As 50 melhores músicas de 2008: 28) Little Joy – "Brand New Start"

Dá pra sentir o fardo que o Los Hermanos vinha sendo nos ombros de Rodrigo Amarante no jeito que ele canta na primeira música que o Little Joy revelou ao mundo – ao mesmo tempo em que se inclina para trás, sua voz parece sair com um sorriso escancarado, acompanhado de uma guitarra posicionada entre o Havaí e alguma praia do sul da Bahia. De férias com uma banda californiana, ele parece está devolvendo para o mundo ensinamentos que aprendeu com Lulu Santos no Brasil: da tranqüilidade atmosférica ao calor tropical, passando pela métrica conversada, um refrão pra ser cantado em grupo ou a dois e melodias que grudam no cérebro como se viessem de fábrica.

28) Little Joy – “Brand New Start

As 50 melhores músicas de 2008: 29) Lykke Li – “I’m Good I’m Gone”

Estamos em um puteiro, num escritório gigantesco, no quarto de uma adolescente enfurecida com os pais ou num delírio melancólico de uma menina de 10 anos? “I’m Good I’m Gone” é tudo isso e mais. É uma espécie de “Like a Virgin” indie, engolindo as referências do pop feminino escapista do século e as transformando em suor febril, como se houvesse doses pesadas de ironia consciente em cada hit de Britney Spears ou Christina Aguillera. É também uma descida tão íngreme quanto o furacão que leva Dorothy a Oz ou o buraco em que Alice cai para sair no País das Maravilhas – com palmas, ecos, backing vocals, um piano fantasmagórico e a certeza que sai diretamente da inocência: “E se você diz que eu não estou OK, então devemos ir/ Se você diz que não tem jeito que eu possa saber/ Se você diz que eu miro muito alto daqui de baixo/ Bem, diga que não, porque quando eu for/ Você vai me chamar, mas eu não atenderei o telefone”. Lykke Li vai longe.

29) Lykke Li – “I’m Good I’m Gone

As 50 melhores músicas de 2008: 30) Passion Pit – “Sleepyhead”

O sample enganchado do começo e uma introdução à Dave Fridmann não nos preparam para as palmas que marcam o ritmo muito menos para os vocais esganiçados de Michael Angelakos. E pelo meio de “Sleepyhead”, percebe-se que o Passion Pit se encaixa perfeitamente na nova categoria criada pelo MGMT no ano passado – em que a psicodelia da pista de dança é traduzida para o século 21 sem perder seus ares essencialmente hippies. Mas o elemento bicho-grilo no caso não é o ripongo dos anos 60, mas o indie-kid fã de Scritti Pollitti e Prefab Sprout que, em algum momento dos anos 90, descobriu que, com uma guitarra e um sample, podia ser tão psicodélico quanto os Beatles ou o Pink Floyd de Syd Barrett. Primeiro single de uma banda ainda sem disco, “Sleepyhead” sofre do mesmo distúrbio bipolar que acomete a década – e é tão pueril e melancólica quanto assobiável e divertida. Uma jóia.


30) Passion Pit – “Sleepyhead

As 50 melhores músicas de 2008: 31) Vampire Weekend – “Cape Cod Kwassa Kwassa”

Inevitável que o revival dos anos 80 saísse das bandas da trilha sonora da Sessão da Tarde e do Globo de Ouro para avançar para outros territórios – e 2008 viu o cenário pop revisitar seu apreço pelo continente negro, com todo aquela culpa pós-colonialista disfarçado de pena (seja em filmes, discos-tributo, gêneros musicais redescobertos ou na ascensão de Nollywood para o olho mundial). Revisitando os mesmos anos 80 habitados pelo “We Are the World”, pela world music do Sting, Paul Simon e Peter Gabriel e pelo Live Aid, essa (nova) pilhagem ocorreu mais no plano das idéias do que na vida real, embora juju music, highlife, kwaito e afrobeat ainda sejam o mesmo tipo de som (“música africana”) para a maioria das pessoas (como se a África fosse um só país… Alou Sarah Palin!), que também não se importam com o que acontece por lá. Um dos expoentes desta nova tendência, o grupo nova-iorquino Vampire Weekend seria só mais uma bandinha indie nova-iorquina tentando soar inglesa se não fosse essa queda pela música do Congo, daquela vaibe praieira que deu ao Caribe a essência de sua musicalidade e ritmo (a influência espanhola veio por cima, como cobertura e, em alguns casos, recheio). O hit “The Kids Don’t Stand a Chance” (pô, Bruno, achei o remix bonzão) funcionaria em qualquer época, mas tem tanto de apelo popular quanto não tem de criatividade ou originalidade. Se lançado nos anos 90, o disco homônimo de estréia do grupo cairia na vala comum da terceira onda do ska – mas provavelmente com um prefixo “alt.” na frente, pois eles não jogam pelo pop descarado, optando pelo indiesmo. Mas no meio da pasmaceira há uma pérola. “Cape Cod Kwassa Kwassa” é toda certinha: do suíngue à economia dos instrumentos, do baixo recolhido aos vibrafones, do riff curto e preciso aos acordes que desenham uma linha de baixo, da percussão que fica atravessada no refrão aos “uuuuuuuuuu” que o vocalista Ezra Koenig puxa lá pelo final. “Parece tão inatural/Peter Gabriel também”, canta a canção, auto-referente. Mas é o Peter Gabriel que parece tão não-natural ou o sentimento da música que soa tanto inatural quanto Peter Gabriel, transformando o ex-vocalista do Genesis num adjetivo. Aposto na segunda opcão, que torna a faixa ainda mais eficaz – e preciosa. Esqueça o resto do disco, você só precisa desses três minutos e meio.


31) Vampire Weekend – “Cape Cod Kwassa Kwassa

As 50 melhores músicas de 2008: 32) Mickey Gang – “I Was Born in the 90s”

Num ano em que uma das principais protagonista foi uma menina de 15/16 anos, quatro moleques um pouco mais velhos que isso (mas com menos de 20 anos) surgiam de Colatina, no interior do Espírito Santo, cantando a seguinte canção:

“I was born in the 90s and asked my mom
“Why did i came so late?”
Cause all my friends born in 80s
And i’m still lost in 90s
Oh my god, something isn’t OK

When i go to the club
Waiting DJ play J-Lo
The only thing i hear is another Devo song
I wish Spice Girls were younger
So they could save the world

I was born in the 90s

(91 or 92 or 93 or 94)
We were all born silly guys
Now all we think is about fuck

(I’d say I love Prince if you stay
Come and wash my “Purple Rain”)

I still love my walkman
Cause these ipods are only trends

Come to my house
Spend the afternoon watching friends
Then we could go my room
Do the “Macarena” dance
Can’t touch this?
Can’t touch this?
Don’t go on baby cause it’s not working
I’m horny but I’m not a slut
I was born in the 90s

Save my posters of Backstreet Boys
My Nintendo and Lion King box
Hold on mother I’m coming home tonight”

Toda “I Was Born in the 90s” é noventista: irônica, cospe referências como se precisasse delas para parar em pé, transformando pós-punk inglês em hit de rádio, enquanto finge apatia e casa riffs secos com bateria crua e camas de teclado que resvalam no gótico. E a música é uma demo. Forma e conteúdo não se distinguem e faz com que a Gangue do Mickey soe moderna e retrô ao mesmo tempo – algo como se o tema dos anos 00 fossem a volta dos anos 00.

32) Mickey Gang – “I Was Born in the 90s (Demo)

As 50 melhores músicas de 2008: 33) Santogold – “L.E.S. Artistes”

Não se deixe enganar pelo visual street e pela voz gemida: Santogold tem tanto a ver com a M.I.A. ou Missy Elliott, quanto com os Strokes ou os Yeah Yeah Yeahs. E onde melhor que “L.E.S. Artistes” para perceber a indie chorona que se esconde por trás de seus bonés, perucas e óculos escuros? Da guitarrinha cata-milho da introdução ao refrão pop anos 80 (new wave de arena anyone?) passando por uma letra que poderia ser assinada por Kurt Cobain, o hit de Santogold é mais uma prova de que o melhor rock de hoje é encontrado onde menos se espera.


33) Santogold – “L.E.S. Artistes

As 50 melhores músicas de 2008: 34) Fujiya & Miyagi – “Knickerbocker”

“Baunilha, morango…”, parece ser um jeito estranho de assumir uma guinada, mas é assim que o Fujiya & Miyagi caminham aos poucos rumo à uma popularidade maior – para frustração dos indies e felicidade da pista de dança. Mas sem delírio eletrônico – a pegada aqui ainda é o bom e velho krautrock em que o F&M construiu sua casa – a tensão rítmica e repetitiva sussurrando riffs, deslizes de baixo e uma letra que mistura a maçã bíblica com o fantasma de uma modelo infantil. E não é um movimento isolado, como talvez tenha sido seu primeiro espasmo rumo ao pop, a deliciosa “Collarbone” – afinal, além de “Knickerbocker” funcionar como introdução para um disco estável (Lightbulbs, também deste ano), o quarteto ainda desequilibrou o melhor momento do disco do Bomb the Bass desse ano, em “Butterfingers”. Preste atenção que, em um próximo disco, com mais um hit redondo desses, eles saem de seu gueto.

34) Fujiya & Miyagi – “Knickerbocker

As 50 melhores músicas de 2008: 35) Sam Sparro – "Black & Gold"

2008 reacendeu a disco music como um estilo de música sofisticado, suave, cool e emotivo, sem a felicidade histérica ou groove pesado de suas origens. A recente nu-disco toma para si o rótulo que um dia já abrangeu Jamiroquai e Brand New Heavies separando a musicalidade refinada com o tom robótico e europeu continental ao chamar para si a finesse da pista de dança, que um dia era exclusiva da house music. É aí que se encaixa o hit de Sam Sparro – “Black & Gold” é, ao mesmo tempo tempo, chique e escorregadia, posuda e quente, séria e sexy – como poucos tentaram durante o ano.


35) Sam Sparro – “Black & Gold

As 50 melhores músicas de 2008: 36) Kills – "Cheap and Cheerful"

A música-chave do novo disco dos Kills, Midnight Boom, já vale por toda sua carreira. “Cheap and Cheerful” é um chega pra lá no roquinho fuleiro que se passa por punk nos anos 00, que transforma a guitarra em elemento de percussão, enfatizando a divisão de forças entre o ritmo primitivo e o escárnio primitivista que a vocalista americana VV resmunga sobre a chatice que é ser normal. “Tudo bem ser mal”, resume o espírito de uma música que é tão perigosa quanto divertida – elementos básicos para isso que chamamos de rock’n’roll. Fora o fato de servir para remixes fodaços.


36) Kills – “Cheap and Cheerful