Impressão digital #152: O fim

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Eis minha última Impressão Digital. A partir da semana que vem, o Link passa a ser uma coluna no caderno de Economia do Estadão, às segundas-feiras, e deixa de ser um caderno semanal. Ano que vem o caderno completaria 10 anos, cinco deles sob a minha edição. Aproveitei a deixa e a usei como assunto da última coluna, para lembrar os bons tempos que vivi neste período, tanto do ponto de vista do caderno, de jornalismo, quanto do da redação, humano. Foi uma época incrível, só posso agradecer a todos. Abaixo a versão integral da coluna, que teve de ser enxuta para caber no tamanho estabelecido.

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Cinco anos mudando a cara do jornalismo de tecnologia no Brasil
“This is the end…”: Despeço-me desta coluna logo após ela completar três anos

É inevitável ouvir Jim Morrison sussurrar a frase que batiza o maior épico dos Doors à medida em que começo a digitar essa coluna. É última Impressão Digital que assino, justamente um mês após ela ter completado três anos. A coluna, que começou no Caderno 2 com o redesenho do jornal em 2010, era o último resquício de vínculo que ainda tinha com este centenário jornal no Limão. Com a transformação do Link em uma seção no caderno de economia, encerro a jornada que comecei aqui em 2007 – e despeço-me destas páginas.

(Minha relação com o Estado, contudo, é anterior à existência do Link. Durante os anos 90, colaborei tanto com o extinto caderno Zap!, que à época contava com a dupla Ricardo Alexandre e Emerson Gasperin, grandes amigos, em sua liderança, e na versão reduzida que o mesmo caderno tinha às sextas-feiras no Caderno 2, o Caderno Z. Foi no Caderno Z que publiquei minha primeira matéria num grande veículo de comunicação no Brasil, ao comemorar o cinquentenário do gênio psicodélico Syd Barrett, que ainda era vivo e seguia recluso. O que quer dizer que o fim da Impressão Digital talvez seja o encerramento do meu segundo ciclo nesta casa, não minha despedida final.)

Comecei a trabalhar no Link em maio de 2007, dois meses após sair da gravadora Trama, onde coordenava a agência de notícias do projeto Trama Universitário, que terminou depois que os contratos com seus patrocinadores chegaram ao fim. Em abril, o antigo editor-assistente do Link, Guilherme Werneck, me chamou para conversar com o então editor Otávio Dias. Guilherme estava saindo para dirigir a redação da revista Trip e sabia que eu havia saído da Trama. Veio me perguntar se eu toparia assumir seu cargo, logo que ele saísse. Gostei da ideia e fui conversar na redação do Limão – já acompanhava o Link de perto por atuar na cobertura de tecnologia desde o início da década passada e sabia que ele já era um caderno fora do padrão dos cadernos de informática de então (a começar pela mudança de nome).

Quando comecei a frequentar a redação do bairro do Limão, o Link era chefiado pelo Otávio e tinha nomes como Bruno Garatoni (hoje na Super Interessante), Maurício Moraes (que foi para a Info), Jocelyn Auricchio, Rodrigo Martins, Gustavo Miller, Cinthia Toledo e Filipe Serrano, estes três últimos, estagiários. Pedro Doria, que depois viria ser o editor-chefe de conteúdos digitais do jornal e hoje ocupa um cargo semelhante n’O Globo, ainda era colunista do caderno ao mesmo tempo em que também era repórter do caderno Aliás e também participava comigo, com o Otávio e com o Fabio “Fabão” Lima, do programa Link Eldorado, que ia ao ar todos os domingos. A arte do caderno, quando entrei, era tocada pela Bia Oliveira, depois pelo Marcelo Begosso, por Gustavo Godoy e, nesta primeira fase, Adriano Araújo.

Era uma outra época. O Orkut ainda era forte, o Facebook não existia fora dos EUA, o iPhone acabara de ser lançado, os consoles eram a grande força dos videogames, a Lei Azeredo pairava sobre nossas cabeças cogitando a obrigatoriedade de se digitar o CPF para acessar à internet, a internet via celular ainda era WAP, Rafinha Bastos e Danilo Gentili eram estrelas do YouTube, Lost misturava internet e TV e o Google começava a se expandir para além da web.

Quando o Ilan Kow, que hoje ocupa o cargo de diretor de produtos e projetos da casa, tornou-se editor-chefe de publicações especiais, ele assumiu a gestão de todos os suplementos do jornal e achou que eu funcionaria melhor como editor do que como editor-assistente do Link. Foi aí, em maio de 2009, que comecei a mudar completamente a forma como o caderno funcionava.

Para começar, finalizei a transferência da seção de tecnologia do portal Estadao.com.br para as mãos da equipe do Link. Não fazia sentido um caderno que cobre tecnologia e internet ter um site atualizado uma vez por semana (sério). Ao procurar alguém para ser meu editor-assistente, Ilan e seu braço direito Luiz Américo Camargo me sugeriram o nome de Heloisa Lupinacci, então editora-assistente do caderno de Turismo da Folha de S. Paulo. Lembro do primeiro almoço que tive com Helô (“só minha mãe me chama de Heloisa!”, disse ao final do encontro) e que ela dizia que não conhecia muito de tecnologia. “Não importa”, frisei, “você tem que entender de jornalismo”, antes de repetir um dos meus mantras – que essa é das poucas profissões em que você é pago para aprender.

Com Helô como copilota, reestruturei a equipe que, por outros motivos, ficara desfalcada. A repórter Juliana Cunha foi fazer um mestrado na Áustria, o repórter Lucas Pretti foi tocar o site do Divirta-se e Rodrigo Martins tornou-se editor de mídias sociais do jornal. Em seus lugares, chamei Tatiana de Mello Dias, que já havia trabalhado comigo na Trama e estava na IstoÉ, o amigo Fred Leal para ser o Personal Nerd e Ana Freitas, que havia acabado de terminar o estágio com a equipe do portal. O Filipe, que já era repórter, tornou-se o editor do novo site do Link e, no ano seguinte, todo mundo ganhou sua coluna.

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As diferentes equipes do Link durante a minha gestão

Estas mudanças atingiram a pauta de tal forma que o Link logo tornou-se referência não apenas entre os veículos que cobrem tecnologia, mas no jornalismo brasileiro. Na época a Helô, que hoje é editora-assistente do caderno Paladar, dizia que o Link não era um caderno, era um experimento jornalístico. E todos que passaram por ele – além dos citados, vale mencionar o compadre Camilo Rocha, Rafael Cabral, Fernando Martines, Marcus Vinícius Brasil, Bruno Galo, Murilo Roncolato, Carla Peralva, Ana Carol Papp e Vinícius Félix e, claro, o patolino magrelo Thiago Jardim, o diagramador que deu a cara que o Link tinha enquanto eu era editor do caderno.

Ao fim de 2012, me ausentei da edição por ter de me submeter a uma cirurgia, e, logo que voltei, recebi o convite para dirigir a redação da Galileu. Mas o diretor de redação do Estado, Ricardo Gandour, queria manter meu vínculo no jornal e me propôs continuar com esta coluna, que já havia saído do Caderno 2 e ido para o Link. Filipe Serrano, que tornou-se o editor-assistente após a saída da Helô, assumiu a edição do caderno, cargo que ocupa até hoje.

Nesta nova fase do Link, a Impressão Digital chegou ao fim. Foram 152 colunas ininterruptas. Parece motivo de tristeza, mas é bom que as coisas terminem. Encerro meu segundo ciclo na centenária redação com uma pontinha de saudade e um enorme orgulho. Sei do bom trabalho que fiz e como foi bom conhecer todos que conheci – e são dezenas de pessoas, de velhos amigos que reencontrei a novos conhecidos que tornaram-se chapas, amigos e confidentes. Despeço-me de todos aqui – mas a vida continua e com certeza nos encontraremos por aí.

Quem sabe, num futuro, até mesmo nas páginas deste jornal.

E não se esqueçam: só melhora!

Um abraço e tudo de bom.

Impressão Digital #131: Saindo do Link Estadão


A última encarnação do Link que comandei (em sentido horário a partir da esquerda): eu, Camilo, Thiago, Murilo, Vinícius, Carol, Filipe e Tati. sdds glr :~

Minha coluna de despedida da edição do Link. A coluna segue no caderno, toda segunda, mas desde a sexta-feira passada eu não frequento mais os corredores do sexto andar do prédio ocre perto da ponte do Limão na Marginal Tietê. Foi foda – saio com dorzinha no peito por perder determinadas convivências diárias, mas com a sensação de dever cumprido. Depois eu escrevo mais sobre isso…

Jornalismo, tecnologia, web e o que eu tenho a ver com isso
Sou feliz de trabalhar com quem trabalhei

Foi num jornal diário que comecei minha carreira e tomei gosto pelo jornalismo. A redação em que diferentes egos e perspectivas conversam e se chocam é um ambiente fantástico, circo-hospício seríssimo. Os assuntos mais pedestres trombam com as Grandes Questões da Humanidade, tudo correndo contra o relógio do fechamento, segundos contados para terminar o texto, chegar a foto, tratar a imagem, exportar a arte, pensar na página.

A primeira redação em que trabalhei tinha acabado de aposentar as máquinas de escrever e as trocado por PCs, mas não havia e-mail nem internet. Filmes eram revelados. Fumava-se na redação. Parece Mad Men, mas era 1994.

Lembro do primeiro PC com acesso à internet na redação, abandonado na sala de produção, ao lado dos computadores com matérias das agências de notícias, faxes e até uma máquina de telex. Eu era o único jornalista que me dedicava mais do que meia hora online, fuçando sites, listas de discussão e e-zines, antes de ter acesso à web em casa. Não à toa instiguei o próprio jornal a ter sua própria página na rede, ainda em 1996.

Mudei para a redação do jornal concorrente e tornei-me editor do caderno de cultura no mesmo ano em que o Napster popularizou o MP3. Foi quando percebi que internet não era só tecnologia – era cultura. Que baixar MP3 era o primeiro indício da transformação que o meio digital trazia. Não era só uma forma nova de “consumir cultura”, mas uma nova camada de experiência que atravessaria nosso cotidiano em breve.

E aconteceu: vieram os blogs, o Google cresceu, depois o YouTube, as redes sociais e o celular passou a acessar a internet. Passei por outras redações e cheguei a esta do Estadão no mesmo ano em que Steve Jobs mostrou seu iPhone. Novamente num jornal diário, mas o digital se impunha: fatos podiam ser checados online, fontes e personagens podiam ser descobertos em redes sociais, repórteres mandavam informações por celulares, todo mundo tinha e-mail, uma parte (pequena) da redação tinha blog. Ainda havia a máquina de fax e não era possível fumar no computador, mas ainda havia o fumódromo.

Quando comecei no Link, ainda editor-assistente, era relativamente fácil separar quem cobria que área no caderno. Mas os assuntos se misturaram e, ao ser promovido a editor em 2009, implodimos essas barreiras. Como passamos a escrever tanto para um caderno semanal quanto para um site diário – em vez de separar quem é do impresso com quem é do online. A mesma equipe também assumia o caderno em outras plataformas, que experimentou com as redes sociais antes do próprio jornal ter suas contas. Falamos do Twitter, do Marco Civil, do Facebook, da pirataria política e de impressão 3D antes de esses assuntos entrarem na pauta brasileira.

Mas a melhor coisa nestes cinco anos e meio de Link, que terminam nesta edição (estou deixando o Estadão esta semana) foi estar junto a pessoas ótimas, amigos dispostos a encarar desafios e a aprender, sempre de bom humor. Pessoalmente é a principal dívida que tenho com o jornal: ter trabalhado com pessoas tão fodas que vocês conhecem pelo nome e sobrenome, mas que me refiro como amigos – Filipe, Tati, Camilo, Murilo, Carol, Vinícius, Thiago, Helô, Carla, Rafa, Fernando, Ana, Fred, Rodrigo, Bruno, Ju, Lucas, Gustavo, Marcus. Juntos, transformamos não apenas o suplemento de tecnologia em um caderno central para o jornal como aceleramos a mudança na cobertura de tecnologia no Brasil. Além de termos aprendido e nos divertido muito, neste processo.

Quis o destino que meu último Link viesse na mesma semana em que o primeiro jornal que trabalhei acabou; o Diário do Povo, de Campinas, parou de circular no primeiro domingo deste mês. Mas isso não significa que o impresso irá acabar – estamos começando a ver uma transformação bem interessante no que diz respeito ao jornalismo, à tecnologia e, claro, à cultura humana. Vamos ver o que virá.

Saio da redação, mas sigo nestas páginas. A Impressão Digital segue aqui, toda segunda. Foi muito bom, aprendi muito. E não se esqueçam: só melhora.