Nick Drake revisitado

Foto: Camila Pastorelli

Foto: Camila Pastorelli

Um dos principais nomes da música britânica do século passado, Nick Drake é daqueles artistas que fez pouco, mas o pouco que fez foi muito. Lançou três álbuns e uma série de gravações esporádicas numa discografia impecável que reúne um cancioneiro único no Reino Unido. Tímido e recluso (e com quase dois metros de altura), fazia parte da cena folk inglesa de bandas como Incredible String Band, Fairport Convention e Sandy Denny, da virada dos anos 60 para os 70, e embora não fosse um dos integrantes mais ativos da cena, era seu principal nome. Ainda desconhecido no Brasil, ele é alvo de um tributo organizado pelo produtor Eduardo Lemos e pelo músico Régis Damasceno, guitarrista do Cidadão Instigado e diretor musical do show Lua Rosa, que acontece no Sesc 24 de Maio nos dias 14 e 15 de novembro e reúne, além de Regis, nomes como Filipe Catto, Stela Campos, Ceumar e Gui Amabis (mais informações aqui). Bati um papo com os dois, que também anteciparam em primeira mão para o Trabalho Sujo a versão que Filipe Catto e Regis Damasceno fizeram para “Clothes of Sand”, uma das músicas mais conhecidas dele por aqui, que foi gravada no primeiro disco solo de Renato Russo, The Stonewall Celebration Concert.

Como surgiu a ideia de homenagear Nick Drake? Como você conheceu o trabalho do autor?
Eduardo Lemos: Conheci Nick Drake em 2008, quando assisti Garden State. Uma de suas mais bonitas canções, “One of These Things First”, faz parte da trilha sonora do filme. Nas semanas seguintes, fiquei obcecado por sua obra: escutava o tempo todo seus três discos lançados em vida, pesquisava sobre sua vida em fóruns na internet, procurava amigos músicos e jornalistas pra saber se alguém o conhecia. A resposta era sempre ‘não’. Me formei jornalista, comecei a trabalhar na área e descobrir que um ou outro músico era também obcecado pelo cara. Meu interesse por ele só ia aumentando. Visitei duas vezes sua cidade, Tanworth In Arden, um vilarejo perdido no meio da Inglaterra, a uma hora de Birmingham, li biografias, revistas, fanzines e, mais importante, continuei escutando suas músicas e tendo a mesma sensação mágica das primeiras vezes. Há uns dois anos, me dei conta que em 2018 ele faria 70 anos. Achei que a data redonda pudesse ser um gancho pra tirar um antigo sonho da cabeça: fazer um show de músicos brasileiros em homenagem a Nick Drake.

Fale sobre sua aproximação com Regis Damasceno para dirigir a parte musical do show.
Eduardo Lemos: O diretor musical é Regis Damasceno. Mas eu não o conhecia até então. E há uma história curiosa em torno disso. Um dos amigos músicos que compartilham comigo o fascínio pelo Nick Drake é Meno del Picchia, um dos mais talentosos músicos da cena contemporânea. Em janeiro deste ano, convidei-o para pensar comigo o espetáculo. Ele adorou a ideia, tentamos começar o projeto diversas vezes, mas a coisa sempre travava em algum lugar, ou na agenda dele, ou na minha. Decidimos que era melhor que eu buscasse outro nome. Por coincidência, dias depois fui para a Inglaterra e novamente visitei Tanworth in Arden. O seu túmulo fica no jardim de uma igreja milenar, solitário embaixo de uma grande árvore de carvalho. Me aproximei, falei algumas coisas, rezei e chorei. Quando eu já havia dado alguns passos para ir embora, resolvi voltar e fazer um pedido: se ele, Nick, achasse legal a ideia de um projeto em sua homenagem, que me enviasse um sinal. horas depois, já de volta a Londres, recebo uma mensagem do Meno dizendo: “tenho a pessoa perfeita pro show do Nick: Regis Damasceno”. Dali em diante, Regis tocou a parte musical e eu fui cuidar do resto: conceito, produção, comunicação etc.

Como aconteceu a escolha dos intérpretes?
Regis Damasceno: A escolha dos intérpretes não foi uma tarefa muito fácil. A gente pesquisou bastante pra encontrar, dentro do universo de intérpretes que a gente conhece, artistas que fossem fãs do trabalho do Nick Drake. Algumas escolhas foram simples, outras foram surpresas pra nós. Por exemplo, eu não imaginava que a Ceumar fosse fã do Nick Drake, foi uma boa surpresa pra nós. O Gui Amabis eu já conhecia, toco com ele e, inclusive, a gente tocava uma música do Nick Drake nos shows dele (“Day is Done”). A Stela é uma fã de longa data do Drake. E o Filipe Catto, um cantor pop, atual, que tem afinidade com a obra dele. E foi legal descobrir outros nomes de fora de São Paulo que também curtem o Nick Drake, e que podem estar com a gente se conseguirmos levar o show para o Rio de Janeiro ou Belo Horizonte, por exemplo.

E o repertório, ele privilegia alguma fase, alguma estética ou é uma introdução ao trabalho de Drake?
Regis Damasceno: O repertório privilegia músicas dos três álbuns e duas que não estão em disco – foram singles lançados posteriormente à sua morte ou sobras de estúdio. A gente fez um recorte estético, algo que pudesse representar a obra dele. Há músicas que serão abordadas só no arranjo de violão, como é característico dele, e outras que serão recheadas com cordas, como cello, rabeca, contrabaixo. E muitas, que no original são calcadas apenas no violão, foram arranjadas para a linguagem de banda.

O que você descobriu sobre Nick Drake que não sabia durante esta pesquisa?
Eduardo Lemos: Muita coisa. Drake era um ótimo atleta quando adolescente. Mais velho, numa viagem ao Marrocos, encontrou com – e tocou algumas canções para – ninguém menos que Mick Jagger e Keith Richards. E escutava Astrud Gilberto na faculdade. Há dezenas de histórias saborosas, mas acho que a maior descoberta está a ser feita. Desde o começo deste projeto, eu tentei que ele não fosse apenas um show ou um evento de oportunidade, algo que acende e depois apaga. Me determinei a criá-lo como um projeto contínuo, de longa duração, para que tivéssemos tempo de explorar os muitos assuntos que Drake propõe. Essa é, portanto, a maior descoberta de todas: quanto mais se lê, se escuta e se conversa sobre ele, mais ele se revela. Nick Drake não foi devidamente escrutinado pela mídia quando estava vivo – não há nenhum registro seu em movimento, seja entrevistas ou performances ao vivo, há pouquíssimas aspas para jornalistas e ele não deixou nenhum diário. A descoberta de seu universo se dá, portanto, pelo som e pela palavra. É um movimento lento e o projeto pretende seguir esse ritmo. Um exemplo prático vem de sua reconhecida habilidade em criar e usar afinações alternativas de violão. Então, criamos uma aula-espetáculo de afinações de violão típicas de Nick Drake, que Regis vai ministrar no dia 15/11, às 13h, no Sesc 24 de Maio, com entrada gratuita.

Nick Drake foi influenciado por João Gilberto

nickdrake

O músico e jornalista Thomas Pappon assistiu a um bate-papo com o produtor Joe Boyd em Londres e não esperava ser surpreendido por uma bomba intercontinental: Nick Drake teria se inspirado em João Gilberto para buscar sua própria sonoridade, uma das assinaturas musicais mais fortes da música britânica, mesmo que registrada em parcos três discos e gravações esparsas. Ele contou brevemente a história em seu perfil no Facebook e pedi para que ele compartilhasse sua descoberta aqui no Trabalho Sujo. Valeu Thomas!

Peter Paphides e Joe Boyd (foto: Thomas Pappon)

Peter Paphides e Joe Boyd (foto: Thomas Pappon)

Trilhas da Hammer e cocktail jazz: a conexão Nick Drake – João Gilberto

O que era para ser um programinha bacana num fim de tarde chuvoso de domingo trouxe uma bomba, pelo menos para os jornalistas de música: Nick Drake, o trágico bardo depressivo que morreu no ostracismo para ser redescoberto nos anos 80 e influenciar deus e o mundo – de Robert Smith a Renato Russo – passava horas no quarto ouvindo João Gilberto.

Pelo menos é o que sugeriu Joe Boyd, o produtor americano que descobriu Drake na Grã-Bretanha e produziu seus dois primeiros álbuns, num evento no bar/restaurante audiófilo Spiritland, em Londres.

Boyd participou de uma conversa sobre Nick Drake, respondendo a perguntas feitas pelo jornalista Peter Paphides e, ao final, de membros do público.

Ele contou como conheceu Drake: através de um bilhete de Ashley Hutchings, baixista do Fairport Convention, deixado sobre sua mesa com um número de telefone e um nome. Hutchings tinha visto Drake tocar num concerto contra a guerra do Vietnã na noite anterior (uma das raras apresentações ao vivo del, pelo visto) e ficara impressionado.

Boyd ligou, chamou Drake ao escritório, ouviu suas músicas e assim começa a trajetória de três álbuns lançados pela gravadora Island, Five Leaves Left (69), Bryter Layter (71) e Pink Moon (72). Drake morreu em 1974, aos 26 anos, de overdose de antidepressivos (30 comprimidos, o que levou muita gente, inclusive a irmã dele, Gabrielle, a acreditar que foi suicídio).

“Com os anos, fiquei surpreso em ver que muitas pessoas próximas pintavam um quadro de Nick bem diferente do que eu conheci”, disse Boyd. “Diziam que ele era popular na faculdade (Cambridge), que participava de corridas (atletismo)…o Nick que conheci era bashful (Boyd usou essa palavra ao menos duas vezes para descrevê-lo, significa ‘relutante em chamar atenção sobre si, tímido, reservado’).

Boyd deu detalhes sobre as gravações. Falou do fiasco dos arranjos de cordas de Robert Hewson, que tinha trabalhado com James Taylor, e do alívio que Drake sentiu quando soube que Boyd também não tinha gostado. Sobre a tímida indicação de Drake – “tem um amigo meu de Cambridge que conhece minhas músicas” -, Robert Kirby, que acabou cuidando dos arranjos de cordas, parte tão orgânica das canções.

E contou que Kirby se recusara a fazer o arranjo para River Man, talvez música mais conhecida – e reverenciada – do repertório de Drake.

“Kirby era ligado a música barroca. Ela não se sentia à vontade para fazer um arranjo de uma música em (andamento) 5 por 4. Haendel não tinha 5 por 4”, disse Boyd.

“Quem acabou sendo chave nessa história foi o engenheiro de som, John Wood. Wood perguntou a Drake: ‘Que tipo de arranjo de cordas você quer?’ ‘Algo tipo Delius (compositor britânico)’. Wood era o dono do estúdio e estava acostumado a gravar trilhas sonoras de filmes. Ele conhecia um cara que fazia arranjos imitando qualquer compositor. Se você precisa de uma trilha tipo Mahler, ele fazia. Tipo Wagner, ele fazia.”

Esse cara era Harry Robinson, “que compunha trilhas para os filmes de terror da Hammer”.

“Eu e Nick fomos de carro conhecê-lo. Nick levou um violão e um gravador cassete. Ele tocou o cassete com o violão de ‘River Man’ e tocou, junto, a ideia que tinha de arranjo. Portanto Harry Robinson fez o arranjo a partir da ideia de Drake e do pedido de fazer algo ‘tipo Delius’.”

Boyd contou que tudo foi gravado em um só take ao vivo: Nick Drake, voz e violão, e o grupo de cordas executando as partituras de Harry Robinson, ao vivo. “O John Wood diz que a voz de Drake foi gravada depois, ms não é essa a lembrança que tenho”.

Depois, veio a bomba: “A forma como a voz e o violão parecem ter duas vidas próprias segue o estilo do cantor e violonista brasileiro João Gilberto”.

“Isso só me ocorreu mais tarde. Mas um amigo de Drake, da Universidade de Cambridge, me disse que ele ouvia João Gilberto, que tinha discos dele”.

O comentário passou batido, menos para mim e meu amigo, o também jornalista Rogério Simões, fã de longa data de Nick Drake. Não tínhamos ideia…

Na sessão de perguntas do público, o Rogério perguntou por que os discos de Nick Drake não venderam (nem 5 mil cópias cada) na época.

Boyd deu, como pista, uma resenha que tinha saído na época na Melody Maker, do álbum Bryter Layter, que dizia que a música “parece uma mistura esquisita de folk e cocktail jazz”.

E depois, o serviço da casa foi interrompido, para que os pouco mais de 100 presentes pudessem ouvir, à meia-luz em em silêncio total, à mistura esquisita – e mágica – de folk e cocktail jazz do Bryter Layter.”

Vida Fodona #416: Especial Sebadoh

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Músicas curtas, sentimento pleno.

Sebadoh – “Elixir is Zog”
Sebadoh – “Everybody’s Been Burned”
Sebadoh – “Willing to Wait”
Sebadoh – “Tree”
Sebadoh – “On Fire”
Sebadoh – “Happily Divided”
Sebadoh – “Spoiled”
Sebadoh – “Vampire”
Sebadoh – “Bouquet for a Siren”
Sebadoh – “Ocean”
Sebadoh – “Defend Yr Self”
Sebadoh – “Notsur Dnuora Selcric”
Sebadoh – “Brand New Love”
Sebadoh – “Two Years Two Days”
Sebadoh – “Beauty of the Ride”
Sebadoh – “Mean Distance”
Sebadoh – “Sixteen”
Sebadoh – “Mind Reader”
Sebadoh – “Pink Moon”
Sebadoh – “Cliche”
Sebadoh – “Skull”
Sebadoh – “Homemade”
Sebadoh – “Soul and Fire”
Sebadoh – “Dreams”
Sebadoh – “Sacred Attention”
Sebadoh – “Magnet’s Coil”
Sebadoh – “Renaissance Man”
Sebadoh – “Rebound”
Sebadoh – “Forced Love”
Sebadoh – “Not Too Amused”
Sebadoh – “It’s so Hard to Fall in Love”
Sebadoh – “Think (Let Tommorow Bee)”

And so what?

Nick Drake inédito

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A cantora inglesa Beverley Martyn finalmente registrou a canção que escreveu com Nick Drake. Ela só conseguiu terminar de escrever “Reckless Jane” dois anos após a morte dele, em 1974, e a música só chega ao disco este mês, quando acontece o lançamento de seu novo álbum The Phoenix & the Turtle.

Escrevi sobre ele há muito tempo, um texto de que gosto muito.

Vida Fodona #406: Carnaval 2014

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Desconecto até terça que vem, quando volto com aquela festa

Metronomy – “The Upsetter”
Broken Bells – “After the Disco”
Blood Orange – “You’re Not Good Enough”
Don L – “Chips (Controla ou Te Controlam)”
Tommy Guerrero – “The Gunslinger”
Handsome Family – “Far From Any Road”
Nick Drake – “Pink Moon”
Delgados – “Clarinet”
Supercordas – “Happiness is a Warm Gun”
Mutantes – “Lady Lady”
Pavement – “Grounded”
Siba + Fernando Catatau – “Deus é uma Viagem”
Juliana R. – “Fuga”
Benji Hughes – “Country Love”
Rolling Stones – “Memo from Turner”
Erasmo Carlos – “Preciso Encontrar um Amigo”
Beatles – “And I Love Her (Allure Remix)”

E por aí?

” I saw it written and I saw it say…”

E essa versão vinil de luxo do clássico do Nick Drake?

De chorar.

Vida Fodona #287: O antídoto do frio

Deixa comigo. E nessa quinta tem festa, hein…

Soulive – “Come Together”
Paul McCartney – “Smile Away”
Mallu Magalhães – “Shine Yellow”
Céu – “Bubuia”
Chalawa – “Waiting in Vain”
Rockers Control – “46 do Segundo Tempo”
Ave Sangria – “Geórgia, A Carniceira”
Rafael Castro & os Monumentais – “Ultrapassa, Pai!”
Eddie – “Pode Me Chamar”
Rolling Stones – “Flight 505”
Sebadoh – “Pink Moon”
Fleet Foxes – “Sim Sala Bim”
Karina Buhr – “Ciranda”
João Donato – “Sambongo”
Rubinho Jacobina e a Força Bruta – “Toc Toc”
Stevie Wonder – “Superstition (Camara Remix)”
Boney M – “Rasputin”
Babe Ruth – “The Mexican”
Marcelo Jeneci + Laura Lavieri – “It’s Very Nice Pra Xuxu”

Vem!

Vida Fodona #264: Mais um programa da temporada praiana

Tchubirudãum-dãum…

Neil Young – “Homegrown”
Isaac Hayes – “Walk On By”
Lô Borges – “O Caçador”
Work Drugs – “Third Wave”
Stepkids – “Legend in My Own Mind”
Oh Land – “Sun of a Gun”
Nick Drake – “Radio”
Mombojó – “Entre a União e a Saudade”
Little Joy – “How to Hang a Warhol”
Paul McCartney – “Hot as Sun”
Margo Guryan – “Sun”
Tennis – “Take Me Somewhere”
Darondo – “Didn’t I”
Karina Buhr – “Vira Pó”
JJ – “Into the Light”
Marcelo Jeneci – “Felicidade”
Smashing Pumpkins – “1979”

Junto.

Vida Fodona #214: Tudo muito ótimo

Retomando o ritmo, sempre numa boa, quadris e neurônios requebrando pra espantar o frio e eu como guia.

Lulina – “Bichinho do Sono”
Free Energy – “Something in Common”
Spoon – “Written in Reverse”
Wale + Mark Ronson – “902010”
Charlotte Gainsbourg – “Time of the Assassins (XXX Change Remix)”
Kissed Her Little Sister – “I’m Too High”
Washed Out + Caroline Polachek – “You and I”
Oasis – “Wonderwall (Questions Version)”
Two Door Cinema Club – “What You Know (LightsoverLA Remix)”
Broken Bells – “Sailing to Nowhere”
Apples in Stereo – “Dance Floor”
Mopho – “Não Mande Flores”
Tulipa Ruiz – “Brocal Dourado”
Supercordas – “Happiness is a Warm Gun”
Xx – “Hot Like Fire”
JJ – “My Life”
Books + José Gonzalez – “Cello Song”
Breakbot + Irfane – “Baby I’m Yours”

Vem, vem.

Nick Drake – A Skin Too Few

O ótimo documentário que Jeroen Berkvens fez no início da década sobre Nick Drake pode ser assistido na íntegra no YouTube. Obrigatório para fãs e bem didático para quem quer conhecer um pouco mais sobre esse mito moderno britânico. Escrevi há um tempinho sobre a importância do cara aqui.