Branca para inaugurar essa nova etapa. Lago aponta a internet como um fator importante para a reformulação. “As marcas que se apresentaram ao mundo no boom do consumo de moda pela internet hoje sentem necessidade de sair do mundo on-line para se aproximar do público.”

Agenda primaveril

Setembro
YardSale (dia 27): www.facebook.com/yardsalesp
Brooklin Coletivo (dias 27 e 28): www.facebook.com/brooklincoletivo

Outubro
Feirinha Pantasma (dia 18): www.facebook.com/neuclubsp

Novembro
Mercado Mundo Mix (dias 8 e 9): www.facebook.com/pages/Mercado-Mundo-Mix/481991788604564

Dezembro
Jardim Secreto (dias 6 e 7): www.facebook.com/jsecreto
Bazar Pop Plus Size (a definir): www.facebook.com/bazarpopplussize

Noites Trabalho Sujo: fervor no Alberta #3

No especial que a revista Sãopaulo, da Folha, fez sobre a noite paulistana, minha festa ficou em destaque na programação do Alberta e nas dicas de festas na cidade:

ALBERTA #3
Aconchegante, o clubinho tem decoração que remete aos hotéis antigos do centro, com sofás de couro, bar com balcão “vintage” e fotos de ícones do rock, como Bob Dylan. Abre cedo para happy hour e, no começo da “madruga”, assume sua vocação de boate com pista animada: as noites do Trabalho Sujo, às sextas, são as mais fervidas, com sets do “indie” rock ao pop.

Curto a ironia do “indie” entre aspas.