As 50 melhores músicas de 2008: 19) Ting Tings – “Great DJ (Calvin Harris Remix)”

Vamos aos fatos: o que salva o Ting Tings é o refrão de “Great DJ”. Sem ele, os hits da banda (“DJ”, “Shut Up and Let Me Go” e “That’s Not My Name”) seriam só a repetição de uma fórmula que o Ting Tings descobriu, que transforma o White Stripes em pomponetes de torcida de futebol americano. Graças a uma vocalista loira e magra que funciona no vídeo, a fórmula vem sendo repetida com tanta insistência que, não fosse o tal refrão, a dupla inglesa conseguiria ser mais chata do que a Peaches. Mas há o refrão de “Great DJ”: “Imagine all the boys/ And the girls/ And the strings/ And the drums, the drums, the drums” com todos seus “a-a-a-a” e “i-i-i-i” que tornam a música memorável. Aí vem o Calvin Harris e sacrifica uma das melhores partes da música (o trecho guitar), distorcendo-o e entortando-o de um jeito que a música ganha um par de quadris até então não utilizados. O remix chacoalha a dupla inglesa formada por Katie White e Jules De Martino de tal forma que se eles insistirem no formato riff-e-bateria por mais um disco, não vão muito longe. Calvin deu a dica – rebolem.

19) Ting Tings – “Great DJ (Calvin Harris Remix)

Os 50 melhores discos de 2008: 19) Momo – Buscador

Marcelo Frota é o contraponto perfeito para os Supercordas. Juntos, ambos fecham todo o espectro de emoções necessário para chamarmos de nova psicodelia carioca. À frente de seu projeto solitário Momo, ele tem as mesmas características do quinteto liderado por Bonifrate e Valentino: carioca, vintage, lisérgico, denso, retrô, chapado, ensolarado e muito sério. Mas enquanto os Supercordas se divertem com os Mutantes e Syd Barrett num chá da tarde no Sítio do Picapau Amarelo, o Momo nos carrega para as profundezas da alma, abismos sentimentais existencialistas em que a solidão é a única opção. E por mais que beba no folk deprê de bardos filhotes de Nick Drake, como Elliott Smith, Bill Calaham e Will Oldham (papas da mesma cena folk que deita-se sobre São Paulo), é no Brasil dos anos 70 que se encontra sua matriz musical. Apesar da primeira referência musical ser o soberbo disco de estréia do Clube da Esquina e os primeiros trabalhos de Lô Borges e Flávio Venturini, o som do Momo bebe tanto do Pessoal do Ceará (Ednardo, Fagner, Belchior) quanto dos momentos mais hippies dos Novos Baianos e de Raul Seixas e dos discos ingleses de Gil e Caetano. E em oposto à festa sorridente dos Supercordas, Marcelo é sempre triste, taciturno, melancólico, mas seu segundo disco consegue erguer a cabeça e, mesmo com um onipresente clima de fim de festa, parece que estamos vendo o fim dos Beatles. É um big bang em câmera lenta, um espelho se espatifando em pedaços musicais tão diferentes quanto Pink Floyd ou Geraldo Azevedo, Love ou Marcos Valle, James Taylor ou Chico Buarque. Buscador em vez de cair na espiral depressiva da Estética do Rabisco (seu primeiro disco) propõe-se deixar a melancolia para trás, nem que, para isso, tenha de fazer canções tristes mas otimistas – o que pode melhor resumir o disco do que uma música chamada “Tristeza” cujo refrão abre a canção sobre o canto de passarinhos, afirmando, firme “e o Sol nascerá”? O Momo já é um dos novos trabalhos mais promissores da música brasileira atual – com disposição para tornar-se um dos nomes mais importantes da próxima década.

19) Momo – Buscador

Momo – “Preciso Ser Pedra

Os 50 melhores discos de 2008: 18) Metronomy – Nights Out

O começo e o final do segundo disco grupo inglês Metronomy (a dobradinha “Nights Intro/Nights Outro”) pode induzir o ouvinte à entrada num universo de melancolia indie que aproxima a psicodelia rústica do Neutral Milk Hotel ao leste europeu espiritual do Beirut de Zach Condon. Mas logo que “The End of You Too” engata – pouco antes de enganchar nos últimos vinte segundos de seu primeiro minuto – percebemos que estamos em uma pista de dança. Mas acompanhe o balanço quadrado, os timbres bregas de teclado, as guitarras-base meio frouxas e o caminhar torto do ritmo em si – o receituário de indie rock está nos detalhes que tornam o Metronomy uma banda pelo menos inusitada. O susto inicial é só a isca, pois o trio inventado por Joseph Mount (que oficializou a dupla Oscar Cash e Gabriel Stebbing como parte da banda – antes, os dois assinavam como The Food Group e funcionavam como banda de apoio quando Mount tocava ao vivo) pisa firme seus próprios preceitos rítmicos e estéticos, com um aparente orgulho nerd que se torna puro e inocente a cada audição. Compostas sempre sobre um ritmo matriz em que detalhes de produção e samples aleatórios vão sendo sincronizadas, as faixas de Nights Out podem ser entendidas como um enorme videogame sonoro de lógica, uma mistura de Sudoku com Guitar Hero que só pode ser jogado com os ouvidos – quanto mais você se envolver com a música, mais pontos você ganha. Para isso, o grupo propõe uma série de fases, que vão desde o pop fácil (“Heartbreaker”, que sampleia uma porta abrindo) à dance torta (“A Thing for Me”), de uma mistura de krautrock com new wave (“On the Motorway”) a um ritmo caribenho robotizado (“Radio Ladio”) de uma balada composta ao redor de gemido eletrônico (“On Dancefloors”) a uma versão japonesa para o pós-punk (“Back on the Motorway”). E distorcendo vocais em falsete e timbres mecânicos e sintéticos, vão superpondo riffs, refrões, linhas de baixo, viradas de bateria e frases de efeito como se cada faixa fosse um minijogo, o Metronomy faz indie dance para tempos minimalistas, engrossando uma cena que surge debaixo dos confetes da new rave e logo vem assumindo um papel importante na música atual, que são as bandas de rock que tocam música para dançar. Essa nova cena inclui a safra de 2006 – de nomes como Rapture, Klaxons, Digitalism, Crystal Castles, Hot Chip, New Young Pony Club, Friendly Fires, Cansei de Ser Sexy – e a proximidade das cenas australiana e parisiense, além de poder agregar nomes da cena de novo rock do início da década, que começou com os Strokes e terminou com o Franz Ferdinand. Com Nights Out, o Metronomy coloca-se entre este panteão de bandas de médio porte que podem, em pouco tempo, mudar a cara da música ouvida no mundo inteiro. E daí que “My Heart Rate Rapid” lembra Gang 90?

18) Metronomy – Nights Out

Metronomy – “A Thing for Me

As 50 melhores músicas de 2008: 18) Britney Spears – “Womanizer”

A introdução composta por um zunido repetitivo abre a música como se o Daft Punk da fase “Robot Rock” estivesse experimentando uma áudio-hipnose gerada por uma furadeira. E quando Britney começa a cantar – monocórdica, monótona, robótica, mecânica – a faixa ganha ainda mais contornos artificiais, mesmo que sua sensualidade de plástico atice algum vestígio de humanidade. Quando ela entra no refrão – “Womanizer” quer dizer “Mulherengo”, imagina um refrão que repete essa palavra nove vezes seguidas -, Britney já extrapolou as fronteiras entre jingle e o single, o hit e o repeat. Termos como “comercial” e “pop” ganham novas dimensões à medida em que a diva fake dispensa outro jovem popstar que vem bater em sua porta com uma música incrivelmente grudenta, bubblegum para a era eletrônica. “Womanizer” não chega nem aos calcanhares das melhores faixas de Britney (“Toxic”, “Baby One More Time”, “Slave 4 U”, “Gimme More”), mas é boa o suficiente para figurar entre as melhores do ano. E sedimentar a carreira cada vez mais sólida de Britney Spears.

18) Britney Spears – “Womanizer

Os 50 melhores discos de 2008: 21) TV on the Radio – Dear Science,

“A era dos milagres/ A era do som/ Há uma era de ouro/ Vindo aí”. Quem diria que, ao descobrir a pista de dança, o TV on the Radio se tornaria uma banda relevante? Ao contrário de outros que abraçam a dance music e batidas eletrônicas como último recurso para fazer sucesso, os nova-iorquinos usaram o ritmo como opção estética, que era exatamente o que faltava para que seu belo trabalho de guitarras pudesse ir além do mimimi indie, que deixava a banda sempre com uma sensação de incompletitude. Pisando na mesma disco music que se espatifou para dar origem tanto ao hip hop quanto à carreira de titãs dos anos 80 como Prince, Madonna e Michael Jackson, o grupo, felizmente, não abandonou a melancolia e a solidão – apenas as adicionou à inconseqüência hedonista dos dias de hoje, limpando-a dos excessos felizes e jogando uma luz sóbria e sombria sobre um universo que parece formado apenas de deleite e transição. E mesmo com metais animados e baixos funky, ainda encontram momento para cordas lânguidas criar uma atmosfera de introspecção. E, mesmo assim, soa otimista e feliz com o futuro próximo – mesmo que isso signifique remar contra a maré.

21) TV on the Radio – Dear Science,

TV on the Radio – “Golden Age

As 50 melhores músicas de 2008: 20) MGMT – “Electric Feel”

Por mais desleixado e relaxado que os dois MGMT pareçam, eles são um projeto – algo entre um minucioso relatório nerd sobre a era psicodélica e suas relações com as ciências ocultas e um estudo fashion sobre o resgate das cores e do despojo durante os anos 60. Usam toda a mitologia sessentista como os góticos se referem aos poetas românticos, os metaleiros do mal se debruçam sobre o satanismo e algumas bandas de música eletrônica deixam-se levar por clássicos da ficção científica. Assim, vêem a década que deu ao mundo o flower power, os mods, o arcadismo hippie, a transgressão política, a esquerda rebelde e o rock como estilo de vida como uma coisa só – e traduzem hinos pop que poderiam ser gravados pelo Cure, pelo Kiss ou pelo Abba sob arranjos descaradamente retrô. “Electric Feel” é sua ode à selva, ao paganismo naturista, de sacrifícios a deuses-animais e confins do planeta. Mas, no fundo, no fundo, é só uma canção de amor. E das boas.


20) MGMT – “Electric Feel

As 50 melhores músicas de 2008: 22) Black Kids – “I’m Not Gonna Teach Your Boyfriend How to Dance with You (Twelves Remix)”

Não é senso de composição que falta aos Black Kids. O grupo americano tem noção do que faz uma música tornar-se memorável e realmente trabalha nesse sentido – seu disco de estréia, Partie Traumatic, é um esforço louvável de se fazer música pop pura e simples no século 21 e seu vocalista Reggie Youngblood tenha a voz com mais personalidade entre as bandas que não têm mais de dois discos de carreira. Mas a banda ainda não chegou lá – “I’ve Underestimated My Charm (Again)” e “Hurricane Jane” tem refrões irresistíveis, mas instrumentação frouxa, preguiçosa, desleixada – o que pra muitos é estilo. Mas a dupla carioca Twelves mata a charada ao costurar as pontas que sobram, subir um pouquinho o tempo e o pitch da faixa original e finalmente envernizá-la com um brilho oitentista, que, se sozinho reflete e brilha, sobre os Black Kids dá a textura ideal para que a banda aspire para além da própria vizinhança. Questão de postura – tem gente que prefere andar encurvado, tem gente que prefere esticar os ombros e estufar o peito. Os Twelves fazem os Black Kids andarem nos trilhos.


22) Black Kids – “I’m Not Gonna Teach Your Boyfriend How to Dance with You (Twelves Remix)

Os 50 melhores discos de 2008: 23) Little Joy

Com a possibilidade de estourar da noite pro dia se tornando cada vez mais regra do que exceção no jogo da música pop atual, vão-se aos poucos indo embora os tempos em que artistas podiam calibrar técnica, carisma e suas próprias músicas longe das multidões e das pressões do sucesso. Só por isso já seria suficiente para comemorar a existência do Little Joy, formado quando Rodrigo Amarante e Fabrízio Moretti deixam suas bandas principais de lado para tocarem em botecos de beira de estrada nos EUA e em eventos indies de médio porte no Brasil. Longe dos holofotes, podem tocar e compor sem stress nem cobranças, curtindo seu sonho de fazer parte de uma espécie de Velvet Underground californiano, uma parceria entre Lulu Santos clássico e Jack Johnson, tão metido à cabeça quanto bicho-grilo e assim compõem um conjunto de canções que ganha justamente pelo desprendimento e descontração, como uma banda new wave de férias na Jamaica. Porém, por mais que eles tentem fugir de seus ambientes originais, Little Joy soa essencialmente como se a latidindade de PUC do Rio do Los Hermanos (um elemento mais Amarante do que Camelo) contagiasse os hits mais Funhouse/Casa da Matriz dos Strokes. Um disco sem vergonha de assumir que rock e pop podem ser a mesma coisa sem que isso não necessariamente aponte para a adolescência ou para a caixa registradora. Nos shows no Brasil, não tocaram “Eat at Home”, do segundo disco solo de Paul McCartney, Ram, parente das mesmas condições de temperatura, umidade e pressão do Little Joy. Mas o recado parece dado – e aos poucos vamos separamos quem é o Paul e quem é o John nessa brincadeira…

23) Little Joy

Little Joy – “Keep Me in My Mind

As 50 melhores músicas de 2008: 23) Snoop Dogg – "Sensual Seduction"

O que acontece quando um dos gangstas da velha guarda resolve dar seu pitaco nessa conversa de revival dos anos 80? Pois Daft Punk e Chromeo bebem da mesma fonte de vocoders, sintetizadores e suíngue quadrado que o próprio gangsta reinventa há vinte anos – e que foi justamente o ponto de atrito entre aquele novo rap e a soul music dos anos 90, dando origem a esse cenário R&B de Beyoncés, John Legends e Chris Browns. Por isso quando Snoop Dogg surge no horizonte, antes de perguntar-se se aquilo tudo é fumaça branca ou gelo seco, preste atenção. Preguiçoso e cantando (rá!), o velho Snoop espreguiça-se em uma rede de cordas sintetizadas, deixando seu vocal modular-se pelo Autotune tendo como espelho mais a dupla Roger & Zapp do que Cher (chupa, Kanye West!). Fora o clipe, retrô no talo, que também é – fácil, fácil – um dos melhores do ano passado.


23) Snoop Dogg – “Sensual Seduction

Os 50 melhores discos de 2008: 24) Júpiter Maçã – Uma Tarde na Fruteira

Gravado no começo da década e lançado originalmente em 2006 pela gravadora espanhola Elefant, o quarto disco de Júpiter Maçã finalmente foi lançado em seu próprio país – e como os três anteriores, é uma viagem. Depois de derreter-se na psicodelia sessentista (A Sétima Efervescência), no lounge de brechó pra turista (Plastic Soda) e no futurismo cabeça (Hiss-Civilization), dessa vez a trip do velho Júpiter é rumo ao início dos anos 70, de Beatles solo, folk sentimental, cinema marginal paulistano e pós-tropicalismo. E por mais que a paisagem ecoe seus dois primeiros discos, Uma Tarde na Fruteira é uma coleção de canções maduras e sentimentais, em que o cinismo pop art e o ruído do rock’n’roll surgem em momentos específicos (o primeiro na “Marcinha Psicótica do Doutor Stu”, o segundo na garageira “Síndrome de Pânico”). O resto é domado pela consciência de Basso em construir um cenário sonoro adulto e moderno – o interlúdio instrumental de “Little Raver” ecoa Pet Sounds e Sgt. Pepper’s ao mesmo tempo, “O Retirante” alinha Sérgio Mendes e a bossa nova política do Teatro de Arena e do Opinião de Nara Leão, “Um Sorvete Pra Você” poderia estar no Panis et Circensis, “Violão de Aço” clona, em partes diferentes, Walter Franco e Bob Dylan e “A Menina Super Brasil” requenta Marcos Valle e Mutantes via Stereolab. Isso quer dizer que Júpiter Maçã cresceu? Só ele pode dizer.

24) Júpiter Maçã – Uma Tarde na Fruteira

Júpiter Maçã– “A Marchinha Psicótica do Doutor Stu