Coração certeiro

Fui mais uma vez reencontrar o mestre Jards Macalé, desta vez no Sesc Bom Retiro, onde ele está mostra, durante o fim de semana, seu ótimo Coração Bifurcado, que produziu no ano passado ao lado de Rômulo Froes, Rodrigo Campos, Guilherme Held, Pedro Dantas e Thomas Harres, que no palco surge com uma superbanda formada apenas por mulheres: a gigantesca Maíra Freitas, a guitar heroine Navalha Carrera (que toca na banda da Letrux), Lelena Anhaia (eterna parceira de Anelis Assumpção), a espoleta Victoria dos Santos, Aline Gonçalves e Flavia Belchior. Mas Jards também quis seu momento solo e com seu instrumento passou por três do disco mais recente (“Mistérios do Nosso Amor”, cantada no disco por Bethania, “Grãos de Açúcar” e “Simples Assim”, acompanhada pela voz e pelo piano de Maíra) e pela maravilhosa instrumental “Um Abraço do João”, em que saúda o mestre João Gilberto com um causo incluído em todos seus shows depois da pandemia. Com a banda completa, que além de repassar quase todo o repertório do disco do ano passado, ainda desbravou seus clássicos “Mal Secreto” (emendada, como vem fazendo, com “Corcovado”), “Hotel das Estrelas”, “Soluços” e “Meu Amor, Meu Cansaço”, esta última mais recente mas que já chegou a esse status – foi quando ele apresentou as musicistas que o acompanhavam uma a uma. Foi demais.

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Eis os melhores de 2023 na categoria Música Popular segundo a APCA

Ludmilla, Jards Macalé, Ana Frango Elétrico, Titãs, Luiza Lian, projeto Relicário e Mateus Fazeno Rock são os vencedores nas categorias de Música Popular da edição de 2023 do prêmio dado pela Associação Paulista dos Críticos de Arte, da qual faço parte. Eis os vencedores de cada categoria:  

Os 50 melhores discos de 2023 segundo o júri de música popular da APCA

Estes são os 50 discos mais importantes lançados em 2023 segundo o júri da comissão de música popular da Associação Paulista dos Críticos de Arte, da qual faço parte ao lado de Adriana de Barros (editora do site da TV Cultura e apresentadora do Mistura Cultural), José Norberto Flesch (Canal do Flesch), Marcelo Costa (Scream & Yell) e Pedro Antunes (Tem um Gato na Minha Vitrola, Popload e Primavera Sound). A amplitude de gêneros, estilos musicais, faixas etárias e localidades destas coleções de canções é uma bela amostra de como a música brasileira conseguiu se reerguer após o período pandêmico com o lançamento de álbuns emblemáticos tanto na carreiras de seus autores quanto no impacto junto ao público. Além dos discos contemporâneos, fizemos menções honrosas para dois álbuns maravilhosos que pertencem a outras décadas, mas que só conseguiram ver a luz do dia neste ano passado, um de João Gilberto e outro dos Tincoãs. Na semana que vem divulgaremos os indicados nas categorias Artista do Ano, Show e Artista Revelação, para, no final de janeiro, finalmente escolhermos os vencedores de cada categoria. Veja os 50 (e dois) discos escolhidos abaixo:  

Jards com ascendente em Tutty

Em 2023 tive o privilégio de assistir ao encontro ao mestre Jards Macalé ao vivo por cinco vezes: uma delas com o saudoso Donato, outra com o Metá Metá, mais uma sozinho com seu violão e duas vezes com seu velho camarada Tutty Moreno e a presença do mestre baterista eleva a performance de Macau a outro patamar. Não foi diferente nesta quarta-feira, quando os dois voltaram a se apresentar juntos, mais uma vez escudados por Guilherme Held e Pedro Dantas, na Casa de Francisca. Passeando pelos clássicos de Jards e as composições de seus discos mais recentes, os quatro hipnotizaram o público que lotou o Palacete Tereza, tantra musical conduzido pelo groove da mão direita de Jards e pelo corpo de Tutty, um dos maiores bateristas deste país até hoje, sempre solando contido, mesmo quando o band leader não sublinha estes momentos. Uma noite mágica.

Assista aqui:  

Vida Fodona #801: Lanny Gordin (1951-2023)

Minha homenagem a esse deus de seu instrumento. Viva Lanny!

Ouça abaixo:  

Conjunção de forças

Não estava programado, mas encerrar a segunda aula do curso História Crítica da Música Brasileira, que estou fazendo no Sesc Pinheiros, com um show gratuito do Metá Metá convidando Jards Macalé dentro do festival Mario de Andrade (organizado pela Biblioteca Municipal que carrega o nome do escritor e pensador paulista) no Paço das Artes, no Centro de São Paulo, deu um tempero especial para o sábado frio de São Paulo. E a experiência não é só pessoal, uma vez que tanto Bernardo Oliveira (que deu a aula deste sábado) e Rodrigo Caçapa (que dará a aula no próximo e estava como ouvinte na aula passada) também concluíram essa jornada comigo, como alguns alunos que pude reencontrar entre o público. O show pecou pelo som baixo – nada justifica terem colocado as caixas de PA rente ao chão e não apontadas para o público -, mas a química entre o trio paulistano e o mestre carioca é irresistível. O Metá Metá começou a apresentação sozinho, enfileirando seus hits irresistíveis, todos recebidos pelo público como bênçãos coletivas: “Oyá”, “São Jorge”, “Orunmilá”, “Atotô”, “Cobra Rasteira” e “Vias de Fato”, esta última cantada baixinho pelo público e ganhando sua condição de reza. Depois o trio chamou o velho Macau para o palco, que logo depois assumiu o show sozinho puxando hinos como “Soluços” e “Vapor Barato”, esta tocada ao lado do sax de Thiago França. Kiko Dinucci e Juçara Marçal voltaram ao palco para acompanhar o compadre em outros clássicos, como “Pano pra Manga”, a nova “Coração Bifurcado”, a imortal “Negra Melodia”, composta com Waly Salomão (te dedico, Juliana Vettore), e “Let’s Play That”, que o Metá já toca em seu repertório habitual. Os quatro não resistiram ao clamor do público e voltaram para o bis cantando “Juízo Final”, de Nelson Cavaquinho, que transformou o local numa missa sobre a vitória da luz sobre as trevas. Ave música!

Assista aqui:  

Caetano Veloso tocando o Transa ao vivo com o Jards Macalé em São Paulo

Era inevitável e os ingressos estão quase no fim: depois da comoção (pro bem e pro mal) da apresentação em que Caetano Veloso tocou seu clássico disco de 1972, Transa, ao vivo, no Rio de Janeiro – acompanhado de ninguém menos que Jards Macalé, Tutty Moreno e Áureo de Souza -, o show inevitavelmente ressurgiria em São Paulo. E não é dentro de festival nem nada: o espetáculo acontece no dia 25 de novembro no antigo Espaço das Américas (agora Espaço Unimed) e a versão paulistana ainda conta com a presença de Angela Rô Rô, que também tocou no mitológico álbum gravado em Londres. Os ingressos estão acabando (garanta logo o seu neste link), mas algo me diz que vai ter uma nova data (e se tiver no domingo talvez eu consiga assistir). Fora que isso é show pro Caetano rodar o Brasil todo, com público sentado, em teatros, como deve ser.

Todo o show: Caetano Veloso toca Transa com Jards Macalé (13.8.2023)

Domingo passado o Brasil pode assistir, depois de acompanhar a série de trapalhadas do evento que proporcionou aquele encontro, ao momento em que Caetano Veloso dedicou ao seu Transa acompanhado de ninguém menos que Jards Macalé, Tutty Moreno e Áureo de Souza, que tocaram no clássico disco de 1972. E enquanto o festival não disponibiliza online sua versão do show, transmitida ao vivo pelo YouTube do evento, coube ao herói youtuber Vingador de Lampião, colocar a sua própria captação da íntegra do show online.

Assista abaixo.  

Caetano Veloso e Jards Macalé transando o Transa

E neste domingo ainda teve a primeira edição do festival Doce Maravilha no Rio de Janeiro que, apesar de vários perrengues (incluindo o atraso enorme da principal atração da noite), conseguiu materializar Caetano Veloso comemorando os 50 anos do Transa (com um ano de atraso) ao lado de seus velhos compadres de disco Jards Macalé, Tutty Moreno e Áureo de Souza. Caetano começou o show acompanhado da jovem banda com o qual apresenta seu disco mais recente, Meu Coco, puxando músicas anteriores ao disco clássico, como “Irene”, “Maria Bethania”, “London London”, entre outras. Depois seus contemporâneos subiram no palco para a celebração e o público abraçou o grupo cantando tudo junto. O festival transmitiu o show online e vamos torcer para que disponibilizem a íntegra da apresentação – e, mais que isso, que esse show possa correr o Brasil, para que o país redescubra esse disco tão fundamental.

Assista aqui:  

“Há um morcego na porta principal”

E que tal arrematar um mês de 400 dias que começou com Edu Lobo com mais um show do velho Macau? Nunca tinha ido ao Tranquilo SP, série de shows acústicos que são realizados toda segunda-feira em São Paulo pelo simples motivo de que às segundas estou curtindo a colheita das minhas provocações no Centro da Terra, mas a Julianna Sá acabou de assumir a curadoria da noite e me soprou não só que a nova edição da noite (que não tem local fixo) iria acontecer no mágico salão do União Fraterna (onde fiz, com o Thiago França, os três bailes de carnaval pós-pandemia em 2022), que é pertinho do Centro da Terra, como a apresentação final desta primeira segunda sob sua batuta aconteceria após às 22h (portanto, após o fim do show no teatro) e com ninguém menos que Jards Macalé. Mesmo tendo assistido à sua apresentação no sábado, Jards Macalé nunca é demais, e pude mais uma vez reverenciá-lo, desta vez apenas tocando seu violão. Ele repetiu os hits e as histórias que contou nos shows do fim de semana (era inevitável), mas guardou sua pouco tocada “Gotham City” para o público dócil do Tranquilo, que assistiu a todos os shows sentados no chão. E lembrou de quando tocou essa sua parceria com Capinam arranjada originalmente por Duprat no IV Festival da Canção, em 1969, e tomou uma barulhenta vaia do público no Maracanãzinho. “Me vaiaram de pé e com o dedo pra baixo”, lembrou, antes de dizer que estava “com saudade daquela vaia”, pedindo às centenas de presentes que repetissem aquela reprovação sonora, com um risinho no canto da boca satisfazendo sua própria vingança política – e estética.

Assista abaixo: